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Fotos

O Mundo de Godlis: Fotos dos Primórdios do Punk Rock Depois do Pôr do Sol

Godlis capturou os primeiros shows de Blondie, Television, Ramones, Richard Hell and the Voidoids, Suicide, Talking Heads, Dead Boys, Patti Smith e outros mais na lendária incubadora CBGB.

Havia uns seis ou sete fotógrafos presentes no nascimento do punk, mas sempre vai existir apenas um Godlis. Isso mesmo: estamos falando de um fotógrafo punk que realmente se chama Godlis. Muitos dos outros profissionais que tiveram a sorte ou a inteligência de fotografar na Bowery no começo dos anos 70 favoreciam o foco nítido e brilhante, preferido pelos jornais de música da época, mas David Godlis, recém-chegado de Boston em 1976, começou a fotografar num estilo romântico e pictórico, usando longas exposições e a luz disponível. Inspirado nas cenas cheias de nuances da vida noturna de Paris nos anos 30 de seu herói Brassaï, Godlis capturou os primeiros shows de Blondie, Television, Ramones, Richard Hell and the Voidoids, Suicide, Talking Heads, Dead Boys, Patti Smith e outros mais na lendária incubadora CBGB.

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Apesar de objetivamente belo e inquestionavelmente único, o estilo de fotografia de Godlis foi considerável "impossível de imprimir" por editores de jornais e revistas da época. Por essa razão, nunca houve um livro abrangente de suas fotografias dos primórdios do punk apesar da enorme popularidade de seus temas hoje.

Conheci Godlis no ano passado através de Henry Horenstein, o fotógrafo veterano de Boston que capturou os últimos dias da antiga música country em sua série Honky Tonk. Henry sabia que, além de ser o editor fotográfico da VICE, eu também tenho uma publicação de fotógrafos emergentes chamada MATTE; então, ele sugeriu Godlis. Ele não sabia, mas parte da minha inspiração para a MATTE foi a seminal Punk magazine, de John Holmstrom e Legs McNeil, a publicação DIY que deu o nome ao movimento. Godlis pensava em publicar um livro há anos; então, concordei em me juntar ao projeto. Decidimos que o financiamento coletivo era a única maneira de fazer isso acontecer: nas 48 primeiras horas, levantamos mais de US$ 20 mil no Kickstarter para o primeiro livro da MATTE Editions provisoriamente batizado de History Is Made at Night. Conversei com Godlis sobre a mistura de destino e intuição que possibilitou essas fotos históricas.

VICE: Depois de quase quatro décadas, vimos uma resposta incrível para a transformação dessas fotos em livro.
Godlis: Estou meio chocado, para dizer a verdade. Eu estava preparado para um nada.

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Para ajudar a espalhar a notícia, você falou com várias pessoas que estão nas fotos: gente da cena punk da época.
Desde que entrei no Facebook e me acostumei com o que podia fazer lá, comecei a perceber que isso era como voltar a sair com as pessoas que eu encontrava no CBGB – só que todo mundo estava em casa, online, falando um com o outro. Descobri onde todos meus amigos daquela época estão agora. Eles notam as fotos que posto e eu valorizo seu feedback. Foram essas pessoas que abordei, e elas toparam de cara.

Algumas das histórias que vão acompanhar as fotos do livro vão vir dessas pessoas também, certo?
Toda vez que posto uma foto, as pessoas lembram de coisas sobre aquela imagem que eu nem me lembrava mais. Na foto da Patti Smith, por exemplo, ficamos debatendo quem era a pessoa no fundo, no lado esquerdo da foto. As pessoas têm histórias ótimas, e vamos misturar isso.

Esse é seu primeiro livro, certo?
É. Participei de muitos outros livros e documentários, mas nunca tive meu livro solo, digamos assim. E o plano sempre foi fazer um livro para isso. Era o jeito como eu fotografava. Mas o tempo foi passando e as coisas pareceram se alinhar perfeitamente dessa maneira: para [se] usar financiamento coletivo para fazer o livro. Era exatamente o que estávamos fazendo no CBGB naquela época. É faça-você-mesmo. Essa é uma maneira DIY de montar um livro sobre uma cena que era muito DIY. Então, acho que era assim mesmo que as coisas deviam acontecer. Parece que tudo se encaixou perfeitamente.

