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Música

Warpaint: 7th Chamber

Entrevistamos a banda de Los Angeles e descobrimos que elas curtem Wu-Tang Clan, além de ir fundo na criação do seu novo álbum.

“Você tem que se… qual é a palavra?” Emily Kokal pergunta ao telefone e eu não faço a menor ideia. Ela soluciona o próprio enigma rapidamente e solta um “Conciliar!”, satisfeita.

“Isso devia estar tatuado no meu corpo”, acrescenta, e depois, como se respondesse a uma pergunta sobre isso, e que nunca foi feita, ela vai além: “Na verdade não preciso tatuar, agora está na minha alma”.

Com o segundo LP da sua banda, o Warpaint, previsto para sair em algumas semanas, confesso a ela que as primeiras audições dessa coleção autointitulada foram duras, mas não difíceis no sentido tradicional. Warpaint não é um álbum desagradável, nem é desnecessariamente complexo, nem mesmo monótono. Mas principalmente nas primeiras vezes, o álbum mantém seus segredos muito bem guardados. E ouvi-lo é muito parecido com conversar com a banda, como se te fizessem uma pergunta para a qual você não percebe que sabe a resposta.

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Em vez de ser uma grande recompensa, a arte de Warpaint fica mais óbvia não depois que a experiência auditiva termina, mas quando você para de tentar resolver o enigma, conforme a banda revela exatamente o que quer dentro da música. Ainda assim, há pistas. Como a capa do álbum, feita pelo marido da baixista Jenny Lee Lindberg, Chris Cunningham, diretor do icônico vídeo de “Come to Daddy” do Aphex Twin. A imagem retrata as quatro mulheres, Kokal, Lindberg, Theresa Wayman e Stella Mozgawa, como transparências fantasmagóricas, todas compartilhando o mesmo espaço, tornando difícil distinguir partes da presença física de cada uma. É uma representação visual do que Kokal afirma estar gravado na alma — conciliação.

“Quando começamos a banda, o que nos atraía era que a música parecia muito fluida e natural”, diz Lindberg em outra entrevista por telefone. “Não precisávamos ter uma conversa sobre o caminho que a música tomaria, ela simplesmente ia naquela direção. Mas conforme você escreve mais músicas e cresce junto, isso começa a mudar. Você começa a ter suas próprias opiniões e sua própria visão. Então agora é importante ser atenciosa com a outra, sabendo que não sou só eu na banda e não é só o que eu quero. Passa a ser muito importante escutar a outra, tanto dentro quanto fora da banda. E acho que essa evolução aparece neste disco.”

Pouco depois de dizer isso, Lindberg cita uma das músicas novas da banda, descrevendo a convivência do Warpaint em termos de um título. “Keep it healthy (Mantenha saudável)”, afirma.

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E é o que elas fazem. A banda ainda opera como uma amizade, elas ainda passam tempo juntas como uma unidade, e até mesmo ficaram isoladas no parque Joshua Tree por três semanas para dedicarem totalmente ao álbum. Afinal, Warpaint é o primeiro disco gravado e escrito em conjunto, já que o primeiro LP, The Fool, foi produto de anos de aperfeiçoamento. A manutenção da dinâmica da banda, no entanto, continua sendo tarefa delas. Claro, há espiadelas nas pessoas da vida real, mas só petisquinhos, como o namoro de Wayman com o compositor de música eletrônica e cantor de baladas britânico James Blake, ou a conexão de Lindberg com Hollywood através da irmã Shannyn Sossamon, ex-membro do Warpaint, mas tudo isso parece banal comparado às impressionantes apresentações ao vivo ou à estética envolvente delas.

Embora cuidadosa daquele jeito que se fica ao falar com estranhos, a personalidade de Kokal aparece de formas sutis. A banda é citada por colocar o hip-hop como influência e, apesar disso talvez não ter uma ligação direta com o álbum de forma que o ouvinte possa perceber, não é difícil de acreditar quando Kokal faz referência a Wu-Tang Clan ao mencionar “Bees”, do álbum The Fool, ou quando chama The Notorious B.I.G. por seu nome de batismo, Chris Wallace. Mas nunca há uma sensação de chegar a conhecer Kokal ou Lindberg, o que parece intencional na forma como elas apresentam a banda.

