FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Este Doidera Gravou 16.000 Canções Sobre Tudo, de Cocô a Ellen DeGeneres

As canções de Matt Farley são boas porque são espertas e contagiantes. Mas tem algumas que só repetem uma palavra diversas vezes, ou falam sobre o que ele comeu no café da manhã naquele dia.

Mais pessoas precisam conhecer Matt Farley. Por quê? Bem, essa é difícil de explicar. E parte do motivo de seu trabalho ser tão excelente é que ele desafia explicações simples. Ou é o apelo que ele dá a cada explicação? Digo, as canções de Farley são boas porque são espertas e contagiantes. Mas ele também compôs centenas de músicas em que só repete uma palavra diversas vezes, ou soletra um nome, ou canta sobre o que comeu no café da manhã naquele dia. Ah, talvez eu deva explicar logo quem é esse cara.

Publicidade

Matt Farley é um rapaz de 30 e poucos anos que mora no nordeste de Massachusetts. Ele tem uma empresa de entretenimento chamada Motern Media que agencia cerca de 70 bandas, e juntas gravaram mais de 16.000 músicas. O lance é que ele também toca e canta em todas as bandas, além de ser o único integrante das mesmas. A Motern Media é, na verdade, Matt Farley.

Agora as coisas ficam meio complicadas. Beleza, esse cara gravou mais de 16.000 músicas – qual é a delas? O básico: Matt toca teclado e canta. Ele compõe tudo que é tipo de música, em todos os sentidos possíveis. Algumas são improvisadas, outras são bem escritas, algumas são bobocas onde ele só repete uma palavra e um nome trocentas vezes, outras são inteligentes e observadoras, outras baladas de amor seríssimas; a maioria delas é feita ao piano de forma que lembram Randy Newman ou Elton John, mas muitas delas são com instrumentos diferentes (mesmo que tocados em um teclado). Ele tem uma baita voz, por mais que seja um tom meio bobão. Mas, novamente, essa impressão pode ser pelo tempo que o ouvi cantando sobre torradas ou sobre o filme Hora de Voltar ou sobre aqueles toletinhos de merda que ficam presos na bunda. Mas estou divagando. Se você quer conferir por conta própria, o site da Motern Media conta com um link para uma playlist de 14 horas no Spotify só pra começar. Lamento ser tão curta, ali tem só os grandes hits.

Clicou? Ótimo. Agora você está ouvindo uma música chamada “Poop Into A Wormhole” [Cagar em um buraco de minhoca], por uma banda chamada The Toilet Bowl Cleaners, ou, em bom português, Os Limpadores de Privada. A banda talvez seja a mais popular da Motern Media, mas a primeira que ouvi foi a Family Party Song Singers. Alguns meses atrás, estava escutando uns episódios antigos de um podcast chamado The Bone Zone, apresentado por dois comediantes de Los Angeles, Brendan Walsh e Randy Liedke. Era aniversário do Mick Jagger, e enquanto zanzavam pelo Spotify, esbarraram em uma música chamada “Happy Birthday, Mick Jagger”. Demais, né? E acabou que aquela banda, The Family Party Song Singers, tinha canções para tudo que é celebridade. Mas espere, tem também outra banda que canta sobre aniversário, The Best Birthday Song Band Ever. E elas aparentemente têm o mesmo vocalista. E se você fuçar um pouco mais, elas parecem estar competindo, como duas cafeterias no mesmo quarteirão. Se você for MAIS FUNDO AINDA, descobrirá o The Toilet Bowl Cleaners.

Publicidade

Uma das muitas canções de Matt sobre cocô. Essa acerta na mosca.

