Ibulay dentro de sua caverna
Todas as fotos por Felipe Passolas.

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Viagem

Os moradores das cavernas de Granada

Por décadas, as cavernas são o lar de pessoas que buscam um modo de vida alternativo.
Madalena Maltez
Traduzido por Madalena Maltez
MS
Traduzido por Marina Schnoor

Este artigo foi originalmente publicado na VICE Espanha.

Nos montes de Granada, ainda há pessoas a viver nas cavernas, em Albaicín e Sacromonte, zonas protegidas como Património Mundial da Humanidade [seleccionadas pela ONU como marcos nacionais].

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O espaço de Curro Albaicín's is a shrine to tradition.

Em 1963, os então habitantes dessas cavernas foram despejados pelo governo de Franco, depois de chuvas pesadas terem causado deslizamentos de terra e inundações pela cidade. Mas, nas últimas décadas, as cavernas abandonadas foram reocupadas. Algumas famílias conseguiram licenças de habitação, mas nem todas.

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A comunidade das cavernas de Albaicín é formada principalmente por imigrantes e pessoas que buscam um modo alternativo de vida – todos recebem de braços abertos os forasteiros que procuram sítio onde ficar a curto prazo.

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Uma caverna na zona de Albaicín

Sacromonte está dividido em duas comunidades – uma é um lar de famílias que moram aqui há gerações e, a outra, formada por viajantes e "espíritos livres". Mas, independentemente de onde vivas, tem uma das melhores vistas de Granada, de onde se podem ver alguns dos marcos mais populares de Espanha.

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A comunidade das cavernas de Sacromonte

Enrique Carmona é roma e dançarino de flamenco profissional. É o dono do María La Canastera, um bar tradicional de flamenco em Sacromonte que atrai espanhóis e turistas há meio século. Enrique aprendeu os seus primeiros passos de dança com a mãe, María, uma figura famosa na cultura flamenca. A caverna de Canastra, baptizada com o nome da sua mãe, é um dos pontos mais populares da área.

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Enrique Carmona

Carmona tem como objectivo preservar o sabor e a autenticidade do flamenco de Sacromonte - evita instalar holofotes e usar microfones e prefere que os dançarinos estejam no chão, sem palco, sempre perto do público.

O cantor Curro Albaicín anda pelas cavernas de Albaicín desde que era criança, nos anos 1950. Na época, a comunidade recebia actores de Hollywood e celebridades nos seus famosos espetáculos de flamenco.

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Uma actuação no María La Canastera.

“Foi assim que aprendemos”, diz-me Curro, “a ver, a ouvir e a cantar”. A forma como a comunidade combinava a sua paixão pela cultura com a vida quotidiana, acrescenta Curro, foi o que tornou este sítio especial.

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Hoje, Curro ensina as tradições da comunidade e da cena do flamenco a vários jovens, transformando a sua caverna num museu vivo de memória e arte. “Mesmo que os jovens deixem as suas pegadas modernas, a coisa mais importante é que não se esqueçam da tradição, porque já não restam muitos de nós vivos. Quando morrermos, a tradição vai perder-se para sempre, a menos que a passemos às gerações mais novas”, explica.

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Curro Albaicín

Ibulay é da pequena cidade de Passi, no Senegal. O homem de 46 anos mora em Espanha há 17 e trabalha agora como motorista. “A vida é mais calma nas cavernas”, diz-me. E acrescenta: “Sofro menos racismo do que na cidade e aqui vivo numa comunidade onde há pessoas do meu país”.

Fica triste com a falta de integração no resto do país e confessa que, quando chegou à Europa, nunca imaginou que a vida em Espanha fosse assim. Mas, aqui em Albaicín, Ibulay adora o facto de que cada caverna conta uma história diferente e com orgulho.

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A caverna de Curro Albaicín é um altar dedicado à tradição

Mbacke, de 34 anos, é de Touba, uma cidade a 193 quilómetros de Dakar. Chegou a Espanha ilegalmente em 2015 e ainda está à espera da legalização. Os seus amigos contam-me que teve uma vida difícil nos últimos anos, vivendo entre Bilbao, Madrid e Almeria, mas que sempre o apoiaram e que, agora, ele se sente parte da comunidade. “Nós protegemos-nos e fazemos companhia uns aos outros”, diz-me Mbacke.

Ainda assim, os moradores vivem com medo de serem despejados. “Houve alguns despejos em 2013”, diz Lola Boloix, representante da Associação do Bairro de Albaicín. A comunidade, acrescenta Boloix, está determinada a encontrar uma solução a longo prazo. E salienta: “Entendemos que, devido ao tipo de pessoas que as cavernas atraem, é importante para as autoridades saber quem mora aqui e porquê”.

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Ibulay inside his home.

No ano passado, Miguel Angel Fernandez – o conselheiro local de planeamento urbano – explicou que a área tinha sido designada para uso polivalente, mas como é tradição na política da Andaluzia, nada foi feito para explicar aos moradores o que isso significa para o seu futuro. Até o governo já argumentou que, por ser uma área protegida, é difícil fazer qualquer plano de construção.

Os moradores das famosas cavernas de Granada vão continuar a lutar contra as acusações de que a sua comunidade é cheia de viciados, violência e cães raivosos. Eles querem que as pessoas saibam que cada pessoa cuida da sua caverna à sua maneira, que muitas pessoas vão e vêm, mas que nas cavernas a vida é maravilhosa, não só pela temperatura, mas também pelo sentimento de comunidade.

Vê mais fotografias das cavernas de Alabaicín e Sacromonte abaixo.

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Mbacke

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