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Três policiais civis falam sobre os Crimes de Maio de 2006

Tensão, violência, união e desilusão com o Estado na visão de quem teve acesso à informações que destoam das versões oficiais sobre os ataques do PCC e os Crimes de Maio. Como isso influencia a segurança pública nos dias de hoje e o que será dela...
Foto: Apu Gomes

Há dez anos, São Paulo parou. Pânico na Zona Sul. Pânico em SP. Caos mental geral. Na noite de 12 de maio de 2006, sexta-feira, a maior organização criminosa da história do Brasil, o PCC, pôs em prática um ataque simultâneo a dezenas de alvos pela cidade e motins por cadeias em todo o estado. 59 agentes policiais foram mortos. A retaliação veio com força total, de farda ou capuz, e, nos dias seguintes, centenas de civis morreram por arma de fogo. Este bangue-bangue urbano moderno virou São Paulo do avesso, e, guardadas as devidas proporções, deixou uma marca profunda na psiquê coletiva da cidade, à lá 11 de setembro. Aproveitamos a ocasião de uma década dos Crimes de Maio para relembrar, com uma série de matérias em todos os nossos sites, a fatídica semana, um trauma social que até hoje tem imensa influência na sociedade paulista, das favelas ao Jardins, passando pelo Palácio dos Bandeirantes.

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Fazer um policial falar sobre os ataques do PCC e os Crimes de Maio de 2006 não é tarefa fácil, mesmo dez anos depois. Para encontrar os três que deram depoimento para esta reportagem, tive que negociar as condições para que cada um se sentisse confortável para conversar sobre o assunto. Dois deles, ainda na ativa, exigiram o anonimato.

Aquele que será identificado como Agente H. trabalhava na época na Divisão de Homicídios da Polícia Civil, mas hoje atua em outro setor. Ele me recebeu no próprio ambiente de trabalho e preferiu resguardar o nome para evitar rusgas internas. Já o Agente G. fazia parte do Grupo de Operações Especiais da Polícia Civil, e também continua na ativa e em outro departamento. Combinamos de nos encontrar na porta de um famoso bar de São Paulo; o Agente G. passou na minha frente e pediu para que eu o seguisse. Ficamos dando voltas no quarteirão enquanto ele falava. A cautela era visível e, para ele, entre os motivos do anonimato, está a desonra de saber que a própria organização policial teve responsabilidade nas mortes de agentes em maio de 2006.

Roger Franchini foi uma exceção. Troquei e-mails e telefonemas com este ex-investigador da Polícia Civil que atualmente é um dos principais autores brasileiros de literatura policial, com cinco obras publicadas. Em livros como Ponto Quarenta e Matar Alguém, alia ficção e realidade para apresentar as tensões e complexidades de ser policial. Talvez por já estar fora da corporação, Roger mostrou-se tranquilo em revelar sua identidade, assim como em expor as críticas mais contundentes ao Estado.

São três homens que tiveram a Polícia Civil como ponto de convergência, mas com experiências distintas daquela época. Atuando em uma corporação de caráter investigativo, eles apresentam a visão de quem teve acesso à informações que destoam das versões oficiais e midiáticas sobre o que levou ao fim daquela guerra que entocou a população. Também falam sobre como maio de 2006 influencia a segurança pública nos dias de hoje e, não menos importante, o que será dela no amanhã. Abaixo, um recorte da visão de quem esteve lá pra contar: Roger Franchini

