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Games

O futuro da realidade virtual está no shopping da sua cidade

A experiência interativa de Star Wars tão impressionante que pensei, “Puta merda, o futuro chegou e ninguém me avisou”.
Imagens cedidas por The Void

O shopping Glendale Galleria fica em Glendale, Califórnia, mas caso você acordasse de um coma lá dentro, te perdoaríamos se você não sacasse que está em Los Angeles ou em qualquer outro lugar familiar, considerando que todo shopping nos EUA funciona como uma espécie de embaixada suburbana. Fato é, este shopping se assemelha exatamente ao que você tem em mente agora: um átrio branco de dois andares com iluminação diurna suave vinda de duas claraboias, com lojas genéricas de roupas entre grandes marcas.

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Esse cenário suburbano tão familiar, tradicional e pacato apenas aumenta o contraste chocante quando, ao sair pela direita na praça de alimentação, você encontra com uma estrutura (que não tem nada demais) que abriga uma das experiências de videogame mais inovadoras dos últimos anos.

Bem-vindo ao The VOID, uma experiência interativa de Star Wars tão impressionante que a primeira coisa que pensei ao passar por ali foi “Puta merda, o futuro chegou e ninguém me avisou”.

Batizada de “Star Wars: Secrets of the Empire”, fruto de uma colaboração entre o estúdio de “hiper-realidade” The VOID e a ILMxLAB, a divisão de entretenimento imersivo da Lucasfilm, a experiência junta realidade virtual com elementos de salas de fuga e jogos de laser tag.

[Arcades de realidade virtual também estão surgindo em shoppings brasileiros, como a VR Gamer, cujo criador entrevistamos no nosso podcast de games.]

Ao passo em que muitas experiências envolvendo RV te botam grudado numa cadeira ou ligado a algum aparato enorme, o The VOID te coloca um headset e um colete háptico, então você está livre para zanzar por um espaço físico real cheio de salas vazias e corredores. O vídeo e áudio no seu capacete – que conta com alguns efeitos reais e partes físicas com as quais você precisa interagir – misturam o mundo da realidade virtual com o mundo tátil, real, criando uma experiência inacreditavelmente imersiva. Diferente de uma sessão típica de games ou realidade virtual em que você logo toma ciência de suas regras e parâmetros rapidamente, o mérito da The VOID é passar a perna no seu cérebro e o que ele consideram serem as limitações de uma experiência virtual. O slogan da parada poderia ser “Vai lá, pode tocar, está ali mesmo”.

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Parte da mágica reside em como cada elemento é apresentado: logo de cara, a equipe do local equipa você e até outros três amigos, levando-os até um pequeno cômodo cinza, orientando então que coloquem seus visores.

Dali em diante, o visual movido pelo Unreal Engine 4 te coloca em um cômodo cinza virtual muito parecido com o que você está de pé de fato, com a diferença de que você e seus amigos agora estão vestidos de stormtroopers. Você olha pra baixo e percebe que suas novas mãos virtuais movem-se exatamente como as suas mãos de verdade, incluindo o movimento dos dedos. Faça o sinal da paz, dê um joia, cumprimente um amigo, o que for; o jogo é tão bem renderizado em tempo real que estes movimentos se correspondem ao que é observado no mundo virtual.

Então as paredes cinza sem-graça se transformam no detalhado interior de uma espaçonave, que ganha vida com sua própria unidade R2 virtual e tripulação. De repente, você é transportado oficialmente para o universo de Star Wars.

Logo você percebe que sua nave está aterrissando ao lado de uma base imperial no planeta de lava Mustafar, e assim que você sai dela e pisa num pedaço de metal flutuando a cima da lava, você é levado a um dos diversos momentos “puta merda” do rolê: bate uma leve sensação de vertigem. O cheiro de enxofre sobe, o calor é sentido na pele – você literalmente sente isso aí, tem algum mecanismo no cômodo que te surpreende com o cheiro e calor – e então você se prepara pra seguir em cima desta plataforma flutuando sobre a superfície ardente deste planeta, maravilhado com o quão longe consegue ver, em todas as direções.

