FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Ava Rocha quer te devorar

A nova cara da antropofagia musical brasileira é feiticeira, fã de MC Carol e mulher.

Em março, na coluna Mulher do Dia, vamos diariamente parar por um minutinho o torno informacional para respirar e pensar sobre quantas vezes nós levamos realmente a sério o fato de que muitas das nossas artistas preferidas são, todos os dias, mulheres.

Divulgação

Mãe, amiga, cozinheira, cineasta, feiticeira, maconheira e ubuntu-budista, Ava Rocha quer te devorar. E também tudo que está ao seu redor. “Tô impregnada de tudo e me influenciando por tudo o tempo todo”, me disse a cantora-cineasta carioca de 37 anos.

Publicidade

Metade colombiana, metade brasileira. Meio judia por parte de mãe (a artista plástica e cineasta Paula Gáitan) e meio indígena-negra-portuguesa por parte de pai (o cineasta Glauber Rocha), Ava juntou todas essas influências das suas origens com Violeta Parra e neotropicalismos, as “deglutiu” e teve como resultado o seu segundo disco, Ava Patrya Yndia Yracema (2015).

Cantando o que eu e você, mulheres brasileiras, sentimos, Ava fez do seu trampo um emaranhado bem bonito de vozes femininas de todas as cores — como dá pra ver no trecho “cara de índia/ amazonina/ filha de branca/ filha de preta”, da faixa “Uma”. E foi com essa Yndia Yracema brasileiríssima demais que troquei uma ideia sobre força feminina na arte e até sobre MC Carol (de quem ela é fanzoca). Saca só:

NOISEY: Como você entrou no mundo da música?
Ava: Faço 37 anos no próximo dia 21 de março. Canto desde pequena. A descoberta da minha voz e do meu cantar surgiu cedo, quando eu tinha uns 10 anos. Fui conduzindo isso por um caminho à margem do ambiente musical, até porque, desde pequena, tenho uma relação forte com o cinema também. Adorava atuar, estudava teatro, etc. Aos 16 anos, a atuação fortaleceu minha visão sobre cinema e me vi por trás das cameras e da ilha de montagem. Nos filmes, eu cantava, compunha, editava som, pensava musicalmente o filme e, paralelamente, comecei a compor, a musicar escritos antigos e novos. Então, eu já vinha elaborando a música desde sempre, até que, em 2007, cantei cenicamente na peça Os Sertões, a convite do Zé Celso. Em 2008, iniciei oficialmente meu trabalho na música, quando juntei uma banda e coloquei na mesa o primeiro grupo de canções que queria cantar e o que queria experimentar da linguagem musical naquele momento.

Publicidade

Você já sofreu algum preconceito na música só por ser mulher?
Já me senti assim, sim. Acontece a todo momento em qualquer lugar e se manifesta de diferentes formas. Mas nada grave que me fizesse paralisar por aquilo.

Quais mulheres você tem como influência/referência?
Minha mãe Paula Gaitán, Maria Sabina, Frida Kahlo, Violeta Parra, Nina Simone, Pagu, Elza Soares, Policarpa Salavarrieta e tantas outras.

O que você acha do cenário da música atual para as mulheres?
Acredito que estamos bem empoderadas. As mulheres em geral estão bem empoderadas. E isso reflete em tudo. MC Carol me parece que encarna bem essa mulher. Ela foge de qualquer estereótipo, canta o que pensa e é mulher pra caralho, transpira desejo, ocupa seu espaço e mete o grelo. Mas estamos também dando apenas continuidade a uma luta extensa, da mulher dentro e fora da música, de resistência e revolução. Estamos continuando a histórica luta feminista e fazendo deste tempo um tempo marcante na retomada com força e inovação dessa luta, que abrange temas seculares e também contemporâneos.

Hoje, há muito mais poder de conscientização, militância nas redes e campanhas muito inteligentes. É um momento com certeza muito forte. Além de que, na música, como no cinema, por exemplo, vemos esse empoderamento tanto na parte técnica como criativa. Muitas mulheres carregando câmera, gravando disco, tocando bateria, dirigindo filmes, tirando a roupa e botando a roupa.

O espetáculo Primavera das Mulheres, que reune artistas mães, e Meteoro — um coletivo só de mulheres na música experimental, com muitas compositoras mulheres, muitas bruxas, muitas entidades —, por exemplo, têm muito a ver com a maneira que nós nos enxergamos e com nos coroar e assumirmos o nosso poder. É o que as mulheres estão fazendo. Outra coisa linda que tá acontecendo é o movimento do black power, das mulheres negras, com seus cabelos e a autoestima que elas vêm recuperando gradativamente. Tudo isso é muito importante, e vai tudo junto, mulheres na música, na rua, na escola, onde for, tamos juntas! É nós!

Siga o Noisey nas redes Facebook | Soundcloud | Twitter