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Música

Sick of It All Diz: "Os Bons Tempos São Agora"

A lendária banda de NYC fala abertamente sobre política e sobre o processo de se tornarem caras enrugados do hardcore.

O Sick Of It All, com quase 30 anos na ativa agora, sempre foi uma espécie de caso (levemente) isolado no hardcore nova-iorquino. Com os pés firmes no passado de matinês no CBGB nos anos 80, mas sempre tocando com bandas novas, nunca se separando, nunca se reunindo. Sua música deve tanto para o Oi! e street punk quanto suas raízes hardcoreanas. A banda sempre foi mais conhecida por sua música do que pela imagem de durona. Assim, com exceção daquela briga ao vivo no rádio com o Born Against, mas aquilo foi apenas uma dose tremendamente divertida de cultura norte-americana, há cerca de um milhão de anos. Desde então, o Sick of It All tem, em um ritmo quase de rock clássico, lançado discos regularmente e consistentemente, dentro dos limites do gênero, inventivos em termos de ritmo, contagiantes pra caralho, e as letras, se nem sempre estão de acordo com a minha visão política perfeita de mundo, são ao menos engajadas. Pude ouvir uma amostra de seu próximo disco, e fico feliz em dizer que segue a o esquema de “Based On A True Story” de pedradas a lá Slade/Blitz. Em determinado momento o baixista Craig Setari até mesmo disse: “sabe quem escreve verdadeiros hinos Oi!? Bon Jovi”.

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Justo, mas o novo álbum do Sick of It All é consideravelmente melhor que qualquer imagem essa frase possa evocar.

Encontrei com Setari e o vocalist do SOIA, Lou Koller (seu irmão, Pete, é o guitarrista e Armand Majidi, o baterista, completa a formação), no Benny’s Burritos, um dos poucos lugares que ainda reconhecíamos na Avenue A, onde ficamos olhando pela janela, sacaneamos squatters e gambés, além de falarmos sobre a banda, sua história e seu futuro.

Mais uma observação sobre política: não concordo com estes caras sobre tudo, e se soubesse mais a respeito da Operação Velozes e Furiosos para conversar com o Craig, o teria feito. Mas não o fiz e não era minha entrevista. Sendo assim, meu ponto é: os dois foram extremamente simpáticos e interessantes, e quando discordávamos, eles se mostravam não menos que abertos para uma visão diferente. Planejo mandar ao Craig, por conta de sua postura com relação a crime e castigo, uma cópia de The New Jim Crow e não tenho dúvida de que ele irá ler. Também sou grato pelo tempo que dispensaram para falar comigo.

Para uma grande banda, uma grande (espero/acho) entrevista. Aproveitem.

Noisey: Vocês tem uma abordagem muito complicada sobre nostalgia. Vocês falam sobre assistir bandas novas, enfatizam muito o viver agora, mas sempre tem pelo menos uma música sobre os bons tempos em cada disco.
Craig: Os bons tempos são agora. E eram bons naquela época, você me entende. Não sabíamos naquele momento, mas a vida é o que você faz dela.
Lou: Nos divertimos muito. De vez em quando ficamos nostálgicos, mas não estamos presos a isso. Algumas pessoas simplesmente se apegam demais ao passado.
Craig: Isso que a gente faz? É algo especial mesmo, diferente. O lance é: não era especial no passado e não é agora porque continuamos fazendo. Ou seja, qualquer um pode se envolver… Só tem que se esforçar pra isso. É só isso. Então, sim, temos boas memórias desse lance muito massa que gostamos de fazer… Mas ainda tá rolando. Sendo assim, novas memórias são criadas todos os dias. Tudo faz parte da sua perspectiva, de como você vive a vida.

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Vocês são românticos, mas não muito; atribuem isso ao fato de não pegarem pesado na bebida?
Craig: Provavelmente.
Lou: Talvez.
Craig: Nunca nos estragamos, sabe?

