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Entrevista

Anya Taylor-Joy é a nova estrela do terror

Falamos com a atriz de 20 anos sobre empatia, chorar nas filmagens e trabalhar com M. Night Shyamalan em seu novo thriller, 'Fragmentado'.

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE US

"Eu não tenho pele", diz Anya Taylor-Joy, apertando um travesseiro gigante contra o peito. "Posso entrar numa sala e sentir a energia de todo mundo lá, e a absorvo — não consigo evitar." A atriz de 20 anos está explicando como a empatia ajuda em seu trabalho. "Sinto algo muito intenso e essa intensidade de emoções é uma benção e uma maldição." Digo a ela que sempre me senti assim também. Ela faz que sim com a cabeça e diz "você também é sensitiva".

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Por sensitiva ela quer dizer o termo new age para pessoas supersensíveis que sentem os sentimentos dos outros — emoções, dor, pensamentos — como se fossem seus. Acredite ou não, como o público e os diretores estão rapidamente percebendo, Anya é uma ótima atriz — e ela não estudou na RADA ou com Sylvia Young. Então seja lá em qual intuição ela esteja se baseando para criar um personagem, isso funciona.

"Quando era criança, eu sempre chegava para minha mãe e dizia 'por que sou diferente? Por que me sinto assim? Por que vejo flores e começo a chorar?' Ela sempre era carinhosa comigo porque isso realmente me assustava quando era criança. As pessoas veem sensibilidade como uma fraqueza, não uma força. Não gosto dessa interpretação porque isso quer dizer que você é mais chorona e suscetível às coisas? Sim. Mas vejo isso como algo bonito."

Há uma ligação aqui com as personagens que ela escolheu interpretar até agora. Thomasin em A Bruxa, Morgan em Morgan; e Casey no novo filme Fragmentado: todas são delicadas, mas calejadas pela necessidade, por não serem compreendidas por forças exteriores. O rosto de Anya tem uma qualidade ilegível, mas sempre há emoções borbulhando sob a superfície — uma qualidade que faz as pessoas se importarem imensamente com suas personagens.

Stil de 'Fragmentado'.

Nos envolvemos em parte porque ela se importa com suas personagens também. "É um amor feroz", ela me diz. "É quase uma preocupação porque sei que elas não são tecnicamente pessoas de verdade, mas elas são reais pra mim. Às vezes acho difícil me defender, mas é muito fácil defender meus amigos. E agora, você não venha mexer com as minhas personagens. Vou protegê-las ferozmente."

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Anya é a mais nova de seis irmãos, todos muito mais velhos que ela — adultos quando ela era criança. Seu pai meio escocês, meio argentino, era campeão de corrida de barcos a motor. Sua mãe é psicóloga, com uma "personalidade Stevie Nicks, artística com um grande coração". Passando tanto tempo cercada de adultos, ela tinha a mesma confiança que eles. Aos 16, ela disse aos pais que podia ficar sozinha na casa da família em Londres para que eles pudessem sair numa demorada lua de mel tardia. Dali em diante, continuou morando sozinha, e logo depois escreveu uma carta aos pais ("na verdade era mais um ensaio, com introdução, conclusão e tudo mais") sobre por que ela estava largando a escola para se tornar atriz. Os dias então consistiam em aprender coisas sozinha em casa por diversão e trabalhar como modelo.

Ela estourou mesmo depois de uma sessão de fotos para a LOVE Magazine com o elenco de Downton Abbey. Ela estava inocentemente lendo Semus Heaney para o ator irlandês Allan Leech; impressionado, ele passou seu agente para ela. Quando leu o roteiro de A Bruxa, ela diz que sentiu como se estivesse tendo um ataque de pânico. "Eu nunca tinha experimentado essa sensação antes. Agora, lembrando disso, sei que esse é o sentimento que tenho quando um roteiro é ideal para mim", ela diz. "Aí eu entrei na sala para conhecer o Rob [Eggers, o diretor], e disse 'não consigo lembrar as falas, não trabalhei no sotaque e estou tendo meio que um ataque de pânico — você ainda quer que eu leia?'"