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Há, é claro, aquela parte do seu cérebro ciente de que você está dentro de um lugar vazio que divide uma parede com a loja da Gap ao lado, mas os truques sutis e o escopo do que você está vendo, ouvindo e sentindo torna quase impossível não se maravilhar com o negócio todo. É emocionante, é impressionante. É a coisa mais próxima da Sala de Perigo ou do Holodeck que temos no momento.

Isso que ainda não chegamos na parte em que você pega uns blasters e começa a trocar tiros.

Você se meterá num tiroteio enquanto tenta sair de uma base imperial, você sentirá o impacto dos tiros inimigos no seu peito. Você mergulhará atrás de qualquer coisa que possa servir como cobertura enquanto tenta se livrar de outros stormtroopers, tentando conseguir um tempo enquanto seu colega acelera pra resolver o quebra-cabeça que abre a próxima porta.

E depois de tudo isso você se pegará pensando no que mais pode ser feito com essa tecnologia. E se rolasse um assalto a banco? Ou zumbis? Ou Portal? Poderemos montar nos dragões de Daenerys? Será que algum arrombado poderia sair balançando em teias como o Homem-Aranha? O que vem depois?

Encarando o vazio do The VOID

Quem melhor para responder tantas perguntas que não Curtis Hickman, co-fundador e diretor de criação do The VOID? Seu histórico de ilusionista e produtor de efeitos especiais ajudou a moldar todas as experiências disponíveis no The VOID, bem como as que ainda vem por aí. Glendale é só uma das sete locações da VOID em operação no momento, com outras nove anunciadas recentemente, cada uma oferecendo os seguintes títulos: Star Wars: Secrets of the Empire, Ghostbusters: Dimensions de 2016 e Nicodemus: Demon of Evanishment.

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Participei da experiência de Star Wars oferecida pela VOID diversas vezes, mas quase tão divertido quanto isso é ficar pensando nas possibilidades que o formato oferece. Quanto do trabalho desenvolvido por você e sua equipe consiste nisso e experimentos?

Hickman: Passo boa parte do tempo fazendo exatamente isso. Ficamos ali conversando coisas do tipo “Como fazer escadas no VOID? Ou ao menos fazer parecer que há escadas ali? Como fazer as pessoas se sentirem como se estivessem flutuando? Como seria isso?”.

Mais da metade dos nossos experimentos vão pra lixo, mas vez ou outra chegamos num ponto em que achamos algo incrível e consideramos incluir em nossa próxima experiência.

Em termos de experiências, tem algo que vocês ainda não conseguiram colocar 100% na prática, tipo “Queria conseguir fazer x no VOID”?

Hickman: Bem, a Nicodemus [nova experiência original de terror da VOID, lançada em Las Vegas neste semestre] foi uma dessas. Tinha um monte de truques que eu queria fazer há um bom tempo e pudemos colocar ali, brincar um pouco. Mexer mesmo com espaço e diferentes formas de redirecionamento, meio que enganando os sentidos e fazer as pessoas acreditarem que estão mesmo neste enorme espaço assustador, incluindo alguns truques divertidos de mágica.

Tem um monte de coisa divertida a ser feita ainda, mas eu particularmente tenho um fascínio maior por algo mais aberto.

Você fala no sentido de ter um espaço maior ou maior duração de um jogo?

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Hickman: Meio que tudo isso aí. Experimentamos como reutilizar o espaço e fazê-lo parecer maior do que realmente é. Muita gente chegou e disse que queria experiências mais longas e eu encaro isso como um elogio. Damos duro para tentar fazê-las durarem mais.

Mas também me agrada a ideia de maior liberdade no sentido de onde se pode ir, em que tudo pareça menos algo sobre trilhos e mais uma situação em que você possa decidir entre lutar para seguir adiante ou tentar se esgueirar pela porta de trás. Tais escolhas refletiriam como a realidade se desdobra na sua frente. Programar esse tipo de decisões no VOID, mantendo o nível de resposta por parte do programa, de maneira comercialmente viável e segura, é com isso que estou me ocupando.