É um desafio manter-se motivado? Vocês tem que lembrar a si mesmos constantemente de continuarem empolgados?
Craig: Que nada. Talvez em algum dia específico… Digo, não somos mais adolescentes. Mas a verdade é que nos sentimos muito abençoados por poder fazer isso. Temos muita sorte. Não há outro jeito de encarar. Esse mundo em que vivemos é como uma armadilha, vivemos em escravidão no sentido de que somos escravos do trabalho e dinheiro. Poder cantar, compor e fazer shows sobre essa sensação de estar preso e expressar isso enquanto, bem, não somos ricos, mas conseguimos ganhar algo, então podemos viver e tirar esse peso do peito, o que é ótimo.

Há um aspecto na banda que é economicamente progressivo e não é sutil. Tenho um monte de amigos do hardcore, que, sabe, tem que esconder atualizações de amigos no Facebook porque eles continuam bem liberais enquanto os outros caras, digamos, deram uma “endireitada”. Vocês mantem as coisas no geral para não alienar ninguém?
Craig: Não necessariamente. Porque talvez sejamos um pouco mais voltados para a esquerda em termos monetários, no sentido de que sabemos de que ganância é algo ruim. Mas também somos de direita em um monte de coisas. Acredito em crime e castigo. Acredito que se alguém é uma ameaça real para a sociedade, essa pessoa deva sofrer punição de acordo. Acredito firmemente na 2ª Emenda. Há certas coisas do sistema em que ele tenta emascular o homem e torná-lo tão dependente do sistema que acabam sendo ainda mais escravos do sistema monetário. Então, de muitas formas, somos bastante direitistas. Em termos de liberdade individual, somos bem de direita. Mas quanto ao sistema e como ele cria e monitora classes, somos de esquerda.
Lou: Obama é de esquerda, mas ele fez mais contra o Oriente Médio e a liberdade individual que Bush… Que era um cuzão.
Craig: É uma farsa e sempre foi uma enganação. Não estou falando nada profundo aqui, mas o sistema todo é falso e uma mentira. Se tenho as respostas para consertá-lo? Não, mas vou te dizer onde a coisa começa… União e companheirismo. Aquele lance antigo do hardcore – união. [ambos riem]

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Vocês estão evitando ser mais específicos em nome da união?
Lou: Quando escrevo as letras, e elas saem como de esquerda ou moderadas, tento manter um tom mais geral para que as pessoas tentem de fato se relacionar com elas. E quando alguém que talvez tenha um pensamento oposto se identifica com aquela canção, talvez inicie aí um diálogo.
Craig: Digo, veja só “DNC”. Pode-se dizer que é uma canção de direita, porque é contra o controle sobre o porte de armas, mas ao mesmo tempo não se manifesta a favor de machucar ninguém. É só que as regras impostas são enganações, são mentiras para categorizar você. Não te deixam alternativas. Há toda essa propaganda na imprensa, e sim, existem loucos, mas são poucos. A polícia não tem o direito de proteger você, repare na Operação Velozes e Furiosos. Você acha que eu acredito no direito do governo de me proteger? Eles acabam de dar caminhões cheios de metralhadoras para pessoas que matam famílias dos dois lados da fronteira. E o governo é responsável por aquelas mortes.
Lou: Como em Based on a True Storyem que Armand (Majidi, baterista) escreveu uma música chamada “Good Cop” e as pessoas acharam que era sobre gambés mesmo, mas na verdade era a respeito de Obama e como Armand foi enganado por ele, votando nele achando que as coisas mudariam e… Aconteceu o mesmo e de algumas maneiras, foi ainda pior.

Olha, eu não estou defendendo o Obama, mas é o mesmo caso do que aconteceu com Bloomberg quando todos comentaram que ele era o pior, esquecendo o quanto Giuliani foi péssimo quando prefeito de Nova York, então fica fácil esquecer o quão horrível Bush foi.
Lou: Verdade, verdade.

