FYI.

This story is over 5 years old.

Noisey

O Lucas Estrela apresenta a guitarrada do futuro em seu novo disco 'Farol'

No segundo álbum, financiado pelo Natura Musical, o paraense de 25 anos mistura synthpop, post-rock e um tiquinho assim de carimbó.
Foto: Luan Rodrigues

Com a importante função de manter o legado de constante evolução e quebra de paradigmas da música paraense, o guitarrista Lucas Estrela lança seu segundo álbum, Farol, que você ouve com exclusividade no Noisey. Influenciado diretamente por mestres da guitarrada, que moldaram sua persona musical e são símbolos da rica cena cultural do estado do Norte do país, Estrela traz em seu novo trabalho uma nova ressignificação do gênero, incorporando em suas canções elementos do synthpop dos anos 1980 e até do post-rock, influenciado pelo grupo norte-americano Tortoise, uma das bandas prediletas do artista.

Publicidade

Ouça o álbum completo na playlist abaixo:

A guitarrada é tema constante nas conversas com Estrela. Exímio conhecedor do gênero e das figuras que o construíram, o músico mostra habilidade ao traçar um paralelo entre seu som e o que vem sendo feito nos últimos anos, além de listar um sem fim de importantes artistas paraenses de gerações distintas, que ajudaram a construir a identidade musical de seu estado nas últimas décadas. "Mestre Vieira tem um estilo muito próprio. Quando a gente ouve, dá pra sacar na hora que é ele. Assim como o Manoel Cordeiro tem um jeito de tocar, o Felipe (Cordeiro, filho de Manoel) tem outro, o Félix Robatto, Lia Sophia, Renata Beckmann, Pio Lobato e muitos outros."

Farol marca um novo momento na carreira do jovem de 25 anos. Rodeado de importantes nomes da música paraense na concepção do novo trabalho — Felipe Cordeiro, outro importante nome deste processo de renovação da guitarrada nascido nos últimos anos no Pará, assina a direção artística do disco —, Estrela ainda conta com parcerias com outros músicos de renome. Lucas Santtana, por exemplo, empresta sua voz para "A Sereia", única faixa cantada do disco.

Lucas Estrela conversou com o Noisey sobre Farol e algumas outras coisas. Das tardes de videogame que fizeram ele conhecer Felipe Cordeiro a seu amor por Radiohead e outras bandas indies. A turnê do novo disco de Estrela começa dia 13 de outubro em Belém e chega em São Paulo dia 21 de outubro, com (animado) show no Mundo Pensante.

Publicidade

Noisey: Quais as maiores diferenças sonoras entre "Farol" e seu disco de estreia, "Sal Ou Moscou", lançado ano passado?
Lucas Estrela: O processo de produção do Farol foi muito diferente do Sal ou Moscou. Primeiro porque no Sal ou Moscou produzi e gravei quase tudo sozinho, no home studio, de maneira bem independente. Contei com o trabalho do Waldo Squash, ex-Gang do Eletro, nas bases, do Assis Figueiredo, que masterizou, e do Pio Lobato com uma música em parceria. Já no Farol, pelo Natura Musical, quis trazer todo mundo mais pra perto. Pessoas que me influenciaram ao longo desses anos. Amigos como Felipe e Manoel Cordeiro, Will Love, Lucas Santtana, Luê, Félix Robatto. Vejo esse disco como um trabalho coletivo, muita gente participou e esse disco também é deles. Cada um contribuiu da melhor forma pro trabalho.

Outra grande diferença foi o tempo de produção também. Passei uns dois anos trabalhando no primeiro álbum. No Farol, foram 3 meses de gravação no Casarão Floresta Sonora em Belém e no mês seguinte já tava mixado no Rootsans, em São Paulo.

Farol é um recorte preciso de qual momento da vida de Lucas Estrela?
É um recorte desse momento de modernização que a música paraense vem passando. O resgate da música tradicional que se mistura aos elementos mais experimentais. Toda essa energia que a música daqui carrega, sendo levada a outros lugares, outras linguagens, e isso reflete na nossa música. Diferentes paisagens sonoras.

