

Publicidade
Afonsinho: Eu estou bem. Rapaz, é a vida, né.Como você ficou sabendo da sua demissão?
Primeiro, eu tava lá Cachoeira Seca, no posto, com os índios, e daí ouvi no rádio, na Rádio Nacional da Amazônia. Ouvi meu nome. Mas não entendi bem não. Depois eu vim pra cidade, ia sair de férias uns dias. Mas daí vieram aqui me avisar que eu tinha sido demitido, tinha perdido a minha função.O que você estava fazendo no posto?
Lá é o lugar para fiscalizar a terra dos araras, para não ter invasão. Dar assistência pra eles. Agora eu tava construindo um alojamento melhorzinho, porque o outro já ta bem degradado. Mas daí faltava recurso, e a gente tem que se virar, né.Quanto tempo você ficou no mato para fazer a pacificação desse povo, que atacava todos os brancos que chegavam ao território deles?
Foi de 1980 até 1º. de janeiro de 1987. Mas ia e voltava, a gente montou um posto, dava brindes pra eles, fazia uma roça grande. Eles eram nômades, andavam por tudo lá. Tavam fugindo, precisavam de comida. Daí vinham pegar essas que a gente deixava pra eles, mandioca, farinha, mamão, jerimum.Por que vocês estavam lá para pacificar eles?
Estavam construindo a Transamazônica, que passou pela aldeia deles. E tinham muitos colonos chegando. Eles eram índio brabo, arredio, ainda não tinham tido contato com os brancos. Os brancos estavam atacando eles. Eles fugiam.

Claro, é meu amigo. Quem me flechou vive na aldeia do Laranjal, outra terra indígena dos arara, ali perto. Ele tá lá, é meu amigo. Não temos problema não. Acho que ele tem um pouco de vergonha, sabe. Quando me vê vem querer me agradar, dá umas bananas, um pedaço de caça. Mas não tem nada disso não. Ele me disse, é que ele não sabia que eu tava querendo ajudar ele.Morreram muitos índios depois do contato, por epidemias?
Nenhum. Eu isolei completamente a área. Não entrava ninguém com gripe. Por dois anos, não houve nenhuma epidemia de gripe. E depois, a gente conseguiu salvar todos que contraíram o vírus. Foi a primeira vez que houve um contato, no Brasil, com um povo indígena isolado, em que todos os índios sobreviveram.Eles confiam em você?
Confiam. Sou amigo deles. Eles sabem que eu sempre vou ajudar eles. Esses araras do rio Iriri, da Cachoeira Seca, não conhecem esse mundo dos brancos, e têm medo do que pode acontecer.Não sei também se eu conheço esse “mundo dos brancos”.