FYI.

This story is over 5 years old.

VICE Sports

Bons filmes brasileiros obscuros (ou um tanto esquecidos) sobre futebol

Avaliamos o melhor do cinema boleiro alternativo.
Cena de Perigo Negro, filme de Rogério Sganzerla sobre a decadência de um craque. Crédito: Reprodução

De vez em quando, ainda mais em ano de Copa do Mundo, o papo aparece. Quem já não ouviu ou leu que o cinema nacional segue sem retratar o futebol à altura, como ele merece? Ou que faltam obras-primas tematizando a bola? Olha, sabe-se não ser fácil simular a plástica, os dribles, a imprevisibilidade do jogo e colocar em cena a apreensão do torcedor. Mas o cenário tá longe de ser essa terra arrasada. Bote fé: tem coisa boa na produção brasileira, trabalhos que conseguiram traduzir o esporte e sua paixão em belas imagens. Foi a nossa conclusão ao procurar títulos apenas nesta categoria, desviando de obras mais famosas como “Boleiros – Era Uma Vez o Futebol”, “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias” e “Linha de Passe”. Encontramos uns filmes obscuros, outros um tanto esquecidos da cinematografia futebolística do país e, ó, dá pra se divertir vendo paradas de várias décadas. Dirigidas por cineastas consagrados e desconhecidos. Se liga na lista de achados.

Publicidade

PERIGO NEGRO (1992)
Direção e roteiro: Rogério Sganzerla

A princípio, a fábula que junta um jogador em ascensão, um inescrupuloso dirigente e um torcedor fanático pode parecer meio esquisita nas mãos do diretor de “O Bandido da Luz Vermelha”. Relaxa que dá jogo. Um dos cinco episódios do filme “Oswaldianas”, este média-metragem é inspirado em roteiro escrito por Oswald de Andrade e publicado na “Revista do Brasil” em 1938. Grande fã do modernista, Rogério Sganzerla achou o script e foi adiante: escalou o Perigo Negro pra jogar no cinema, transpondo a história pro começo dos 1990. O personagem-título é craque do Estrela – na real, o Flamengo, com direito a uniforme e tudo –, idolatrado pela galera, festejado por poderosos e, portanto, por cima da carne-seca. Pra ter uma ideia do moral do cara, ele faz questão de mandar no microfone dos repórteres de campo que “com Perigo, escreveu, não leu, o pau comeu”. É mole? Sua trajetória é acompanhada com paixão por Rafael, barbeiro de fala italianada interpretado por Abrahão Farc, e de maneira bem crua pelo cartola Moscosão, papel de Antônio Abujamra. Daí nasce uma baita tensão.

Sganzerla nos mostra um Bangu e Flamengo disputado na Gávea, coloca o Maestro Junior em cena, expõe um triângulo amoroso entre o cabeleireiro, sua mulher, a manicure Finfa (Helena Ignez), e o dirigente. Mas o bicho pega mesmo é com a contusão de Perigo. O atacante precisa de tempo e oportunidade pra se recuperar, o que não vai rolar. Então, o artista da bola é colocado de lado e temas como ingratidão e falta de comprometimento vêm à tona. Sem contar os conflitos. Rafael se revolta, xinga muito, Moscosão fecha a porta e, escondido, ainda põe os troféus do clube pra derreter.

Publicidade

Tem fogos de artifício preenchendo a tela no fim, tem um cara gritando que o sindicato é a saída várias vezes durante o filme. E tem o herói virando, de forma prematura, um ex-atleta com um filho pequeno pra criar. Que paulada.

Avaliação VICE Sports: Pênalti do francês Bellone que bateu na trave, no corpo do goleiro brasileiro Carlos e acabou entrando no gol na Copa de 1986. Curioso, marcante, dramático. Nota 8,5/10

A REVOLTA DO VIDEOTAPE (2001)
Direção e roteiro: Rogério de Moura

Primeiro, há torcedores tristes, irritados e desanimados pelo fato de seu time não ter vencido o clássico que rolou à tarde. Depois, como se não bastasse o sofrimento, eles aguardam ansiosamente o instante de rever lances da partida e ouvir os comentaristas da TV. Por fim, um dos jornalistas da mesa redonda entra no ar transtornado com o resultado de 0 a 0 e um gol inacreditavelmente perdido no duelo mais esperado da rodada. “[Ele] Dá um bico tão infantil na bola”, lamenta-se, ao vivo, aos telespectadores. Pra quem acompanha futebol, sequência muito familiar essa. Aliás, é realidade que chama, né? Sim e não. Em pouco mais de dez minutos, este curta-metragem parte do habitual e chega ao fantástico dando outro ângulo às discussões em torno do jogo, um lance específico e seu replay.

