O 3º ato do MPL não foi nem tão tranquilo, muito menos favorável — mas e a tarifa?

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O 3º ato do MPL não foi nem tão tranquilo, muito menos favorável — mas e a tarifa?

A forte repressão policial das duas primeiras manifestações, além dos danos físicos e políticos, também desviou a atenção da verdadeira reivindicação dos atos: R$ 3,80 não!

Após a forte repressão policial que pautou as duas primeiras manifestações do Movimento Passe Livre (MPL), o terceiro ato contra o aumento das passagens de ônibus e metrô de SP aconteceu nesta quinta (14) simultaneamente em dois pontos da cidade: no Theatro Municipal e no Largo da Batata. Desta vez, as manifestações contaram com começo, meio e fim – e sem maiores problemas. Mais ou menos.

Manifestantes concentrados no Largo da Batata, em Pinheiros. Foto: Felipe Larozza/VICE

A causa do MPL é específica: a diminuição da tarifa do transporte público e, futuramente, a tarifa zero. Porém, pouco se ouviu das autoridades governamentais sobre a questão do transporte público. Em vez disso, as manifestações do MPL se tornaram uma longa e tediosa discussão sobre o legítimo direito de se manifestar e se há ou não uma burocracia para divulgar com muita ou pouca antecedência o percurso dos atos.

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O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Alexandre de Moraes, já declarou que considera o Movimento Passe Livre uma organização "antidemocrática" e "desrespeitosa" por não divulgar o trajeto com antecedência. Ele também o critica por acreditar que o movimento " acoberta black blocs".

O outro ato simultâneo saiu do Theatro Municipal, no Centro de São Paulo, sentido MASP, na Av. Paulista. Foto: Guilherme Santana/VICE

Os trajetos das duas manifestações foram divulgados nas redes sociais às 15h. Após a divulgação, militantes do MPL foram chamados para uma reunião com o Governo do Estado, o Ministério Público e a Prefeitura na quinta à tarde, mas não compareceram. "É complicado um policial ligar pra você uma hora antes da manifestação te chamando para uma reunião para a qual a gente não teve nenhuma preparação, nenhuma linha política definida. Não ir a essa reunião também é uma espécie de protesto contra o fato de eles tentarem definir o trajeto da manifestação, que não cabe à polícia", declarou Matheus Preis, porta-voz do MPL presente no ato que saiu do Theatro Municipal.

O Matheus Preis era um dos representantes do MPL no ato que partiu do Theatro Municipal. Foto: Guilherme Santana/VICE

Anteriormente, pouco se falava do hábito do MPL de não divulgar seus trajetos antecipadamente. A grande crítica do secretário é que a organização é a única que não faz essa divulgação e que isso seria uma grave violação ao inciso XVI do artigo 5º da Constituição Federal. Embora o dispositivo não estabeleça um prazo para a divulgação do ato, esse foi um motivo válido para o Governo do Estado autorizar o massacre da última terça-feira (12), triplicando a presença de policiais militares e de P2 (agentes infiltrados), desviando, assim, qualquer atenção sobre a verdadeira discussão: a redução da tarifa.

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A Polícia Militar, em grande número, acompanhou todo o trajeto das duas manifestações. Foto: Guilherme Santana/VICE

O silêncio e a tolerância do prefeito Fernando Haddad, conhecido por seus discursos de mobilidade urbana, também contribuíram para que os gritos das manifestações denunciassem a aliança entre ele e o governador Geraldo Alckmin. "Ano passado teve faixa de ônibus e passe escolar; então, deu uma amenizada no discurso contra o aumento. Mas… e neste ano?", aponta Matheus. "O Alckmin e o Haddad estão muito bem articulados. A polícia claramente tinha um respaldo muito forte pra fazer o que fez, tanto do prefeito quanto do governador. É bastante preocupante a forma como eles atendem às demandas políticas. Em vez de gastar dinheiro com a repressão, esse dinheiro poderia ser usado para atender a reivindicações populares", conclui.

Foto: Felipe Larozza/VICE

No último ato simultâneo – e ainda com o gosto ruim do gás lacrimogêneo que não deixou as duas primeiras manifestações (só no segundo ato, foram 13 detidos e diversos feridos por estilhaços e balas de borracha) terminarem normalmente –, o MPL acabou divulgando o trajeto em sua página oficial no Facebook algumas horas antes da concentração. "A gente está definindo o trajeto antes justamente pra deixar claro que, ao contrário do que a polícia disse, a gente não está descumprindo nenhum acordo. O que acontece é que a polícia tentou impor um trajeto; então, a gente publicizou nosso trajeto pra que fique claro que esse é o trajeto que a gente definiu e que a gente pretende cumprir", declarou Matheus.

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Foto: Felipe Larozza/VICE

"Quem deve decidir o trajeto são as pessoas que estão organizando o ato. Seja a população por meio de assembleia, seja o movimento social que está puxando a manifestação – e não a polícia", frisou Vitor Quintilliano, do MPL, presente no ato de Pinheiros.

