The Exposure Project Colocou Câmeras nas Mãos das Trabalhadoras da Indústria do Sexo


As fotos deste artigo foram compartilhadas conosco pelo The Exposure Project.

Um grupo de prostitutas de Toronto resolveu se reunir e participar do The Exposure Project, uma exposição de fotografias que visa mostrar a vida das pessoas exatamente como ela é, da perspectiva em primeira pessoa das próprias prostitutas. São 11 artistas no total de um grupo formado por mulheres e transexuais.

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Muitas delas se envolveram no projeto porque estavam cansadas dos mitos e bobagens que cercam esse trabalho — mitos circulados por pessoas que não têm experiência sobre o mundo que criticam.

Janet é uma das artistas participantes do projeto deste ano. Ela me explicou, por e-mail, por que quis oferecer às pessoas um olhar aprofundado sobre sua vida através da fotografia.

“O que é retratado em filmes não é a realidade da maioria dos trabalhadores da indústria do sexo. Nem todo mundo está na pior. Veja todos os universitários que trabalham on-line — isso ainda é trabalho sexual, esteja você numa esquina ou num dormitório de faculdade. Nem todo mundo é viciado em drogas.”

Quando a maioria das pessoas retrata trabalhadores sexuais, eles mostram aqueles que trabalham nas ruas, sob a proteção da noite, geralmente usando drogas e em áreas decadentes. Na realidade, apenas 20% do trabalho sexual no Canadá acontece nas ruas. É óbvio que muitos outros também vivem sob essa definição, incluindo mulheres que trabalham em casas de massagem, clubes de strip-tease e agências de acompanhantes, entre outras formas de trabalho sexual. Indo além, estudos sugerem que a maioria dos trabalhadores sexuais da América do Norte não são usuários de drogas ilícitas. As pessoas se envolvem nesse comércio por suas próprias razões.

“Queria que as pessoas vissem a comunidade de maneira diferente”, disse Janet, “para que elas abram a mente e julguem menos”.

O Exposure Project foi concebido por Carly Kalish, gerente clínica e de programa do centro comunitário da All Saints Church. Kalish já trabalhou com prostitutas na África Ocidental e em Nova York, além de ajudar sobreviventes de tráfico humano. Ela desenvolveu o Exposure Project como parte de um leilão silencioso. As 33 fotos foram leiloadas na noite da exposição, com todo o lucro destinado para o financiamento de iniciativas criativas para as mulheres da All Saints.

Cada uma das mulheres recebeu uma câmera digital para documentar sua vida. Algumas das artistas eram clientes da All Saints e outras ouviram sobre o projeto e pediram para participar. Não há uma direção específica dando forma ao trabalho delas; Kalish queria que elas se sentissem livres para explorar o que as inspirava.

“Os temas sobre os quais falamos eram coisas como ‘lar’. Algumas imagens são bem literais sobre a vida nas ruas, outras são impressões abstratas do que elas estavam sentindo no momento.”

“Em vez de guiá-las, nós nos abrimos. Eu disse simplesmente: ‘O que vocês querem ensinar às pessoas?’ Todo esse projeto nasceu da criatividade feminina.”

O evento foi “como uma festa”, disse Kalish, com canapés e drinques servidos a noite toda. Todas as participantes estavam presentes, explicando seu trabalho e acompanhando os visitantes.

“O objetivo do projeto é criar um escape para mulheres que vivem ou viveram da indústria do sexo, para que elas possam compartilhar suas histórias”, ela disse. “Mas também para educar a comunidade sobre a vida das mulheres que estão nas ruas. E isso inclui as mulheres transexuais.”

O projeto opera não somente como uma oportunidade para que as pessoas aprendam sobre a vida das trabalhadoras sexuais —– também é uma chance para as mulheres aprenderem sobre si mesmas.

“Foi uma chance de fazer algo que eu nunca tinha feito antes”, Janet me disse. “Eu não sabia nada sobre fotografia e estava cansada de ficar sentada esperando nos pontos de encontro. Foi uma chance de fazer algo novo e aprender sobre fotografia.”

“Eu me sinto bem com isso e espero ter contribuído no grupo. Não estou acostumada a trabalhar com várias mulheres. Também estou aprendendo sobre isso.”

Janet afirma que quer continuar explorando a vida por meio da fotografia. Ela estava empolgada com a chance de fotografar seus parentes quando fosse visitá-los e pretendia mostrar as fotos que fez para sua família “para ajudá-los a entender de onde eu venho”.

Ter um entendimento melhor sobre de onde ela, e as outras trabalhadoras dessa indústria, vem é claramente muito necessário em nossa sociedade. Os olhos do sistema de justiça canadense estão se abrindo lentamente sobre as questões encaradas pela comunidade dos trabalhadores sexuais. Os próprios trabalhadores da indústria do sexo já deram um grande passo nessa área. Amy Lebovich, Terri-Jean Bedford e Valerie Scott venceram seu caso no Tribunal Superior de Ontário. A decisão no Caso Himel de 2010 derrubou as leis canadenses de prostituição como inconstitucionais, porque elas impediam ativamente que as mulheres envolvidas no trabalho sexual se protegessem (as leis em questão eram sobre viver com o lucro da prostituição, comunicar-se em público com o propósito de prostituição e manter um bordel).

A Corte de Apelação de Ontário acabou restabelecendo a lei sobre comunicação depois. O que se seguiu foi meio que uma partida de tênis, com diversas apelações federais no Tribunal Superior canadense visando restaurar as outras leis. Então, Bedford e as outras mudaram a tática para apelação subordinada.

Em 13 de junho, o Tribunal Superior ouviu os argumentos do caso Canadá versus Bedford, que continua em apelação. Espera-se que a criminalização dessas atividades seja abolida de uma vez por toda. É um progresso lento e trabalhoso, mas é um progresso.

Mas isso não impede julgamentos entre a população em geral. Ainda vivemos num mundo que condena a sexualidade feminina, onde as mulheres que trabalham na indústria do sexo são consideradas culpadas por qualquer mal que aconteça com elas e o sistema não faz nada para ajudar (estatísticas no Canadá mostraram que entre 1991 e 2004, 171 trabalhadoras sexuais foram assassinadas no país. Gritantes 45% dos casos continuam sem solução. E se elas fossem advogadas em vez de prostitutas?). Derrubar esse fator de julgamento é um dos principais objetivos para Janet e um dos principais motivos para que ela decidisse participar do Exposure Project.

“Podia ser qualquer pessoa. Não julgue. Poderia ser sua irmã, sua mãe, sua namorada, seu filho. Algumas pessoas escolheram estar na indústria. Outras fazem isso por questões financeiras e, às vezes, por coerção.”

“Espero que minhas fotos atinjam esse objetivo e eduquem o público sobre o que realmente acontece na comunidade – o que está visível e o que está invisível.” A questão da visibilidade também foi apontada por Kalish. Ela me disse que um de seus objetivos era informar a sociedade “sobre as pessoas que são consideradas invisíveis em nossa cidade.”

“Queremos abrir os olhos das pessoas para a realidade dessa comunidade e para como as ruas de Toronto realmente são.”