Acredite: Rogério de Moura envereda pelo realismo mágico aqui. Senão, vejamos. O preâmbulo é narrado por Pedro Bial (sério), que enfatiza em sua fala ter sido o videotape “a mais fascinante das invenções”. Ponto central da história, o recurso encanta por dar outras chances de entender a realidade. Não tão fácil, claro. A todo momento, ele tanto mostra e amplia o que aconteceu quanto pode até distorcer a parada. Pela repetição, pelo ponto de vista. É aí que entra Zequinha, jogador do Pindamonhangaba achincalhado no programa “Futebol Debate” por desperdiçar grande oportunidade diante do São Tomé, só ele e o gol. Vivido por Eduardo Silva, o ator que interpretava Bongô no “Castelo Rá-Tim-Bum”, o personagem se redime, de maneira hilária, pelo replay. Tipo “olhe de novo pra ver o que acontece”. Bem antes da cultuada série “Black Mirror”, a tecnologia da informação e os humanos se chocam, incluindo nesta treta grande barraco entre um monitor e um comentarista, a quebra da tela de uma TV e vias de fato. As consequências da modernidade, porém, deságuam num sambão no Bar do Pedrinho, na Vila Santa Isabel, zona leste de São Paulo. No fim, quem ri por último ainda canta Paulo Vanzolini.

Publicidade

Avaliação VICE Sports: Drible do são-paulino Müller em Ferrer, lateral do Barcelona, na final do Mundial Interclubes de 1992. Desconcertante, engraçado, vibrante. Nota 9/10

INICIADA A PELEJA (1965)
Direção e roteiro: Carlos Hugo Christensen

Cena da trama inspirada em conto de Fernando Sabino. Crédito: Reprodução

Logo de cara, dá pra ver que o advogado da história tá bem bolado. O motivo? Enquanto Brasil e Espanha se enfrentam em Madrid, ele tem de encarar uma reunião de trabalho com a chefia no Rio de Janeiro. Sua paixão pelo futebol e a seleção gritam, mas não dá pra pular o compromisso. Assim sendo, em vez de ver o jogo em casa, o jeito é levar o radinho pro trampo. Aí é que tá o deleite, toda a graça do filme.

Como o homem contrariado em estar ali, Jardel Filho dá um show. No início, toda a seriedade do encontro – a discussão sobre o crédito agrícola no país – o faz tentar se segurar. Em vão. Pelo fone, ele escuta Jairzinho, Pelé e Gerson tramarem as maiores jogadas ao mesmo tempo em que as palavras dos diretores da empresa a respeito de safras, dívidas e produtores entram por um ouvido e saem pelo outro.

Adaptação de conto homônimo de Fernando Sabino, o filme transforma-se num jogral cheio de intervenções (furadas) do personagem principal. Em meio à votação de um tema na reunião, o advogado solta um “impedido!”. Não satisfeito, segue firme no nonsense. Numa espécie de transe, ele se levanta, interrompe quem lê o relatório, deixa os colegas de sala em suspense e enfim vibra com mais um gol do Brasil na partida. Impagável. O último dos 11 episódios de “Crônica da Cidade Amada”, longa produzido em homenagem à Cidade Maravilhosa, é uma bela tabela entre Jardel Filho e o cineasta argentino Carlos Hugo Christensen.

Publicidade

Avaliação VICE Sports: Gol de Ricardinho pro Corinthians, no fim do jogo contra o Santos e que classifica o time pra final do Paulistão 2001. Trabalhado e impensável ao mesmo tempo. Nota 8,5/10

