Até começar a namorar uma mulher um ano e meio atrás, quando eu tinha 33 anos, eu só tinha ficado e feito sexo com homens. Até fui casada com um. Não tinha me ocorrido de maneira consciente de que eu podia estar interessada em outra coisa.
Aí, um ano depois do meu divórcio, comecei a trabalhar num grande projeto com uma colega — e me vi realmente ansiosa pelos nossos encontros, e me diverti muito no Slack com ela. Algumas semanas depois de ficar muito empolgada para encontrar com ela no trabalho todo dia (e um incidente onde fiquei muito nervosa em perguntar se ela queria almoçar comigo), pensei “Hum, não é estranho que eu pense muito sobre essa colega fora do trabalho, e realmente quero conversar com ela?” Parece… estranho, né?” E sem nem perceber, respondi minha própria pergunta: “Ah, estou gostando dela”.
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Eu não tinha ideia do que fazer com essa informação. Parte da minha confusão era sobre o que esse crush significava pra mim. Perceber que você tem sentimentos queer ou bissexuais, particularmente quando você é uma adulta com mais de, digamos, 20 anos, pode te fazer cair num círculo vicioso: “Quero explorar esses sentimentos para descobrir qual a minha identidade… mas preciso ter uma identidade para namorar/beijar/transar com uma pessoa de verdade segundo as regras dessa identidade”.
E esse era meu caso — fiquei pensando demais sobre rótulos como “queer” e “bi” (como eu ousava dizer que era de um grupo marginalizado quando eu nunca tinha vivido uma experiência disso?). Eu também detestava a ideia de usar outra pessoa para “experimentar”. Eu me preocupava com a possibilidade disso dar em outra coisa. E se a gente se beijasse e eu não gostasse, eu me sentiria horrível… mas e se a gente se beijasse e eu gostasse e, em algum momento, eu tivesse que confessar que nunca fiz sexo com uma mulher e não sabia o que fazer?
Finalmente, me abri com minha amiga Sally, que é gay, e ela me confortou — ela ficou muito animada, confirmou que parecia que o crush tinha acordado alguma coisa dentro de mim, e me encorajou a não pensar tanto sobre rótulos.
Eu ainda tinha muitas perguntas que tinha vergonha de fazer pra ela (ou seja: as de sexo). Mesmo quando eu finalmente digitei “garotas héteros” no Autostraddle e li tudo que apareceu, ainda não descobri o que eu estava realmente procurando. E por isso, 18 meses depois — o tempo em que minha ex-colega e agora namorada estamos juntas, aliás — decidi criar o conteúdo que eu queria ter visto, e escrever este guia sobre explorar seus sentimentos queer quando você não é mais tão jovem.
Se você é uma mulher questionando a sexualidade que sempre conheceu, ou está começando a sentir que é hora de finalmente atender o telefone que fica tocando no fundo de sua mente há anos, e não tem ideia de por onde começar, você veio ao lugar certo. Com ajuda de algumas especialistas e dicas de outras pessoas queer (além de perguntas de pessoas que já estavam curiosas!), estou aqui para responder as dúvidas que você pode ter. (Além disso: se atualmente você está num relacionamento hétero que não vai acabar tão cedo, você pode achar o texto “Como explorar seu lado queer se tem um parceiro hétero” útil.)
Parte I – Se assumindo
Tudo isso foi algo que eu não previ! Sempre fui gay, e só não percebi, ou acontece de alguém desenvolver sentimentos queer mais tarde na vida?
Isso acontece, sim! E não invalida os relacionamentos heterossexuais que você já teve — ou pode ter! (Pra começar, a bissexualidade simplesmente… existe!) “Assumir sua identidade queer mais tarde na vida é totalmente normal e comum”, disse Rae McDaniel, terapeuta sexual de Chicago que trabalha com pessoas se sentindo ansiosas com uma transição que estão experimentando no sexo, gênero e/ou relacionamentos. “Crescemos numa cultura que não apoia explorar uma identidade queer do mesmo jeito que apoia explorar uma identidade hétero, então é difícil identificar as ‘pistas’ que podem apontar para atrações fora dos caras cisgênero. Sabe aquela amiga com quem você vivia abraçada no colégio, e as coisas ficaram estranhas depois que ela arranjou um namorado? Esse tipo de pista.”
