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Como namorar alguém com ansiedade

O primeiro passo é entender o que é esse transtorno que afeta milhões de jovens adultos pelo mundo.
AP
Traduzido por Ananda Pieratti
Crédito: Abbie Bernet

"Minha mente está sempre a cem por hora", disse meu paciente.

O caos da vida urbana — jornada de trabalho exaustiva, grana curta e longo percurso diário até o trabalho — estava o deixando exausto. Empregado no setor de tecnologia, ele se sentia pressionado a impressionar os outros engenheiros.

Quando me procurou, ele não conseguia dormir, mal estava se alimentando e seu rendimento no trabalho havia decaído. Ele temia estar ficando louco. No entanto, meu paciente estava sofrendo do transtorno psiquiátrico mais comum entre jovens adultos — a ansiedade.

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Esse fluxo incessante de preocupações afeta 25 milhões de pessoas todos os anos. Segundo a Associação Americana de Psicologia, a ansiedade é o transtorno mental mais comum — mais até do que a depressão. Seguindo essa ideia, um novo estudo mostra que os millenials apresentam mais sintomas de ansiedade e estresse do que membros da geração X, baby boomers e aposentados.

A ansiedade mina nossa sensação de segurança, despertando nossos instintos mais primitivos. Quando o sistema nervoso é sobrecarregado, surgem sintomas como fisgadas no peito, mãos suadas, respiração curta e dores no estômago. O desconforto físico causado pela ansiedade pode afetar nosso raciocínio. Pessoas ansiosas veem o mundo através de seus medos, enxergando perigos onde eles não existem. Para um ansioso crônico, a vida gira em torno de uma sequência assustadora de possibilidades.

"E se eu perder meu emprego?"; "e se meu cônjuge me largar?"; "e se meu comportamento irritar alguém?".

A ansiedade do meu paciente havia se tornado tão intensa que ele não conseguia mais encarar o mundo. Ele começou a se trancar em seu apartamento, ignorando mensagens de seus amigos e parente por dias a fio. Um dos seus medos era que seu comportamento pudesse afastar sua namorada. Embora ela tentasse ajudar, seus conselhos eram coisas como "vai caminhar, você vai se sentir melhor", ou "acho que conversar sobre isso está piorando as coisas", o que obviamente não ajudava muito.

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Muitas vezes, nossos entes queridos tem ideias deturpadas sobre o que é um transtorno mental. Uma pesquisa conduzida pela Kaiser Permanente revelou que 75% dos americanos acreditam saber o suficiente sobre transtornos mentais. No entanto, quase 50% dos millennials acreditam que é possível melhorar de um transtorno mental sem ajuda profissional e 60% dos entrevistados afirmaram que a depressão é um sinal de fraqueza.

Um transtorno mental não é uma falha moral, mas sim um problema de saúde que requer um tratamento psiquiátrico. Como a maioria das pessoas não sabe muito sobre saúde mental, namorar alguém com ansiedade pode ser um caos, cheio de desentendimentos e brigas frustrantes. Em muitos dos casos, ainda que os cônjuges queiram ajudar, eles não sabem o que dizer ou fazer por alguém que está passando por uma crise de ansiedade. Embora seja improvável que você consiga "curar" os problemas do seu cônjuge, saber mais sobre transtornos de ansiedade e como eles afetam relações românticas pode ser extremamente proveitoso.

Leia mais sobre ansiedade.

Em nossa sociedade, a desinformação e os mitos sobre transtornos mentais são onipresentes. No entanto, aprender a identificar os sinais e sintomas dos transtornos de ansiedade pode desmentir esses mitos, o que por sua vez ajuda a derrubar o estigma que cerca as questões relacionadas à saúde mental.

A Associação Americana de Ansiedade e Depressão oferece uma descrição detalhada de diversos transtornos de ansiedade, entre eles o transtorno de ansiedade generalizada, a síndrome do pânico, fobias e a ansiedade social. Resumindo, pessoas com transtorno de ansiedade generalizada (como o meu ex-paciente) se preocupam com tudo, indivíduos com fobias têm medo de coisas específicas (como elevadores ou aviões) e aqueles que sofrem de ansiedade social têm medo de interagir com colegas de trabalho e amigos, especialmente em grandes eventos sociais. Alguns desses comportamentos podem parecer irracionais ou bobos para alguém que não sofre de ansiedade, mas seja paciente; afinal, todos temos nossos problemas.

