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Música

O escândalo de Rita Oliva

A vocalista do Cabana Café e metade do PARATI conta que às vezes é preciso ser agressiva para ser ouvida.

Em março, na coluna Mulher do Dia, vamos diariamente parar por um minutinho o torno informacional para respirar e pensar sobre quantas vezes nós levamos realmente a sério o fato de que muitas das nossas artistas preferidas são, todos os dias, mulheres.

Foto: Luiz Sontachi

Chega a ser engraçado que as duas músicas que a Rita Oliva compôs para Moio, o indie e psicodélico segundo álbum do Cabana Café, falem sobre “grito” e/ou “escândalo”. Na primeira faixa do disco, “Vândalo”, ela já começa o refrão mandando um “Faz escândalo” bem, uhn, escandaloso. Já em “Vibrar na Garganta”, Rita canta “Que a veia que salta/Faça a língua vibrar na garganta/De tanta vontade de ir contra/O que o mundo inteiro diz”. Coincidência? Talvez. Mas que isso tem muito a ver com como a cantora de 28 anos encara “ser mina” no mundo da música, isso tem.

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“Às vezes, a gente precisa ser agressiva. Meio que colocar o pau na mesa para ser ouvida, saca?”, diz a paulista. Nascida em Jundiaí, Rita entrou no mundo da música aos sete anos, quando começou a estudar piano, e conta que sempre teve apoio da família. “Mas acho que isso não rola com muitas meninas (e meninos também), o que pode tornar o processo [de seguir carreira musical] muito mais difícil”. Ela cresceu, passou pelo violão e pela bateria, até que descobriu o seu verdadeiro amor: a composição. E, hoje, além de cantar no sexteto Cabana Café (junto com mais cinco caras, sendo que dois são membros do Bike), Rita faz parte do duo de dream-pop PARATI, junto com mais um menino, Zé Lanfranchi.

“Sempre tive bandas com muitos amigos homens, mas rola uma exclusão de vez em quando”, comentou, dizendo que já foi deixada de fora de grupos de Whatsapp para que os meninos pudessem enviar “putaria”. “Não que eu quisesse ver alguma dessas putarias. Mas fico puta com essas coisas. Se as bandas fossem mais mistas, isso não ia rolar.”

Enquanto você lê a entrevista com a nossa Mulher do Dia, dê um play no embed abaixo e ouça Rita arrebentando no vocal em Moio, do Cabana Café:

NOISEY: Como você entrou no mundo da música?
Rita Oliva: Comecei com piano clássico, aos sete anos. Com uns 13, comecei a tocar violão, olhando revistinha de cifra. Quando tinha 14, estudei bateria (e ouvi alguns “ah, mas você, uma menina, tocando bateria, é meio estranho, né?”), toquei em algumas bandinhas e também fui estudar canto. Sempre tive apoio da minha família com meus estudos na música, mas acho que ninguém imaginava que eu ia acabar trabalhando com isso. Ou talvez, sim. Não sei.

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Até fiz comunicação social. E ainda faço outros trabalhos relacionados a isso. Só que nada me traz tanta realização com a música. Não consigo nem imaginar minha vida sem poder compor, gravar, ir pro palco e me relacionar com as pessoas pela música. É meio que um vício bom.

Quantas bandas você já teve?
Cantei em algumas bandas no colégio. Uma era de metal — durou pouco tempo porque não era muito minha praia —, e as outras eram de amigos que me chamavam pra cantar. Na faculdade, me juntei com amigos em uma banda na qual tinha espaço pra composição. Foi quando me encontrei. Assim que comecei a participar de outros projetos, até chegar no Cabana e ao Parati.

Como é ser uma menina nesse meio?
Quando você é cantora, até que não é muito difícil. Mas acho que se formos além do papel de cantora, sim. Já ouvi coisas do tipo: “Violão não cai muito bem pra você”, entre outras [coisas].
Mas já senti sim dificuldade de ser ouvida. Ou então de ter minha opiniões validadas, mesmo tendo sorte de tocar com pessoas que me respeitam. Às vezes, a gente precisa ser agressiva ou colocar o pau na mesa para ser ouvida. Foi uma coisa que fui entendendo com o tempo: sair da posição “meiga” e ser mais firme quando acho que existe um ponto a ser defendido.

Quais mulheres você tem como referência no mundo da música?
Não tem como citar as monstras: Juana Molina, Elza Soares, Elis, Gal, Bethania, Janis Joplin, Joni Mitchel, Björk, Kim Gordon, Erykah Badu.

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A Björk por exemplo, tem um controle artístico da carreira dela que acho formidável. A forma com que ela coordena o processo e a equipe é incrível. É uma grande inspiração. Elis, Gal e Bethania são cantoras que me aproximaram da música brasileira. E tem essas garotas que são do rolê de “banda”, tipo a Brittany Howard ou a Kim Gordon, que, sem dúvida, abriram muitas portas para as meninas de hoje. As duas com certeza me inspiram quando tô passando perrengue com banda, viajando, dormindo em qualquer lugar (ou não dormindo), etc.

Você acha que o cenário para as mulheres na música tá melhorando?
Acho que sim, porque, por exemplo, hoje em dia, exista a iniciativa incrível do Girls Rock Camp, projeto para as meninas aprenderem instrumentos e formarem bandas. Essa geração com certeza vai vir pro mercado com outra informação, com mais segurança e encontrando um ambiente de mais igualdade. A educação, tanto para as meninas quanto para os meninos, é muito importante nesse sentido.

Que dicas você daria para as meninas que tão começando agora?
Bom, é difícil dar conselho, porque nem sempre o que funciona pra mim funciona para outras pessoas. De qualquer forma, sou sempre a favor do aprendizado pela prática. E a melhor forma de descobrir o que queremos fazer é fazendo. Falaria pra elas: “não pense duas vezes. Se você ouviu o chamado da música e tá a fim de fazer, se joga no mundão, gata! A melhor pessoa pra dizer o que é melhor pra você é você mesma.”

Que minas você recomenda escutar?
Gosto muito da Luiza Lian. Tem muita mulher que representa, no Hierofante Púrpura, Garotas Suecas, Carne Doce, Inky, Camarones Orquestra Guitarrística, Alambradas, My Magical Glowing Lens, Far From Alaska. A própria Marcela, do Mahmundi, uma querida e guerreira que tem plena noção do que tá fazendo e de todos os processos do trabalho dela. Ouvi faz pouco tempo o trabalho da Duda Brack e também achei cheio de atitude. A Sara Não Tem Nome é uma linda também, com aquela inocência irônica. Tá vendo, tá cheio de mina foda por aí!

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