Heterossexualidade compulsória — ou seja, a ideia de que alguém é hétero até que se prove o contrário — tem um grande papel nisso também. A maioria das pessoas não é encorajada a começar a pensar sobre atração de um ponto tipo “Como me sinto quando tenho um crush? Tenho um crush nele? Tenho um crush nela?” As pessoas só perguntam para as garotas “De que menino você gosta?” E, se você é bissexual, você pode gostar realmente de alguns meninos! Tudo isso, além de antigos estereótipos sobre mulheres queer de como elas parecem (e como não parecem) e as narrativas predominantes cercando “amizades intensas entre mulheres” (no homo!), pode dificultar identificar sentimentos queer.
McDaniel diz que o jeito como a sociedade discute atração sexual tem muito a ver com isso. “Nossa cultura não fala ou prioriza ensinar as pessoas com vulvas sobre excitação e prazer”, ela disse. “Pessoas que são definidas como mulheres no nascimento podem não estar tão conscientes de como seus corpos respondem a atrações.”
Heather Corinna, fundadora e diretora do site de educação sexual Scarleteen, disse a VICE que achar que as atrações de uma pessoa vão continuar sempre as mesmas durante a vida toda é como achar que o trabalho que você queria ter com cinco anos de idade é o mesmo que você vai ter pra sempre. E sim, pode acontecer… mas, no geral, isso pode mudar com o tempo.
“É possível que você tenha perdido a dicas e que sua sexualidade está simplesmente evoluindo”, disse McDaniel. “É verdade, e apoiado por pesquisas científicas, que a sexualidade pode ser fluída.”
“É muito comum se descobrir mais tarde na vida”, disse Lindsay King-Miller, autora de Ask a Queer Chick: A Guide to Sex, Love, and Life for Girls Who Dig Girls. Mas se você está preocupada com ser “muito velha” para descobrir algo novo sobre sua sexualidade, vale a pena considerar se sua crença de que “superou” a fase de exploração não está enraizada em crenças equivocadas sobre envelhecer e quem “tem permissão” de fazer sexo bom, ou no equívoco de que ser LGBTQ só é aceitável quando você está na faculdade.
Se “Será que sou gay/queer/bi?” é uma pergunta para qual você sempre volta, isso é algo pra prestar atenção. Você não precisa agir sobre isso; você pode apenas… reconhecer. Mesmo se você estiver lendo isto e pensando “Bom, que dia lindo aqui em… hum, talvez eu esteja na Cidade Bi!!!”, você não precisa fazer nada com essa informação ainda.
Estar consciente de e nomear sua sexualidade é um pouco diferente para cada um. Não posso dizer como será pra você, mas posso dizer como foi pra mim: não será necessariamente algo que você “sempre soube”, ou algo que vai te atingir como um raio. Pra mim, foi como uma luz aumentando gradualmente.
McDaniel disse que se você está muito estressada com a possibilidade de ser queer, você pode analisar isso mais, e considerar se tem algum preconceito influenciando seu pensamento. “Tem alguma homofobia vindo de você?”, ela disse. “Você tem medo de mudanças? Está nervosa porque agora precisa comprar um coturno, um macacão jeans e um caminhão? Em que outros estereótipos você pode estar pensando? E olha, eu adoro macacão jeans. Recomendo.”
OK, admito que acho muitas mulheres lindas, mas todo mundo acha, né? Como saber se o que estou sentindo é realmente atração, ou se é só… admiração?
Como minha amiga Sally disse durante nossa conversa inicial, acreditar que toda mulher hétero acha várias mulheres lindas ou gosta de pornô lésbico é algo muito comum em mulheres que mais tarde descobrem que são queer. (Esse jeito de pensar até foi imortalizado no clássico queer de 1999 Nunca Fui Santa.)
Como nossa cultura objetifica intensamente as mulheres, pode ser realmente difícil descobrir se o que você está sentindo é realmente atração, ou só como uma mulher hétero é socializada para notar a beleza feminina (talvez em comparação com a nossa).
“Achar pessoas do mesmo gênero sexy não significa necessariamente que você quer fazer sexo com elas”, disse Allison Moon, autora de Girl Sex 101 e do guia para sexo casual que ainda será lançado Getting It. “Tem muito mais coisa no sexo do que apenas o que é visualmente atraente, e há muitas razões para uma pessoa gostar de pornô lésbico além de querer realmente transar com uma mulher.”
