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Skate

Uma breve história de andar de skate fumando

Relembrando essa tendência (um tanto) infeliz.
Dan Drehobl. Foto por Brynce Kanights.

Esportes radicais e estilos de vida pouco saudáveis representam opostos da escala de perigo. No primeiro, qualquer dano resultante acontece imediatamente; no último, o dano vai ser acumulando mais lentamente, com os efeitos dormentes por anos. O mais legal de uma atividade como base jumping é que, assim que você decide que cansou de pular de prédios – supondo que não teve nenhum ferimento relacionado – você continua saudável como se nunca tivesse feito o esporte. Com esse espectro de risco em mente, quando vemos um skatista mandando uma manobra fumando um cigarro, não dá pra deixar de se sentir inspirado pela audácia envolvida. Mesmo quando, como Etienne Gange faz no novo vídeo da Alltimers, um skatista consegue mandar um longo 50-50 sem se queimar ou acabar com uma brasa no olho, ele ainda pode sentir a repercussão décadas mais tarde na forma de enfisema, doença cardíaca e vários tipos de câncer. Outro jeito de encarar a morte de frente, né?

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Claro, skate e cigarro tradicionalmente são vendidos como atividades de rebeldes e antissociais descoladas. Tipo esse shape com desenho de cigarro. Mas nos últimos anos as coisas mudaram. Gostando ou não, o skate logo será um esporte olímpico, e o número de jovens fumando nunca foi tão baixo. Então, enquanto avançamos para esse novo mundo mais saudável, vamos refletir sobre a modinha em risco de extinção de fumar andando de skate.

Deixando bem explícito aqui: fumar não é legal. “Qual a liberdade de agir como um idiota? / Por que não abraçar a saúde simples?” canta Phil Elverum em “Don't Smoke” do Mount Eerie. Mas essa música é o único exemplo de arte que me fez não querer fumar, pensando nas milhares de fotos, quadros e filmes mostrando fumantes como, bom, legais. Simples assim: é glamouroso quando as pessoas desconsideram a própria saúde em busca de prazer, e nem todos os dados médicos do mundo podem mudar isso. Mas algumas fumantes são mais descolados que outros. Kevin Rodrigues pulando um gap para a calçada em Paris no novo vídeo da Converse Purple (aos 10:38) funciona porque ele é um típico descontente francês. O switch flip de Tom Penny fumando, do primeiro vídeo da Transworld, é parte de um conjunto de manobras lendárias em San Diego. Não sei se Brandon Biebel (que é tipo um Tom Penny norte-americano) ainda é viciado em cigarros, mas com sua barriga tanquinho e corpo atlético, um cigarro ia parecer fora do personagem. Também tem alguma coisa estranha nos skatistas que gosto de pensar como Fumantes Adolescentes, como o livro de fotos do Ed Templeton de mesmo nome. Gente menor de idade fumando só parece carismático quando você é menor de idade; de outro jeito a combinação de mochila e maços é simplesmente dissonante. A turnê de Bill Strobeck com a Supreme cai nessa categoria. Assim como o feeble five-o to fakie do Arto Saari em Sorry. A parte do Arto nesse vídeo tem o comprimento de duas músicas do Bowie, indo do final da puberdade até o começo do seu auge no esporte, mas essa manobra fumando é pura fanfarronice adolescente. Um amigo tem que segurar ele para não ele ser atropelado, e o Arto quase acaba enfiando a brasa do careta na cara do amigo – um negócio que não entraria num comercial de cigarros.

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A parte de Andrew Reynolds em Stay Gold é o ponto alto de sua carreira, a última amostra de um dos maiores skatistas de todos os tempos. É quase perfeita, fora a trilha sonora muito indie adolescente, e não tem postura quando o Chefe faz um switch frontside flip sobre quatro degraus perto do final. Ele só aterrissa e coloca a mão direita na boca. A “loucura” pré-manobras de Reynold é bem documentada, e parece que ele só estava descansando fumando um cigarro entre as tentativas, quando teve um surto de coragem e não queria esperar o cigarro acabar no caso da confiança necessária para pular três degraus enormes de cimento de switch passar. A filmagem não foca no cigarro, avançando rapidamente para a próxima manobra, um gigante fakie 360. Aposto que Reynolds, que se transformou de um conhecido bêbado putaço para um verdadeiro modelo a ser seguido, provavelmente teria cortado o cigarro se pudesse.

O começo dos anos 2000 foi o auge de andar de skate fumando. Teve o Piss Drunx, Arto Saari em Sorry e o tailslide na cerca de Frank Gerwer. Claro, também teve o Bag of Sucks da Enjoi, o primeiro vídeo de skate a começar com um médico alertando sobre os perigos do tabaco. Jerry Hsu, na era do cinto de cadarço, acende um cigarro com o dedão pegando fogo, Caswell Berry parece um balconista de loja sem tempo para terminar de fumar antes de dar um heelflip varial entre dois telhados.

Mais recentemente temos a linha noturna de Pete Eldridge de 2012 em NYC. Na maioria desses clipes, o skatista segura o cigarro na mão. Já Eldridge consegue continuar fumando normalmente enquanto manda heelplips e só depois solta a fumaça. Como a Quartersnacks escreveu na sua lista Partes de Skate mais Sussas da História, “Ele está longe de ser o primeiro a andar de skate com um cigarro, mas é o mais perto que o skate já chegou de um astro do cinema dos anos 40 fumando num filme em preto e branco, e parecer incrível enquanto faz isso”.

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Qualquer análise de skate + cigarro estaria incompleta sem mencionar Dan Drehobl, o cara que transformou fumar andando de skate de uma escolha estética num estilo de vida. Drehobl está aí há décadas, mas a principal coisa que skatistas de uma certa idade sabem sobre ele é que, na maioria de suas propagandas, ele está com um cigarro na boca – às vezes vários. Drehobl e cigarro estão tão ligados que, em 2003, quando o skatista profissional e conhecido hater do tabaco Tim O'Connor escreveu uma lista de manobras de skate ruins, o número seis era “Andar de skate com um cigarro na boca se você não é o Dan Drehobl”: “Esse é um daqueles casos onde o cara está tentando dar a ilusão de que tudo é tão fácil pra ele que ele pode curtir uma fumaça com sabor enquanto tenta dar a manobra de sua vida. É tudo mentira, garotada!”.

Drehobl concorda. Em 2013, ele disse ao Muckmouth que até estava tentando usar cigarro eletrônico para largar o hábito. “Acho fumar uma bosta e queria poder parar. Cigarros são viciantes pacas, eles te pegam pelas bolas e te fazem sentir na merda. Claro, é divertido fazer piada, mas só quero dizer para qualquer um lendo isso que se você nunca fumou antes, é melhor nem experimentar.”

A boa notícia, tanto para críticos como O'Connor quanto para quem ficou preocupado com a saúde dos skatistas, a taxa de jovens que fumam hoje é a mais baixa da história. A porcentagem de skatistas que fumam não é exatamente o tipo de coisa documentada pelos programas de saúde, mas se a população geral é um indicativo, os dias de andar de skate fumando estão contados.

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