FYI.

This story is over 5 years old.

MEXICALIA

As Gangues do Metrô da Cidade do México

No México, existem várias gangues locais chamadas combos, formadas por reggaetoneiros (fãs de reggaeton) com idades entre 15 e 20 e poucos anos que assombram as estações de metrô da Cidade do México.

A CENA SUBTERRÂNEA

OS COMBOS REGGAETONEIROS DO METRÔ DA CIDADE DO MÉXICO

By Bernardo Loyola

Autoridades do metrô mudam passageiros de vagão para que os Sikarios incomodem o menor número possível de pessoas. Fotos por Mauricio Castillo.

É manhã de sábado numa estação de metrô da Cidade do México e os membros da gangue Panamiur estão indo para uma festa. Seu líder, Cidel, está usando óculos escuros enormes, um moicano fajuto, calça cargo e uma camiseta aerografada com um dois e um seis gigantes — uma referência ao 26 de novembro de 2010, a data em que o Panamiur foi fundado.

Publicidade

Os quase 50 meninos cercando Cidel estão na mesma pinta, com correntes de ouro falsas, óculos de sol gigantes, bonés de basebol coloridos e jeans apertados. Eles gritam uma música para um membro de uma gangue rival do outro lado da plataforma. “A porra da mãe do Jori está tomando banho, eh, oh!”, eles gritam. “Ela tá muito perto do nosso território, eh, oh! Um pinto numa mão e um pano de cola na outra, eh, oh! E a gangue diz, vamos estuprá-la, vamos estuprá-la. Bem na bunda! Vadia!”

Eles estão rindo porque é só uma piada, mas os demais passageiros parecem nervosos. A Panamiur é uma das várias gangues locais chamadas combos, formadas por reggaetoneiros (fãs de reggaeton) com idades entre 15 e 20 e poucos anos que assombram as estações de metrô da Cidade do México. Como todos os combos, Cidel diz que o negócio do Panamiur é, principalmente, música, festa e o apoio ao grupo não importa o que aconteça. Da perspectiva dos passageiros, no entanto, isso também quer dizer baforar limpador de cachimbo e cola industrial, fazer sinais de gangue e gritar obscenidades sobre estuprar a mãe dos outros, logo, o nervosismo é compreensível. Especialmente considerando as histórias sobre os combos que vêm circulando na mídia local no último ano.

Os combos viraram manchete pela primeira vez em julho do ano passado, quando mais de 600 reggaetoneiros decepcionados e sem rumo depois de um show de reggaeton ter sido cancelado decidiram passear pelas estações de metrô de bairros da moda. Placas foram arrancadas, rolaram brigas e mais de 200 meninos foram presos e ficaram na cadeia por um tempo até serem liberados. Algumas semanas depois, no dia 4 de agosto, uma briga em larga escala estourou em outra estação, quando 50 meninos foram emboscados por 150 membros de uma gangue rival que odiava reggaeton. Os vídeos de câmeras de segurança que mostram a briga, com bombas caseiras explodindo na plataforma, viralizaram e, de repente, a Cidade do México tinha uma nova onda adolescente com que se preocupar, fazendo todo mundo se perguntar se o que estava acontecendo era um remake em espanhol do filme The Warriors.

Publicidade

Mesmo que a maioria dos combos seja culpada por fazer pequenos atos de vandalismo e baforar substâncias químicas em público, como os greasers norte-americanos dos anos 1950 e os fãs de heavy metal nos 1970, eles não são uma ameaça tão grande quanto seu perfil na mídia sugere. De acordo com muitos combos, há um esforço coordenado por parte dos próprios membros para se organizar e evitar conflitos sérios, principalmente graças a um cara com 20 e poucos anos e fala mansa chamado Brenan. Em 2011, Brenan fundou a FU Antrax — algo como uma ONU dos adolescentes cheiradores de cola do metrô.

Os Sikarios posam para uma foto em frente à estação de metrô Garibaldi, no caminho de um clube para comemorar seu terceiro aniversário. As camisetas têm o logotipo da estação de metrô que eles costumam frequentar.

Brenan começou sua interação com os combos quando trabalhava na porta de uma danceteria popular de reggaeton. Ele notou que o público das festas despencava sempre que havia rumores de rixas entre gangues rivais e se ligou que poderia organizar festas melhores, maiores e mais pacíficas.

“Na primeira reunião, todo mundo estava tenso e cético”, disse Brenan, “mas nós conversamos, resolvemos nossas diferenças e começamos com a alma limpa”. Mais tarde, alguns combos romperam com a FU Antrax e formaram uma segunda federação chamada La Familia. Brenan disse que alguns colegas queriam atacar esse grupo separado, mas que ele conseguiu dissuadi-los. “As pessoas não me veem tanto como um líder, mas mais como um coordenador”, ele disse. “Eu conduzo as pessoas. Tento guiá-las para que elas não façam coisas que não deveriam estar fazendo.”