Em termos de experiências, tem algo que vocês ainda não conseguiram colocar 100% na prática, tipo “Queria conseguir fazer x no VOID”?

Hickman: Bem, a Nicodemus [nova experiência original de terror da VOID, lançada em Las Vegas neste semestre] foi uma dessas. Tinha um monte de truques que eu queria fazer há um bom tempo e pudemos colocar ali, brincar um pouco. Mexer mesmo com espaço e diferentes formas de redirecionamento, meio que enganando os sentidos e fazer as pessoas acreditarem que estão mesmo neste enorme espaço assustador, incluindo alguns truques divertidos de mágica.

Tem um monte de coisa divertida a ser feita ainda, mas eu particularmente tenho um fascínio maior por algo mais aberto.

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Você fala no sentido de ter um espaço maior ou maior duração de um jogo?

Hickman: Meio que tudo isso aí. Experimentamos como reutilizar o espaço e fazê-lo parecer maior do que realmente é. Muita gente chegou e disse que queria experiências mais longas e eu encaro isso como um elogio. Damos duro para tentar fazê-las durarem mais.

Mas também me agrada a ideia de maior liberdade no sentido de onde se pode ir, em que tudo pareça menos algo sobre trilhos e mais uma situação em que você possa decidir entre lutar para seguir adiante ou tentar se esgueirar pela porta de trás. Tais escolhas refletiriam como a realidade se desdobra na sua frente. Programar esse tipo de decisões no VOID, mantendo o nível de resposta por parte do programa, de maneira comercialmente viável e segura, é com isso que estou me ocupando.

Você já se viu na situação de estar com algo em mãos para o qual o público não estaria pronto por ser muito intenso ou assustador?

Hickman: Tem coisas que não fizemos mesmo por questão de segurança mesmo, e também porque quando se trata de compreensão por parte do público, há todo um processo e educação a serem conduzidos. Toda experiência precisa ensinar as pessoas como agirem dentro do VOID antes de que mergulhem nele.

É pedir demais que alguém lá dentro solucione problemas complexos porque rola meio que uma sobrecarga sensorial. No futuro, quando as pessoas se acostumarem com esse tipo de entretenimento, seremos capazes de criar coisas um pouco mais desafiadoras.

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Você poderia elaborar um pouco mais sobre estes eventos mais desafiadores?

Hickman: Mexer com dilatação e relatividade, em situações em que você não estaria distante de mim e ao mesmo tempo estaria, uma coisa meio Escher de estar em um tempo, uma dimensão diferente. E lá estamos solucionando problemas além do tempo juntos, usando a relatividade da minha realidade e da sua para tanto.

Você se importaria da gente fazer um pingue-pongue aqui rapidinho? Eu digo algo e você só diz se sim, não ou se passa.

Hickman: [risos] Vamos lá, vamos ver no que dá.

Voar, pique Super-Homem.

Hickman: Não.

Combate corpo a corpo.

Hickman: Sim, já experimentamos com isso.

Veículos.

Hickman: Sim, já experimentamos com isso.

Essa próxima é um tiro no escuro, mas foi a primeira coisa que pensei: balançar em teias, como o Homem-Aranha.

Hickman: Balançar em teias? Essa é bem específica [risos]. Não sei se já tentamos algo do tipo, com arpéus ou o que for. No VOID, o objetivo é tentar fazer tudo da maneira mais realista possível, então isso de usar cipós, teias, arpéus ou o que for, eu gostaria mesmo de fazer. Queria criar uma arena com cordas e um percurso, mandar ver mesmo.

Cabos de aço, trampolins, arnês?

Hickman: Certamente pensamos em algumas dessas coisas aí. A segurança sempre é vital e pode ser preciso um grande esforço em P&D pra fazer disso uma realidade, mas são ideias com as quais brincamos um pouco e certamente debatemos. Há algo de promissor aqui.

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Como a sua experiência como ilusionista afeta seu trabalho no The VOID?

