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Música

Dezenove Anos Sem Tirar

Uma história que ainda merecia ser devidamente documentada é a do Garage Fuzz, que acaba de completar 19 anos.

Falar em hardcore à essa altura do campeonato, quando quase todas as bandas decentes já parecem ter feito tudo, pode parecer besteira. Mas se tinha uma história que ainda merecia ser devidamente documentada é a do Garage Fuzz, que acaba de completar 19 anos. Para os fãs, ou mesmo para quem começou a revirar e a pirar no udigrudi do terceiro mundo agora, acaba de sair um ótimo pacote multimídia, chamado Definitively Alive (Ideal Records), com CD e DVD.

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Dentro da realidade em que ficaram conhecidos, isto é, no meio de bandas toscas, fitas-demo mal gravadas, distribuidoras independentes capengas e fanzines mais ou menos, quando alguém surgia com um som minimamente coeso, ainda que sujo e urgente, o pessoal do skate costumava brincar dizendo "parece banda gringa". E o Garage, hoje formado por Alexandre "Sesper" Cruz – o Farofa (vocal), Fabrício de Souza (baixo), Daniel Siqueira (bateria), e os guitarristas Nando Basseto e Wagner Reis, cabia nessa comparação. Não à toa, foi com eles que a Roadrunner, depois do Sepultura, quis assinar contrato à cata de uma nova descoberta do rock tipo exportação.

Sem todos os meios de divulgação, troca e produção de que os artistas independentes podem lançar mão hoje, muitas bandas de hardcore nasceram no começo dos 90 por aqui, mas poucas atravessaram as dificuldades e a reciclagem tão constante do cenário. E, por mais que sempre pintasse uma treta de movimento aqui e ali, a rede comunitária que se formava em torno de todas as vertentes do punk rock nacional desde os anos 80 até meados dos 90 era mais do que inspiradora, refletia ideais e um estilo de vida. "Acho que banalizou muita coisa", critica o baixista Fabrício de Sousa, "Quem corria atrás dava um puta valor, hoje não é bem assim. O pessoal que pegou essa época, acho que talvez enxergue a facilidade atual de outra forma, mas a molecada mais nova tem que tomar cuidado".

Parte da história do nosso "Do It Yourself" se confunde com a história do quinteto no documentário dirigido pelo próprio Farofa e Lucas Valente, com depoimentos, cenas raras e uma boa construção. Apesar dos escorregões iniciais na gramática, estes rapazes de Santos foram pioneiros em cantar em inglês quando parte dos punks achava que isso era fascismo (vide as cusparadas, xingos e latas de cerveja voando no palco do antológico festival Juntatribo 2, em 94). Tudo por uma questão admiravelmente estética, já que eles, além de jamais terem se intimidado com acusação de babaca, nunca renunciaram à sua natureza sonora crua em nome da fama - mandaram a Roadrunner e os tais punks à merda e seguem até hoje pelas mesmas vias. Perguntei ao Fabrício sobre isso e ele me disse o mesmo que teria dito nas antigas: "Devemos acreditar em nossa personalidade. Grana realmente não é tudo!".

Todos os fatos marcantes são curiosamente abordados, fase a fase, o Farofa deixando a guitarra e assumindo somente o vocal, o aprendizado em estúdio na época da gravação de Relax In Your Favorite Chair, a tour com Samian em 2002, shows com Fugazi, Sick Of It All - todas bandas que os influenciaram -, e o já lendário episódio do Juntatribo 2. "O momento do Juntatribo foi engraçado", brinca Farofa ao relembrar, "na real o mais difícil era ficar explicando por todo lugar que tocamos, por anos, o que realmente aconteceu lá (risos). Mas superamos esse período na boa. Tocar com o Seaweed em 99 foi bem legal, a tour toda, os caras, as pessoas envolvidas".

A outra parte do DVD traz um show comemorativo aos 18 anos do grupo, com direito a faixas como "Post it Reminder", rara de se escutar nas apresentações dos últimos anos, além de hinos pra mandar ver no singalong e no stage diving como "Shore of Hope", "Embedded Needs" e "It's Funny". Aqui, as câmeras pegam quadros de tudo quanto é ângulo, os cortes são bem feitos, a edição é ágil e a fotografia está legal, além da resoluta captação sonora – apenas os takes de rosto ficaram meio zoados, mas quem se importa? Já no CD, tem faixas que não entraram no repertório do DVD, com arranjos especiais, regravações como a de "Wrapping Paper", que saiu numa demo, e as inéditas "Old Red Low Top" e "Dive In Yourself". E pra quem acha que isso é tudo, o Farofa me contou que eles estão preparando coisa inédita pela frente: "Já temos umas 12 músicas novas pra serem finalizadas, em breve teremos novidades, sem dúvida!". "A intenção é de gravar no segundo semestre desse ano", completou Fabrício.