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O novo acesso de raiva do Robert Mugabe

Ainda está tudo por decidir no Zimbabué.

O Zimbabué está prestes a realizar a sua primeira eleição presidencial desde que

a nova constituição

foi aprovada. Este documento introduz ideais como a igualdade e a liberdade de expressão, aquilo que os zimbabuanos queriam — até perceberem que o Robert Mugabe não passa de um líder violento e mãos largas. Esbanjador para o que lhe convém, entenda-se. Convenhamos que estas qualidades não ficam muito bem num líder que governa um país onde

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três quartos da população

vive no limiar da pobreza.

Através das reformas que se estabeleceram, os líderes do Zimbabué só poderão, a partir de agora, permanecer na presidência durante dois mandatos de cinco anos. Já não é por tempo indefinido que se divertem a massacrar a população. Estas cláusulas, no entanto, não têm efeitos retroactivos. Isto quer dizer que Mugabe pode concorrer outra vez e que os zimbabuanos estão a viver uma nova onda de medo. É difícil esquecer o que aconteceu nas últimas eleições deste país supostamente democrático.

Foi em 2008, quando Mugabe perdeu as eleições e viu-se obrigado a entrar numa segunda volta eleitoral com o oponente Morgan Tsvangirai, do MDC-T. Tal como se sabe, o presidente do Zimbabué não é um homem que aceite a derrota facilmente. Como consequência do mau comportamento dos seus súbditos, deu ordem ao seu partido, ZANU-PF, para “reeducar” a população através de

torturas

,

assassinatos

e

violações

. Tsvangirai percebeu logo que

era melhor desistir

, antes que sofresse na pele um tratamento semelhante ao do massacre de Gukurahundi. Esta atitude deixou Mugabe livre para um “pequeníssimo” mandato de 26 anos. A falta de apoio, contudo, tornou-se tão evidente que, passados alguns meses, Tsvangirai foi convidado a assinar um

acordo para a partilha de poder

.

Numa entrevista recente dada ao programa

HARDtalk

 da

BBC

, o ministro da justiça do Zimbabué deixou bem claro que, enquanto oficial do ZANU-PF, não iria deixar que Tsvangirai vencesse as eleições. Alegações que deixaram toda a gente nervosa. Para descobrir o que está mesmo a acontecer, quis falar com as pessoas da campanha

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Eleições Livres e Justas do Zimbabué

(ELJZ).

APREENSÃO DE RÁDIOS

O ZANU-PF tem invadido, de madrugada, pequenas aldeias ao mesmo tempo e

confiscado os rádios

. Os aparelhos foram distribuídos por algumas organizações de direitos humanos para que as “comunidades rurais estivessem a par do que está acontecer no país”, disse-me o Barry. “O ZANU-PF tem consciência do que está a acontecer, por isso é que faz o que faz.” O partido justificou-se, primeiro, com os discursos de ódio transmitidos pelas estações. Depois acabou por mudar de ideias e declarou que os rádios tinham sido trazidos ilegalmente como carga diplomática. Uma desculpa bem melhor: agora podem apreender material de organizações de direitos humanos por envio ilegal de rádios.

A pior parte disto é que usam

as crianças

para chegar aos donos dos rádios e “apagá-los”. O Barry contou-me: “Não posso dizer com toda a minha certeza que essas afirmações são verdadeiras, mas isso não me surpreenderia. O ZANU-PF já explorou crianças no passado e provavelmente fará isso outra vez. As milícias infanto-juvenis tiveram sempre um papel central nas tácticas de intimidação do ZANU. Muitas dessas crianças vêm de áreas rurais fechadas ao exterior, sem terem acesso a qualquer tipo de informação, e acabam por sofrer uma autêntica lavagem cerebral que as faz crer que a política começa e acaba no ZANU-PF.”

REUNIÕES OBRIGATÓRIAS NOCTURNAS

Por todo o Zimbabué, as pessoas são obrigadas a comparecer em

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reuniões nocturnas

pela juventude pró-Mugabe. O Barry esclareceu-me: “O ZANU-PF não tem o apoio da maioria da população, então o partido recorre a estas tácticas.” Nas reuniões, as pessoas acabam por ser partidárias do ZANU-PF. Quem não comparece é marcado como possível “opositor” do regime de Mugabe — tradicionalmente, os oponentes do regime não têm uma vida muito fácil no Zimbabué.