Publicidade

Já vi declarações suas sobre a diferença entre o disco de estúdio e o seu show, de como é difícil reproduzir a energia das apresentações e da interação do público. Fale um pouco sobre isso.
Essa energia da música do Pará, toda essa estética, elementos visuais que a gente só encontra aqui, especialmente no tecnobrega, é algo muito difícil de transportar pra um álbum de estúdio. Por isso as performances ao vivo são muito importantes pra gente. É o momento em que a gente se conecta com o público e troca essa energia toda que circula no palco.

Você se sente pressionado por seguir caminho similar aos grandes mestres da guitarrada do Pará?
Uma coisa muito interessante é perceber o jeito que cada guitarra é tocada. Mestre Vieira tem um estilo muito próprio. Quando a gente ouve, dá pra sacar na hora que é ele. Assim como o Manoel Cordeiro tem um jeito de tocar, o Felipe tem outro, o Félix Robatto, Lia Sophia, Renata Beckmann, Pio Lobato e muitos outros. E isso, claro, reflete no processo de composição de cada instrumentista. Eu já vou pra esse lado mais eletrônico, buscando outras referências além da guitarrada, carimbó e brega. Uma coisa que me ajudou desde que comecei a estudar música foi ouvir muita coisa diferente, desde choro até música contemporânea. Sempre fui muito aberto musicalmente. Acho que isso fica mais evidente no segundo disco do que no primeiro.

Qual a importância da família Cordeiro — Manoel e Felipe — para a construção da sua identidade musical?
Eles são duas pessoas importantíssimas na construção não só da minha identidade musical mas da música do Pará. Primeiro que o Manoel é um dos maiores produtores musicais de lambada e brega de todos os tempos. Nos anos 1980/90 ele foi responsável pela sonoridade de vários discos. Fafá de Belém, Beto Barbosa, Roberta Miranda, Banda Warilou, Alípio Martins… A lista é bem longa. Como produtor musical, arranjador, músico participante, são mais de mil gravados. Minha amizade com Felipe começou jogando videogame. Eu tinha uns 15 anos e um belo dia a gente se conheceu jogando na casa de um amigo. Mas a gente só foi tocar junto muito tempo depois. E hoje tê-lo assinando a direção artística do meu novo disco é uma felicidade enorme. Viva o Combo Cordeiro.

Publicidade

Teu som tem influência grande do synthpop dos anos 1980. O que você ouve que extrapole o universo da música paraense?
Gosto muito de sintetizadores analógicos, inclusive me aventuro na construção de synths de vez em quando, naquele estilo bem gambiarra. Acho que é influência de um monte de coisa, não só da música, mas de todas essas máquinas que a gente usa pra fazer som. Isso é uma coisa muito rica que a música instrumental permite, a experimentação com alguns elementos não convencionais. É claro que pode — e deve — ser explorada em outros tipos de composição mas, na música instrumental, acredito que essa liberdade seja um pouco maior. Por exemplo, usamos um camburão de lixo como percussão em várias músicas. Ficou lindo tocado com vassourinha. Teve também um órgão Palmer muito antigo do Dan Bordallo que tem um timbre incrível mas falhava toda hora, tivemos que repetir várias vezes o take até ele funcionar. Valeu o esforço.

Fala aí uma banda que você gosta que as pessoas nem imaginam que seja uma influência no seu som.
Tortoise, sem dúvida, é uma das maiores influências. Foi a banda que fez eu me apaixonar pela música instrumental. Escuto muito até hoje. Mas também poderia citar Hamilton de Holanda, Radiohead, Ratatat, Hurtmold, Avishai Cohen…

Como você encara esse (não tão) recente interesse de certos núcleos culturais da região Sudeste na cultura do Norte do país, especialmente do Pará?
É muito bom quando nossa música consegue chegar até lugares mais distantes, porque o Norte do país sempre foi uma região mais esquecida. Mas vejo esse avanço como um processo natural, mesmo não sendo muito atual pois tem muita — mas muita mesmo! — coisa boa sendo produzida aqui no Pará há muito tempo e que falta ser mostrada pro resto do Brasil e pro mundo.

Farol sai nesta terça (29). Veja a tracklist:

01. Farol
02. Onde é Que Eu Vou Parar
03. Reflexões
04. Jaguar
05. Lambada Star
06. A Sereia (part. Lucas Santtana)
07. Búfalo
08. Florestinha
09. Na Corda
10. Você É Tudo Pra Mim