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Música

Relembrando Buddy Esquire, o Rei das Filipetas de Hip Hop

Buddy Esquire era um artista autodidata. Seu estilo era todo art déco e, no geral, lembrava jukeboxes e fachadas clássicas de cinemas. Ele criou centenas de filipetas de 1978 em diante, mas nunca conseguiu viver de sua arte. E morreu agora, aos 58 anos.

Ilustração por Nick Gazin.

Conheci o Buddy Esquire em agosto passado quando eu pastava pela coleção de discos do Afrika Bambaataa. Johan Kugelberg tem os 40 mil discos arquivados publicamente e me deixou discotecar com eles como presente de aniversário. No começo, achei que nada poderia ser melhor do que tocar a cópia do Trans-Europe Express que o Bambaataa sampleou em “Planet Rock”, mas aí o Johan me apresentou ao Buddy, o “Rei das Filipetas”.

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Ele usava uma camiseta com uma filipeta clássica, então, achei que ele estava lucrando com um contrato com alguma marca de roupas do começo do hip hop. Acontece que a camiseta era uma peça única. Ele colocava sua arte em roupas fazia tempo, era assim que ele conseguia exposição. Ele já pintava animês em camisetas nos anos 1980, muito antes de alguém pensar em traduzir os desenhos. Mas ele estava falido.

Um livro do Buddy Esquire estava em andamento, com o Johan, que é perito no assunto, como editor. Johan sugeriu que eu entrevistasse o Buddy, já que nós dois gostávamos de filipetas e quadrinhos. Depois da primeira entrevista, eu tinha que passar mais tempo com o Buddy. Entrevistei ele três vezes no total.

O Buddy era um artista autodidata. Seu estilo era todo art déco e, no geral, lembrava jukeboxes e fachadas clássicas de cinemas. Seu trabalho trouxe vida à musica que ele estava divulgando, com suas formas e padrões abstratos. Apesar do trabalho de Buddy ser associado à música, ele me disse que raramente ia aos shows para os quais ele fazia as filipetas. Ele curtia mais ficar em casa. Ele era um trabalhador meticuloso.

Buddy se mantinha num nível excessivamente crítico, sempre lutando para alcançar a perfeição. Eu sempre achei seu trabalho perfeito, mas entendia sua necessidade de aprimoração constante. Um artista não alcança o que o Buddy alcançou quando se contenta com qualquer coisa. Mesmo quando ele colocou sua tag em meu sketchbook ele pediu desculpas. Eu tive que assegurar a ele que estava ótima. E estava ótima mesmo.

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Minhas entrevistas com o Buddy foram muito intensas. Apesar de ele não entrar em detalhes com frequência, estava claro que muita gente o tinha magoado durante a vida. Buddy continuava desenhando, mas sua carreira despencou quando a cena de hip hop old school acabou. Ele tinha feito todas essas imagens incríveis e era parte integral do nascimento de algo maravilhoso, ainda assim, ele trabalhava para a UPS e não tinha uma conta bancária.

Quando Johan me mandou a mensagem dizendo que o Buddy tinha falecido, eu entendi mal e achei que um “buddy”, isto é, um amigo dele, tinha morrido. Tive que reler três vezes para entender a que buddy o Johan estava se referindo. Talvez seja negação, ou só idiotice minha.

Quando penso na morte de Buddy, sinto como uma onda de depressão e decepção passando por mim. Buddy morreu ao 58 anos, o que é trágico. Eu sempre fantasiava que o livro sobre Buddy Esquire ia reacender sua carreira, e ele poderia trabalhar com arte em tempo integral. Sou muito grato por ter tido a chance de falar longamente com o Buddy sobre sua arte. Eu sei que em algum momento, quando o livro sobre Buddy Squire for lançado, o mundo vai finalmente reconhecer seu valor. E dói muito saber que o Buddy não estará aqui para ver isso.

– Nicholas Gazin

O hip hop, em sua infância, não teve nenhum impulso da mídia. Anos passaram antes que alguém prestasse atenção nisso, exceto dentro da própria comunidade – a primeira geração de artistas do hip hop conseguia reunir um público de quatro dígitos no Bronx na época. O hip hop começou como uma cultura baseada nos shows. Um cultura baseada em apresentações ao vivo, baseada na performance de DJs e MCs e baseada nas noites de sábado. Na época em que o primeiro disco de hip hop foi lançado (começo de 1979, mas alguns especialistas continuam discutindo qual tenha sido o primeiro), a cultura já estava por aí há seis anos.

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O Buddy começou fazendo grafite em 1972. Ele fazia tags e colecionava as tags de outras pessoas em livros pretos enquanto aprimorava constantemente sua habilidade como desenhista. Ele criou sua primeira filipeta no verão de 1977 para uma festa no bairro. Sua primeira filipeta para um show de hip hop veio um ano depois. Buddy começou a trabalhar seguindo os passos do artista Phase 2. Os dois passaram a criar designs elaborados para shows de hip hop várias vezes por semana. As filipetas se tornaram uma questão de prestígio para os artistas e promotores das festas – ter uma filipeta desenhada pelo Buddy Esquire se tonou padrão para promover um evento de hip hop.

Seu trabalho combinava formas austeras em chiaroscuro com uma tensão alegre entre letras, fotos e ornamentos. As câmeras eram raridade no Bronx, então, as poucas fotos que existiam eram recicladas de filipeta para filipeta. Ainda é empolgante rastrear as influências visuais dos designs: as superfícies limpas de virtuosismo visual eram inspiradas nos quadrinhos da Marvel, no Guerra nas Estrelas, em cartazes de boxe, em capas de discos, em fachadas art déco de cinemas que ainda existiam num estado decadente no Bronx dos anos 1970. Buddy Esquire incorporava todos esses elementos em designs atemporais. Sua evolução como artista – de seus primeiros trabalhos com letras traçadas e floreios estilo Vaughn Bode até suas obras de arte dos anos 1880 de arte Bronx/Guerra nas Estrelas –  é clara.

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Tive o privilégio de trabalhar com o Buddy por mais de dez anos, arquivando seu trabalho para a Universidade de Cornell e incluindo no livro e na exposição itinerante Born in Bronx. Buddy era gentil e paciente quando artistas mais jovens e fãs de hip hop vinham até ele. Ele era generoso com seu tempo e conhecimento.

Buddy Esquire criou centenas de filipetas de 1978 em diante, mas ele nunca conseguiu viver de sua arte – ele acabou trabalhando para a UPS por várias décadas. Às vezes, a fama e a fortuna não chegam para quem estava lá antes. Buddy sabia o valor e a influência de seu trabalho. Ele nunca mostrou amargura por seu nível de fama e reconhecimento. Ele me disse que tinha orgulho de sua arte e que sentia que sua influência continuaria por muito tempo ainda.

Leia aqui uma entrevista (em inglês) com Buddy Esquire.

– Johan Kugelberg

O funeral de Buddy “Esquire” Thompson aconteceu sábado passado na McCall's Bronxwood Funeral Home, no Bronx, em Nova York.