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Tenho um amigo que sempre diz: “Amar seu presidente é como amar mesmo os meganhas”.
Lou: Bom, eu tenho muitos amigos na polícia também…

Não, eu sei. É mais complicado pra vocês, acho. Você vem da classe trabalhadora, e ao envelhecer, talvez seus fãs possam se tornar, digamos, de forma diplomática, um estereótipo da classe trabalhadora.
Craig: É uma fraude, uma situação tão escrota. O sistema é tão corrupto…
Lou: Ás vezes quando você tenta conversar com seus amigos que talvez sejam um pouco mais de direita e tenta explicar a eles os níveis de corrupção e eles nem querem saber porque você deveria fazer parte de algum sindicato, eles ganham o que precisam de seus empregos e você tenta dizer a eles que o país está indo pra merda… E eles concordam contigo, mas põem a culpa no motivo mais errado possível. São os imigrantes, isso, aquilo…

Mas qual era a porcentagem mesmo antigamente? Digo, esse é o problema com o rock’n’roll em geral. Quanto dele é rebeldia de verdade e quanto é só extravasar? “Pô, acabei de surtar aqui e me diverti muito! Agora posso voltar a não ligar pra porra nenhuma…”
Lou: Bom, um dos aspectos disso era o que hardcore era pra gente. Todo domingo você podia pirar e a pressão sumia.

Mas aí vocês continuaram interessados em política.
Craig: Não temos interesse em política. Não acho que tenhamos. Temos interesse em mentiras e papo mole.

Discordo respeitosamente. Com respeito, mas isso é uma implicância minha, pessoas que dizem odiar política. Vocês vivem na política, o mundo é assim.
Craig: Você tá certo, tá certo.

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Você não odeia política. Você está falando sobre ela. Você é um cara interessante que fala sobre política.
Craig: Mas você sabe o que eu quis dizer com isso.
Lou: É um saco.
Craig: Eu tenho uma teoria: narcisistas megalomaníacos são atraídos pelo poder como um apostador é atraído pra corridas de cavalos e um bêbado atraído pelo bar. E essas são as pessoas que se tornam os grandes políticos que tomam todas as decisões. Você e eu, nós acordamos com um sorriso no rosto, ouvimos os pássaros cantar e vamos dar uma caminhada. E isso nos faz felizes porque estamos relativamente satisfeitos. Mas estas pessoas? Elas precisam ter o controle. Um viciado eventualmente terá uma overdose; um apostador ficará sem grana, mas um político? Ele não para até que o mundo queime.

Há algo parecido, intraduzível, que faz tanto uma banda quanto um político popular. Há carisma no meio.
Craig: Há um narcisismo sociopata megalômano. Uma doença mental. Um distúrbio pessoal…

Bem, o que faz você sair em uma turnê de 11 meses por ano, subir no palco e gritar suas opiniões pro mundo?
Craig: [Risos] A mesma coisa, mas não estou tirando vantagem em cima de ninguém! Ok, não sou o melhor exemplo, mas você entendeu…

Não, não, mas sei que a coisa exige um certo nível de vaidade…
Craig: Mas não tenho interesse de tomar o que é seu ou te dizer o que fazer, essa que é a diferença. Um destes lados tem uma percepção distorcida e o outro é relativamente saudável, digo relativamente porque ninguém que toca em uma banda é 100% saudável, não me entenda mal…

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Aceito o seu “relativamente saudável”. E não sei se a molecada liga, mas há uma forma de compor que acho que vocês e bandas como o Against Me! fazem muito bem, em que os versos são cheios de política, e então rola um puta refrão que poderia ser sobre derrubar o governo ou não se encaixar.
Craig: E aí temos músicas que não tem nada a ver com isso. Temos músicas sobre se divertir, misturamos as coisas… Não dá pra ficar martelando o mesmo prego. Não dá pra afundar tanto e ser negativo o dia inteiro.
Lou:Mas como mencionamos, é algo libertador pra nós também.

