FYI.

This story is over 5 years old.

Noticias

Brunei Acabou de Implementar a Charia

O estado se tornou o único país do Sudeste Asiático a implementar a charia em nível nacional.

Um outdoor promovendo os muitos talentos do Sultão de Brunei. (Foto via.)

É muito raro Brunei render alguma notícia internacional, a menos que o príncipe Jefri Bolkiah compre outro negócio de joias ou decida batizar seu superiate de “Tetas” (e as chalupas se chamam “Mamilo 1” e “Mamilo 2”). Na verdade, fora a imensa riqueza da família real, pouco se sabe sobre esse pequenino país soberano ao norte de Bornéu.

Publicidade

Então, a menos que você tenha trabalhado para a Shell em algum momento de sua vida, examinando as enormes jazidas responsáveis pela fortuna real, tudo bem não saber quase nada sobre o povo e o governo de Brunei, nem mesmo que, a partir do dia 30 de março, o estado se tornou o único país do Sudeste Asiático a implementar a charia em nível nacional.

Mario Vargas Llosa cunhou a expressão “a ditadura perfeita” em 1990, em referência ao Partido Revolucionário Institucional do México (o PRI). O PRI conseguiu centralizar o poder por meio da institucionalização dos sindicatos e empregando o método “cenoura na ponta da vara” de governo; quando os trabalhadores exigiam maiores salários, o PRI suprimia as demandas com concessões, como melhorar, de forma aparente, a saúde e subsidiar alimentos essenciais. De vez em quando, o governo prendia ou matava líderes do movimento, só para mostrar que não estava de brincadeira.

Esse método de barganha lembra o jeito bruneano de fazer as coisas – só que sem barganhas. A maioria da população vive uma vida extremamente confortável graças às concessões do governo; a maioria só trabalha seis horas por dia e recebe bônus todo ano; a gasolina custa 25 centavos por litro e a nação inteira não paga impostos.

É a preservação desse estilo de vida que distrai as pessoas de outras questões. Apesar de os cidadãos, tecnicamente, terem direito à liberdade de expressão, é bem aparente que as coisas não funcionam bem assim – o que não é uma surpresa num país comandado por uma monarquia absoluta. Toda quarta-feira e domingo, por exemplo, uma página de “opiniões” no Borneo Bulletin – o mais popular dos dois jornais em inglês produzidos pelo governo – busca fornecer uma plataforma para que as pessoas falem o que estão pensando. Só que o que a maioria das pessoas está pensando é em como a força policial nacional é incrível, ou no quão fantástico era o bufê de Ramadã num certo restaurante local.

Publicidade

Mas as pessoas de Brunei não parecem se importar muito com o sufocamento de sua liberdade de expressão, principalmente por três razões: o país é rico, o governo é generoso e a população é pequena, o que significa que as autoridades podem administrar e regular o país muito facilmente.

Uma mesquita em Brunei. (Foto via.)

Ontem, Brunei se tornou o primeiro e único país do Sudeste Asiático a forçar o código criminal charia. O código – que só será aplicado aos muçulmanos (que formam 67% da população) – pode finalmente render a Brunei o status de mais nova “ditadura perfeita”. Pesquisando o tema no Google, os resultados quase exclusivamente detalham o comando já “feudal” do sultão, ou descrevem a severa charia introduzida em Brunei como “bárbara e draconiana”. As duas coisas podem ser verdade, mas Brunei é um país quase feudal e onde as pessoas conseguem viver porque os benefícios superam os pontos negativos.

Em vez de temer a charia, as pessoas de Brunei estão questionando os motivos para sua introdução. De acordo com uma fonte do Telegraph, pode ser em razão da influência trazida ao país por estudantes que moraram no exterior – mas isso me parece apenas especulação. Até onde consegui chegar, ninguém realmente entende por que isso está sendo implementado.

Depois de falar com vários moradores do país, a razão mais óbvia parece ser que a charia vai agir como impedimento para crimes menores. Mas o crime em Brunei já é extremamente baixo e não há, de fato, nenhuma razão para roubar; o governo dá tudo que for preciso, então, se você tiver as mãos cortadas por roubar cinco pacotes de miojo, a culpa é só sua. E a pena de morte já existia antes em Brunei, então, pouco mudou, exceto que agora – se você for muçulmano – você será apedrejado em vez de enforcado.

A opinião ocidental tem jogado com o fato de que as pessoas não vão falar contra a implementação da charia, mas essa avaliação simplista não leva em conta vários fatores locais importantes. Bruneanos não têm tempo de comentar sobre essa história porque às três da tarde eles saem do escritório e vão direto para o café em seus Mercedes Classe E. E, falando a verdade, você ia reclamar de viver num país sem impostos, com um emprego estável que paga mais que em qualquer outro lugar, dois carros, educação e saúde públicas e uma casa alugada por quase nada num clima de 35ºC constantes?

A implementação da charia em Brunei não faz muito sentido – o país já é incrivelmente seguro, e parece que isso vai aumentar a garantia de segurança no futuro. E mesmo que as práticas brutais da charia atraiam o ódio do Ocidente, as pessoas de Brunei não parecem tão incomodadas – elas estão felizes vivendo numa nação pacífica sob uma “ditadura perfeita”.

Então, mesmo que haja problemas com a charia, que não podem ser desculpados por qualquer quantidade de concessões governamentais – e mesmo questionando a apatia dos bruneanos a respeito de viver sob uma ditadura – eu diria que as pessoas devem olhar para os outros fatores que fazem de Brunei o país que ele é, antes de ouvir o que mídia ocidental tem a dizer como se fosse a palavra do Senhor.