Naquele sábado, o mundo se transformou. Na noite anterior, eu havia feito plantão. Foi tranquilo. Saí da delegacia de manhã e fui pra casa tentar dormir o resto do dia. Acordei por volta das 17h com o delegado me convocando com urgência. Perguntei o motivo e ele não quis falar. Nunca tinha visto aquele homem assim, tão nervoso. Fiquei com raiva porque era meu dia de folga; achava que se tratava de alguma treta de parceiro que tinha feito merda por aí, e precisavam de ajuda. Tomei um banho e liguei a TV. Foi quando vi as imagens das cadeias em chamas e presos rebelados. Até então, se tratando de São Paulo nos anos 2000, não era novidade ver cenas de rebeliões. Mas, logo que cheguei na delegacia, vi todo os colegas em choque. Um deles nem esperou eu perguntar e disse: "Roger, o mundo tá acabando". Depois disso, só voltei pra casa na terça-feira à tarde. Fui enviado para a Cadeia Municipal de Franca e fiquei dias na muralha vigiando quinhentos presos amotinados. Nada do que fizemos deu resultado para por fim à rebelião. Jogamos bombas, os bombeiros lançavam jatos d'água no pátio sobre os detentos, cortamos a comida, a luz, a água. Nada disso adiantou. O último recurso seria a invasão. Foi então que chegou um salve vindo dos Torres [do PCC] para eles, e finalmente os presos resolveram terminar a rebelião. Eles terminaram porque quiseram, e estavam dispostos a levar aquilo até o último corpo ser empacotado. Eu dormi lá, pelos cantos, e voltei pra casa só na terça-feira. Comia as comidas trazidas pelas mães dos presos, porque era o final de semana do Dia das Mães, e elas tinham ido visitá-los. Também fumava os cigarros que elas tinham levado. Hoje, a imprensa diz que foram contabilizados 59 agentes públicos e 505 civis mortos durante o período dos ataques do PCC. As mortes de cidadãos comuns foram represálias proporcionais ao medo dos policiais, não necessariamente ao número de policiais mortos. É um número que não me surpreende, pois é a média comum de morte cometidas por policiais no Brasil. Temos um sistema político corrupto, uma elite medíocre, e um sistema de segurança pública que serve aos interesses dos governantes. Entrei na Polícia Civil em 2002 e, desde a academia, ouvíamos histórias sobre a força do PCC. Em toda ocorrência com gravidade, que envolvesse tráfico de entorpecentes, latrocínio, sequestro etc., sempre havia a participação do partido, seja com a atuação direta de seus membros, seja indiretamente, financiando o delito. O mais comum era ter contato com o criminoso do dia a dia, aquele que não é participante ativo dos negócios da organização, mas que pratica o crime com a ajuda do PCC, seja alugando armas, fazendo o pequeno tráfico, ou então para pagar alguma dívida pendente. Nem todo criminoso é do PCC, mas todo criminoso que de alguma forma se destaca presta contas a ele. Os policiais tinham consciência da onipresença da organização criminosa, e havia um certo respeito velado entre as duas instituições. Mas os ataques de 2006 nos pegaram de surpresa. Ninguém imaginava a dimensão do evento. Havia policiais com quem eu não me dava bem, inclusive, tinha discutido com dois ou três por alguma coisa relacionada ao trabalho (hoje eu não faço ideia do motivo) e não nos falávamos. Mas, naqueles dias, um sentimento de lealdade desceu em todos nós. Eram tantas notícias de ataques, policiais mortos, emboscadas, que o sentimento de impotência e de vulnerabilidade acabou com todas as rusgas. Pelo menos momentaneamente. A equipe saia em bonde, sem nem mesmo escolher o parceiro que nos acompanharia nas viaturas. A sensação era de que algo de muito ruim estaria nos esperando em qualquer esquina e, se um tombasse, a culpa seria de todos. Não sei dizer se o que eu senti era medo. Eu já senti medo em outros momentos, e garanto que não era a mesma coisa. Pela primeira