“Se você acha que gosta de mulheres, considere fantasiar sobre as minúcias do sexo com uma mulher”, ela continuou. “Imagine tocar o corpo dela, tocar e sentir o gosto dos genitais dela. Imagine o cheiro dela. Imagine como ela ficaria em cima de você. Se visualizar num ato sexual pode te dar uma boa noção de que você quer a coisa de verdade.”
Mas tem mais coisa aí que apenas sexo. “Quando falamos sobre orientação sexual, estamos falando sobre sentimentos sexuais, românticos ou de afeição, em combinação OU sobre um ou outro”, Corinna escreveu no ensaio “Como se chama quando uma garota hétero acha outras mulheres bonitas?” “Muitas vezes, tentar definir, sem nenhuma dúvida, por quem temos sentimentos sexuais ou românticos, ou não temos sentimento nenhum, pode ser um exercício fútil.”
“Se você olha para outra mulher e pensa ‘Uau, queria que meu cabelo fosse assim’, é uma coisa”, disse King-Miller. “Mas se você está olhando para ela e pensando ‘Uau, eu queria colocar minha boca no rosto dela’, então provavelmente isso é algo que vale a pena investigar.”
Parte II “Experimentar” e ficar
Sei que estou sentindo alguma coisa — quero realmente colocar minha boca no rosto dela, sabe — então acho que vou tentar. O que significa “explorar” ou “experimentar”?
“Explorar sua sexualidade significa investigar os processos da sua mente, e abordar nossos desejos com curiosidade e flexibilidade”, disse Moon. “Há vários jeitos práticos de embarcar na sua exploração sexual, incluindo ler livros eróticos, guias de educação sexual, assistir pornô, explorar fantasias, paquerar, interrogar suas suposições sobre si mesma e outras pessoas, ir a eventos sex-positive como festas e oficinas, se envolver sexualmente com várias parceiras, e muitos mais.
“Nem toda exploração de identidade queer precisa envolver exploração física”, disse McDaniel. “Sua orientação sexual não é só sobre sexo.”
Como já falamos na VICE, você pode ganhar muito se conectando com outras pessoas quando começa a explorar sua sexualidade: “Vá a eventos LGBTQ, leia livros sobre sexualidade ou escritos por autores queer, apoie artistas e músicos bissexuais, ou se junte a grupos queer. Na internet, o subreddit r/bisexual é um espaço divertido e informativo para pessoas bi fazerem perguntas ou apenas discutir suas experiências, enquanto a página Fluid Arizona e os eventos e reuniões do Autostraddle podem ajudar pessoas queer a construírem uma comunidade na vida real”.
Recomendo fortemente uma fase de exploração “passiva”; seguir comediantes queer no Twitter, ver posts engraçados sobre ser bissexual no Tumblr, e seguir contas de memes lésbicos/bissexuais e contas de casais no Instagram. Entre em contato com o TikTok lésbico. É como estudar obsessivamente o anuário de um irmão mais velho nas férias antes de entrar no colegial; saber onde você está entrando facilita se estabelecer quando você chegar lá, e consumir coisas divertidas e leves pode te animar se você está se sentindo intimidada. Se você está nervosa em ser a pessoa nova da escola e não saber as piadas internas, pensar na comunidade como uma parte virtual do processo de exploração pode aliviar esses medos.
“Quando você é nova num grupo social, sempre vai ter o período de se atualizar, e sempre vai ter um período quando você vai começar a conhecer as pessoas, estabelecer seu lugar e fazer amigos”, disse King-Miller. “Para pessoas que se assumiram recentemente, fazer amigos é até mais importante que ficar com outras pessoas e namorar.”
Também procure exemplos de pessoas queer que parecem com você — que têm a mesma origem étnica e religiosa ou de apresentação de gênero. E leia a histórias de mulheres que se assumiram bi ou queer mais tarde na vida, depois de ter relacionamentos apenas com homens. (Tem muita gente como nós!)
OK, acho que quero explorar ficar com mulheres menos na teoria e um pouco mais na prática. Por onde começo?
Tem muitas opções! (Claro, muitas delas não são uma boa ideia no momento por causa da pandemia, mas nem sempre será o caso.) Se você já usa aplicativos como Tinder e Hinge, você pode mudar suas preferências para incluir mulheres, ou pode experimentar apps voltados para pessoas queer como o Lex e HER. Você também pode visitar bares queer; conhecer pessoas em eventos queer locais, ou em eventos como o Queer Soup Night; ou frequentar festas de sexo bissexual como a Skirt Club.
