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Como aceitar todas as maneiras com que a ansiedade pode mudar sua vida

O livro ‘First, We Make The Beast Beautiful’ fala sobre a luta contra a ansiedade severa e todas as formas com as quais você pode domá-la.
Foto por Chelsea Victoria, via Stocksy.

Eu não consigo dormir. Acabei de fazer 21 e nunca havia tido problemas com o sono até então – mas agora, minha pele está rachando, minha mente considerando tudo e nada ao mesmo tempo. Eu me sinto doente. Todas as noites, fico acordada até 4 da manhã. Pra me acalmar, eu leio o blog de Roxane Gay por horas, rolando pelos posts noite após noite. Quando chego ao final do blog, assisto Orphan Black. Isso não acalma minha mente, mas me faz focar em alguma outra coisa até que as conversas e os efeitos sonoros sejam um som ambiente, uma TV ligada sem o cabo conectado.

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Sempre fui uma pessoa preocupada, mas nunca me pareceu realmente um problema. Eu não sei o que há de errado comigo. Isso é, até minha amiga que foi diagnosticada com ansiedade me contar que o que eu sinto soa como o que ela sente quando não toma seus remédios. Com isso, algo clicou na minha mente – mesmo que tenha levado um tempo até que eu aceitasse totalmente.

Isso foi em 2014, eu até consigo dormir melhor atualmente, mas considero a ansiedade já como uma parte da minha personalidade. Às vezes a reconheço como um medo injustificado, às vezes como intuição, e raramente a sinto como um problema intransponível na minha vida. Numa base diária, na maior parte do tempo, eu sei como me acalmar. Eu medito e tento escrever toda manhã. Eu tento me jogar nas incertezas da vida, em vez de me agarrar ao que eu (acho que) posso controlar. Mas eu também sei que já fui uma garota que não conseguia dormir e sou uma pessoa que existe nas profundezas dos meus pensamentos. E enquanto eu não me importo com isso, os outros vêm insinuando que esse aspecto da minha vida é uma besta que precisa ser domada.

É por essa razão que fui atraída pelo livro de Sarah Wilson, First, We Make the Beast Beautiful, lançado no começo de 2018. O título vem de um provérbio chinês que Kay Redfield Jamison escreveu sobre em sua autobiografia, An Unquiet Mind. É algo como: Para conquistar uma besta, você deve primeiro, torná-la bonita. No livro de Wilson, a besta é a ansiedade e o foco do livro é em sua jornada tentando entender de onde vem, o que significa e como domá-la.

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De acordo com First, Wilson sofre de depressão, TOC, transtorno bipolar, doença de Hashimoto e outras condições que mudam suas experiências de vida, além da ansiedade. Mas acredita que sua ansiedade é a raiz de tudo isso. Ela passou muito tempo pensando, pesquisando, e escrevendo sobre sua ansiedade. (Além disso, alguns podem conhecê-la por seu livro I Quit Sugar e todos os seus spin-offs, ou por seu trabalho como editora na Cosmopolitan Australia.) Em First, ela nos deixa entrar em sua luta pessoal contra a ansiedade como um amigo para o café da manhã. E enquanto escreve sobre ela, também adiciona anedotas sobre experiências que pessoas próximas viveram com a ansiedade, pesquisas sobre ansiedade, exercícios para lidar com a ansiedade, e palavras para ajudar aos parceiros de pessoas com ansiedade a entenderem melhor.

First definitivamente não respondeu a todas as minhas perguntas sobre ansiedade, mas me ajudou profundamente a validar algumas de minhas experiências que não havia pensado serem ligadas à ansiedade – como minha aversão à descamação ou como eu tenho tendência a entrar em uma espiral nas minhas crises em vez de ter um mega ataque de pânico. Quando minha experiência não exatamente se encaixa em representações da mídia popular e definições do Google, às vezes parece ser minimizada, como se não fosse real. O livro de Wilson reconhece que aqueles padrões de definições e diagnósticos descrevem minimamente nossas vidas reais e que cientistas ainda não descobriram totalmente como o cérebro funciona.

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Wilson também escreve sobre a mudança na percepção da doença com o tempo – como os sentimentos que associamos à ansiedade nem sempre foram “ansiedade” e os que associamos à depressão nem sempre foram “depressão”; em vez disso, ambos eram simplesmente considerados sintomas típicos de viver a vida. Eu ouvi essa ideia anteriormente, mas estimo sua aparição em First porque reconhece que nenhum de nós vive em um vácuo; nossos estados mentais são moldados e afetados pelas nossas experiências – seja a de alguém sendo rude com você na rua, ou a de crescer com pais abusivos, ou a de viver sob a realidade de ser uma pessoa marginalizada dentro de uma sociedade capitalista, racista, sexista e homofóbica. Mas mesmo se admitirmos que a ansiedade e as condições relacionadas à ela geralmente são reações justificadas de viver a vida, elas ainda podem difíceis de lidar.

Para ajudar a lidar com essas questões, Wilson dá algumas sugestões como cortar o açúcar, meditar, estabelecer uma rotina, e checar com suas “pessoas internas” (uma prática que consiste em simplesmente sentar e perguntar “Nós estamos bem?” “Nós estamos confortáveis?” Aqui é o lugar onde deveríamos estar?” “Isso faz sentido?”).

Eu não acho que tudo o que Wilson sugere vai funcionar com todo mundo. E muitas das coisas que ela fez pra lidar com sua própria ansiedade, como ir a retiros espirituais ou ficar em uma cabana no campo, nem são possíveis para muitas pessoas. Enquanto Wilson parece saber que sua vida é diferente da maioria, em alguns momentos parece que ela está fazendo prescrições irreais, em vez de oferecer sugestões abertas. Mesmo assim, tem tanta coisa nesse livro que com certeza todo mundo vai poder tirar algo dele – desde que estejam procurando por possibilidades e não soluções concretas.

Finalmente, o que Wilson conclui é que a superação da ansiedade é em sua maior parte sobre aceitação. Ela demonstra que a ansiedade ao mesmo tempo que tirou, deu coisas a ela também. “Acredito que a ansiedade nos impulsiona” escreve Wilson. “Ela existe pra isso – ela ajuda a acender uma chama. Mesmo quando ela nos faz travar de terror, ela eventualmente torna as condições tão insuportáveis que nos empurra a uma nova e importante direção. Eventualmente.” Eu acho que se fosse analisar de perto minhas próprias experiências, provavelmente concluiria a mesma coisa.

Já no final do livro, Wilson diz que ela aprendeu que não pode continuar fugindo – do amor, da vida, das experiências: “Onde eu for, lá estarei.” Esse sentimento parece ser a essência de First. É sobre aprender a se aceitar totalmente e aprender a lidar com o que você traz ao mundo. E com isso, ela está falando àqueles que sofrem com a ansiedade, mas também aos que não – a quem ela chama de “Vida Natural.” Para ela, nenhuma é melhor, são apenas diferentes expressões da condição humana. E ela quer que saibamos que todos os caminhos – mesmo aqueles às vezes considerados como bestas – podem ser bonitos.

Artigo originalmente publicado na VICE US.

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