Publicidade

A reunião de combos na manhã de sábado é para comemorar o aniversário de Brenan. E mesmo que a intenção seja de um evento totalmente pacífico — só 300 de seus amigos mais próximos, de vários combos, chapando e dançando raggaeton num galpão — os detalhes da festa estavam envoltos em mistérios.

Chegamos ao espaço do evento, um local sem nenhuma característica especial e sem identificação na fachada. Às quatro da tarde, as portas foram trancadas. “O governo chama nossas festas de clandestinas, mas isso porque não podemos ter nosso próprio espaço”, diz Brenan. “Se o governo vê uma reunião como esta, vamos dizer que numa festa na casa de alguém, imediatamente um monte de carros da polícia vão aparecer para acabar com tudo. Mesmo se a gente não estiver fazendo nada de errado. As pessoas têm medo de nós.”

Não há dúvidas de que as autoridades estão de olho nas atividades dos combos. José Alfredo Carrillo, que supervisiona a segurança no sistema de metrô da Cidade do México, disse que, num sábado comum, seus funcionários vigiam cerca de 3 mil reggaetoneiros, torcedores de futebol e outros encrenqueiros em potencial que usam os trens para ir a festas ou eventos esportivos. “Nos últimos anos, esses grupos começaram a representar um problema não só para os trens e as estações, mas também para outros usuários e para eles mesmos”, ele disse. “Eles estão cada vez mais violentos e agressivos, e temos que ter força operacional para conseguir transportá-los e garantir a segurança deles e dos demais usuários. Quando eles entram, não podemos misturá-los com os outros passageiros. Já os vimos roubando pessoas e começando brigas.” Policiais da tropa de choque monitoram com frequência os combos nos metrôs, desocupando vagões e os separando dos outros passageiros.

Publicidade

Perguntei a Carrillo se ele achava que os combos eram grupos criminosos ou só meninos rebeldes procurando diversão. “Entendemos isso como um fenômeno cultural”, ele disse. “Eles são jovens e estão procurando uma maneira de se expressar. Felizmente, eles não são todos iguais; vemos muitos grupos que sabem se comportar. O problema é quando eles ultrapassam o limite entre o que é legal e o que não é.”

Os Sikarios, o maior combo da Cidade do México, celebra seu terceiro aniversário num clube perto da estação de metrô Ciudad Azteca.

Alguns combos brincam com o estereótipo de encrenqueiros violentos, como os Sikarios, a maior e mais notória gangue do metrô da Cidade do México. Contando com centenas de membros, o nome do combo é um jogo com a palavra em espanhol para “assassino”, e o logo deles tem uma AK-47 no lugar do “k”. Mas os Sikarios não estão associados a cartéis do narcotráfico ou ao crime organizado e não são tão perigosos quanto sua reputação pode sugerir. Apesar disso, as autoridades os têm como alvo. Em dezembro, eles celebraram seu aniversário fazendo o que fazem melhor: juntando 400 moleques num clube e dançando, bebendo, tocando tambores e cheirando cola a noite toda, até que os policiais apareceram para estragar a festa.

“A polícia disse que a gente tinha roubado uma padaria, mas não era verdade”, disse Micky, o líder dos Sikarios. “Estávamos do lado de fora com nossos tambores, mas eles simplesmente não entenderam o que estava acontecendo. Eles pegaram alguns de nossos amigos, jogaram no carro da polícia, levaram eles embora e roubaram seu dinheiro e seus celulares… Fomos estigmatizados; eles botaram na cabeça que somos viciados, violentos e ladrões. Mas isso não é verdade.” Quando comentei sobre as brigas entre combos relatadas no ano passado, Micky culpou grupos menores e menos organizados, combos com líderes incapazes de controlar seus membros.

Em sua festa de aniversário, Brenan concorda que os combos são visados de forma injusta. “Por causa do jeito que a gente se veste, as pessoas nos veem na rua e pensam que vamos assaltá-las, mas nós só estamos voltando da escola!”, ele diz. “Muitos acham que não trabalhamos, mas trabalhamos. Por exemplo, eu sou formado — sou engenheiro elétrico.”

Pergunto sobre seus amigos cheirando cola à nossa volta, mas ele dá de ombros. “As pessoas não usam drogas porque pertencem a um combo ou ouvem reggaeton. Muitos têm problemas com a família e acabam usando drogas para escapar disso. E não é porque um de nós usa drogas que todos somos viciados; não é porque um de nós rouba que somos todos ladrões. Tem políticos que usam drogas, celebridades que usam drogas, mas não vou dizer que todos usam drogas… Quem sou eu para julgar?”