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Games

Um jogo feito de paciência, silêncio e morte

‘PlayerUnknown's Battlegrounds’ coloca 100 jogadores numa arena no melhor pique de ‘Jogos Vorazes’

Esta matéria foi originalmente publicada no Waypoint .

Sentado na minha mesa, eu fecho meus olhos. Os fones de ouvido que tenho no trampo são desses genéricos, que você compra em banca de jornal, porque tinha esquecido meus fones bons em casa. Mesmo assim, eu preciso ouvir esse jogo. Como as caixinhas de som do meu computador estão péssimas, estou agora com o ouvido colado nesses fones, com os olhos fechados, tentando ouvir passos. Preciso ouvir pra saber se tem alguém vindo me matar.

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Acabo ficando lá, parado, com os olhos fechados e focado, por três longos minutos. Não ouço passos, mas em vez disso, o som calmo do vento e das folhagens. Escuto o som desse mundo, vazio a não ser pela minha presença. E, estranhamente, estou tenso e calmo ao mesmo tempo.

Essa é a experiência do PlayerUnknown's Battlegrounds pra mim. Apesar do nome estranho, o jogo é muito simples. No total, 100 pessoas entram num servidor, se distribuem pelo mapa usando paraquedas e todos tentam se matar. É tipo Battle Royale – o clássico filme japonês de suspense sangrento adolescente – mas videogame. O lugar onde estão os jogadores fica cada vez menor com o tempo, e aqui o tempo voa, então o game design força todos a se digladiar até o fim.

Foto no topo e outras de Battlegrounds: cortesia da Bluehole

A morte chega a cavalo nesse jogo. Rifles semi-automáticos, umas escopetas e toda sorte de pistolas são fáceis de encontrar, junto com toda a munição necessária. Os pulos de paraquedas, que é onde começa toda partida de Battlegrounds, é sempre acompanhada de umas 10 ameaças de morte entre jogadores que pipocam rapidamente na tela. Alguém toma um tiro na cabeça. Outra pessoa é esmurrada até a morte.

Você sempre fica sabendo dessas mortes porque o jogo quer mostrar onde você se encaixa na cadeia alimentar daquela rodada. Se está vivo, então tem uma colocação no ranking, e sua colocação pode subir. Se continuar assim, consegue chegar no topo. Pra ganhar o jogo, basta não estar morto.

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Não sou o tipo de jogador que pula do avião junto com as outras 10 pessoas. Não tento chegar antes na base militar ou na zona industrial, ou até no centro da cidade. Eu espero até o último minuto e então pulo o mais longe possível dessas pessoas. Assim como elas, vasculho todos os lugares por onde passo, entrando de casa em casa nesse cenário meio Leste Europeu com muita atenção. Encontro armas, curativos, munição e tudo que posso levar na mochila.

E então fico de ouvido atento, escutando a morte chegar pra outros jogadores enquanto a lista de sobreviventes vai diminuindo no canto esquerdo da minha tela.

A experiência toda me lembra DayZ, quando ainda era um simples mod de Arma 2, logo depois de ser lançado. Passei por uns perrengues pra instalar o jogo e comecei uma partida numa ilha enorme, cheia de zumbis e outros jogadores que queriam minha cabeça, então eu só corria. Fui pro norte do mapa, onde tinham estradas cortando uma floresta alta, e fiquei andando por lá. Não encontrei outros jogadores e os zumbis eram raros de se trombar.

Eu sabia que se morresse ali, talvez eu não voltasse tão cedo. Eu acabaria naquela mesma praia do começo, no meio de um monte de novos jogadores e trolls que curtiam mata-los sem dó. Mesmo com vidas infinitas, eu sabia que não poderia ter aquela vida de novo.

Finalmente, morri, e outros jogadores já sabiam se virar bem melhor naquele mundo. Nunca mais foi a mesma experiência. Aquela solidão simplesmente não existia mais.

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Em Battlegrounds, passei a maior parte do tempo testemunhando a morte dos outros. Eu descolo os itens que precisava, coloco tudo na mochila, e encontro uma cabaninha, ou uma árvore alta no meio do campo. Me deito no chão e fico esperando a galera que quer ficar se matando fazer exatamente o que desejam. Vejo a lista de mortos no canto esquerdo da tela rolar e penso em todas as formas diferentes que as pessoas podem morrer.

Passo boa parte da partida sozinho, o que é bem normal visto que todas as pessoas do mundo querem te matar, e enquanto isso, vi coisas lindas que me lembraram dos dias que passava nas estradas de DayZ. Passei por um pântano e descobri um observatório. Fiquei parado numa pedra, observando duas cidades ao longe. Caminhei sem pressa pela floresta, ouvindo o som ambiente do mundo.

Ouvir é fundamental.

Em Battlegrounds, quase tudo o que você escuta tem a ver com uma morte. Você acaba ouvindo um rifle soando lá longe, e uns segundos depois, aparece um anúncio na lista de mortes. Meu corpo fica tenso quando escuto o barulho raro de um carro parando perto da casa que estou explorando naquele momento, sentindo uma mistura de pânico e medo que é difícil descrever. Pior que isso é ficar petrificado dentro do banheiro enquanto escuto pessoas em volta da casa. Ouço o barulho de cada passo pelas paredes e tiro as minhas mãos do teclado, na esperança de que eles não entrem onde estou.

Esses momentos, no entanto, são raros. São enormes ilhas num oceano de som, e a morte é um ponto de exclamação em uma enorme frase que conta a história desse mundo, enquanto eu aprecio suas paisagens e barulhos. Battlegrounds, na sua tentativa de encapsular a vida como um evento violento e rápido, me força a focar nos pequenos movimentos nas árvores, prédios, e no som ambiente da vida para evitar que o meu ponto de exclamação chegue logo. Enquanto espero pelo final, o ponto final da minha vida nesse mundo, eu aprecio tudo ainda mais.

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