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Música

O Halloween não é só abóboras

Isto é rap verdadeiro, seja lá o que isso for.

A primeira e última vez que vi o Allen Halloween ao vivo, há precisamente um ano, na ZdB, ele cantou seis ou sete músicas, assomado por uma rouquidão quase brutal (sim, eu sei a que soa a voz dele mas nessa noite estava pior) e, no final, consta que levou a

dele a um bar desaconselhado a menores de dezoito onde estoirou o dinheiro todo do cachet. Rumores, mas que só beneficiam o mito Halloween, quiçá o melhor rapper de Portugal continental e das ilhas — e nem me venham com merdas sobre o Valete, que igualmente adoro, mas que não chega ao nível boss a que chega este grande de Odivelas. Um concerto dele não é um mero espectáculo rap, é uma experiência vertiginosa em que a cada rima tememos pelas nossas vidas, ainda para mais se formos betos brancos à procura do perigo que os nossos bairros suburbanos teimam em não manifestar. Ser assaltado e esfaqueado é a cena mais rock n' roll que ainda não me aconteceu. O rapper menos googlável do mundo? Meus ménes: o Allen Halloween editou o álbum português do ano passado para muito boa gente, betos ou não. E é das melhores coisas que este Portugal ainda não refeito de Salazar já teve: um tipo que versa com uma precisão notável, que te faz tremer todo ao subir a agonia interior de tom (NA NOITE DA LISAAAAAAAAAAAA) e que te diverte, acima de tudo diverte, com cada puta de cada dica que enfia a toque de butterfly (os niggas de hoje ainda usam butterflies, ou estarei parado em 2001?) em cada qual das malhas que põe cá para fora. Talvez o único tipo neste país — ou no mundo inteiro — com a capacidade para debitar algo como mic meu, mic meu, há alguém que rime mais do que eu? Não, Halloween, Shakur já morreu e estar absolutamente pleno de razão. Não há. Nem que te peles todo à procura do novo disco do Kendrick Lamar ou do puto Tyler ou do cinturão de bombas em forma de mp3 que são os Death Grips. Isto é rap verdadeiro, seja lá o que for essa merda, pleno de significado, gigante que devora tudo à sua passagem. O Sam the Kid quer ser a Dulce Pontes? O Halloween quer ser o Jeffrey Dahmer, o estrangulador de Boston, o Breivik da rima acelerada. Que se foda a internacionalização quando o mundo é menor que um bairro em Santo António. Ya, imaginem um holograma do Halloween. Já está? Boa, estão mortos. Amanhã, no São Jorge, inserido no Misty Fest, a bruxa será mais forte do que qualquer público, venha de que estirpe social vier. Atreve-te a invadir o palco e acabas morto. Fica sentado na cadeira quietinho como um menino educado e ele fode-te a espinha. O melhor será mesmo não aparecer, mas aí perderias a melhor experiência da tua vida: testemunhar, ao vivo e a cores, a pujança de malhas como a “Não Há Luz No Meu Quarto”, a “Killa Me”, a “Fly Nigga Fly” ou até a mui chorosa “Crazy” (já tentei papar uma miúda à custa desta, infelizmente não resultou, mas se calhar até foi melhor assim). Contribui com os teus quinze euros, leva umas boas doses de wella e, quem sabe, pode ser que acabes no estúdio dele, a falar completamente tranquilo, e a gravar teclados para uma malha ainda não editada como sucedeu a um puto fixe/cantautor da nossa praça. E já poderias dizer que viste o melhor gajo do hip-hop tuga em acção antes de voltares às merdas indie que de certeza ouves. Quanto a mim, não poderei lá estar porque, infelizmente, os comboios não andam para trás e eu moro demasiado longe para ver concertos que começam tão tarde. Mas é provável que, depois da noite de Halloween de 2011, não sobrevivesse para contar a história.