Na noite de quarta-feira (12), foi aprovado pela Câmara dos Deputados o texto-base do projeto de Lei nº 2016/15 para incluir o crime de terrorismo no Código Penal. O texto, sob a relatoria do deputado federal Arthur Oliveira Maia (SD – BA), prevê a inclusão desse crime no ordenamento jurídico e foi criticado por possibilitar a criminalização de movimentos sociais e populares.
O texto foi elaborado pelo próprio Executivo sob a justificativa de que, nos últimos anos, houve muitos “atentados em alta escala” e que “o Brasil deve estar atento aos fatos ocorridos no exterior”. A lei também decorre de cooperações internacionais que repudiam atos terroristas.
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O projeto agora será encaminhado para a aprovação no Senado.
O que pode mudar?
O crime de terrorismo não está tipificado no nosso Código Penal, mas é claramente repudiado na Constituição Federal de 1988 no art. 4, inciso VIII, como um dos seus princípios regentes pelas cooperações internacionais.
Isso significa que nós nos posicionamos, obviamente, contra qualquer tipo de ato terrorista, embora não especifiquemos o que significa um “ato terrorista” em nossa lei. O que vigora é que o sujeito responderá pelos crimes já existentes no Código Penal, como homicídio, depredação e afins.
O texto do PL especifica que a prática terrorista é um ato cometido por uma ou mais pessoas “cujos atos preparatórios ou executórios ocorram por razões de ideologia, política, xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou gênero e que tenham por finalidade provocar o terror, expondo a perigo a pessoa, o patrimônio, a incolumidade pública ou a paz pública ou coagir autoridades a fazer ou deixar de fazer algo”.
E mais: o texto configura como prática terrorista a depredação de bens públicos ou privados, o armazenamento, uso ou transporte de explosivos ou gases tóxicos. E também “afetar o controle, ainda que de modo temporário, de meios de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas civis ou militares, locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, embaixadas ou consulados”.
A proposta inicial era que a pena prevista para o crime de terrorismo fosse de 8 a 12 anos; no entanto, ela foi ampliada pelos próprios parlamentares, que aprovaram o projeto da Câmara dos Deputados para detenções de 12 a 30 anos. Pena igual à de homicídio qualificado.
Isso vai sufocar os movimentos sociais?
O texto-base prevê que o enquadramento do crime de terrorismo não “se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais ou sindicais movidos por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender ou buscar direitos, garantias e liberdades constitucionais”.
Ainda assim, muitos deputados questionaram a validade do disposto, dizendo que, mesmo com essa ressalva, os movimentos sociais seriam alvo de repressões e perseguições por parte do Estado.
A deputada do PCdoB, Jandira Feghali, atacou o PL, afirmando que o texto dá margem para o enquadramento de qualquer pessoa como terrorista. Em um texto do ano passado, Jandira questionou a necessidade do projeto, sendo que já existem dispositivos capazes de punir as mesmas condutas criminosas.
“Basta um rápido olhar para alguns artigos de nosso Código Penal: o artigo 132, sobre exposição da vida ou saúde de uma pessoa com perigo direto ou eminente; o 148, para casos de sequestro de pessoas; ou o 121, em situações de provocar a morte. Exemplos simples para mostrar que nossa legislação já contempla a punição para os crimes agora alvo[s] de uma lei antiterrorismo”, escreveu.
Outro político que se mostrou preocupado com a existência do PL foi o deputado Paulo Teixeira, do Partido dos Trabalhadores, que declarou, durante debate na sede da ONG Viva Rio , na última terça-feira (11), que “o Brasil não precisa de uma lei dessa natureza. (…) não permitiremos a aprovação de nenhum dispositivo que possa se confundir com a criminalização de movimentos sociais. Se precisar ter uma lei, que seja a mais restrita possível. Mas, se não precisar, melhor ainda. Porque não tem terrorismo no Brasil”.
Durante a votação da Câmara, Ivan Valente, do PSOL, também criticou o projeto, alegando que o objetivo principal dele é a criminalização das manifestações sociais e populares.
Em contraponto, o deputado Ronaldo Benedet, do PMDB,defendeu o projeto e disse que é preciso uma definição do que é terrorismo, tendo em vista que o Brasil sediará as Olimpíadas no ano que vem.
Black blocs terroristas?
O relator do caso, Arthur Oliveira Maia, assegurou que black blocs não serão processados como terroristas, justamente pela lei diferenciar os atos de organizações terroristas daqueles decorrentes de manifestações populares. “Nesse caso, os integrantes dos grupos black blocs responderiam por vandalismo e depredação de bens”, explica.