Você também pode simplesmente… abordar mulheres! Não seja muito insistente, claro, mas é totalmente OK conversar com as pessoas, chamar alguém pra sair, pedir o número delas, dizer “Ei, você quer ir pra outro lugar?”, etc., tanto em lugares “héteros” como em espaços queer.
E se todo mundo acha que sou hétero e não quero que elas pensem isso… mas também não quero assumir uma identidade que pode não ser minha?
Isso depende em certa parte de como você está abordando namoro/sexo. Se você é uma mulher usando aplicativos para conhecer outras mulheres, as pessoas não vão achar que você é hétero. Se você está interessada numa pessoa específica, como eu estava, ou está falando com alguém numa festa, você pode se comunicar um pouco mais, tipo, “Estou te paquerando”. Então pense na sua paquera padrão, e confie nas suas técnicas.
Se você ainda se preocupa com os outros pensando que você é hétero, você pode colocar suas referências culturais queer para fazer o trabalho. Use camisetas da Shamir ou Hayley Kiyoko quando estiver passeando pela cidade; poste histórias no Instagram sobre livros queer que está lendo; cole um adesivo do arco-íris no seu notebook; mencione casualmente que você está maratonando Feel Good numa conversa… o que parecer natural pra você! Confie em mim, as pessoas queer notam essas coisas. Com a paquera mencionada acima, você está no caminho certo.
E de novo; tente não se preocupar muito com rótulos! “As pessoas acham que ter um encontro com uma mulher ou até expressar interesse em alguém exige algum tipo de ‘papelada gay oficial’”, como minha namorada disse recentemente. “Tipo, como se você tivesse carteira de motorista a achasse que precisa tirar uma carteira para moto. Mas ninguém espera que você apresente suas credenciais num encontro. O fato de você ter estabelecido sua preferência por mulheres num aplicativo, estar num encontro com uma mulher ou num espaço queer para conhecer mulheres, já é sua qualificação.”
“Quando foca na questão de rótulos, você percebe que tem uma expectativa injusta para pessoas não-héteros para experimentar… bom… não ser hétero de alguma forma física para ser ‘queer o suficiente’. Isso é conversa fiada”, disse McDaniel.
“Se você quer ficar com uma mulher, tipo… vai lá e fique”, disse King-Miller. “Não é uma coisa tão importante, se você se chama de gay, bi, queer ou qualquer outra coisa — apesar de eu defender o rótulo de bissexual, porque é uma comunidade fantástica e muito receptiva.”
No final das contas, rótulos não são tão importantes quanto podem parecer pra você agora. “Acho que rótulos são um jeito de se organizar: ‘Essas são pessoas que se identificam com isso, essa comunidade e as pessoas que são parte dela’”, disse King-Miller. “Quando se trata de começar a ficar com alguém, acho que rótulos são secundários. O ponto de qualquer rótulo de identidade é descrever o jeito como você se sente e pensa sobre as coisas que faz… mas ter uma palavra para todas essas coisas é secundário para realmente sentir, pensar e fazer essas coisas.”
Não quero desperdiçar o tempo de ninguém, ou fazer a pessoa achar que ela é só um experimento, mas também tenho medo que ninguém vai querer ficar com alguém que está questionando ou não tem experiência — algum conselho?
Primeiro, seja honesta consigo mesma sobre suas intenções. Tirando o gênero da equação, o que você está procurando no geral? Você quer uma amizade colorida? Está em busca de uma cúmplice? Definir o que você está procurando facilita saber quando encontrar, mas também te permite agir de um lugar de integridade.
No geral, é uma boa ideia mencionar em algum ponto que você é nova em ficar com mulheres, para a pessoa com quem você está poder decidir por ela se quer continuar falando com você. “Muitas pessoas queer tendem a se afastar de pessoas que dizem que estão explorando ou experimentando com sua sexualidade, porque já passaram por ser um experimento no passado”, disse McDaniel. “Isso é real.”
“Sugiro o modelo de consentimento informado”, ela continuou. “Antes de se envolver com alguém enquanto você está explorando sua sexualidade, informe a pessoa de onde você está no desenvolvimento da sua identidade, o que você está procurando e quão disponível emocionalmente você está. Assim a pessoa pode tomar uma decisão informada se esse é um relacionamento/dinâmica sexual em que ela também está interessada.”