ONDA NOVA (1983)
Direção e roteiro: José Antonio Garcia e Ícaro Martins

Num tempo em que o futebol feminino penava pra ser considerado esporte pelo CND (Conselho Nacional de Desportos, o então responsável pela regulamentação das modalidades no país) e só o fato de ele existir era malvisto até pelo Ministério do Trabalho (olha essa notícia em edição da “Folha de S.Paulo”, de março de 1983, chamada “Mulheres, novo problema”)), “Onda Nova” fala justo de jogadoras. Pura ousadia e alegria de Garcia e Martins. Em seu segundo longa, a dupla de cineastas formados na USP e ligados à Boca do Lixo monta um quadro das dores e delícias das mulheres que decidiam entrar em campo e viver como queriam. Ali há o cotidiano de morar em comunidade num apê, a goleira que jogava bola escondida dos pais e acaba saindo de casa, a pressão dos cartolas, a festa de ir pro jogo cantando e dançando no busão, a mina que transa, engravida e recorre a um aborto. Vendido como “colagem surrealista da juventude paulistana”, o filme retrata ainda uma época.

Tem desde Regina Casé beijando o lateral esquerdo Wladimir, passando por uma pá de Fusca, Brasília e Passat nas ruas, a trilha sonora com Michael Jackson, Rita Lee e “China Girl”, de David Bowie. Numa sequência, até Caetano Veloso entra, pegando um táxi e dando uns amassos numa moça pelo caminho, sem saber se quer ir pra Liberdade ou pro Parque Trianon, em São Paulo. Em meio a tudo isso, a produção joga seus holofotes em sexo – muito sexo – pro corpo ficar odara e na autodeterminação diante de novos tempos, em fim de regime militar, do oliva da nuvem chumbo ficando pra trás da manhã. É pornochanchada, é frescor, é algo de trash, é um grito (como o do personagem, no fim, num carro na Marginal Pinheiros).

Publicidade

E, lógico, depois daqueles três gols de Paolo Rossi na Copa de 1982, é a vontade de dar a volta por cima, com o confronto entre o time das garotas e a seleção italiana, narrado por Osmar Santos. Não se mediram esforços: no elenco, Tânia Alves e Cida Moreira mais seus vozeirões, Carla Camurati em começo de carreira interpretando um verdadeiro furacão. Casagrande também tá na tela, “descabaçando” uma jogadora (Noris Lima) que queria perder a virgindade e manter alta a atividade pós-treino. O filme inicialmente barrado pela ditadura só pôde estrear em circuito comercial já em 1984, quando enfim liberado pelo Conselho Superior de Censura.

Avaliação VICE Sports: Gol de Marta contra os Estados Unidos na semifinal da Copa do Mundo de 2007. “Como é que é aquela jogada mesmo? Vou ver de novo.” Nota 8/10

OS FIÉIS (2003)
Direção e roteiro: Danilo Solferini

Como já indica o nome do filme, o papo aqui é o Corinthians, mas não imagine que só a Fiel possa curti-lo. O lance vai além ao falar de amizade, da paixão por um clube e de aventura. Tudo isso mais a viagem que três caras fazem numa Kombi pra torcer pelo Timão no Rio de Janeiro. Estamos em 1976 e a ocasião é importantíssima. Há 22 anos sem título, a equipe disputaria a semifinal do Campeonato Brasileiro contra o favorito Fluminense em pleno Maracanã. Eles estão a caminho de invadir ruas, praias e arquibancadas cariocas com outros 70 mil entusiastas do time. Ou seja, 5 de dezembro daquele ano era o Dia D pra estes brothers.

Publicidade

É futebol, é sofrimento e mais, bem mais. Entre flashbacks e depoimentos no presente, eles relembram a data, as expectativas e, principalmente, seus desejos. Túlio (Donizete Mazonas) queria reconquistar a namorada que picou a mula – Denise, simplesmente Malu Mader. Já Pedrão (Gustavo Brandão) buscava revanche, não disfarçando a relação de amor e ódio mantida com Rivellino. Na opinião dele, era um genial traíra que deixara o time em 1974 pra jogar justamente no Flu, o rival da ocasião. Joca (João Bresser), por sua vez, tinha motivações políticas: tempos de mudança e de mandar o regime militar pras cucuias podiam começar ali.

A Invasão Corintiana deu certo. E o curta também, inflando a vontade de entrar numa máquina do tempo e ser despejado no Maracanã naquele dia, mesmo que se passe longe de torcer pro clube do Parque São Jorge ou pro das Laranjeiras. Delicioso relato de época, com direito a resgatar até a narração de Fiori Gigliotti pro pênalti batido por Zé Maria, que classificou os paulistas à final contra o Internacional. Pepita do cinema nacional sobre futebol.

