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Entrevistamos Ativistas dos Direitos Aborígenes no Dia da Austrália

​Enquanto a maioria dos cidadãos do país comemora o Dia da Austrália com churrascos e cerveja, no dia 26 de janeiro um grande grupo de manifestantes se reuniu no prédio do parlamento da nação para lamentar a colonização do continente pelos brancos.

Enquanto a maioria dos cidadãos do país comemora o Dia da Austrália com churrascos e cerveja, no dia 26 de janeiro um grande grupo de manifestantes se reuniu nos degraus do prédio do parlamento da nação para lamentar a colonização do continente pelos brancos. Foram muitos protestos em Melbourne, mas a manifestação mais turbulenta veio dos Warriors of Aboriginal Resistance – ou WAR, para encurtar.

Lançado antes da reunião do G20 em novembro passado, o WAR é uma coalizão de "jovens aborígenes comprometidos com a causa da descolonização e com o nacionalismo aborígene", segundo seu manifesto. Seus protestos #Genocidal20 do ano passado contaram com 5 mil pessoas marchando pelas ruas de Brisbane e queimando meia dúzia de bandeiras australianas. Conversamos com dois membros do grupo para saber mais sobre essa abordagem provocadora.

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VICE: WAR é um nome poderoso. Por que vocês o escolheram?
Meriki: Não é um acidente. Somos Guerreiros da Resistência Aborígene. Sem resistência, o homem branco toma nossa terra e nosso país; então, nosso propósito não é atacar, mas defender e proteger. Queremos reviver o espírito guerreiro do nosso povo e promover a cultura da resistência.

Como o grupo se formou?
Minha avó chamou minha atenção para o trabalho incrível que os cofundadores estavam fazendo no norte, principalmente em Queensland. Entramos em contato, conversamos e o WAR nasceu. Então, viajamos para o Canadá juntos em agosto passado para encontrar grupos similares. Foi muito inspirador. Quando voltamos, lançamos o WAR antes da reunião do G20.

Fiquei pensando de que maneira o WAR é diferente de outros grupos ativistas. Afinal de contas, esse não é um movimento novo.
Sim, mas o ativismo aborígene militante na Austrália estava dormente desde os anos 70. Os anos 90 foram péssimos para as organizações de negros australianos. Então, estamos aqui para mudar isso. E, diferentemente de outros grupos, não estamos aqui para dançar com as estruturas de poder escravizantes existentes. Somos jovens e estamos prontos para lutar por tudo que tiraram dos nossos ancestrais.

OK. Então como é essa luta? Qual a missão do WAR?
Descolonização. Queremos informar nosso povo e o inspirar – particularmente os jovens, para que eles tomem uma ação na luta anticolonial, porque esse é o único jeito. Descolonização engloba todos os aspectos da vida. É a comida que você come, as coisas que você compra. Alimentação e saúde estão no topo da nossa agenda, mas também estamos ajudando as comunidades a aprenderem as línguas, as danças, as tradições. Queremos que as pessoas estudem e se informem sobre sua verdadeira história.

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O que vocês acham dos líderes indígenas que cooperam com o governo?
Acho que isso não ajuda a causa, mas não vou dar nomes, porque somos solidários como australianos aborígenes. Acho que essas pessoas tendem a ser usadas como fantoches pelo homem branco. Nada realmente muda, mas eles podem dizer: "Olhe, temos essa pessoa negra na mesa. Veja como somos progressistas".

Há muitas bandeiras australianas aqui. O que você sente quando vê essa bandeira?
É extremamente doloroso. É difícil explicar o que sinto quando vejo esses rostos sorridentes segurando essa bandeira no dia de hoje. Hoje, meu povo sente como se estivéssemos num funeral. Não consigo entender a comemoração. Isso sempre será o Dia da Invasão: o dia em que adotamos uma norma cultural ocidental importada, que não é a certa para a Austrália.

Quem são seus heróis do ativismo?
Pearl Gibbs e Malcolm X. Nos inspiramos muito nesses dois, particularmente em nossa publicação Black Nations Rising.

Como Malcolm X influenciou o WAR?
Principalmente em como somos formados inteiramente por jovens aborígenes. X disse que mesmo os melhores membros brancos de organizações negras atrasam a descoberta do que precisamos para nós mesmos. E nossa revista é baseada no Intercommunal News Service, do Partido dos Panteras Negras.

Você acha que este é um momento importante para os jovens indígenas?
Sim. Estamos nos unindo, estamos reclamando o que é nosso e não vamos ser educados. Os membros do WAR têm todos menos de 30 anos. Nossos membros mais jovens estão no final da adolescência e temos a sorte de ter a internet como ferramenta – não apenas para conectar e apoiar, mas para chamar atenção para a causa, tanto na Austrália como internacionalmente.

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_O artista Kai Clancy, 19 anos, é das nações _Wakka Wakka_ e Wulli Wulli._

Você discursou hoje mais cedo. Fale sobre essa experiência.
Kai Clancy: Sim. Fiquei muito emocionado, especialmente pelo dia de hoje. Como não? Sinto que tenho um dever para com a minha família, meus ancestrais e todos os meus colegas. Temos de proteger nossa terra e nossa soberania a fim de podermos avançar, para nossa cultura não só sobreviver como prosperar.

Também ouvi dizer que você se mudou de Melbourne para Brisbane especialmente para protestar.
Sim. Todos os nossos colegas negros [indígenas australianos] estão pegando o ônibus para Melbourne. Acabei de terminar a faculdade, me formei em ciência política; então, pensei: "Por que não ficar por aqui?". Tem dado tudo certo. O WAR organizou seu primeiro encontro nacional aqui no final do mês, com muitos painéis sobre descolonização, e recentemente comecei a trabalhar no AIDS Victoria. Meu chefe e meus colegas estão aqui hoje. Eles estão carregando aquela faixa ali.

Sim. Você também é ativista dos direitos das pessoas aborígenes transgênero, certo?
Sim. Sou transgênero. Nos chamamos de Brotherboys. Então, sim: direitos queer, transgênero e feminismo também são uma paixão minha.

Quem são seus heróis e modelos no ativismo?
Troy Clancy, meu pai. Ele é tudo a que aspiro ser, mas também me inspiro em pessoas da minha comunidade. Uncle Dean (Ednason) é um modelo muito pessoal, já que ele é um Brotherboy das antigas.

Você sente que 2015 é um momento importante para os jovens indígenas?
Sim, nossa hora é agora.

O que você diria ao primeiro-ministro Tony Abbott hoje?
Não consigo entender a obsessão dele pela rainha e pela monarquia. "O que essa mulher tem que te enfeitiça tanto, Tony?"

Texto e imagens por Courtney DeWitt. Siga-a no Twitter.

Tradução: Marina Schnoor