Hickman: Quando eu era mais jovem, fui apresentado ao conceito de teoria da mágica por um mentor meu que insistia que devia estudar o tema e claro que nada aquilo me interessava aos 14 anos de idade. Eu queria aprender uns truques pra zoar meus amigos e ele dizia “Não, você tem que ler esse monte de livros velhos”. Acabei lendo e isso me afetou bastante, porque é com base naquela teoria que pude aplicar a mágica a este e outros meios.

Só tem três maneiras de fazer algo desaparecer: movendo o objeto, escondendo o objeto ou ele simplesmente nunca esteve ali pra começo de conversa. Quando você compreende disso, então você sabe que em termos de realidade virtual só tem três maneiras de fazer algo ou alguém desaparecer. Daí que dá pra brincar com o visual da RV e as teorias práticas de mágica para criar momentos verdadeiramente incríveis.

Qual é o seu projeto dos sonhos?

Hickman: Sendo bem honesto, toda vez que alguém me perguntava isso quando estávamos começando eu falava de Star Wars logo de cara, então é engraçado que tenha sido nosso segundo projeto. Sempre serei grato à Walt Disney Company, Lucasfilm e ILMxLAB por acreditarem em nós.

Claro que há um monte de outras histórias que gostaríamos de fazer. Aprendi a não falar tanto sobre isso porque deixa as pessoas especulando. Mas é aquilo mesmo que todo mundo comenta, todos os mundos que as pessoas gostariam de visitar. Fazem parques temáticos gigantes destes universos e tentam dar ao público a experiência de estar dentro deles, mas em minha modesta opinião, a melhor maneira é viver tudo dentro do VOID. Tem muita coisa incrível vindo por aí e acredito que o mundo todo se empolgará com as experiências novas que já vem dobrando a esquina.

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Vocês estão nas Disneylândia, em Dubai, Londres e no Madame Tussaud’s em Nova York. Como o VOID acabou indo parar num shopping em Glendale?

Hickman: [Risos] Bom, estamos tentando chegar em todos os lugares possíveis, nunca foi nessa ideia ficar confinado a estes locais de luxo, mas também fazer experimentos em locais mais próximos do público em geral.

Pense assim: você acorda e tem uma decisão a tomar, escolhendo entre um filme no cinema ou uma experiência no VOID. Pra onde você vai? Como vai ser aquilo? Glendale, pra mim, é isso.

Como você imagina o VOID em cinco anos? No que você está trabalhando?

Hickman: Tudo vai ficar mais acessível para todos. Ao menos é nisso que estamos trabalhando, em levar esta experiência a mais locais.

A tecnologia, claro, melhorará bastante. Trabalhamos com os grandes nomes da indústria de realidade virtual para sempre aprimorar nosso hardware, bem como o design, gráficos e tudo mais que envolve a experiência. É essa combinação entre o técnico, o físico, teórico e psicológico que faz nosso trabalho ser o que é e ao passo em que estes campos avançarem, faremos de tudo para acompanhá-los.

Sinceramente, mal posso esperar por estes cinco anos!

Foto do autor.

O futuro da Realidade Virtual

Após encerrar a sessão no The VOID e voltar ao shopping, é bastante complicado não partilhar da mesma empolgação que Curtis tem com relação ao futuro. Todas as vezes que participei de uma sessão de Star Wars no VOID, eu e meus amigos só ficamos ali com um sorrisão na cara comentando nossas partes favoritas. Invariavelmente alguém comentava algo do tipo “Queria que tivesse algo mais pra fazer, eu voltava ali na hora” (a boa nova é que há planos para apresentar as três experiências VOID neste mês de agosto ali em Glendale mesmo).

Observando os frequentadores comuns ali do shopping passando, você meio que acaba sentindo como se soubesse de um segredo. Essa galera faz ideia do que rola ali dentro? Essa molecada ia PIRAR no VOID, não?

O que me leva a fazer a seguinte pergunta: será que o público em geral está pronto para esta tecnologia? Após cerca de 25 anos de chutes porcos sobre o futuro da realidade virtual, eu que não vou tentar dar meu palpite, mas mesmo assim, com a chegada do VOID a diversos lugares por aí, fica a sensação de que estamos prestes a descobrir, finalmente.

Matéria originalmente publicada no Waypoint.

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