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Assad é acusado de usar armas químicas em civis na Síria

Autoridade da saúde no país acredita que ataques foram feitos gases tóxicos como sarin e cloro. Governo Trump diminuiu oposição a Assad.

Foto via REUTERS/Ammar Adbullah.

Esta matéria foi originalmente publicada em VICE News.

Pelo menos 58 pessoas, incluindo 11 crianças, morreram no que se acredita ser um ataque com gás tóxico conduzido por jatos do governo sírio na província de Idlib, dominada pelos rebeldes, na terça-feira, segundo o Observatório Sírio de Direitos Humanos em Londres e oficiais de saúde locais.

Relatos do ataque químico em Idlib vêm apenas alguns dias depois que Nikki Haley, embaixadora dos EUA na ONU, chamou Assad de um "criminoso de guerra", mas disse que removê-lo do poder não é mais uma "prioridade" para o governo norte-americano. Os comentários de Haley são os últimos numa série de declarações da administração Trump que sinalizam uma mudança de prioridades dos EUA na Síria, com a guerra contra o ISIS assumindo a primeira posição.

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Na terça, o secretário de imprensa da Casa Branca Sean Spicer repetiu a posição da administração Trump de que Assad agora é uma "realidade política". Spicer chamou os ataques de "hediondos", mas acrescentou que eles são "consequência da fraqueza e indecisão da administração passada".

Imagens da cena do ataque na cidade de Khan Sheikhoun mostram vítimas com a boca espumando e a pupila contraída. Médicos na área disseram que os sintomas das vítimas eram consistentes com exposição ao gás mortal sarin, uma arma química proibida.

"Esta manhã [terça, dia 4], às 6h30, aviões atacaram Khan Sheikhon com gases, que acreditamos ser sarin e cloro", disse Mounzer Khalil, chefe da autoridade de saúde de Idlib, numa entrevista coletiva. Mais tarde, aviões dispararam foguetes contra clínicas onde os feridos estavam sendo tratados, dizem médicos e ativistas.

Uma fonte do exército sírio negou que armas químicas foram usadas, e o ministério da defesa da Rússia insistiu que não conduziu ataques aéreos na área.

Se confirmado, esse será o ataque químico mais mortal na Síria desde que sarin matou centenas de civis em Ghouta, nas proximidades de Damasco, em agosto de 2013. O ataque — que governos ocidentais e grupos de monitoramento como o Human Rights Watch atribuíram a Assad, e Assad culpou os rebeldes — levaram os EUA à beira da intervenção para remover o presidente sírio, antes de um acordo ser fechado prometendo a destruição dos arsenais químicos no país.

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Depois de quase quatro anos, Assad de alguma forma permanece no poder, ancorado pelo apoio russo e iraniano, que tem pendido a guerra para seu lado. Ataques químicos teriam continuado, mas em nível menor e com impunidade.

Não é uma surpresa

Nos últimos dias, oficiais dos EUA; incluindo o secretário de Estado Rex Tillerson, a embaixadora norte-americana da ONU Nikki Haley, e o secretário de imprensa da Casa Branca Sean Spicer; sinalizaram que retirar Assad do poder não é mais uma prioridade para os EUA.

Essas declarações marcam um rompimento radical com a posição pública da administração Obama — que pediu a saída imediata de Assad inicialmente, depois a mudou para reconhecer que Assad provavelmente continuaria no poder, mas insistindo que ele não poderia ser parte de nenhum governo de transição.

"Sabemos que ele é um obstáculo? Sim." Haley disse na última quinta-feira. "Vamos sentar aqui e nos focar em derrubá-lo? Não."

Os comentários de Haley atraíram ira dentro do próprio partido de Trump, com o senador John McCain criticando duramente a posição quanto a Assad. McCain reiterou suas críticas na terça, dizendo que o homem forte sírio provavelmente se sentiu encorajado pelos comentários recentes de oficiais norte-americanos. "Tenho certeza que eles se sentiram encorajados ao saber que os EUA vão recuar e buscar um novo arranjo com os russos", McCain disse a CNN.

Ainda assim, analistas não veem a nova posição como uma mudança muito significativa do status quo.

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Bill Roggio, editor do Long War Journal, disse que a posição da administração Trump marcou uma mudança retórica, mas reflete a realidade da posição dos EUA sob Obama.

"A administração Obama definiu uma linha vermelha, recuou, teve mais de cinco anos para fazer um esforço para remover Assad, e ao mesmo tempo trabalhou perifericamente com a Rússia para garantir que não houvesse problemas nas operações militares deles contra o Estado Islâmico", ele disse.

Roggio disse que as declarações norte-americanas podem ter encorajado Assad até certo ponto, mas que ele já tinha sido estimulado pelo fracasso norte-americano em agir contra ele em 2013.

"O que o encorajou mais? Os EUA dizendo que ia tirá-lo do poder por conduzir ataques químicos, e depois recuando? Ou os EUA dizendo que ele não é realmente uma prioridade?", ele disse.

Randa Slim, uma analista do Middle East Institute, tomou uma posição similar, escrevendo que as últimas declarações sobre Assad meramente refletem a adoção pública de "políticas que a Casa Branca de Obama buscou em segredo".

"Ele vem fazendo isso desde sempre"

"Ele vem fazendo isso desde sempre. Ele não precisa de uma declaração dos EUA como desculpa para jogar bombas", disse Roggio.

Desde o massacre em Ghouta, ataques químicos continuaram na Síria, mas em escala muito menor. Muitos deles envolveram gás cloro, que não foi incluído no acordo de armas químicas porque também tem usos não militares.

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Uma investigação conjunta entre ONU e a Organização para Proibição de Armas Químicas (OPAC) descobriu, em outubro, que as forças do governo sírio tinham usado gás cloro em pelo menos três ocasiões em 2014 e 2015, enquanto o ISIS usou dióxido de enxofre.

Em janeiro do ano passado, a OPAC disse que uma amostra de uma vítima de um ataque mostrava presença de sarin ou uma substância similar. Em fevereiro, a Human Rights Watch acusou helicópteros do governo sírio de lançar bombas de cloro em áreas rebeldes de Alepo, durante os estágios finais da batalha pela cidade.

A França pediu uma reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU sobre o ataque, enquanto a Turquia, que apoia os rebeldes no conflito e é um agente-chave em negociações de cessar-fogo, alertou que o ataque pode prejudicar tentativas de negociação para a solução do conflito.

Tradução: Marina Schnoor

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