Avaliação VICE Sports: Futebol do argelino Rabah Madjer. Habilidoso, incisivo, semidesconhecido no Brasil. Nota 10/10.

O BARÃO OTELO NO BARATO DOS BILHÕES (1971)
Direção e roteiro: Miguel Borges

Nos anos 1970, enquanto a ditadura alardeava o “milagre econômico”, muitos viam na Loteria Esportiva a saída pra tornar o falatório uma realidade. Criado pelos milicos em 1969, o jogo virou febre, fazendo a galera vibrar só de pensar em embolsar uma grana alta da noite pro dia, sem ficar vendo o bolo crescer pra tentar pegar alguma fatia depois. Virou também tema recorrente nas telas, como na comédia de Miguel Borges, um dos nomes do Cinema Novo (à época já afastado do movimento). Aqui, Grande Otelo é João Sem Direção, ora frentista de posto, ora gandula no Maracanã, sempre no corre pra sustentar suas três mulheres. Até que conhece o empresário Carvalhais (Ivan Cândido) a caminho do estádio.

João Sem Direção. Crédito: Reprodução

Publicidade

Após saber o que é a Loteca, o trabalhador passa a investir todas as forças em acertar cada um dos resultados das 13 partidas no cartãozinho. Isso envolvia, por exemplo, viajar ao interior do Rio de Janeiro com uma mala recheada de cédulas pra ver se rolava um empate num duelo entre Fluminense e Rio da Prata – seu estilo de tentativa de suborno e a conclusão do episódio são desconcertantes. Otelo inclusive vai em busca de levantar algum pra alcançar o objetivo, ocasião em que dá de cara com Pelé, ou melhor, o Doutor Arantes, diretor do banco que lhe avaliza um empréstimo de 10 milhões de cruzeiros. O filme mostra um goleiro (interpretado por Rogério Fróes) em crise e Ivan Cândido de volta ao Mario Filho interessado em apostar, como em seu papel em “A Falecida”, de Leon Hirszman, mas não enfoca apenas o futebol.

Ao dar atenção aos questionamentos de João sobre o que fazer com o dinheiro faturado no jogo, Borges tanto brinca de ser surrealista, convertendo o personagem em estátua (bem vivo e peladão) no Museu da República depois de uma perseguição, quanto faz referência em outra cena a “Tempos Modernos” e ao Carlitos que enlouquece nos movimentos repetitivos da fábrica. Na história, surgem ainda um alquimista hippie (Milton Moraes), citações bíblicas aqui e acolá, Dina Sfat na pele de uma espécie de dominatrix, a Maria Vai Com as Outras, e, sim, a transformação de João em milionário, no Barão do título. Tem até a poesia de uma sequência em que Carvalhais, suas secretárias (entre elas, Elke Maravilha) e Otelo entram numa daquelas máquinas de lavar carro, jorrando água a valer, ao som de Edu Lobo e Luiz Eça. Um barato, bicho.

Publicidade

Avaliação VICE Sports: Gol de Bebeto contra a Holanda na Copa de 1994. Um lance que vai do cômico, com Romário se excluindo da jogada quase como um malandro andando pela cidade, ao lírico, na comemoração do camisa 7 embalando um bebê (depois, banalizado). Nota 8,5/10

ASA BRANCA – UM SONHO BRASILEIRO (1981)
Direção e roteiro: Djalma Limongi Batista

Em sua estreia no cinema, Edson Celulari convence como jogador. Aos 23 anos, ele vive todas as aventuras que vêm à cabeça quando se pensa num boleiro. No cardápio, muitos dribles e gols, brigas com técnico, futebolzinho com os parças na praia em dia de folga, treinos físicos, assédio da imprensa. Acrescente aí óculos escuros, carrão, desfile no Carnaval. Não faltam nem baladas, porres e transas – numa festa, Asa Branca pega até a mulher do presidente do clube em que joga, interpretada pela chacrete Rita Cadillac. E mesmo trocando passes com Garrincha o ator se sai bem na pele do garoto sonhador que faz de tudo pra vencer no esporte.