Deixando claro, você não precisa colocar “ALIÁS, EU NUNCA FIZ ISSO ANTES!!!” na bio do Tinder. Experiências passadas e o que você está procurando costuma surgir nas conversas enquanto vocês se conhecem, e esse é um bom momento para dizer que você está se questionando, ou que nunca fez isso antes, ou o que você se sentir confortável pra dizer, e tudo bem.
“Seja honesta. Seja direta. Trate pessoas como pessoas. Algumas mulheres vão topar ser a sua primeira. Algumas não”, disse Moon. “Esconder quem você é e o que você quer para levar alguém pra cama é manipulador. Se você quer descobrir algo, diga isso! Se você está gostando muito de alguma garota e tem medo que ela te rejeite por ser honesta, melhor dizer logo a verdade e ser rejeitada que transar com base em mentiras. Você merece ter sua primeira vez com alguém que gosta de você por quem você é. Você pode se surpreender com quem é experiente e quem não é.”
“Você está se divertindo? A pessoa está se divertindo?”, continuou Moon. “Então não fique estressada com as nuances da ideologia ou ser parte de um tipo. Só aproveite.”
Lembre-se que todos os encontros são um experimento. Muitos encontros não vão dar em nada, e ninguém pensa muito nisso ou considera perda de tempo. Não fique tão presa na pergunta “Vou gostar dela?” pra esquecer que ela pode não gostar de você. E não digo isso pra te deixar mais nervosa, mas para ajudar a lembrar de ver as outras pessoas como seres humanos, com suas próprias necessidades e desejos. Basicamente… não seja esta mulher.
Legal; conselhos para minha primeira tentativa de ficar com mulheres?
Sim — tente não agir de uma mentalidade de “Esse encontro é o fim de tudo”, pense assim “O que está acontecendo com a minha sexualidade?” Não sou uma cientistas, mas tenho certeza que a maioria dos experimentos não são coisas que você tenta uma vez só, sob um único conjunto de condições, depois abandona tudo se não sair como planejado. Isso não quer dizer continuar se você não está com vontade, mas é muito fácil sentir que sua identidade depende de gostar de uma primeira experiência — o que é uma expectativa grande demais, e não a mesma que temos com relacionamentos héteros.
Você provavelmente não deu um beijo hétero sem graça, ou fez uma coisa com as mãos não muito excitante quando era adolescente, e pensou “É, não curti, acho que nunca vou gostar de nenhum homem pro resto da vida!!!”
Falando em fazer coisas com as mãos, você pode pensar que esse “experimento” é principalmente sobre sexo (e vamos chegar nisso daqui a pouco), mas você precisa considerar mais “Gosto de dedada?” Esse processo é, em parte, sobre descobrir se você realmente quer ter um relacionamento com uma mulher.
“Tem essa convenção de que se você está experimentando, você precisa experimentar sexualmente primeiro, e emocionalmente depois”, disse Corinna. “Quando, na verdade, um jeito melhor pode ser ‘Vamos ter três ou quatro encontros e não transar’, e ver como você se sente num encontro com outra mulher, indo pra um restaurante ou saindo com seus amigos.”
Tente não pensar nos homens com quem você já esteve como um grupo de controle desse processo. “Muitas vezes é uma comparação”, disse Corinna. “Tipo ‘Se tive esses sentimentos sexuais por homens, o jeito de descobrir meus sentimentos sexuais com outras pessoas tem que lembrar esses sentimentos sexuais com eles’ — o que pode ser verdade, mas também pode não ser.”
É difícil comparar algo com que você tem zero experiência com algo que você tem anos de experiência. E se você é uma mulher que só ficava com homens numa cultura que prioriza o prazer e o poder masculino, é muito difícil evitar ter seus desejos, expectativas e comportamento afetados por essa dinâmica.
Não há razão para acreditar que o melhor sexo que você fez com um homem é o melhor sexo que você já fez na vida. Use isso como uma oportunidade para se afastar da heterossexualidade compulsória e redefinir o que atração, romance, intimidade e “sexo bom” são pra você agora. O que nos trás para…
Parte III – Sexo mesmo
Não sei realmente como fazer sexo ou dar prazer para uma mulher, e tenho medo de passar vergonha.
