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Tecnologia

Músculos Artificais Mais Fortes Deixam Robôs Mais Humanos

Músculos artificiais transformam robôs e aparelhos protéticos, mas são surpreendentemente difíceis de fazer.
O robô Repliee Q2. Crédito: BradBeattie/Wikipédia

Ray Baughman, professor de química e diretor do Instituto de Nanotecnologia da Universidade do Texas, em Dallas, lembra-se de ver uma linda mulher do outro lado do saguão durante um congresso na Coreia do Sul. Mas à medida que se aproximou dela, ficou perturbado.

"Era a EveR, uma robô humanoide", ele me contou. Os criadores da EveR fizeram um excelente trabalho emulando a forma humana, ele disse, mas "ela não tinha músculos o suficiente no rosto para sorrir naturalmente". É o tipo de imperfeição sutil que deixa robôs mais assustadores do que convidativos.

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Músculos artificiais transformam robôs e aparelhos protéticos, mas são surpreendentemente difíceis de fazer. Há anos, pesquisadores tentam fazer com que robôs contraiam e soltem os músculos rapidamente, sem perder a flexibilidade ou deixá-los quebradiços. Já tentaram diversas estruturas diferentes, de uma linha de pesca elástica a um cilindro de borracha que se contrai com estímulos elétricos.

Um dos conceitos mais futurísticos é a ideia de um músculo feito com gel, que pode remodelar por completo a maneira como vemos o acabamento dos músculos — caso alguém consiga construir um músculo forte o bastante para durar.

Mês passado, pesquisadores japoneses publicaram um estudo na revista acadêmica Nature Communications, sobre um novo hidrogel, ou uma rede de moléculas sintéticas que se expandem ao absorver água, que, segundo os pesquisadores, podem ser usadas como músculo artificial, mesmo que ainda não estejam prontas para implementação no campo.

"Tradicionalmente, géis são usados por pesquisadores em diversos campos, porque a preparação deles é muito fácil", Yukikazu Takeoka, professor de engenharia molecular na Universidade de Nagoya, no Japão, e autor do estudo, escreveu em um email. Mas ele e a equipe descobriram uma maneira de fortalecer os géis, ele disse, que pode inspirar outros pesquisadores a pensar em aplicações diferentes.

No artigo, escreveram que, embora hidrogéis "tenham potencial (…) para uso em músculos artificiais, a fragilidade deles precisa ser reduzida antes que possam ser utilizados nessas aplicações", e acrescentaram que o novo método de desenvolvimento de géis pode gerar "melhorias significativas" em durabilidade.

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Este vídeo da Universidade do Estado da Carolina do Norte mostra uma aplicação dos hidrogéis em motores simples.

"Já trabalhamos com músculos artificiais de gel no passado, mas eram muito fracos e lentos", Paul Calvert, professor de bioengenharia da Universidade de Massachusetts, em Dartmouth, disse numa entrevista. "Eram muito lentos porque o material tem que se propagar, e isso leva tempo, pois estamos falando de coisas microscópicas."

E fracos porque os filamentos do material são repuxados com força quando estão cheios de água, o que os deixa quebradiços. "Pense em gelatina — com apenas um corte, ela pode ser dividida ao meio", disse Calvert.

Nos últimos 15 anos, disse Calvert, pequenas inovações incrementaram os projetos dos engenheiros e os aproximaram de uma manufatura de gel com a qualidade adequada para músculos artificiais. O processo ainda está em curso, e o caminho é longo, mesmo com as contribuições recentes da equipe de pesquisadores japoneses.

Um gel é como uma rede de fibras, disse Calvert, e elas se cruzam em diversos pontos, que foram fixados no passado. Os autores do novo estudo colocaram um "donut" na extremidade das fibras, para que as interseções não sejam mais fixas no espaço.

"Isso dá mais flexibilidade, porque tudo pode deslizar até uma extremidade antes que o material seja repuxado com força", disse Calvert. Essa inovação não é nova em folha, mas "ninguém havia unido as duas coisas [a reticulação e o donut] antes", acrescentou.

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Propriedades do hidrogel dos pesquisadores japoneses. Créditos: Nature Communications

Apesar dos autores do artigo da Nature terem mencionado músculos artificiais como uma aplicação possível do novo hidrogel, Baughman acredita que géis "normalmente são elásticos demais" para isso. Eles funcionam melhor em distribuição de medicamentos, porque podem liberar ou absorver materiais na presença de substâncias químicas particulares, o que significa que poderiam liberar medicamentos no corpo na presença de células apropriadas, como os antígenos.

Por ora, Calvert concorda; os projetos mais promissores são da SRI International, uma empresa de pesquisas situada no Vale do Silício. A SRI foi quem mais se aproximou de uma resposta, colocando díodos de metal lubrificados em ambas as extremidades de um cilindro de borracha.

"Por enquanto, os géis estão parados", disse Calvert, porque ninguém conseguiu deixá-los fortes e sensíveis o bastante.

Mas eles apontam para um futuro em que robôs terão um acabamento muito mais flexível. "Se observamos todos os robôs atuais, incluindo membros protéticos, veremos que todos são movidos por motores elétricos e engrenagens. É óbvio que precisamos de um músculo artificial e um tipo humanoide de membro", disse Calvert.

Uma aplicação estimulante em potencial é o campo emergente da robótica soft. Calvert acredita que os primeiros robôs soft serão parecidos com "cachorros com uma bateria dentro", ideais para detectar minas terrestres. Mas eles vão progredir rapidamente, para além dessas aplicações práticas. Os músculos artificiais são a chave desse progresso, mesmo que as pessoas não entendam muito bem por que precisam de robôs humanoides, para começo de conversa.

"À medida que as pessoas começarem a interagir mais com robôs, vão precisar de coisas bem mais humanas", disse Calvert. "Por ora, a questão é: 'Será que damos conta de fazer isso?'"

Tradução: Stephanie Fernandes