Vitor Quintilliano, representante do Movimento Passe Livre no ato que partiu do Largo da Batata. Foto: Felipe Larozza/VICE

Mesmo sem trégua da chuva nos dois pontos da cidade, a caminhada dos dois atos foi tranquila. Algumas pessoas estavam pessimistas e esperavam o pior, principalmente porque a PM revistou as pessoas que saíam do metrô em busca de qualquer ameaça e também porque proporção de policiais para o número de manifestantes era bem grande. Em ambos, a PM usou a tática de envelopamento, guiando a manifestação na frente, fazendo cordão nos lados e fechando a galera por trás. "É importante tentar espalhar a luta pela cidade: duas manifestações criam dois focos de resistência e mobilização", explicou Quintilliano sobre a tática de manifestações simultâneas. Na manifestação em Pinheiros, muitos policiais da Força Tática que acompanhavam o pessoal estavam sem nenhuma identificação no uniforme. Detalhe que foi diversas vezes mencionado entre os presentes.

Alguns policiais estavam sem identificação no uniforme. Foto: Felipe Larozza/VICE

Segundo o MPL, 6 mil pessoas compareceram ao ato do Centro e 5 mil, em Pinheiros. A Polícia Militar falou em dois mil no total. Nós contamos cerca de três mil pessoas somadas nos dois atos.

Manifestantes na estação Butantã do metrô. Foto: Felipe Larozza/VICE

Terminado o ato da Zona Oeste no Metrô Butantã, houve um pequeno tumulto porque as portas do metrô estavam fechadas. Pouca gente saía e pouquíssimos conseguiam entrar, já que as entradas da estação estavam coalhadas de agentes da Tropa de Choque. Uma bomba de gás foi lançada na Avenida Vital Brasil, causando um corre-corre que se acalmou em instantes.

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Alguns manifestantes (entre eles, os secundaristas que lutaram contra a reforma da educação estadual) conseguiram entrar no metrô e fizeram um círculo defronte às catracas até conseguir liberar o passe livre na linha amarela. "Se eles liberam para os ricos nas passeatas contra a Dilma, têm de liberar para o trabalhador também", comentou uma mulher que aguardava a liberação. A Tropa de Choque estava lá, lógico, com a mão no gatilho das armas pesadas que servem para lançar balas de borracha. Clima pesado, porém, em alguns minutos, um representante da linha amarela falou no megafone que a passagem seria liberada para os presentes.

"Se alguém danificar os equipamentos do metrô, não vai ser bom para ninguém", alertou o funcionário. "Mascarado também não entra". Quem estava lá, voltou de graça para casa.

Atualização (15/01 às 16:17): A assessoria de imprensa da Via Quatro (concessionária da linha amarela) informou que não é permitida a liberação de catracas para a população. O fato, segundo eles, está sendo apurado.

Diferentemente do que aconteceu no Centro. Depois de andar quatro quilômetros, o MPL concluiu o ato no MASP, como prometido. A Avenida Paulista foi fechada nos dois sentidos para a manifestação passar, embora nenhuma estação de metrô estivesse aberta. Na Consolação, algumas pessoas tentaram forçar a entrada: elas quebraram o vidro da estação e conseguiram descer. Na plataforma, houve a tentativa de pular catraca, mas os seguranças do metrô reagiram e rolou o confronto no braço com alguns manifestantes. O pânico aconteceu quando uma bomba estourou dentro da estação. A PM afirma que foi um manifestante que soltou um rojão, porém outras pessoas disseram que foi a Polícia. Na hora, mais policiais desceram e jogaram bombas e gás de pimenta dentro da estação. Um estudante levou um cassetete na cabeça, enquanto outra menina afirmou que foi agredida. O Grupo de Apoio ao Protesto Popular (GAPP) informou que atendeu o estudante e mais um manifestante que escorregou na grade do metrô.

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Manifestante ferido durante confusão na estação Consolação do metrô. Foto: Guilherme Santana/VICE

Do outro lado da estação, o vidro foi completamente estilhaçado para que as pessoas conseguissem passar. Mais gente se feriu por conta dos cacos de vidro, e o tumulto começou a se formar nas calçadas da avenida. Gente que não tinha nada a ver com o protesto ficou desesperada na hora em que a polícia soltou uma série de bombas para dispersar quem ainda tentava furar o bloqueio e entrar na estação. A PM escoltou mais gente para fora e deteve oito pessoas acusadas de depredar a estação. A assessoria de imprensa do metrô não tem nenhum comunicado oficial sobre o confronto.

Alguns manifestantes foram detidos pela Polícia Militar na estação Consolação. Foto: Guilherme Santana/VICE

O próximo ato foi agendado para o dia 19, na terça-feira, às 17h no cruzamento entre duas importantes vias da capital: a Avenida Brigadeiro Faria Lima e a Rebouças. Desta vez, esperamos que a cortina de fumaça montada pelo Governo do Estado e a Prefeitura de São Paulo se desfaça tão rápido quanto o efeito da bomba de gás na chuva e que a discussão sobre a redução ou não da tarifa (e a tão necessária questão do transporte público de uma forma geral) possa ser novamente a protagonista.

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