vez, desde que havia entrado na polícia, eu me sentia pronto para disparar a arma e matar alguém. Os motivos dos ataques é o enredo do meu livro Toupeira – a história do assalto ao Banco Central. Meses antes dos ataques, era comum ouvir pelos corredores das delegacias que membros do PCC tinham trazido os milhões furtados no Banco Central de Fortaleza, ocorrido em 2005, para São Paulo. Como não conseguiam lavar aquela grana com rapidez, diziam que escondiam em sacos com seis milhões de reais cada. Circulavam notícias de que policiais estavam à caça dessas pessoas para extorqui-los. Alguns com êxitos, outros com fracassos. Os jornais traziam notícias de que os principais ladrões do Banco Central eram sequestrados ou encontrados mortos. A gota d'água foi o sequestro do afilhado do Marcola por um policial na Cidade de Suzano, em São Paulo. Esse foi um B.O. que mexeu com toda a cúpula da polícia. Obviamente, ninguém tem provas de nada. O brasileiro — nisso incluo o tiozinho cidadão de bem e a imprensa — não se orgulha de seu passado, não preza pela cientificidade dos fatos, tampouco vai perder tempo em apurar uma história que macula a fama de pessoas que frequentemente ocupam o governo do Estado ou a Presidência da República. Nunca deixamos de ser uma paróquia controlada por capitães do imperador. A cada quatro anos votamos para que isso se perpetue. Passado o susto, tudo voltou à normalidade, ao ponto de ninguém mais se lembrar dos ataques da maneira como foi. Deixou de ser interessante para os jornais, uma geração inteira veio depois disso e o assunto agora é contado como lenda urbana. Como explicar para essa molecada que São Paulo, a capital da América Latina, foi rendida e colocada de quatro por criminosos? Vocês nunca sentirão o que nós sentimos. Hoje o PCC é uma das maiores instituições criminosas do mundo. Só não é maior do que os cartéis mexicanos. Mas há uma diferença no modus operandi do PCC: ele não adquire poder através da imposição de violência e medo. Ele ocupa espaços no serviço público, em conluio com grupos políticos e, assim, se eterniza como único grupo que domina o tráfico e crimes mais graves. Seu poderio é tão vasto que a grande imprensa se recusa a dizer o nome do Partido no horário nobre, e o substitui pelo eufemismo "facção criminosa que domina o crime organizado dentro e fora dos presídios". Os jornalões alegam que assim estão diminuindo a força do PCC, mas o efeito é outro. Eles tiram do cidadão a consciência do perigo do Partido, e amenizam sua existência. Assim, deixamos de cobrar dos políticos o fim do crime organizado, porque ele nos é desconhecido. Não acho que o PCC irá repetir o que fez em 2006. Aquilo foi um aprendizado para os Torres. Hoje, eles não precisam provar mais nada. Naquela ocasião, perderam muito dinheiro e pessoas importantes para a organização por mera vaidade, apenas para demonstrar o tamanho de sua grandeza. Não queriam dominar o poder político, não queriam destronar o governador. Queriam mostrar para o cidadão de bem o quanto seu mundinho de condomínio e carro é frágil. Naquele momento, eles tiveram sucesso. Sua força está concretizada e é indestrutível. Houve, de certa forma, uma repetição de ataques no ano de 2012 em represália à violência praticada pela Polícia Militar, sem o mesmo impacto na sociedade civil, mas com grande repercussão no meio policial. Atacavam e matavam de quatro a cinco milicianos por noite. Mais uma vez, corria pelas delegacias uma história de que o PCC havia mandado avisar o seguinte: os ataques só terminariam quando o secretário de Segurança Pública pedisse exoneração do cargo, ou quando chegassem ao número de 111 policiais mortos. Curiosamente, esse secretário foi defenestrado da pasta na noite do dia 21/11/14, depois da morte de 93 policiais. E, naquela noite, os ataques terminaram.

