Você deve saber que, na teoria, políticos condenados em segunda instância não podem disputar eleições no Brasil. É o princípio da Lei Ficha Limpa: se um candidato está com uma mancha criminal, não concorre. Simples assim.
Na prática, porém, muitos conseguem escapar com liminares. Para se ter uma ideia, o ministro Ricardo Lewandowski disse, em março deste ano, que 24 prefeitos e inúmeros deputados e vereadores foram eleitos nesse “tapetão” e continuam em ação. A parte mais crítica é que não há certeza se tais recursos deixarão de ser usados nas eleições de 2018.
Como saber então se um candidato tem, de fato, uma ficha limpa?
De olho nisso, a empresa responsável pelo Reclame Aqui lançou, há dias, o app “Detector de Corrupção”, um recurso para ajudar o eleitorado a conhecer os políticos que vão entrar no páreo em 2018.
A ferramenta é um dos braços do projeto Vigie Aqui, que, segundo o diretor de marketing do Reclame Aqui, Felipe Paniago, começou a ter banco de dados alimentado há um ano. O app usa tecnologia de reconhecimento facial e afirma possuir 98% de precisão.
O funcionamento é bem simples, como pudemos testar. Depois de baixar gratuitamente a ferramenta, disponível tanto para Android como para iOS, basta fotografar políticos ao vivo, em santinhos, jornais, TV ou sites que o app organiza e concentra informações oficiais e públicas sobre a ficha criminal do dito cujo – caso ele responda a processos por corrupção e improbidade administrativa no Superior Tribunal de Justiça, Supremo Tribunal Federal, Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais.
O app pode identificar todos os políticos que ocupam ou ocuparam, nos últimos oito anos, os cargos de presidente, vice-presidente, senador, deputado federal e governador. “A novidade é que, pelo aplicativo, também é possível identificar se os pré-candidatos aos cargos executivos nas Eleições 2018, presidente e governadores, também estão envolvidos em processos de corrupção”, explica nota do Reclame Aqui.
Testamos com alguns dos pré-candidatos a presidência, e os resultados foram, digamos, quase satisfatórios. (Consideramos a pesquisa Datafolha de abril deste ano que indica que Lula, do PT, lidera com 30% das intenções de voto, seguido por Jair Bolsonaro, do PSL, com 15%, e Marina Silva, do Rede, com 10%.)
Crédito: Reprodução
Ao direcionar o celular em uma foto de Lula, líder das intenções de votos e preso desde abril, o app apresentou oito links. O primeiro informou que o ex-presidente é condenado a nove anos e seis meses em uma ação penal, movida pelo Ministério Público Federal, por crime de corrupção passiva e recebimento de vantagem indevida. O aplicativo acrescentou também que foi interposto recurso perante o Tribunal Regional Federal da 4ª região, que aumentou a pena do petista, neste caso, em 12 anos e um mês. Vale ressaltar que especialistas de Direito questionam a ordem de prisão de Sergio Moro.
Quando a reportagem mirou o aplicativo em uma foto de Jair Bolsonaro, porém, a mensagem “não detectado” apareceu, ao lado da face do político. O político de extrema-direita, afinal, foi denunciado pela procuradora-geral da república, Raquel Dodge, por crime de racismo, e também é réu pelo crime de apologia ao estupro.
Felipe Paniago explicou que a primeira etapa do Detector de Corrupção prevê apontar políticos envolvidos em crimes de corrupção, ativa e passiva, como peculato e lavagem de dinheiro. “Os dados devem estar publicados em um dos tribunais, caso contrário, não incluímos no banco de dados”, diz. “Existe uma demanda para aumentar a atuação do aplicativo, até por conta de interesses locais e causas específicas. Aos poucos, será possível listar todos os problemas com a Justiça dos políticos, o que vai demandar um grande esforço da nossa equipe para manter os dados sempre atualizados”, afirmou.
E quanto ao presidente Temer? Bem, após mirar em uma foto dele, o aplicativo abre três links, que indicam que o atual presidente é investigado por crimes de corrupção passiva, participação em organização criminosa e por receber propina para favorecer empresas do setor portuário.
Já Marina Silva, que também está entre os mais lembrados na pesquisa, não possui qualquer denúncia de corrupção.
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Quando miramos na imagem do agora ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), surge a informação de que o tucano responde a uma ação civil de enriquecimento ilícito, além de violação aos princípios administrativos.
Alckmin não está muito bem nas pesquisas de intenção de voto. Segundo o Datafolha, ele conta com 8%, empatado tecnicamente com o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, que, apesar de não ter se lançado pré-candidato, é apontado entre 8% e 10% dos eleitores, dependendo do cenário projetado. Como Barbosa não ocupou nenhum cargo no Legislativo ou Executivo, e também não se envolveu em nenhum caso de corrupção, o app não o reconhece.
Ciro Gomes (PDT), não conta com nenhum processo nos arquivos dos tribunais usados como fonte de informação do detector de corruptos. Ele conta com 5% das intenções de voto, quando Lula aparece no páreo, e empata com Alckmin e Barbosa, com 9%, em um cenário sem o petista.
Manuela D’Ávila (PCdoB) não é processada por nenhum crime monitorado pelo app. Ela, segundo o Datafolha, está com 2% das intenções de voto. A candidata do partido comunista é um dos nomes da esquerda que pretendem disputar as eleições presidenciais em outubro.
O líder do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST), Guilherme Boulos (PSOL), que conta com 1% das intenções de voto, está com a ficha limpa, como indica o aplicativo. Ele também é uma das apostas da esquerda ao planalto.
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O “caçador de marajás” Fernando Collor de Mello (PTC) vai disputar novamente à presidência, mesmo sendo conhecido como o primeiro presidente da história recente a ser alvo de um processo de impeachment. O Detector de Corrupção indica que ele é denunciado pelo Ministério Público Federal, na Lava Jato, por envolvimento em um esquema de corrupção e lavagem de dinheiro com recursos desviados da Petrobras. Apesar de seu histórico nebuloso, ele conta com 1% das intenções de voto.
Em resumo, quase todos os políticos estão com o rabo preso. O app do Reclame Aqui, por sua vez, se mostrou recurso fácil para investigar denúncias de corrupção de candidatos a cargos políticos em 2018. Esperamos que todo tipo de crime entre numa próxima atualização.
E para os que duvidam da eficiência do reconhecimento facial, a reportagem fez uma selfie e usou a foto no app em que nada constou (ufa).
Crédito: Reprodução
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