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As Fazendeiras Lutadoras de Guerrero, México

Essa cerimônia um tanto quanto curiosa envolve mulheres de algumas das comunidades locais descendo o cacete umas nas outras para que se colete o sangue derramado em baldes e se use isso para arar e irrigar o solo. Um negócio verdadeiramente espiritual.

Todo mês de maio, fazendeiros de La Esperanza – um vilarejo naua do estado de Guerrero, México – se preparam para semear suas terras. Os campos são lavrados e as sementes germinam, mas é do conhecimento de todos os locais que as chuvas pesadas necessárias para que a plantação cresça não vão chegar sem uma sedução extra. Então, enquanto os agricultores aprontam a terra, o resto da vila começa preparar uma cerimônia para chamar chuva.

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A base dessa cerimônia curiosa envolve mulheres de algumas das comunidades locais descendo o cacete umas nas outras para que elas possam coletar o sangue derramado em baldes e depois usá-lo para arar e irrigar o solo. Um lance suave, espiritual.

Antes da luta, as mulheres dessa comunidade naua preparam um banquete na casa do Comissário Municipal.

No dia de abertura da cerimônia, as mulheres da vila acordaram cedo para preparar muita comida – peru, frango, pozole, mole, arroz, ovos cozidos e tortilhas – que elas levaram ao local da festa para dividir com os oficiais da vila e seus familiares. A mesa também estava à disposição de todos que participavam da cerimônia, era só pegar uma cumbuca que as mulheres a enchiam com comida.

Ao meio dia, partimos para Cruzco, uma nascente sagrada onde as pessoas da vila se encontram anualmente para fazer oferendas a suas divindades. Depois de colocar flores, comida, resina ou cera, rezar ou cantar uma música, todo mundo começa a se alinhar para a luta.

As pessoas da aldeia iam chegando aos montes, improvisando um campo de batalha enquanto esperavam as adversárias de fora da cidade. Quando as comunidades vizinhas apareceram, as mulheres começaram imediatamente a procurar por oponentes e desafiá-las para a luta. As mães e as avós, muitas delas lutadoras no passado, incitavam as gerações mais novas a entrar no ringue para cair na pancadaria e derramar um pouco de sangue.

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Quando as adversárias eram definidas, as mulheres se encaravam, amarravam o cabelo para cima, e tiravam anéis ou qualquer coisa que pudesse prejudicar a performance. Aí, geralmente com os olhos fechados, elas mandavam o primeiro soco. Ocasionalmente elas pegavam um punhado de terra para secar o suor das mãos, ou pediam um tempo para limpar o sangue do nariz, mas depois continuavam incansavelmente descendo a lenha umas nas outras. Tudo isso ao som dos gritos eufóricos de apoio vindos de todos os lados do ringue.

Não dava para dizer quem eram as vencedoras ou as perdedoras, e não havia ali uma questão de vingança, como num clube da luta improvisado atrás de um bar numa sexta-feira à noite.

Depois de várias lutas, comecei a notar o cheiro do sangue derramado durante as brigas, mas isso não pareceu perturbar ninguém a não ser a mim. Mesmo quando o sol começou a se pôr e a memórias dos celulares de todas as crianças já estavam praticamente cheias de vídeos de suas irmãs mais velhas sentando o sarrafo umas nas outras, as mulheres, com as mãos em pelo, não paravam de lutar.

Quando a noite finalmente caiu, retornamos ao vilarejo, e era impossível não notar todas as combatentes voltando para casa com sangue escorrendo pelo rosto, orgulhosas de serem mulheres guerreiras, e certas de que seu sangue alimentaria a todos por mais um ano.

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