Agente G. Antes, vou dar um pequeno panorama. Certa vez, no começo dos anos 90, houve uma rebelião de presos em São Paulo. O governo mandou a Polícia Militar controlar a situação. Os policiais entraram e saíram de lá após matar 111 detentos. Havia uma turma de moleques, todos nascidos no Belenzinho, perto da atual Fundação Casa (antiga Febem) que jogavam bola. Quando ficaram com mais de 18, praticamente todos se envolveram em crimes, foram presos e foram parar no Carandiru. O mais inteligente do grupo era um cara chamado Marcola. Lá dentro, novamente se reuniram pra jogar bola em campeonatos internos da cadeia. Eles sobreviveram ao massacre e viram que os presos deveriam se unir e reivindicar seus direitos. Esse grupo evoluiu para gerenciar o crime fora da cadeia, inicialmente com os ex-presos que precisavam saldar dívidas que tinham com esse grupo, enquanto estavam presos. Foi o nascimento do PCC. E nada disso teria acontecido sem a conivência do Estado na época, que sabia da existência do grupo desde seus primeiros tempos, mas fingia que não sabia, pois a ordem estabelecida pelo PCC no mundo da criminalidade fez com que houvessem períodos com menos mortes e aparente tranquilidade nas periferias. Pois bem, naquele maio de 2006, eu era investigador do Grupo de Operações Especiais da Polícia Civil do Estado de São Paulo. Eu era um jovem de 26 anos de idade quando fui convocado pelos meus superiores. Chegando na base do GOE, percebi que havia muita tensão no ar, mas eu e meus colegas não sabíamos exatamente o que estava acontecendo, pois a própria cúpula policial estava escondendo informações. A ordem era para que fizéssemos a proteção da base do GOE. Mas, pouco tempo depois, ficamos sabendo que um dos nossos havia sido surpreendido na rua e atingido por oito tiros. Depois disso, fomos todos pra rua caçar assunto. As abordagens que fazíamos eram bem agressivas e contundentes mesmo, senão você podia ser morto a qualquer momento. Chegávamos com o máximo de força de intimidação para fazer os suspeitos pensarem muito bem antes de reagir. Qualquer atitude era suspeita. Qualquer homem na rua poderia ser alguém querendo te matar. Em algumas situações, realmente batemos de frente com os bandidos, trocamos tiros até a munição deles acabar. Eles davam fuga, a gente partia pra perseguição. Mas, ao menos eu e os policiais que estiveram comigo, não chegamos a matar ou prender ninguém. Aos poucos, as informações começaram a circular. Falavam das escutas do PCC ordenando quais eram os alvos mais valorizados, e os agentes do GOE estavam entre esses alvos. O PCC dizia que quem estivesse endividado com o partido, iria quitar a dívida matando. O PCC oferecia dinheiro para a morte de determinados agentes, fornecia armas e dava todo tipo de apoio aos bandidos. Eles também falavam que era importante matar os policiais que tinham dívidas com o PCC. Eu posso afirmar que, entre os policiais mortos, havia aqueles que tinham tratos com o Primeiro Comando da Capital. Como muitos policiais moram na periferia, os bandidos sabiam como chegar neles. E se a própria cúpula policial não houvesse demorado pra soltar informações, mortes poderiam ter sido evitadas. Hoje, por causa do Whats App, isso é mais difícil de acontecer. A morte indiscriminada de policiais fez com que a polícia também matasse pessoas sem muito critério. Na época dos ataques, um cara armado não era levado pra delegacia; ele era executado e armavam a cena de uma troca de tiros. Se um suspeito estava com droga, matavam. Se era procurado, matavam. Isso não é padrão, mas nas circunstâncias daqueles quatro primeiros dias, tava um liberou geral dos dois lados. Foi ação e reação. Mentalidade de guerra - mas isso não quer dizer que sou a favor da militarização da conduta policial. Enfim, a baixa da grande maioria dos agentes rolou no final de semana mesmo, porque, depois, o PCC percebeu que aquilo tudo estava fazendo com que muito dinheiro fosse perdido. As drogas são uma fonte de renda fundamental para eles, e o povo do asfalto demorou semanas para ter coragem de voltar nas favelas pra comprar droga. Ali, eles aprenderam que a solidez dos negócios do partido está acima de qualquer coisa. Por isso, acho que eles não vão repetir o que fizeram em maio de 2006, o que também não quer dizer que o PCC ainda não planeja a morte de policiais. A diferença agora é que eles são mais silenciosos, não ameçam a população, miram apenas o policial e fazem a morte dele ter a cara de uma ocorrência comum, como um assalto. Tudo o que sabemos daquele período não foi descoberto rápido assim. Demoramos anos para ligar os pontos e entender o que aconteceu. Um dos principais motivos foi um policial da cidade de Suzano que sequestrou um parente do Marcola e pediu R$ 1 milhão. O Marcola pagou a grana, mas o policial não libertou o refém. Na cabeça de um bandido desses, se você é preso por um policial, foi porque você vacilou, e isso não é motivo suficiente pra ter o trabalho de ir atrás dele. Mas se um policial dá um golpe em alguém do PCC, como o policial de Suzano fez, o buraco é literalmente mais embaixo. Sim, houveram outros motivos para o PCC ter parado São Paulo em 2006, mas aquela foi a faísca que disparou o Salve Geral. Quem soube da verdade sobre o que realmente aconteceu, tem vergonha. Por isso muitos policiais não falam sobre isso com a imprensa. O cara fica com vergonha de falar que a própria corporação que ele atua e o governo estadual para o qual ele respondia na época tiveram uma grande parcela de culpa nas vidas que foram perdidas. O cara fica com vergonha de falar que, enquanto aquela turminha do campinho de futebol virou o PCC nos anos 90, ninguém fez nada pra impedir. O PCC estava lá ontem, está aqui hoje e vai continuar amanhã. A não ser que a sociedade como um todo abra os olhos e queira consertar todo o sistema que permite que isso aconteça. Agente H. Eu estava na rua e logo percebi que havia algo de errado. Em toda delegacia que eu passava, eu via um monte de policiais fazendo a guarda das unidades com todo o armamento pesado em mãos. Todo mundo foi pego de surpresa, e eu também. Logo, estaria sendo chamado para a minha unidade da Divisão de Homicídios, na região da Luz, centro de São Paulo. Minha primeira atitude foi ligar para minha esposa e todo o resto da família, avisando 'olha, ninguém deve sair de casa hoje!' A primeira morte que eu fiquei sabendo foi de um investigador assassinado dentro de um bar em um bairro nobre. Morte planejada. Depois apareceram outras informações de mortes de agentes e, logo em seguida, todos estávamos sabendo do Salve Geral do PCC. Esse primeiro impacto fez a polícia recuar. Primeiro era proteger a família, depois proteger as unidades e os agentes policiais. O enfrentamento veio depois. Sempre houve uma rixa entre policiais civis e militares. Mas em maio de 2006 a rixa acabou e cada um exerceu sua função, ajudando o outro. Enquanto os policiais civis ficaram mais nas investigações e contenção da situação, os militares partiram para o confronto direto. Um caso que me marcou foi de um carcereiro, que é uma função que carrega o distintivo da Polícia Civil, que foi alvejado e morto na frente da esposa. Nós tentamos entender o que tinha acontecido. Falamos com um monte de gente, e descobrimos que ele havia crescido na periferia e, chegou uma hora, que ele decidiu seguir na vida policial e seus ex-amigos seguiram para a vida criminosa. Ou seja, os criminosos conheciam ele e sabiam como encontrá-lo.

