Este artigo foi originalmente publicado na VICE UK.
É fácil odiar a selecção de futebol feminino dos EUA. Enquanto quatro vezes vencedoras do Campeonato do Mundo, a equipa é confiante e mortal. Na competição deste ano, em França, passaram pela fase de grupos, sofrendo apenas um golo e com uma vitória recorde de 13-0 contra a Tailândia, o que não tornou a equipa mais querida aos olhos do público em geral. Nos jogos contra o Chile e a Suécia, o conjunto norte-americano continuou a dominar, com um jogo agressivo e de pendor fortemente atacante.
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Acrescente-se a isso o quão irritantes as jogadoras norte-americanas foram durante a Copa SheBelieves em Abril deste ano, ao terem chegado ao jogo contra Inglaterra vestidas com camisolas que ostentavam os nomes de mulheres inspiradoras e pode perceber-se a reputação. Elas são realmente, vocês sabem, americanas – e vão provavelmente ganhar o Campeonato do Mundo.
No entanto, uma das atletas está acima de todas essas crítica (provavelmente, um pouco injustas): a políticamente opinativa Megan Rapinoe. A extrema, que é co-capitã da equipa e está actualmente a disputar o seu terceiro Campeonato do Mundo, foi notícia esta semana depois de um vídeo divulgado há alguns meses pelo Eight by Eight se ter tornado viral. Nele, Rapinoe afirma que não vai “à merda da Casa Branca” se a equipa dos EUA ganhar o Mundial e que a equipa “não será convidada”. Donald Trump, considera-te avisado.
Trump viu o vídeo e lançou-se contra Rapinoe no Twitter. Depois de acidentalmente ter marcado uma conta de fãs (e ter reescrito o tweet 40 minutos depois, Sad!!), o presidente disse a Rapinoe para não “desrespeitar o nosso país, a Casa Branca, ou a nossa bandeira“. Quando questionada sobre a polémica numa conferência de imprensa antes do jogo dos quartos-de-final dos EUA contra a França, Rapinoe reiterou as suas declarações. “Mantenho o comentário que fiz sobre não querer ir à Casa Branca”, garantiu. E acrescentou: “Acho que não gostaria de ir e encorajaria as minhas colegas de equipa a pensarem bem sobre emprestarem esta plataforma e cooperarem com uma administração que não sente da mesma maneira e não luta pelo mesmas coisas que nós lutamos”.
Esta não é a primeira vez que Rapinoe é descaradamente política. É uma jogadora abertamente lésbica, uma porta-voz de muitas instituições de caridade LGBTQ+ e foi a primeira desportista abertamente queer a aparecer na capa da Sports Illustrated. Em 2016, Rapinoe ajoelhou-se em solidariedade com o jogador de futebol americano Colin Kaepernick e, depois de ser proibida pela Federação Americana de Futebol de o voltar a fazer, recusou-se a cantar o hino nacional em todos os jogos do Mundial realizados até agora. É também uma das muitas jogadoras da equipa que estão a processar o seu empregador por salários desiguais, o que é um cenário quase ridículo já que a selecção masculina dos EUA não conseguiu sequer ser classificada para o Campeonato do Mundo do ano passado. Ah e ela é a única jogadora de futebol a ter marcado um “golo olímpico” nas Olimpíadas, directamente de canto. Nada a ver com política, mas só para se perceber que ela é muito, muito boa.
Num desporto em que a maioria dos jogadores são excepcionalmente aborrecidos, o fogo de Rapinoe destaca-se. A maioria dos atletas de alto nível são uns chatos, graças aos anos passados em academias e ao facto de não terem tempo para nada que não seja relacionado com o futebol. Só falam em vernáculo desportivo – aquele discurso vazio e robótico que ouves literalmente de qualquer jogador em qualquer liga quando falam com a imprensa. No futebol feminino, no entanto, ainda é possível captar um toque de carácter, já que muitas das jogadoras não passaram pelo rigoroso treino das academias e viveram vidas reais fora do desporto. Rapinoe, por exemplo, jogou em equipas treinadas pelo seu pai até ao liceu.
Numa altura em que o Mundo é tão profundamente horrível, precisamos de pessoas com plataformas a partir das quais possam foder um pouco as coisas. Rapinoe é uma figura antagónica, o que é raro num desporto onde a maioria dos jogadores não toca em questões controversas nem com o dedo mindinho, (menos o nosso herói e aliado de longa data, Héctor Bellerín). A ideia de que o desporto não é politizado ou que se deve manter longe de questões controversas é ignorante e prejudicial e Rapinoe não tem medo de se opor a isso.
E nós apoiamos a capitã do cabelo cor-de-rosa.
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