É uma história de época e há certo saudosismo em cena. O Brasil não era campeão mundial fazia 11 anos, a Copa na Espanha estava logo ali e o filme resgatava um período em que a camisa amarela triunfava. Assim, no fim da década de 1960, é que Asa Branca batia à porta do Comercial da fictícia Mariana do Sul (na verdade, Santa Bárbara D’Oeste, em São Paulo). Com o caminhão de gols marcados num jogo contra o Sport, o primo rico da cidade, o atacante acabava indo atuar no rival. E lá não parou, ganhando título inclusive. Na cabeça do moleque que começava a alçar voos maiores, nada de Paris, Barcelona, Madrid, Londres. Necas desses picos. Os caminhos do sucesso o levavam à capital, ao Morumbi, ao Maracanã, ao Pacaembu.

Publicidade

Destaque pra sua relação com a mãe (alô, Gabriel Jesus), vivida por Eva Wilma, e pro fato de Asa chegar a São Paulo e morar numa pensão com outros atletas do também imaginado Bandeirante, time que o contratou. Isso, aliás, rolava naqueles tempos. É difícil não prestar atenção também em Mário Américo, histórico massagista da seleção, que faz uma participação especial aconselhando o craque vindo de uma bela noitada. Ou no personagem bem dúbio de Walmor Chagas, o protetor/padrinho do jogador. Se o filme faturou prêmios como os de melhor direção nos festivais de Brasília (1981) e de Gramado (1982), hoje o filme do amazonense Djalma Limongi Batista não é tão reverenciado. Pena. O conto do cara saído do interior pra virar jogador de Copa do Mundo diz muito sobre o antigo estrelato da bola no país e é um dos retratos mais legais que o cinema brasileiro já pintou do futebol.

Avaliação VICE Sports: Gol do lateral direito brasileiro Nelinho na disputa do terceiro lugar da Copa de 1978 contra a Itália. Efeito, trajetória certeira, plástica. Nota 8,5/10

MEIA ENCARNADA DURA DE SANGUE (2000)
Direção: Jorge Furtado
Roteiro: Jorge Furtado e Guel Arraes

Crédito: Cena do filme baseado em conto de Lourenço Cazarré.

Após “Barbosa”, aquele clássico de 1988 que todo mundo já deve ter visto na escola ou na faculdade), o diretor Jorge Furtado voltou suas câmeras ao futebol pra contar a história de um jogador na encruzilhada nos anos 1950. No interior do Rio Grande do Sul, num Brasil pré-Pelé e pré-Copa do Mundo de 1958, o centroavante Bonifácio (Sérgio Menezes) precisa decidir o que fazer. Ele fica no Vinte de Setembro, time dos negros e mulatos da cidade, ou vai pro Serrano, onde só tem brancos? Aceitar a proposta significa parar de jogar de graça e receber casa pra morar, mas assinar o contrato também fecha portas, já que a transferência é traição pra alguns. Como diria Galvão Bueno, “vive um drama” o cara, pois tudo ocorre às vésperas do duelo entre as duas equipes.

Pra começar, seu grande amigo Vicente (Aldri Anunciação), companheiro de time e de trampo, não engole isso e o humilha no açougue. O barato fica cada vez mais louco com provocações e questionamentos a Bonifácio, entre eles, se vai abandonar a mãe num barraco mesmo. Por um lado, nem tudo é triste, porque o convite pra trocar de camisa abre ainda a possibilidade de um futuro melhor pra sua namorada, a doméstica Elisa (Camila Pitanga). Por outro, pode riscar a expressão maré de alegria da parada. A moça sofre nas mãos da patroa pentelha, papel de Susana Vieira. E num acidente de trabalho, ao tentar cortar um pedaço de carne, o atleta dá uma lapada com o facão em seu próprio pé, um dia antes de disputar partida tão importante. Sim, na hora, ele estava descalço – tinham jogado merda em suas botas lá no açougue.

Rola sangue na pele e na alma, mas o jogo segue. Produzido pra TV e exibido num especial da Globo chamado “Brava Gente”, o filme ajuda a sacar um pouco do negro drama que os jogadores encaravam num futebol brasileiro semiamador, discriminatório, cheio de hipocrisias.

Avaliação VICE Sports: Um flamenguista revendo (ou aprendendo sobre) o gol de Rondinelli, que dá um título quase perdido - o Estadual do Rio de 1978 - ao clube da Gávea. Medo, delírio, emoção, descoberta do novo. Nota 8/10

Leia mais matérias de esportes no canal VICE Sports.
Siga a VICE Brasil no Facebook , Twitter e Instagram .