Após muitas conversas com testemunhas, que tinham muito medo de falar, e uma escuta policial, nós descobrimos o paradeiro dos assassinos. Quando chegamos no endereço, damos de frente com uma belíssima casa, com carros caros na calçada e na garagem, e lá estavam doze bandidos, todos com histórico criminal, comemorando a morte do carcereiro. Um policial da região nos contou que um daqueles caras era um bandido notório, seu apelido era Alemão, e uma testemunha indicou que o outro cara, o Adriano, havia sido cúmplice. Eles já estavam graduados dentro do crime organizado. Levamos eles para averiguação. Logo em seguida, chegaram os advogados particulares dos sujeitos. Liberamos o Alemão e o Adriano, até conseguirmos um mandato de prisão. Quando conseguimos o mandato, encontramos o Adriano baleado no hospital; os outros bandidos tentaram matar ele, achando que ele havia delatado os outros vagabundos. O Alemão fugiu por uns tempos, mas depois conseguimos pegá-lo. Minha experiência na época foi essa de investigar os casos dos policiais mortos. Ficamos um mês indo atrás das pessoas que assassinaram alguns dos mais de 50 agentes públicos. Eu mesmo participei de mais de dez investigações. Enquanto estávamos nas viaturas, indo de um lugar pra outro, havia uma tensão, um alerta constante de ser o próximo alvo. Antes de maio de 2006, eu já ficava alerta quando estava na rua fora do trabalho. Mas hoje, depois de ter passado por aquilo, eu fico muito mais alerta. Se chega um vendedor de balas na janela do meu carro, já é um receio, fico esperto. O PCC continua matando os policiais por aí, mas agora eles fazem parecer que foi um assalto. Foi foda, naquele mês de maio vi que, literalmente, o cagaço de ir pra rua bateu em alguns. Pra mim, maio de 2006 não vai se repetir. Hoje, a guerra é outra. O crime acontece nas ruas, mas o jogo de poderes que pode realmente acabar com isso está dentro dos gabinetes.