De macarrão seco a hambúrguer orgânico: a comida de hospital na Europa
Foto por Eli Driu.

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Saúde

De macarrão seco a hambúrguer orgânico: a comida de hospital na Europa

“Aquecemos as refeições embaladas bem lentamente, para a comida não ficar muito mole e sem gosto.”
MS
Traduzido por Marina Schnoor

Matéria originalmente publicada na VICE UK.

Geralmente, ficar internado não é divertido. Principalmente porque quando você acaba no hospital, estará lidando com alguma doença ou trauma sério — e em muitos hospitais, o estado da comida servida aos pacientes também não ajuda. Por alguma razão, quando você está mais vulnerável, te servem porção atrás de porção de cozidões aleatórios que começam a coagular assim que você bota os olhos neles.

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Um estudo recente do grupo inglês Campaign for Better Food descobriu que menos de 30% dos hospitais de Londres servem refeições recém-preparadas aos pacientes, embora 77% ofereçam comida fresca para a equipe. Mais recentemente, fotos de comida de um hospital incrível no Japão viralizaram. Então não são todos os doentes do mundo que sofrem com brócolis molenga e frango gorduroso e seco ao mesmo tempo? Como é a comida de hospital nos outros países?

Para descobrir, conversamos com os responsáveis pelas refeições dos pacientes em cinco hospitais de cinco países europeus. Juntos, eles servem desde refeições batidas como um smoothie a hambúrgueres orgânicos de carne local com queijo feta e chutney de manga.

Henk Hamminga, 60 anos, chefe de nutrição do MC Slotervaart em Amsterdã, Holanda

Fotos por Alex Krancher

VICE: Oi, Henk. Há quanto tempo você comanda o serviço de refeições do seu hospital?
Henk Hamminga: Comecei a trabalhar aqui em 2014. Na época, o hospital estava com problemas financeiros, então eu trabalhava para economizar algum dinheiro não cozinhando aqui, mas terceirizando de uma empresa especializada.

Então como você garante que a comida servida aos pacientes é fresca?
A empresa prepara as refeições e entrega ao hospital diariamente. Reaquecemos a comida bem lentamente em carrinhos especiais, para que ela não fique muito mole e sem gosto, mantendo a textura normal.

Carne com purê de batata, molho, brócolis e vagem. Pudim de chocolate de sobremesa.

Todo mundo recebe a mesma refeição?
Não, sempre oferecemos dois cardápios diferentes, que mudam diariamente. Também tentamos atender as necessidades conforme a dieta do paciente — sempre temos opções halal e vegetariana. E toda refeição vem com uma salada e alguma sobremesa.

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E você também come essas refeições?
Sim, provo todas as refeições servidas aos pacientes e, honestamente, elas são bem saborosas. Mas para pacientes que tem problemas para engolir, batemos tudo num tipo de smoothie. Como você pode imaginar, esses não são muito saborosos.

Alex Krancher

Marco Romano, 33 anos, chef geral do Hospital Triemli em Zurique, Suíça

Fotos por Kamil Biedermann

VICE: Quantas opções vocês dão as pacientes?
Marco Romano: A maioria dos pacientes pode escolher entre cinco cardápios — uma seleção de pratos suíços clássicos, um menu vegetariano, lanches leves e opções especiais com alimentos bem picados ou amassados. A seleção muda todo dia, e somos muito flexíveis se a pessoa quiser misturar ou trocar opções. Os pacientes também podem pedir vegetais extras gratuitamente, porque seria injusto cobrar se eles estão tentando comer melhor.

Como seu orçamento influencia as escolhas culinárias que você toma?
Atualmente, toda a carne que servimos é orgânica, mas acho que isso pode mudar em breve, porque estamos tentando cortar custos. Para três refeições, a média que gastamos por paciente por dia é de €14 [cerca de R$50]. Além disso, alimentos especiais, como leite para recém-nascidos com problemas digestivos, podem ser bem caros — até €5 [cerca de R$ 16] por porção.

Fígado de bezerro orgânico com fritada suíça e tomate no vapor. Servid o com salada de beterraba e pera e um muffin.

De todos os pratos que vocês servem, qual seu favorito?
Gosto de criar refeições criativas e modernas, mas isso nem sempre cai bem com os pacientes. Muitos deles são idosos, então preferem a cozinha tradicional ao meu hambúrguer com queijo feta e chutney de manga, por exemplo.

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Mas não é só a comida. Temos muito orgulho das refeições que preparamos aqui, então é muito importante para mim que a comida também tenha uma boa aparência. Você pode conferir a conta no Instagram que fiz para mostrar nossas criações especiais.

Você tem pacientes particularmente enjoados?
Não, alguns reclamam que a comida é muito salgada, mas acho que isso tem mais a ver com a medicação afetando o paladar deles.

