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Fotos inéditas de Dalí provam que sua esposa era mais que uma musa

No começo do ano, uma exposição no Castelo Púbol da Fundació Gala-Salvador Dalí revelou uma versão do icônico surrealista vista através dos olhos de fotógrafas mulheres. As fotos na exposição, intitulada Women Photograph Dalí, são fascinantes. As curadoras Bea Crespo e Rosa M. Maurell selecionaram imagens do artista em fotos particulares que não deveriam vir a público. Imagens da surrealista Denise Bellon e da colaboradora da Vogue Karen Radkai estavam penduradas ao lado de retratos dos bastidores de Dalí dirigindo In Voluptate Mors, fotografados pela esposa do colaborador Philippe Halsman, Yvonne. Mas as joias da coleção são fotos raras de Gala Dalí, a esposa do artista, tiradas no começo dos seus 53 anos de relacionamento.

Gala Dalí, direitos reservados da Fundació Gala-Salvador Dalí, Figueres, 2018.

Gala nasceu Elena Ivanovna Diakonova na Rússia em 1894. Ela conheceu Dalí em 1929, enquanto era casada com o poeta francês Paul Éluard e tinha um caso com o dadaísta alemão Max Ernst. No final daquele ano, ela e Dalí estavam morando juntos, e entraram num casamento aberto em 1934. Suas fotos na exposição foram capturadas durante os primeiros anos juntos deles, nas praias da cidade da Catalunha Port Lligat.

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Tiradas entre 1930 e 1932, as fotos de Gala de seu frenético relacionamento com Dalí nunca foram expostas ao público antes. Elas acrescentam uma visão diferente de uma das relações mais misteriosas entre artista e musa da história recente. Elas cimentam o lugar de Gala como mais que um objeto da atenção de um artista famoso, imortalizada em pinturas como A Madona de Port Lligat e Retrato de Galarina. O biógrafo de Dalí Ian Gibson disse à VICE que Gala nunca falou com a imprensa sobre o relacionamento deles, então seu impacto na arte de Dalí precisa ser decodificado através de seu incrível memoir performático, aparições públicas e fofocas daqueles que passaram por suas famosas festas e orgias. Mas em Women Photograph Dalí, o olhar dela voltado para ele está em exposição.

Gala Dalí, direitos reservados da Fundació Gala-Salvador Dalí, Figueres, 2018

“Apesar do forte laço emocional entre Dalí e Gala, o relacionamento deles não era maduro”, escreveu o Dr. Zoltan Kovary sobre o casal num e-mail para a VICE. Psicólogo, pesquisador criativo e professor da Universidade Eötvös Loránd de Budapeste, Kovary estudou o casal quando começou a escrever sua análise psicológica da obra de Dalí chamada The Enigma of Desire: Salvador Dalí and the conquest of the irrational.

Há muito eros nas fotos de Gala do jovem Dalí, especialmente nas imagens dele tomando banho de sol em sua casa de praia na Espanha. Mas Kovary diz que o amor deles “Era mais uma coisa de mãe e filho; Galas às vezes chamava Dalí de ‘Meu filhinho’. Eles nunca tiveram um relacionamento sexual ‘real’. Apesar de Gala despertar desejos profundos nele, Dalí tinha medo do contato físico.”

Gala Dalí, direitos reservados da Fundació Gala-Salvador Dalí, Figueres, 2018.

Mesmo assim, essas fotos são cheias da excitação de um romance no começo. Dalí está na frente de uma loja estranha que eles encontraram, ou deitado, quase sem olhar para a câmera. Suas poses são casuais e despretensiosas. Vemos Dalí como ele queria que Gala o visse, anos antes dele se tornar um artista famoso por golpes publicitários como passear com seu tamanduá de estimação pelas ruas e fazer declarações enigmáticas em programas de TV.

Ninguém sabe melhor como é difícil separar fatos de ficção e exageros na vida de Dalí que Gibson. O biógrafo por trás de The Shameful Life of Salvador Dalí disse por e-mail: “Ele é um pesadelo para qualquer biógrafo. O que você faz com um indivíduo que estava sempre atuando, sempre interpretando um papel?” As fotos de Gala criam uma empatia pela mulher que se casou com um homem tão desconcertante.

Anna Laetitia Pecci-Blunt, direitos reservados da Fundació Gala-Salvador Dalí, Figueres, 2018.
Denise Bellon, direitos reservados da Fundació Gala-Salvador Dalí, Figueres, 2018.

O conselho de Gibson para aqueles que ainda estão fascinados pelo homem que pintou a visão fantástica Os Elefantes e a ansiedade transcendental de A Persistência da Memória é direto. “A principal pista para Dalí, acho, é que ele era patologicamente tímido e construiu sua persona exibicionista como uma proteção”, ele disse. “A tragédia é que não temos o lado de Gala da história.”

Women Photograph Dalí nos traz mais perto desse lado que nunca.

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