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Hitler usava cocaína e o Terceiro Reich inventou a guerra às drogas

‘High Hitler’, livro do jornalista alemão Norman Ohler, mostra documentos sobre o consumo de drogas na Alemanha Nazista.
O alemão Norman Ohler. Foto: Divulgação.

Foram necessários 35 milhões de comprimidos para que o exército alemão lutasse noite e dia sem arregar para invadir a França no final da década de 1930. Até Winston Churchill, na época primeiro ministro da Inglaterra, não esperava que o Pervitin (medicação distribuída aos soldados, cujo princípio ativo é a metanfetamina) possibilitasse uma batalha sem tréguas que depois entrou para a história como Blitzkrieg. Graças ao escritor e jornalista alemão Norman Ohler em seu livro High Hitler (Planeta, 384 págs.) foi possível entender como as drogas foram parte essencial para as vitórias alemãs durante a Segunda Guerra Mundial.

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Com uma escrita fluida, High Hitler quase não parece um livro de não-ficção. A ideia de escrever o livro surgiu após Ohler ouvir de um amigo DJ que as drogas, principalmente cocaína e metanfetamina, eram consumidas pelo baixo calão do exército, oficiais e, posteriormente, até por Adolf Hitler durante sua derrocada. Para encontrar as provas, Norman desenterrou diários e arquivos com registros feitos durante a época da II GM. "Queria ter escrito um romance quando descobri sobre isso", contou o autor à VICE por e-mail. "Só que os documentos que encontrei quando pesquisava para escrever um possível romance eram muito interessantes. Assim decidi que um livro de não-ficção era mais plausível."

"Os nazistas inventaram a Guerra às Drogas" — Norman Ohler

Ohler passou cinco anos enterrado nos documentos oficiais para escrever a obra que aborda também o recrudescimento do controle de substâncias recreativas na Alemanha em decorrência da década de 1920. Nesse período existiu uma excitante Alemanha pré-nazifascista abrigando o cinema expressionista e uma efervescente cena cultural servia de cenário propício às drogas, especialmente morfina e cocaína. (Freud que o diga.) Com a ascensão do regime nazifascista no país, tem início o combate do uso de drogas, vista como uma prática que ia na contramão do pensamento ariano de corpos saudáveis e puros. "De certo modo, os nazistas inventaram a Guerra às Drogas, ou pelo menos ajudaram a aperfeiçoa-la", diz o autor. "Ao mesmo tempo eles permitiam que a sociedade consumisse algumas substâncias como remédios controlados. Muito parecido com o que acontece hoje em dia mundialmente."

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Como garoto propaganda do pensamento ariano, o próprio Führer não fumava, não bebia e nem comia carne. Tudo isso, no entanto, mudou quando Hitler conheceu o médico Theo Morell em um jantar em 1936, no qual reclamou de constantes dores de estômago. Morell, por sua vez, receitou probióticos e Hitler foi curado. Assim, Hitler acreditou ter encontrado finalmente um médico milagroso ao seu dispor. "Morell era uma espécie de médico bastante inovador para a época, muito interessado em novos métodos de cura. Ele não era nenhum tipo de especialista, e sim mais como um médico que curtia muito aplicar injeções", diz Ohler.

Com Morell cada vez mais onipresente na vida de Hitler, estima-se que o doutor administrou 74 drogas diferentes no Füher, incluindo hormônios, esteroides e Eukodal, uma droga mais forte do que morfina. Os experimentos para garantir a saúde, força e atenção de Hitler se intensificaram durante a Segunda Guerra Mundial. Em 1944, com a Alemanha nazista em franca derrocada, Hitler estava acabado e já tomando injeções de cocaína segurar as pontas da derrota pelos russos.

Nos registros resgatados por Norman, há passagens de artigos médicos alemães que descrevem a metanfetamina como algo "estimulante" e que a produção da mesma era incentivada e autorizada pelo governo — mesmo que as drogas fossem proibidas na Alemanha desde a ascensão do terceiro Reich.

A publicação de mais um livro sobre Hitler e a Segunda Guerra Mundial pode parecer chover no molhado. Ainda assim, High Hitler trata de um aspecto da Alemanha Nazista um tanto ignorado até então. "Historiadores são pessoas bastante conservadoras", fala Ohler. "Eles não enxergam as drogas como uma importante ferramenta para desvendar fatos históricos. Espero que isso comece a mudar a partir de agora".

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