Kamil Biedermann


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Ramona Bratu, 47 anos, chefe de cozinha do Hospital Universitário de Bucareste, Romênia

Fotos por Eli Driu

VICE: Oi, Ramona. Como é o cardápio no seu hospital?
Ramona Bratu: As opções mudam todo dia e dependem das necessidades de cada paciente. Antes de decidirmos o menu do dia, um especialista em tratamentos e um nutricionista recomendam o que a refeição de cada paciente deve conter. No momento, atendemos cerca de 17 categorias de dietas para cerca de mil pacientes.

Quanto vocês gastam com cada paciente?
Depende das necessidades individuais. Gastamos cerca de €2 [R$7] por refeição por paciente sem exigências específicas de dieta, e por volta de €3 por refeição para diabéticos e grávidas. Refeições para pacientes fazendo diálise custam cerca de €1,50 cada, e eles só comem uma vez por dia.

Arroz com frango servido com sopa de vegetais, salada de repolho e um strudel de maçã de sobremesa.

Que tipo de feedback você recebe do seu trabalho?
É difícil dizer, mas o prato mais pedido é a pasta de feijão com croquetes de carne moída. E parece que nossos pacientes gostam muito dos suflês, especialmente o de queijo. No geral, as pessoas parecem bastante satisfeitas.

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Mas deve ter algo que as pessoas não gostam, né?
Bom, pacientes com problemas cardíacos não podem consumir nenhum sal. Posso preparar a melhor refeição do mundo, mas sem sal ninguém vai gostar.

Răzvan Filip

Linda Hagdahl, 40 anos, nutricionista do Södersjukhuset em Estocolmo, Suécia

Fotos por Hampus Andersson

VICE: Qual o prato que seus pacientes mais gostam?
Linda Hadgahl: Os clássicos, como almondegas e purê de batata — alimentos fáceis de comer, não muito duros. Do cardápio infantil, os tacos, panquecas e lasanha são os mais populares.

Nossa comida é fornecida por uma empresa terceirizada, então montamos o prato para que o alimento pareça o mais apetitoso possível, o que é mais difícil com algumas refeições que outras.

Como vocês criam seus cardápios?
O Södersjukhuset é um hospital de emergência, então um paciente comum fica apenas três ou quatro dias. Isso significa que não temos muitas opções personalizadas como outros hospitais. Para cada refeição oferecemos duas opções — e uma extra para pessoas com exigências especiais, como [quem tem] alergias. Com poucas opções para um hospital inteiro, é difícil criar pratos que atendam uma grande variedade de idades, origens culturais e condições médicas. Mas atualmente estamos construindo uma cozinha maior, onde planejamos preparar um cardápio base de 12 pratos diferentes.

Carne moída e caçarola de lentilha com purê de batatas e cenouras cozidas, com salada de queijo feta e azeitonas. Para sobremesa, damasco com chantili.

O que mais vocês fazem para melhorar a comida?
O conselho do condado de Estocolmo prometeu investir mais em refeições de hospital. Nos próximos cinco anos, vamos nos focar em criar refeições melhores, com mais ingredientes produzidos localmente e orgânicos, por exemplo.

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Qual a reclamação mais comum que você recebe?
Que a comida não está quente o suficiente — esse é um problema com nosso sistema atual de reaquecimento. Mas isso deve mudar quando a nova cozinha estiver pronta.

Hampus Anderson

Dr. Sonja Rdakovic, 52 anos, nutricionista da Clínica Militar de Belgrado, Sérvia

Foto por Nenad Vujanovic

VICE: É muito difícil atender tantas pessoas e tantos gostos diferentes?
Dr. Sonja Radakovic: É um desafio. Com cada paciente tem uma dieta específica, por isso criamos cerca de 20 cardápios especializados e preparamos por volta de mil refeições por dia.

Como vocês garantem a qualidade das refeições?
É uma questão de estar bem preparado. Nosso orçamento anual é disponibilizado com antecedência, baseado no número de pacientes que esperamos tratar. Então sempre sei em que pé estamos, e não temos que sacrificar a quantidade ou a qualidade.

Para o almoço, macarrão e almondegas com molho de tomate. Servido com pão e suco de pera.

Qual a principal reclamação dos pacientes?
Fizemos pesquisas entre os pacientes e 90% deles disseram estar satisfeitos ou muito satisfeitos com a qualidade da nossa comida. Claro, não dá pra agradar todo mundo. Na Sérvia, as pessoas raramente comem bem — elas preferem alimentos gordurosos, fritos e salgados, muita carne processada e o mínimo possível de vegetais e frutas. Tentamos oferecer aos nossos pacientes opções mais saudáveis.

Você leva para o lado pessoal quando os pacientes não ficam felizes?
Não, há muitos fatores que podem contribuir para eles não gostarem da nossa comida. Pesquisas mostram que pacientes no geral comem menos quando hospitalizados — a natureza da medicação e dos efeitos físicos e mentais de sua condição pode levar a uma perda severa de apetite. Tentamos contornar isso oferecendo uma variedade de refeições. Na verdade, meu trabalho número um é garantir que as refeições que servimos contribuam para a recuperação dos pacientes.

Jovana Netkovic

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