Acho que a música que fez com que finalmente ligassem pro cara era uma do TBC sobre o que acontece em jogo de futebol americano se o quarterback precisa dar uma cagada. O jogo para? Ele corre pra fora do campo? É uma música de humor de qualidade aí, meu amigo. Então, durante a ligação, Farley começou a explicar o que é a Motern Media e eles continuaram ouvindo mais e mais músicas, até que uma das coisas mais legais que já vi na internet aconteceu: eles descobriram que Matt Farley havia gravado uma música sobre o apresentador do podcast. Eles nem se conheciam, mas Farley é tão prolífico que uma de suas bandas (Papa Razzi and the Photogs, que toca músicas sobre gente famosa) já havia composto e gravado uma música sobre o programa. Ele tem músicas sobre tudo. Digo, busque pelo seu nome – é quase certeza de encontrar uma canção.

Mas voltando ao Toilet Bowl Cleaners, caso você não tenha percebido ainda, as bandas da Motern Media são classificadas por assunto: a Hungry Food Band fala de comida, The Singing Film Critic fala de cinema, The Toilet Bowl Cleaners é sobre cocô. Pode-se dizer que o TBC é uma espécie de microcosmo para o universo como um todo, no sentido de que parece bobo ou simples logo de cara – qualquer um pode compor sobre fezes da mesma forma que qualquer um pode gravar uma tonelada de músicas. Mas ele o faz de uma forma genuinamente impressionante: cada música tem uma ideia forte por trás, uma letra espertinha, uma música contagiante e distinta, e olha que são umas 200 faixas assim (o Toilet Bowl Cleaners tem, até então, 11 álbuns, acho). Da mesma forma que, sim, gravar 16.000 faixas sem nenhum sentido não é um feito criativo digno de nota por si só. Mas quando são planejadas como as feitas pelas bandas da Motern Media, divididas em músicas de aniversário, músicas sobre cocô, músicas sobre celebridades, músicas sobre músicos, músicas sobre cinema, músicas sobre nomes e por aí vai – todas com uma ideia clara de fundo, ou no mínimo alguma inspiração para distinguí-las das outras, bem, isso é impressionante mesmo.

Publicidade

Pegue como exemplo a letra de “Citizen Kane”, do The Singing Film Critic, do disco “64 Movie Review Songs”:

When you’re ranking films, leave a spot at first
For Orson Welles’ attack of William Randolph Hearst
It’s called Citizen Kane and it is quite great
I give it eight stars, out of eight

[Quando você está listando filmes, deixe o 1º lugar vago

Para o ataque de Orson Welles de Willliam Randolph Hearst

Chama-se Cidadão Kane e é ótimo

Dou-lhe oito estrelas, de oito]

Largely ignored upon initial release
Now it is considered a masterpiece
Orson Welles, we’re so proud of ya
For practically reinventing cinema~

[Amplamente ignorado no lançamento

Agora é considerado uma obra-prima

Orson Welles, temos tanto orgulho d’ocê

Por ter praticamente reinventado o cinema~

With all of the money, and all of the fame
That came with the name of Charles Foster Kane
The very last word that was floating in his head
Was simply the name of his childhood sled

[Com todo o dinheiro e toda a fama

Que vieram com o nome de Charles Foster Kane

A última palavra que passou pela sua cabeça

Foi o nome de seu trenó da infância]

Rosebud, the sled was Rosebud
Rosebud, yeah the sled was called Rosebud
Rosebud, Rosebud, Rosebud

[Rosebud,o trenó era o Rosebud

Rosebud, yeah o trenó se chamava Rosebud

Rosebud, Rosebud, Rosebud]

Citizen Kane was quite unique
For shots of a ceiling and focus quite deep
A fascinating story that makes you feel
And a recreation of those old newsreels

Publicidade

[Cidadão Kane foi bastante único

Com imagens de um teto e foco bem profundo

Uma história fascinante que te faz sentir

E uma recriação das notícias de outrora]

The story structure, it involves
A news reporter with a mystery to solve
He talks to one Kane acquaintance after the other
And slowly all of the layers are uncovered
[A estrutura da história, ela envolve

Um jornalista com um mistério a resolver

Ele fala com um conhecido de Kane após o outro

E de repente todas as camadas se descobrem]

16.000 dessas. E ele também faz longa-metragens.