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Você estava tentando fotografar como o fotógrafo francês Brassaï, certo?
A última edição de The Secret Paris of the 30s dele tinha saído em 1976, e fiquei encantado com aquilo. Eu frequentava o CBGB na mesma época, e as duas coisas se misturaram. Então, fiz fotos noturnas de rua na Bowery.

Você usava longa exposição, por isso algumas pessoas chamam suas fotos de borradas.
Bom, eu não estava usando flash. As pessoas estavam acostumadas com fotos brilhantes tiradas com flash, se isso era uma foto da cena rock. Às vezes, quando eu tirava uma foto de alguém, a pessoa dizia: "Ei, seu flash não disparou". Alguns fotógrafos de arte estavam fazendo coisas como eu, mas fotógrafos de música, não. Então, sempre que eu tentava publicar alguma coisa, os editores diziam: "Não vai dar para imprimir isso". Algumas das minhas fotos foram impressas na New Musical Express, na Inglaterra, e ficaram ótimas. Mas, principalmente editores de Nova York para quem levei meu trabalho, recusaram. Ninguém ligava para o punk quando eu estava fotografando isso nos EUA. Foi só um ano depois, quando os Sex Pistols estouraram, que a coisa mudou. Só depois dos Sex Pistols, as pessoas começaram a prestar atenção.

Jim Jarmusch está escrevendo o prefácio do livro.
Sim, o Jim é um velho amigo – e um tema. Tenho uma foto ótima dele em frente ao CBGB. Nos conhecemos quando ele era estudante de cinema na NYU. Compartilhamos um tema, Christopher Parker, que estava no primeiro filme dele, Permanent Vacation. Ele é exatamente a pessoa que eu sempre quis que escrevesse o prefácio do livro, porque ele conhecia a cena.

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Como você acabou nessa cena?
Vi um anúncio tosco em preto e branco na contracapa da Village Voice com nomes estranhos de banda. Que tipo de banda se chama Television? Eu tinha visto algumas edições da Punk magazine com fotos do que estava acontecendo no CBGB. Assim que entrei, ouvi Television e imediatamente pensei: "OK, todo mundo aqui tem o mesmo disco do Velvet Underground que eu". E as pessoas eram divertidas. O punk não era considerado uma ameaça ainda. Isso até os Sex Pistols. A coisa dos alfinetes ainda não tinha acontecido. Tínhamos 25, 26 anos, e não havia muito espaço para entrar no negócio do rock 'n' roll; então, tivemos de encontrar um lugar onde pudéssemos abrir espaço e criar uma cena. Foi o que as pessoas fizeram ali.

Faça-você-mesmo.
Se você não conseguia um contrato com uma gravadora, lance seu próprio disco. Comece a colocar cartazes. Toque num lugar onde ninguém está disposto a tocar na Bowery. Vi os Ramones e estava tudo acabado. OK, esse é o meu lugar. Blondie? Não preciso nem pensar!

Não havia como definir isso, todo mundo era diferente. "Punk" veio com a Punk magazine, esse fanzine que colocava seus selos por aí. O nome parecia certo para o que todo mundo estava fazendo.

É, isso também era DIY. Eram só três caras de Connecticut que começaram uma revista, porque queriam andar jutos.
John Holmstrom era um cartunista genial que estudou com Harvey Kurtzman, que fez a revista Mad. Todo mundo amava a Mad. Foi o primeiro lugar em que percebemos que os adultos também podiam ser bobos. Ele criava histórias sobre todo mundo da cena.

Essa é uma época e um lugar altamente que são romantizados pelas gerações mais jovens. Como o jeito que as pessoas veem essas fotos mudou?
Bom, a música segue em frente. E, nos anos 80, essas fotos pareciam notícia velha. Aí, quando o Nirvana apareceu, as pessoas começaram a me ligar pedindo fotos. Foi esse som que influenciou gente como Kurt Cobain; então, isso se tornou história da música. Em certa extensão, as fotos foram tiradas para o futuro. Um fotógrafo sabe que é um documentarista além de um artista. Você está tentando capturar um período de tempo para que, quando as pessoas se voltarem para isso, elas tenham essas fotos para ver.

Godlis é um fotógrafo e uma instituição de Nova York. Siga-o no Instagram.

Apoie Godlis no Kickstarter e encomende o livro aqui.