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Pesquisar sobre esses transtornos pode te ajudar a compreender os problemas do seu parceiro, permitindo que você separe fatos de mitos. Um exemplo: muitas pessoas acreditam que técnicas de distração — como bater um elástico no pulso da pessoa em crise — pode ajudar a controlar pensamentos obsessivos, mas essa prática pode piorar alguns quadros de ansiedade. Embora você possa se sentir tentado a distrair seu amado, conversar pode ser mais vantajoso. Pessoas que sofrem de ansiedade muitas vezes sentem vergonha da doença. Deixar claro que você não tem medo de discutir a dor de seu parceiro pode ser uma forma de ajudar no tratamento dele.

Saiba que a ansiedade afeta relacionamentos de uma forma única

"Em relacionamentos amorosos, tudo é agravado", diz Hilary Jacobs-Hendel, uma psicoterapeuta de Nova York. "Por causa do vínculo emocional existente nos relacionamentos amorosos, nós estamos mais propensos a repetir certos padrões de comportamento", diz ela. A ansiedade também pode prejudicar a capacidade de verbalizar nossos sentimentos, nos levando a nos afastar de nossos entes queridos. Hendel afirma que cônjuges muitas vezes confundem essa retração com abandono, o que pode desencadear sentimentos de insegurança, deslocamento e confusão.

Ela diz que cônjuges podem romper esse ciclo conversando de forma sincera e fazendo afirmações na primeira pessoa, estimulando assim um diálogo honesto. Por exemplo, caso você note que seu parceiro se isola quando ele está ansioso, você pode dizer que "eu notei que você anda preocupado e acho que você precisa de um pouco de espaço. Você acha que isso ia te ajudar?" Perguntar como você pode ajudar sem impor certos tipos de apoio também é recomendado.

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Converse, não mande mensagens.

Nessa época de Whatsapp e DMs, nós muitas vezes trocamos o contato direto pela comunicação digital. Pessoas ansiosas muitas vezes preferem esse tipo de comunicação porque ela ameniza a ansiedade social. No entanto, Hendel diz que existe uma linha tênue entre ajuda e covardia. Assim, depender da tecnologia para facilitar diálogos pode reforçar comportamentos negativos, piorando, no fim, a ansiedade do seu amado.

Além disso, não é possível sentir ou transmitir o tom da fala oral por mensagem, então tente controlar o impulso de resolver tudo por mensagem. Quando um conflito surgir, você pode, por exemplo, conversar com seu companheiro pelo telefone ao invés de tentar transmitir seus sentimentos pelo Whatsapp. "O contato direto possibilita uma comunicação interpessoal mais rica, que inclui o contato visual, o tom de voz e as expressões faciais. Esses detalhes se perdem nas mensagens, mesmo quando usamos emojis para nos expressar", diz ela.

Pratiquem alguma forma de mindfulness juntos.

Estudos mostram que o yoga e a prática do mindfulness podem controlar os sintomas da ansiedade, fortalecendo a conexão entre corpo e mente. Fazer uma aula de yoga ou meditação juntos pode ser uma boa forma de acalmar os ânimos (as técnicas de respiração usadas em ambos são surpreendentemente eficazes), além de criar um vínculo que não passa pela comunicação verbal, que pode ser prejudicada quando se está no meio de um conflito.

"O yoga e o mindfulness aprofundam nossa consciência emocional e nos ajudam a sermos mais presentes", diz Melissa Whippo, professora de yoga e assistente social. "Pessoas com ansiedade costumam se sentir fora do controle. O mindfulness ensina a conviver com emoções negativas, o que pode ajudar esses indivíduos a se libertar do impulso de querer saber tudo". Embora "conviver" com emoções negativas pareça contraproducente, a técnica pode ajudar a criar ferramentas para processá-las e superá-las. No fim, meu paciente teve uma melhora significativa após começar a praticar o mindfulness e a fazer terapia.

A meditação lhe deu ferramentas para controlar os sintomas da ansiedade, enquanto a terapia lhe ofereceu uma oportunidade de explorar sua origem.

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