Uma das melhores coisas sobre a Motern Media é que você nunca fica sem aprender nada. Há diversos níveis de divertimento. Por exemplo, as duas bandas que tocam músicas de aniversário e competem entre si. Em determinado momento de sua criação, Papa Razzi & the Photogs (aquela que fala sobre celebridades) percebe que o Toilet Bowl Cleaners está virando um puta sucesso, então começam a fazer músicas sobre eles. A última grande notícia no mundo da Motern Media é que o Toilet Bowl Cleaners cansou de ser encaixado em determinada categoria e lançou um disco romântico. Aparentemente a Motern Media discordou deste novo direcionamento, porque o disco Mature Love Songs foi lançado pelo selo rival Singing Animal Lover Music.

Esta canção é sobre a Ellen DeGeneres, bem, por que não né?

Liguei para o Matt um dia desses (o número consta em seu site e em muitas de suas músicas) para falar sobre esta controvérsia, mas nem tocamos no assunto. Quase que imediatamente começamos a falar sobre minha cidade natal, o emprego dele, podcasts, um monte de coisas.

Publicidade

Em um certo momento ele lamentou que ser bem-sucedido nesse tipo de nicho, de artista outsider, é bem mais fácil se você tem uma personalidade extrema, ou problemas mentais. Tipo se ele batesse aviões como o Daniel Johnston ou fosse um solitário excêntrico como Henry Darger, talvez rendesse uma história mais interessante. Acontece que ele é um cara totalmente normal com uma esposa e um filho, que consegue manter um emprego (em um lar para adolescentes) e não bebe ou usa drogas. Não pude deixar de pensar que há algo de especial nisso aí, “o cara 100% normal que faz músicas loucas”. Mas se isso procede, ele diz, que seja. Não é algo calculado, mas ele não se importa – quanto mais gente ouvindo, melhor!

Uma canção sobre pessoas que se parecem com seus cachorros. O melhor da composição observacional.

Sem cerimônia, ele descreve o que faz como uma “piada épica”. Não no sentido internético de “bacon épico pqp”, mas épica no sentido de grande escala, de um macro-compromisso, obra de uma vida inteira, coisa pra se apostar todas as fichas. Este tipo de épico. Isso é algo que adoro, porque mesmo as músicas que não são boas estão imbuídas com esta espécie de significado apenas por serem parte de algo maior, louco e hilário. Perguntei ao Matt se ele se preocupava em restringir o quanto é extremamente acessível. Ele riu e explicou que ligações telefônicas não são ruins. Geralmente recebe algumas por dia, e quase sempre é de gente rindo e então desligando. Mas a sua teoria é de que se ele tiver algum problema eventualmente, terá sido bem-sucedido o suficiente para poder bancar um novo telefone. Ele me disse que sempre que vê um número de telefone em um programa de TV ou filme acaba ligando, só por ligar mesmo. O que é revelador, porque eu mesmo já pensei em fazer isso, mas ele vai e faz de verdade. Sempre. Matt fala isso ocasionalmente, como se todo mundo ligasse pr’aqueles telefones vistos em filmes. Esse fato meio que resume toda a curiosidade e otimismo galopante que dão o tom de toda a Piada Épica – o que aconteceria se alguém fizesse uma música sobre tudo e a disponibilizasse para todos com o máximo de transparência? Bem, estamos descobrindo isso agora, né?

Publicidade

Eddie Brawley está no Twitter e já escreveu 16.000 tuítes sobre cocô – @ebrawley

Tradução: Thiago “Índio” Silva

--

Quer saber mais de gente fazendo esquisitices relacionadas à música? Toma:

Conversei com Paulo Araújo, o Compositor do 'Melhor Álbum de Rock em Latim dos Últimos 2000 Anos'

Assista a Este Cara Tocando a Discografia do Blink-182 Em Cinco Minutos

Michael Jackson, Videogames E Caminhões: Como Um Moleque Melhorou A Trilha Sonora Do ‘Streets Of Rage’ Usando Racionais Mcs