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Música

O disco solo do BK é uma crise existencial boom bap

O rapper carioca foge da fórmula do trap para encarar a própria vida e as ruínas do reinado do rap golden era.

Diz um conto etíope que para reconhecer um rei na multidão é só observar seu comportamento. Enquanto todos estiverem fazendo a mesma coisa, o rei será o único a fazer diferente. Obviamente, este conto só leva em consideração os triunfos de um vencedor, e nunca sua derrota. Como diz o ditado popular, “você vê as cachaças que eu bebo, mas não vê os tombos que eu levo”. O BK, do Nectar Gang, lançou, na última segunda (21), um disco inteiro solo chamado Castelos e Ruínas. Você pode ouvi-lo abaixo:

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Em Castelos e Ruínas, BK não quer só contar vantagem, mas sim apontar os dois lados da moeda: “A intenção do disco é mostrar desde quando está tudo muito bom, até quando tá tudo ruim”, conta BK via Whatsapp. Sem dúvida, este é o disco mais introspectivo do rapper, uma vibe meio Earl Sweatshirt, meio A$AP Mob. “Gosto muito dos dois. O Earl eu acho foda, apesar de ser muito depressivo”.

Com versos que oscilam entre a autoconfiança (“Se o gatilho tá no meu porte eu aperto, não me arrependo”) e a dúvida (“Uma enchente de pensamentos, e a minha alma transborda/Se eu passar minha visão: quem que vai me entender?”), BK aparece na famigerada crise existencial pela qual todo ser humano passa uma hora ou outra: “Tu faz uns planos e as paradas não rolam. Daí, você entra numa neura de ‘caralho, daqui a pouco tô fazendo trinta!”. Amadurecer não é fácil.

Outra coisa que chama atenção é que o disco é uma avalanche de impressões do BK acerca de sua própria vida, sem a rima de outros MCs para interferir. “Eu não quis botar participação porque é um lance pessoal, uma leitura minha sobre diversos acontecimentos e pensamentos meus sobre minha vida”. No entanto, algumas músicas contam com outras vozes pra somar, como Ashira Wolf em “Quadros” e Lucas Carlos em “O Que Sobra Disso Tudo”.

BK me confessou que, quando se sente solitário, gosta de passar o tempo assistindo filmes. Talvez, isso explique a atmosfera monomítica que o disco tem. É como se o rapper estivesse passando pelas provações da vida, fazendo com que ele reflita sobre sua jornada até aqui. “Não sei se já passei pela provação máxima, porque a gente sempre acha que a última foi a pior, mas não duvido que possam acontecer outras, ou que eu esteja até agora na mesma”, conta.

No entanto, um bom rei nunca perde a majestade. Em “Amores, Vícios e Obsessões”, BK ainda mete a banca de gangsta playboy supreme, como diz o verso: “Ela dava pra outro cara, deu pra mim viu que eu sou o cara”. Mas tudo não passa de pose mesmo, porque o coração tá entregue: “Qual dos de nós vai se render primeiro, fugir primeiro?/ Dizer que ama ou odeia primeiro?/ só o medo da decepção já é um tiro certeiro”. BK explica: “É uma gastação tanto do cara com a mina, quanto da mina com o cara. É mais na brincadeira. Quanto a meter essa bronca de gangsta, vai da disposição do cara, do quanto ele consegue trocar, porque uma hora ele vai ter que provar, não pros outros, mas pra ele mesmo”.

Em se tratando de beats, também se nota uma sutil diferença relacionando o Castelos e Ruínas aos trampos anteriores. As batidas do disco, assinadas por El Lif Beatz e JXNVS, deixam o trap um pouco de lado e adotam um boom bap mais certeiro. BK explanou sobre o processo: “Eu evito chegar com a letra toda pronta e jogar no beat, porque não fica do jeito que eu gosto. Pra fazer os beats deste disco, fui adaptando os beats às letras e vice versa. Eu partia do princípio de que as faixas tinham que ter uma conexão entre si, pra não ficar perdido. Eu gosto muito de vários estilos de beats, e graças a deus, todos os meus beatmakers favoritos estão na Pirâmide Perdida, que é a nossa banca”.

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