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Karllana e João: a Prisão de um Casal Acusado de Tráfico de Drogas em Belém do Pará

Depois de cinco dias na cadeia, o casal foi solto a pedido da justiça, que trancou o inquérito justificando "ilegalidade da prisão e da operação policial".

Arte publicada por amigos de Karllana e João, acusados de tráfico de drogas, detidos e posteriormente soltos pela justiça em decorrência de "ilegalidade da prisão e da operação policial". Créditos: Layse Almada / Reprodução / Facebook

Na semana passada, uma notícia chocou os frequentadores do 8 Bar Bistrô, em Belém, no Estado do Pará: seus donos foram presos acusados de tráfico de drogas. Na manhã de quinta-feira (25), a brasileira Karllana Cordovil de Carvalho e seu marido, o português João Pedro Sousa Paupério, foram levados ainda de pijama até a delegacia depois de a Polícia Civil supostamente ter encontrado 44 papelotes de cocaína na residência do casal, que fica na parte de cima do bar.

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Indignados, amigos e frequentadores fizeram uma página no Facebook e passaram parte do dia de ontem (29) em frente ao Fórum Criminal da Capital, onde um juiz analisou o pedido de relaxamento de prisão e decidiu pela soltura dos dois. De acordo com a decisão judicial publicada na página, o trancamento do inquérito policial se deu em decorrência da "ilegalidade da prisão e da operação policial".

Amigos e advogados do casal em frente ao Fórum Criminal da Capital ontem (29), em Belém, onde um juiz julgava o pedido de relaxamento de prisão. Foto: Henrique Montagne.

Por e-mail, a Polícia Civil do Estado do Pará informa que a operação foi realizada por quatro investigadores depois do recebimento de denúncias anônimas informando que haveria droga na casa dos proprietários. "O que foi confirmado durante averiguação feita no imóvel," relata a assessoria de imprensa.

Advogado e amigo do casal, Stephano Houat alega que o Bar 8 sofre perseguição por nunca ter pagado propina a policiais militares e que o flagrante pode ter sido forjado. "Aqui, em Belém, é comum a polícia passar pelos bares e restaurantes cobrando propina – que eles chamam de 'ajuda'. O bar nunca colaborou, nunca deu dinheiro algum porque sempre foi legalizado, com alvará", disse por telefone.

João Pedro e Karllana. Foto: Reprodução: Facebook

De acordo com o advogado, a proprietária Karllana chegou a formalizar diversas denúncias toda vez que, supostamente, policiais pediam propina. "Ela anotava o nome do policial e, no dia seguinte, ia até a corregedoria registrar. [É] por isso que nós imaginamos que isso seja uma retaliação, uma forma de vingança."

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Sobre as denúncias, a Corregedoria da Polícia Civil do Pará informa que "nada consta" em seu sistema, mas os advogados afirmam possuir os comprovantes necessários, que foram anexados ao pedido de soltura e considerados pelo juiz.

Stephano explica que a visita da polícia era constante, sempre sob a alegação de haver denúncias contra o bar. "Eles entravam e não encontravam droga. [Diziam haver] denúncias de que o som estava alto. Entravam, faziam a medição e o som não estava alto", conta.

A Polícia Civil informa que "os supostos atritos a que essas pessoas se referem foram com policiais militares". Stephano confirma a informação, dizendo que os policiais que supostamente pediam propina estavam sempre fardados.

Num dos perfis mantidos pela casa no Facebook, é possível ver posts de 2013 relatando as tais visitas. Em uma publicação de outubro de 2013, o casal diz temer o pior: "Estamos com medo deles [policiais] implantarem drogas aqui para nos culpar de qualquer coisa. Muitos sabem que isso é muito comum e que já fizeram várias vezes por aí". O advogado é taxativo quando perguntado sobre entorpecentes: "Eles não usam droga alguma. Não usam e não vendem".

Segundo o documento postado na página "Libertem Karllana e João", o juiz que concedeu a soltura do casal atestou que "não é comum que um traficante de droga se exponha voluntariamente diante da polícia, inclusive recorrendo ao órgão correcional da mesma, como fizeram [sic] o casal de presos". Outra atitude que colaborou para a decisão de relaxamento de prisão, de acordo com a postagem, foi o depoimento dos próprios policiais, que aparentemente prenderam João antes mesmo de encontrar a droga no local.

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Um terceiro fator decisivo foi o fato de os policias terem entrado na residência sem mandado judicial – o que, segundo a lei, até pode acontecer, mas somente quando outras provas já foram consolidadas, tal qual a infiltração de policiais no ambiente para a compra do entorpecentes, a visualização de viciados comprando drogas no local ou o cheiro de fumaça proveniente de drogas sendo consumidas.

Recorrente no mundo jurídico, a teoria dos "frutos da árvore envenenada" foi citada pelo juiz, segundo o mesmo post. "O ingresso ilegal no domicílio contaminou todas as provas do crime, não sobrando nada lícito para formar a justa causa até mesmo da ação penal."

Frequentador do bar e amigo do casal, Hugo Gomes do Nascimento publicou um texto falando que Karllana e João sempre cumpriram com "todas as mínimas regras chatas que o Estado impõe aos estabelecimentos comerciais". Isso acontecia quando o casal pedia "ora com mais, ora com menos veemência", que não fumassem maconha nem dentro, nem mesmo perto do estabelecimento.

O susto mobilizou amigos, que continuam postando mensagens de apoio na internet. "Precisamos continuar unidos para ajudá-los a manter o bar aberto", postaram. Para o advogado Stephano, tudo isso foi "uma injustiça enorme".

De certa maneira, o pesadelo continua para Karllana e João: nada poderá apagar os cinco dias na cadeia e, mesmo olhando para frente, será preciso estômago e força de vontade para continuar com o Bar 8 – que realmente parece incomodar muita gente.

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