Fiquei extremamente nervosa sobre sexo quando percebi que minha colega de trabalho também podia gostar de mim. Eu sabia que as respostas que eu precisa podiam estar na internet, mas simplesmente não estava pronta pra procurá-las no Google. Então decidi esperar e descobrir, o que é OK! Você não precisa ter vários movimentos memorizados antes da sua primeira transa.
Sua falta de experiência pode até tornar o sexo melhor. “Ser novata no sexo pode ser algo surpreendente e revigorante”, disse Moon. “Aborde o sexo com a mente de uma principiante, mesmo se você já teve algumas experiências. Ouça atentamente as palavras e sons da parceira. Preste atenção no corpo dela. Faça perguntas e preste atenção nas respostas. É 100% OK pedir dicas. Sério, não é legal quando você está na cama com uma pessoa nova e ela pede seu feedback?”
Alguma perguntas para ter em mente:
- “O que você está com vontade de fazer?”
- “Do que você gosta?”
- “Tudo bem se eu fizer isto?”
- “Está gostoso?”
- “Você está com vontade de [uma coisa específica]?”
- Perguntas como “Mais forte ou não?”, “Mais rápido ou mais devagar?”
- “O que te excita?”
- E depois: “Como você se sentiu com [uma coisa específica]?”
Pense no que você gosta. “Estar familiarizada com seu próprio corpo e suas fantasias e estar confortável em expressar isso é muito mais importante que saber um gesto particular de dedada, ou algo assim”, disse King-Miller. “Meu grande conselho para pessoas preocupadas com sua experiência sexual é se masturbar.”
Uma coisa que eu gostaria de ter lembrado antes, nos meus momentos mais nervosos, é que corpos são só… corpos. É fácil se convencer de que tem algum grande segredo quando se trata de entender as várias partes do corpo feminino que muitas vezes são consideradas misteriosas, complicadas e difíceis de navegar — mas experimentar coisas sexuais novas é só experimentar coisas sexuais novas! Você já experimentou coisas sexuais novas antes? Se sim, você provavelmente sabe que às vezes isso é intuitivo, e às vezes é meio constrangedor, mas desde que todo mundo envolvido seja adulto e tenha consentido, esteja disposto a se comunicar sobre o que quer, ou quer experimentar, os momentos constrangedores provavelmente não serão um grande problema, ou vão durar muito.
No final das contas, não se preocupe em ser “ruim” em algo por um tempo enquanto perde experiências emocionantes, divertidas e que vão enriquecer sua vida.
Acho que estou ansiosa porque descobri como fazer um homem gozar anos atrás, mas não tenho ideia do que fazer com uma mulher.
Acho que essa é uma atitude comum entre mulheres héteros, e não é algo bom! Não dá pra se tornar mestre, falando no geral, no sexo hétero e se você acha que é — em vez de ver cada cara com quem você fica como um indivíduo único que gosta de ser tocado de maneira diferente — desculpe, mas você provavelmente não é tão boa de cama assim.
“Muito desse sentimento de ‘não quero ser nova nisso’, na verdade é ‘não quero ter que perguntar pra pessoa o que fazer’”, disse Corinna. “Mas todo mundo devia perguntar pra outra pessoa o que fazer. Quer dizer, óbvio, de um ponto de vista de consentimento, esse é o ponto de largada — você precisa. Mas de um ponto de vista de prazer, esse também é o ponto de largada.”
Não importa com quem você está ficando, qualquer um que quer ser “bom de cama” precisa estar confortável em se comunicar durante o sexo e perguntar ao parceiro do que ele gosta ou não.
Além disso, clitóris e pênis são homólogos — ou seja, eles se desenvolvem do mesmo tecido embrionário e tem uma estrutura similar — e não são tão diferentes quanto você pode pensar. Não importa o que a mulher em que você está interessada tenha. Vai ficar tudo bem.
E se eu hipoteticamente quiser fazer uma pesquisa antes de ficar pelada na frente de uma mulher?
