A Marcela Ángeles é uma fotojornalista de 27 anos, licenciada em Ciências da Comunicação. Depois de trabalhar cinco anos como jornalista, uma nova oportunidade levou-a a deixar o México e a viajar até Los Angeles. Apesar de se sentir um pouco deslocada culturalmente, a sua paixão por contar histórias fez com que a Marcela fosse estudar fotografia e, desde então, leva uma vida dupla: de dia é escritora, e à noite e aos fins-de-semana é fotojornalista e arquivista. A Marcela enviou-nos um mail com o seu projecto
e nós gostámos tanto que decidimos ligar-lhe e falar com ela para saber mais cenas sobre o trabalho dela.
VICE: Como é que começaste este projecto?
Marcela Ángeles: O projecto começou há seis meses, com a ideia de pôr as pessoas a reflectir sobre a sua existência, aquilo que são e aquilo que não são. Não queria que as pessoas fossem apenas espectadores ou modelos a posarem para mim, queria que a sua história ultrapassasse a própria imagem. Larguei a câmara digital e comprei uma analógica. Comecei a tirar fotografias a pessoas na rua e a pedir-lhes que escrevessem e que completassem a frase “I wish I was…” [Eu gostava de ser…].
Mas de onde vem o interesse por saber aquilo que as pessoas querem ser?
Gosto de observar as pessoas e pergunto-me sempre qual será a sua história, os seus segredos, quais são os seus desejos, como seriam em miúdos e para onde é que irão no futuro. É fascinante escutar as histórias das pessoas e é incrível como todos os dias percebemos menos sobre o que se passa em nosso redor. As histórias estão nas pessoas, não no Facebook. É como abrir um mundo de respostas infinitas. Quantas vezes é que alguém já te perguntou (caso pudesses ser qualquer coisa) o quererias ser?
Que se lixe o Facebook. Há quanto tempo estás a desenvolver o projecto e para onde o irás levar?
Há seis meses que trabalho neste projecto e acho que continuará durante um bom tempo. A ideia passa por publicar um livro no final do ano, em que se apresente não apenas as imagens com os desejos das pessoas mas também a história de cada um deles. Como tenho o contacto de todos aqueles que participaram, a ideia é, dentro de dez anos, falar com eles e fazer a mesma pergunta.
Conheces estas pessoas?
A maioria das pessoas nas fotos são desconhecidas, foram pessoas que encontrei nas ruas de diferentes cidades do México e dos Estados Unidos. Também há algumas pessoas conhecidas que têm histórias e personalidades muito interessantes. Por exemplo, uma história nostálgica e muito interessante é a de Marko, um norte-americano nascido no Missouri que vive em Los Angeles. Tem 57 anos, foi bancário e depois trabalhou numa agência de viagens, mas que, por ser epiléptico, perdeu o emprego. A sua namorada morreu há um ano por fumar e ele anda sempre com a foto dela. Há 11 anos que o Marko é palhaço. Ele escreveu: “Queria ser médico.”
Como é que abordas as pessoas e como consegues que falem contigo?
Quando me aproximo das pessoas, elas ficam surpreendidas com o porquê de uma completa desconhecida lhes perguntar algo tão íntimo. Depois de me apresentar e de lhes explicar a ideia, começa um momento de introspecção e de medo nas suas caras, momento esse em que sei imediatamente que estão à procura de uma resposta e acabam por me perguntar: “Qualquer desejo?” Regra geral, todas as pessoas das quais me aproximei foram muito acessíveis e honestas nas suas respostas, algumas respondem com um sorriso e outras com muita nostalgia, mas todas se mostram curiosas com o facto de usar uma máquina instantânea, por isso tiro uma foto para mim e outra foto para eles. Ficamos todos com uma história para contar.
Quando vais para a rua já estás à procura de um perfil específico?
Não, não tenho um perfil definido. Tirei fotos de pessoas ricas, pobres, mexicanos, imigrantes, norte-americanos, artistas, vendedores, um pouco de tudo. A ideia é precisamente essa, mostrar como os desejos de umas pessoas ou outras não estão sempre baseados no real e na situação em que os próprios se encontram. Aproximo-me de pessoas que tenham uma vibração diferente, pessoas que me despertem curiosidade pela forma de andar, pelos gestos, o que estão a fazer nesse momento e tudo o que me faça querer saber mais sobre eles.
Qual foi a resposta mais estranha que já recebeste?
A resposta mais estranha que tive veio da Edith Salazar, uma artesã de Tepoztlán, no México, que anda de chinelos e vende sombrinhas à porta de uma igreja. Ela escreveu: “Queria estar em Nova Iorque e ser gerente das empresas do Donald Trump.” Não demorou nem um segundo a responder à minha pergunta, ela sabia o que queria.
Fala-nos do senhor de tanga vermelha. Parece um tipo interessante.
O Bill é um homem de 60 anos que em jovem competiu com o Arnold Schwarzenegger nas praias de Venice Beach, California, em concursos de culturismo. Todos os dias, desde há 40 anos, que vai ao Muscle Beach, o lugar onde competiu, vestido com uma tanga vermelha, o corpo besuntado com óleo e uma mala com fotografias daqueles anos de glória. Ele escreveu: “Eu queria ter 26 anos.”
O que procuras transmitir com este projecto?
Quero mostrar que para ser fotojornalista não tens que ir à guerra ou mostrar fotos de pessoas a sofrer. Documentar a vida das pessoas implica contar o seu passado, o seu presente e o seu futuro. Acho que com este projecto consegui ligar as pessoas ao público de uma forma mais pessoal e ao mesmo tempo transmitindo aquilo que sou como fotógrafa.
Para além do I wish I was, tens mais algum projecto em mente?
Sim, ainda que este projecto continue a fazer o seu caminho, estou a trabalhar noutro que vou realizar na India sobre a saúde dental e os dentistas de rua de Varanasi.
Soa fixe. Se tivesses de completar a frase “I wish I was…”, o que dirias?
Não esperava essa pergunta. Agora vejo aquilo que se sente. I wish I was able to control the time [Gostava de poder controlar o tempo].
Obrigada, Marcela!