“É legal que quando as pessoas pensam na banda, elas pensem na música e não nas pessoas que estão fazendo a música”, diz Lindberg, o que é parcialmente verdade. Mais precisamente, o Warpaint vem num pacote completo e é difícil distinguir as partes do todo. Não que cada membro não seja reconhecível dentro e fora da música, mas o todo é diferente; é uma entidade mais forte que qualquer parte separadamente. Lindberg vai além para eliminar qualquer importância que teria ser uma banda só de mulheres, dizendo: “Nunca nos consideramos uma banda de meninas e, de muitas formas, provavelmente somos iguais a um cara.”

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Kokal não desdenha tanto disso, lembrando uma viagem recente à Rússia, onde testemunhou a importância de mulheres tocarem com outras mulheres, mas para além disso, simplesmente parece que não é essa a questão da banda.

O sucesso mainstream também não é a questão da banda. O álbum não tem nenhuma promessa de hit de sucesso, nem faixas que poderiam ser selecionadas e colocadas para tocar sem parar. “Disco // very” e “Love Is to Die” são as que chegam mais perto disso. E embora o produto final possa representar um relacionamento simbiótico dentro da banda, Kokal descreve a criação como uma “batalha entre quatro pessoas”, antes de oferecer as reflexões mais reveladoras da conversa.

“Naturalmente, essa é uma parte importantíssima de como trabalhamos, batalhando por nossas ideias”, diz Kokal. “Se uma pessoa diz ‘vermelho’, a outra diz ‘azul’, meio que só para acrescentar à gama de cores que poderiam ser. Mas é preciso ir massageando e reduzindo até uma coisa que não perca a potência, mas tenha a cor de todo mundo. Esse processo é uma das coisas mais desafiadoras e uma das partes mais gratificantes de fazer parte de uma banda.”

“Então muitas vezes”, acrescenta, “você chega com uma ideia e pode ser uma ideia muito singular sobre a forma como você quer as coisas, mas o sistema todo de uma banda é que você colabora e deixa outras pessoas entrarem nisso e confia no que elas fazem porque gosta da expressão artística delas e do que elas podem contribuir. Então você chega a uma coisa completamente diferente, e talvez a ideia que inicialmente amava passa a não ser nem mais um contorno, e outras vezes você consegue se manter muito fiel ao original. É um processo muito desafiador. Então um álbum, ou o produto final, não é só as músicas, é a colaboração entre nós quatro e o Flood [produtor] e tudo que acontece e pelo que passamos para fazer esse marcador no tempo. É onde você estava naquele momento e como tudo aconteceu. E assim, principalmente se você faz com sinceridade e com uma disposição artística – o que acredito que fazemos – dá para deixar a música existir e divulgá-la e permitir que as pessoas usufruam e continuar evoluindo. Às vezes essa é a parte mais difícil: desapegar e ao mesmo tempo se certificar de que a quantidade de pessoas que vai colocar a mão em alguma coisa não vai diluir aquilo.”

Kokal muda nossa conversa de direção em certo momento e começa a me perguntar sobre as pressões que sinto como jornalista. Lindberg também menciona a pressão do Joshua Tree, de voltar com material que valesse um álbum. E de fato, depois de conversar com elas, a pressão de trazer uma compreensão à criação delas, de iluminar suas personagens, de compreendê-las como artistas que são mais do que uma coleção de músicas; tudo parecia insignificante, como tentar responder a uma pergunta retórica. Mas a música fica melhor a cada ouvida.

“A questão da nossa banda”, diz Kokal adiante na nossa conversa telefônica, “é que nunca fomos para todo mundo, especificamente se comparar com o pop, porque nunca compusemos nessa estrutura. Isso nunca foi uma prioridade. Mas também sinto que encontramos um público e que o público sente a música de uma forma muito parecida com a nossa. A forma como os fãs reagiram no passado, essa meio que parece ser a nossa questão. As pessoas que precisam ou querem ou sentem isso sentem com muita intensidade. E da mesma forma, isso é muito bom.”

Para não ficar muito presa nos sentimentos, Kokal acrescenta: “Então é bom todo mundo gostar.”

Philip Cosores é jornalista e mora em Los Angeles. Ele está no Twitter: @Philip_Cosores