Zimbabuano torturado.

O Barry confessou-me de que “há rumores de que o ZANU-PF vai usar propaganda psicológica.” Em vez de recorrer à violência, tal como o fez em 2008, o partido vai lembrar de forma subliminar o que aconteceu na época. Mas a violência já começou. As milícias já estão mobilizadas para ganhar votos através do medo. O ataque mais difundido provocou a morte de

Christpower Maisiri, de 12 anos

, filho de um aspirante a candidato do MDC-T, que foi queimado vivo na cabana onde vivia no final do mês de Fevereiro.

“Não é a primeira vez que uma criança morre por causa da política”, contou-me o Barry. “Certas pessoas, quando recorrem à violência, não sabem estabelecer as fronteiras e não vêem nenhum problema ferir mulheres e crianças.”

São inúmeras as pessoas

politicamente influentes

que já foram presas no Zimbabué, apenas para “mandar uma mensagem para o resto do país”. Os assessores de Tsvangirai foram presos recentemente e, quando a advogada de direitos humanos, Beatrice Mtetwa, veio ajudar, também ela foi detida. “A Beatrice é uma das figuras mais inspiradoras do país e a sua prisão chocou toda a população. O que acaba por ser impressionante, uma vez que já estamos habituados à injustiça depois de quase 35 anos a viver sob o comando de Mugabe.”

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CONFUSÃO ELEITORAL

Ninguém tem nenhuma pista de quando a eleição acontecerá. Mugabe quer que aconteçam o mais rápido possível, mas o MDC-T quer mais tempo para a organização. Eles querem trazer mais observadores depois do ZANU-PF ter banido

os monitores da União Europeia e dos Estados Unidos

por imporem sanções “injustas”. O Barry explicou-me: “Quanto mais tempo tivermos para trazer observadores, maior é a possibilidade de uma eleição justa. Se realmente for livre e justa, pelo menos até certo ponto, temos a certeza de que o ZANU-PF não terá hipóteses de voltar ao poder.”

Mas mesmo quando chegarem a um acordo, (se realmente acontecer), a nova constituição ainda precisa de passar pelo parlamento. O Zimbábue também anunciou, recentemente, um saldo bancário inacreditável. Uns

míseros 217 dólares

. O que levou o

Ministro das Finanças a admitir

que não sabe como o governo poderá financiar as eleições. Isso ainda permanece um mistério.

O Barry acha que a China vai interferir: “Os órgãos de comunicação social têm a informação de que os chineses vão financiar grande parte do acto eleitoral. Isso é preocupante. Todos sabem que muitas companhias chinesas

têm sustentado o regime de Mugab

e

em troca da exploração das ricas reservas de diamantes e de ouro do país. Se a China ajudar a financiar a eleição, o Mugabe terá o país na mão outra vez.”

Sendo assim, há alguma hipótese do Tsvangirai vencer? O Barry disse-me que, na verdade, essa hipótese existe: “Esta é a primeira eleição que temos desde a chamada Primavera Árabe. Mesmo com o fantasma da violência por perto, é impossível que aconteça algo semelhante a 2008. Todos temos consciência de que o ZANU-PF não vai cair sem lutar. No entanto, achamos que as tácticas de intimidação usadas pelo partido no passado simplesmente não resultarão tão bem. Não só as pessoas estão fartas do actual regime, como agora podem comunicar umas com as outras e informar o resto do mundo sobre a violência que enfrentam. O ano de 2013 é a melhor oportunidade até agora para se ter uma eleição livre e justa no Zimbabué. A intimidação está a esgotar as suas forças. As pessoas não aguentam mais violência. O ZANU-PF não tem o apoio do povo e só continua no poder porque controla o exército e a polícia. Mas, eventualmente, até essas forças se voltarão contra o partido e dirão: 'Chega!’ Não podemos continuar a ferir cidadãos inocentes para seu proveito político'. Essa mudança vai acontecer em 2013”.

Espero que ele esteja certo.