O que hoje em dia faz de vocês uma banda de hardcore? Não digo isso como um insulto, mas alguns dos sons novos parecem com o Blitz só que com uma produção bem gorda. Então, por que vocês seria hardcore e, digamos, o Helmet, não? É porque a banda fala sobre ser uma banda de hardcore?
Lou: Pode ser.
Craig: História…
Lou: Temática…Há bandas por aí que considero hardcore e que outros chamariam de metalcore e eu pergunto “por que?”. Por que eles têm um riff metaleiro ou cantam sobre strippers? Acho que tem muito a ver com o conteúdo das letras e com como você se porta. Saímos de uma época em que havia muita repercussão em cima do que falávamos, se disséssemos algo de errado o MRR [lendário fanzine punk] caía matando, e talvez o que você houvesse dito fosse interpretado da forma errada. Mas agora ouço coisas como “essa é uma tremenda banda de hardcore, a molecada adora”. E paralelamente o cara é dono de um site pornográfico. Antigamente você seria massacrado por algo assim. Não só na imprensa, mas na Europa te agrediriam fisicamente.

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Sim, mas vocês têm muito mais de Oi!/street punk e menos quebradeira pra galera pogar…
Craig: Sim, mas as nossas partes de pogo são mais aquele lance old-school de cantar junto do que esse som metal, apesar de termos um pouco disso.
Lou: Nossas influências mais antigas são Agnostic Front e Reagan Youth e todas aquelas coisas Oi! ainda estão ali, compomos assim pra ajudar a manter o estilo vivo. Dá pra ir no Spotify e achar um monte de bandas Oi! boas das quais nunca se ouviu falar. É esquisito pra eles, porque somos maiores na Europa, daí chamamos esse pessoal pra tocar com a gente e o promotor do show diz: “Ehrrr, mas eles vão tocar nu festival punk/Oi!”. E eu respondo: “E daí? Bota eles pra tocarem com a gente!” e ainda acham que nosso público não vai curtir o som… Mas eu acho que sim! Pelo menos eu adoro!

É estranho esse negócio de internet onde sempre surge uma banda “clássica”…
Craig: E elas nem eram tão clássicas assim.

Quando vocês veem todas essas bandas se reunindo, não pensam que deveriam ter tirado uma folguinha?
Lou: [risos] Tinha um cara na Costa Oeste, que depois virou agente do Green Day ou agente de turnês acho, mais ou menos em 1999, estávamos tocando em uma de suas casas noturnas e ele adorava a gente. Estávamos quase indo embora e ele diz: “Vocês ainda tem público, mas sabe o que deveriam fazer? Tirar um ano de férias”. Estávamos faturando na Europa, fazendo turnês no Japão e em todo lugar, e dissemos: “Um ano de férias? Cê tá louco?” e ele dizia: “Tô avisando… Um ano de folga…”. Devíamos ter feito aquilo! [ambos riem]
Craig: Não sei se deveríamos… O que eu ia fazer? Arrumar um emprego?

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O último disco saiu em 2010? Aí vocês fizeram a tour dele por um ano?
Craig: Mais ou menos dois anos. Aí tiramos um ano de folga. Planejávamos lançar esse disco antes, mas…
Lou: É sempre a mesma coisa. Estamos em casa compondo e recebemos um monte de ofertas pra fazer, sei lá, uma turnê no sul da Ásia, aí topamos e quando voltamos alguém convida pra fazer shows na Europa, onde os shows são demais, e a grana é boa, então…

E esse é o trabalho de vocês…
Craig: Isso, daí algumas coisas atrasam. Em termos gerais? São dois anos direto e um ano parado. Tem vezes em que tudo muda de direção…Tudo é tão saturado que você tem que ir lá e mostrar o ao vivo. Nosso melhor vem nos shows, sabe? Estamos mais velhos, mas ainda mandamos ver no palco. Não importa quantas cambalhotas você dá, mas como você o faz.

Quantas cambalhotas você consegue dar?
Craig: Hoje? Não muitas.

Zachary Lipez consegue dar tipo umas cinco cambalhotas. Siga-o noTwitter - @ZacharyLipez

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