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'Esquadrão Suicida' acaba com a esperança que você tinha nos filmes de super-heróis

Sim, o filme é todo esse glorioso lixo que estão falando, mas tem umas passagens redentoras.
Foto cortesia da Warner Bros.

Esta resenha foi originalmente publicada na VICE US.

Os heróis de Esquadrão Suicida são os cosplayers de Harley Quinn, góticos adolescentes e gamers para quem o último título da DC foi feito calculadamente para agradar. Os vilões do filme são os publicitários cínicos querendo lucrar com essa galera e um estúdio ansioso para impressionar, usando uma trilha sonora nada sutil — com músicas como "Sympathy for the Devil" e "Bohemian Rhapsody" — como atalho em vez de construir o clima organicamente.

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A premissa de Esquadrão Suicida é a mesma da maioria dos filmes de super-heróis, mas com uma grande novidade: em vez de uma agência do governo benevolente armando gente como o Capitão América contra os inimigos do país; aqui uma agência sinistra do governo, que investe em prisões superlotadas, instalações militares e agentes de campo descartáveis, faz o trabalho braçal no começo, e em vez de um super-herói, temos seis violões nefários para lidar. O que obviamente é uma tarefa complicada, e a primeira metade do filme é cortada por um monte de flashbacks, narrações e uma exposição comprimida, que chega a apresentar um personagem com um extra dizendo: "Olha, é o Amarra, o homem que consegue escapar de qualquer coisa".

Will Smith se dá melhor como o Pistoleiro, um assassino que ama a filha — em certo momento até ajudando a menina com a lição de geometria imaginando uma bala ricocheteando numa hipotenusa — e que luta contra o Batman, mesmo que só em flashbacks, logo nos primeiros dez minutos de filme. Tamanha é a simpatia do eterno Maluco no Pedaço que você não precisa ver o filme para saber que um time com o Will Smith como membro vai ser tão mau quanto Michael Jackson no clipe de "Bad".

Para um filme com tantos supostos "bandidos", ES não parece pedir para gostarmos de ninguém realmente mau ou aceitarmos qualquer resultado moral de suas ações. Preferimos perdoar. El Diablo (Jay Hernandez), por exemplo, interpreta um pirocinético que renunciou à violência (suas tatuagens deveriam lembrar a iconografia do Dia dos Mortos mexicano, mas eu continuo ouvindo o rapper Stitches me perguntando o que eu vou fazer com esse tijolo que ele enfiou na minha cara), e Jai Courtney não poderia ser um risco tão grande assim para a segurança mundial como o vilão temático australiano estilo Flash, o Capitão Bumerangue. Adewale Akinnuoye-Agbaje, que interpreta o quase mudo gângster réptil Crocodilo, e alguns formadores de opinião que mantêm o esquadrão na linha, o bom menino Rick Flag e a samurai mística Katana, se perdem na mistura.

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Mais importante no filme: temos Margot Robbie como a ajudante/interesse amoroso do Coringa, a Harley Quinn, uma favorita dos fãs pescada da série animada do Batman. Logo depois do recrutamento, os membros do esquadrão são levados para um acampamento militar onde recebem um saco com todas as suas fantasias e acessórios de action-figure — Harley tira do saco um bastão de basebol e uma marreta do Donkey Kong que, claro, logo ela vai usar para esmagar um exército de zumbis de molde. Mas, fora ser uma palhaça sexualizada, ela tem algum poder? Sua principal função é aparecer para entregar falas engraçadinhas e enfiar o Coringa de qualquer jeito na ação.

"Fazer cara de louco, usar um casaco roxo sem camisa e tatuar a palavra 'Damaged' na testa só vai te levar até certo ponto na vida."

Você já viu a versão cafetão de Jared Leto para o Coringa (que Ayer descreveu para mim como "um Coringa mais calejado"), com um monte de tatuagens e um grill de ouro nos dentes, e ficou sabendo que Leto continuou no personagem fora das câmeras, a ponto de levar um porco morto para a mesa de ensaio. Acho incrível. Eu queria que esse Coringa fizesse mais coisas assim, já que fazer cara de louco, usar um casaco roxo sem camisa e tatuar 'Damaged' na testa só vai te levar até certo ponto na vida.

Mas uma coisa que nunca é questionada é a sinceridade do amor entre o Coringa e sua capanga, e que a ideia de um Coringa ainda mais instável pelo fogo da paixão (e o fato de que eles são, sinceramente, um casal muito sexy) sustenta a interpretação além das obrigações cômicas e relativa irrelevância da ação principal. De algum jeito, quando eles têm permissão para aparecer na tela juntos, o que se dá cada vez mais por meio de flashbacks, Harley e o Coringa funcionam incrivelmente juntos, tipo um Mickey e Mallory Knox graficamente saturados. Mesmo nos trajes do Insane Clown Posse, Leto ainda passa seu fardo emocional pronto a explodir, não muito longe dos dias felizes de My So-Called Life, quando, como já disseram antes: "Ele estava sempre fechando os olhos, como se doesse olhar para as coisas".

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Se a cruzada do Coringa para libertar Harley motivasse a ação principal de Esquadrão Suicida, em vez de ser uma trama secundária, o filme poderia ter dado certo. Em vez disso, a maioria do filme é uma missão de reconhecimento tediosa que chega ao clímax quando o esquadrão enfrenta a personagem CG Magia (uma recruta em potencial que contraria sua programação), numa cena que lembra o final do Caça-Fantasmas original com o Gozer.

Como o Esquadrão Suicida provavelmente foi recrutado para realizar alguma missão suja, é uma vergonha ver vilões mais realistas enfrentando uma personagem dona de uma magia genérica em vez de, digamos, "sumindo" com algum crítico do partido no poder, mas há algumas pérolas de doçura no caminho do inevitável gancho e cena do pós-créditos. Uma das cenas, que Ayer me descreveu como "pão com manteiga", estabelece a marca registrada do diretor dos personagens formando uma "família acidental": Harley faz umas acrobacias aéreas enquanto se pendura no helicóptero do Coringa; Viola Davis está excelente como a oficial do governo que junta o time de "bad guys"; e a cena na qual a bruxa tenta seus adversários e mostra como a vida poderia ser tranquila se eles devolvessem seus trajes de vilão na Hot Topic é comovente, sério.

Mas essas sugestões de humanidade são enterradas numa máquina que claramente não confia no público para fazer mais que consumir anarquia de butique, só para deixar qualquer potencial de verdadeiro caos fora da equação. O que, como todos os nerds de quadrinho sabem, reduz o valor do esforço a zero.

Tradução: Marina Schnoor

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