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Still de 'A Bruxa'

A Bruxa (2015) é um conto sobre uma família de 1630 da Nova Inglaterra ameaçada por bruxaria. A ação acontece no inverno, durante o qual a família está perto de morrer de fome. O orçamento relativamente pequeno e o fato de que Eggers queria filmar tudo em luz natural significou que Anya teve que pegar pesado em seu primeiro filme. "O verão estava chegando e em certo momento a gente teve que arrancar os brotos das árvores, tipo 'Caralho! Isso aqui tinha que ser um lugar desolado!' E eu não conhecia nada diferente. Agora, tendo feito outros filmes, fico pensando '[ A Bruxa] foi extenuante!' Estávamos lutando contra tudo. Os elementos, o dinheiro, o tempo, o tipo de épico que Rob estava fazendo."

Morgan (2016) foi igualmente desafiador, mas de maneiras diferentes: "Eu estava naquela sala do outro lado de um vidro à prova de som, vendo todo mundo e estando completamente desconectada deles. Foi difícil — me senti realmente solitária e isolada. Preciso de afeição para sobreviver, preciso muito".

Foi através das tomadas muito próximas do rosto de Thomasin, que parecem formar a maior parte de A Bruxa, que Anya se tornou "uma atriz para acompanhar". Mas ela era desconhecida para M. Night Shyamalan antes de ele a escolher como a protagonista de Fragmentado, seu novo terror psicológico. Ela interpreta uma adolescente desajustada que é sequestrada, junto com duas outras garotas, pelo personagem de James McAvoy, Kevin, que tem Transtorno Dissociativo de Identidade. Surgiram questões compreensíveis sobre o realismo e a simpatia do retrato dessa doença mental no filme, mas é impossível negar que as interpretações são impressionantes.

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Num diálogo entre Shyamalan e Anya para a Interview, o diretor e roteirista disse a ela: "Eu podia gravar uma tomada atrás da outra, e você parecia ter uma piscina infinita de emoção. Isso é muito incomum. Você é como um nervo exposto". Ela faz que sim com a cabeça quando pergunto se ela concorda com essa análise. "Night foi a primeira pessoa que me conscientizou sobre a arte. Sou tão instintiva que vou lá e simplesmente faço. Mas agora sei que há um poço, e quando atinjo esse poço, não vou parar de chorar. Isso deixa as pessoas muito desconfortáveis, porque não tem nada que os homens tenham mais medo do que uma mulher chorando."

Stil de 'Fragmentado'.

"A primeira vez que isso aconteceu foi em A Bruxa, na cena na qual eu lutava com minha mãe no chão. No meu filme mais recente, teve um dia que chorei por umas nove horas. Foi muito intenso. Me senti mais leve no final; sempre sinto como se tivesse liberado alguma coisa, então posso ir para cama e relaxar."

O trabalho emocional não acaba quando o filme é encerrado. "Thomasin partiu meu coração, porque terminamos de filmar, eu fui para Nova York e fiquei muito deprimida — eu não conseguia entender", diz Anya. "Eu estava tentando achar algum sentido, pensando 'não é por causa do pessoal, vou almoçar com eles daqui uma hora'. Era porque eu sentia falta dela. Ela foi arrancada de mim. Eu me sentia, tipo: a perdi e nunca mais vou tê-la de volta. Isso está cada vez mais fácil com os outros personagens, porque a primeira vez é sempre a mais difícil."

Antes de me abraçar e acenar dando tchau, ela me diz que guarda as ligas e laços de Thomasin na mochila para dar sorte. Ela fica com um item do figurino de cada personagem que interpreta. De Fragmentado ela levou o sutiã, mas deixou suas próprias joias, que no final pareciam mais da Casey que dela. "Vejo tudo isso como esses espíritos que não têm um corpo e confiaram em mim para contar suas histórias. Tenho que contar essas histórias do jeito certo."

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Tradução: Marina Schnoor 

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