Se você quer fazer alguma lição de casa, há vários recursos disponíveis! (Uma nota rápida: algumas dessas fontes são voltadas especificamente para mulheres com vulvas, mas a maioria se aplica a mulheres no geral.) Aqui vão alguns lugares para começar:
- Girl Sex 101 por Allison Moon
- Ask a Queer Chick: A Guide to Sex, Love, and Life for Girls Who Dig Girls por Lindsay King-Miller
- A série de Stevie Boebi Lesbian Sex 101 no YouTube. (Tem um vídeo chamado “literalmente como fazer a tesoura”)
- “This Is Literally How We Do It: Lesbian Sex Positions 101” e “How To Have Lesbian Sex 102: Cunnilingus Edition” no Autostraddle. (Confira também as tags Lesbian Sex 101 e How to Have Lesbian Sex.)
- “Lesbian Sex Tips for Your First Time Having Girl-on-Girl or Vulva-on-Vulva Sex” e “26 Sex Tips to Up Your Girl-on-Girl Game.” (Falando no geral, essa edição da Cosmopolitan é muito útil para esse tipo de sexo, e vale a pena passar um tempo clicando nela!)
- “5 Things I Wish I’d Known Before I Started Having Sex With Other Women” e “4 Safer Sex Tips for Women Who Sleep With Women” da Kinkly. (Confira também a tag lesbian sex da Kinkly.)
- E se você ficou imaginando o significado de palavras como passiva, ativa ou versátil, todos os posts linkados aqui podem ajudar!
Tenho medo de não curtir, sabe?
E você pode acabar não curtindo mesmo! Isso vale pra tudo quando se trata de sexo e qualquer pessoa nova com quem você ficar!
Vale a pena considerar se seus medos de que você não vai gostar de sexo com uma mulher na prática não estão enraizados nas crenças de “que nojo!” sobre o gosto, cheiro e sensação dos genitais femininos, ou no fato de que você tem uma visão negativa dos seus genitais.
Moon disse que descobrir a própria sexualidade “emerge de seguir uma sensação interna de que é a coisa certa”.
“Isso geralmente parece um momento ‘OH, SIM’”, disse Moon. “A primeira vez que fiz sexo com uma mulher, eu surtei. Eu não estava preparada para o gosto e a sensação de uma vagina. Apesar do meu nervosismo, meu cérebro estava gritando ‘OH, SIM’. Então segui essa deixa. Quando você está disposta a ouvir essa voz (que pra muita gente pode ser a parte mais difícil), você pode ficar surpresa com onde ela vai te levar.”
Mas é totalmente OK se você acabar concluindo que sexo com uma mulher não é pra você. (Aliás, se você acabar descobrindo que não curte realmente minas, não precisa dispensá-la com um textão tipo “Quando comecei essa jornada explorando minha sexualidade, eu não tinha certeza de onde ela me levaria…”, OK? Você não curtiu ela, e é isso que importa. Pega leve, pessoal.)
Parte IV – Pra onde vou agora
Ficar com mulheres é melhor do que ficar com homens?
Bom… mulheres também podem ser parceiras tóxicas, então ficar com mulheres não vai resolver seus problemas amorosos, ou ser inerentemente mais fácil. (Pode ser até mais difícil, dependendo do que você quer e onde você mora.)
Ficar com mulheres não é, tipo, incrível unilateralmente — mas ficar com qualquer pessoa que você gosta e com quem quer estar é muito legal, então nesse sentido, namorar uma mulher é muito incrível pra mim, e pode ser pra você também.
Preciso saber de mais alguma coisa?
Só o seguinte: “O queer é uma benção para a sociedade, algo que deixa as pessoas perceberem quantas suposições erradas fazemos sobre sexo”, disse Moon. “O queer nos ensina que não nos apaixonamos para fazer sexo, não fazemos sexo para nos apaixonar, não temos que fazer sexo penetrativo para ser realmente sexual, não temos que tocar nas pessoas para ser sexual, não temos que gostar do toque genital, não temos que ser monogâmicas, não temos que ter um gênero ou orientação, e muito mais.”
“Ser queer é sobre expansão”, ela continuou. “É sobre apagar os limites e exigências para o que ‘conta’. É sobre a exploração sem fim da diversão do sexo e o prazer que somos capazes de experimentar do jeito que queremos.”
Perceber que as pessoas (incluindo você!) são fluídas e que o mundo não é sempre o que parece é algo muito lindo; isso te permite ser mais gentil, curiosa, criativa — notar o amor e o carinho onde você não via antes. Tenho sorte de ser queer, é isso que estou dizendo; espero que você se assuma queer do mesmo jeito — do jeito como quiser chamar, o que escolher fazer sobre isso, e que você se divirta com quem encontrar pelo caminho.
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