Seja lá qual for sua opinião a respeito de Drake e/ou sua música, não dá pra deixar de lado o fato de que para alguns millennials o canadense tristonho tem lá seu apelo. A galera, pelo visto, adora Drake e ele tem lá sua importância. Para uma geração criada com base em nostalgia regurgitada e memes com os quais se identificam, Drake é o mais próximo de um verdadeiro ícone. Assim sendo, quando Drake gosta de algo ou alguém — seja frango na manteiga, casacos Stone Island ou outros rappers — seu público o acompanha. As engrenagens da celebridade sempre funcionaram desse jeito e provavelmente continuarão assim.Há pouco, entre comer quilos de haloumi no Nando's ou indo bem ali comprar detergente, erva-doce ou sei lá que porra ele foi comprar, Drake posou para uma charmosa foto com "duas moças muito importantes" em sua vida: na direita temos sua mãe, Sandi Graham, e à esquerda uma das mais celebradas e esquecidas artistas da música britânica.Helen Folasade Adu nasceu em 16 de janeiro de 1959 em Ibadan, Nigéria. Filha de um professor yorubá de economia e uma enfermeira inglesa, Helen passaria boa parte da sua infância às margens da costa de Essex — local especialmente esquecível da Inglaterra, indistinto de todas as maneiras possíveis. Ao final de 1983, Adu, formada em moda, era importante o bastante para que mil pessoas fossem impedidas de entrar no Heaven, em Londres, e estrear na Danceteria, uma das mais lendárias casas noturnas de Nova York. Em algum momento destes 24 anos, Helen havia deixado de ser Helen para virar Sade.A música, como somos lembrados quase que de maneira recorrente, é cíclica. Gêneros, técnicas de produção, até tipos de chapéu; todas essas coisas tomam seu lugar no cenário cultural e alternam entre frente e fundo, indo e vindo com o passar das estações. Por mais que isto não seja das coisas mais positivas do mundo e uma mania retrô reducionista seja sintomática do mal-estar artístico e social, isto significa que artistas adorados ainda que não bajulados, possam seguir na maciota, ganhando destaque quando bem entendem. Sade é uma destas pessoas.Ao longo de seis discos de estúdio, Sade — e aqui me refiro ao coletivo de artistas que gravou e lançou coisas sob esse nome, não apenas a própria Adu — passou pela consciência coletiva, com sua frontwoman homônima sendo um símbolo do quão bacanudo aquilo tudo era, ainda que de forma discreta. De fato, a própria Adu é tão cool que não surpreende que um paga-pau como Drake — que transparece desespero, pra dizer o mínimo — se alinhou a ela.E é justamente esse ar permanente de cool com o qual ninguém mexeria que a torna uma figura tão longeva — uma espécie de tesouro nacional, com zero ironia. Ela é foda como Alain Delon e cúpulas geodésicas são fodas. Ela reside além do reino da fama, ressurgindo a cada punhado de anos para retomar sua coroa.A música também ajuda, claro. A mistura característica de sons do grupo que vai da sofisticação enfumaçada (demonstrada em sucessos como "Your Love is King" e a favorita das donas de casa "Smooth Operator"), lentinhas ("No Ordinary Love" e "I Couldn't Love You More") e rock ensolarado encharcado de narcóticos (sim, "Lovers Rock") cria um mundo sonoro singular que é pura e sutil sedução. Ao ouvir suas obras passadas, é difícil pensar em algo que soe tão astuto. Fora "New Day" do Round Two ou algo da Tropicália, talvez nem exista mesmo.Mas vejam bem, a noção de cool/foda é um tanto quanto traiçoeira, já que são termos em uso há décadas por quase que todo mundo. Alguém, em algum lugar, em algum momento, falou que seixo ou guardanapos antibacterianos eram o Next Big Thing. Ser cool é algo que buscamos, que esperamos desesperadamente ser atribuído a nós, algo que queremos ser acima de tudo. Infelizmente, para a maioria de nós, tudo isso se evapora a partir do momento que buscamos este status. Quem é cool de verdade não precisa tentar ser, apenas é e é isso que é foda, não?Pense na Sade. Ela não precisa fazer nada pra passar a aura que tem. Ela é tão cool que a Supreme, marca que provavelmente se encara como a mais cool de todas, por mais que aquele relatório recente do Google indique que jovens prefiram navegadores a roupas, quer usar sua imagem para vender camisetas caríssimas, naquilo que pode ser a colaboração mais cool do século 21 até então, apesar de ostentosamente cool, ainda não sabemos se é cool de fato.Já o Reino Unido é decididamente um lugar nada cool; desde a invenção da tal cultura jovem tempos atrás, temos olhado erroneamente para o outro lado do Atlântico em busca de inspiração. De beats a b-boys, a molecada de Kent a Kirkaldy tenta se inspirar em suas contrapartes norte-americanas, esperando que o idealismo escancarado do país e sua confiança sem limites de alguma forma se transfira a eles ao comprar o jeans certo da loja certa no shopping da região. O mito do Reino Unido bacanudo surgiu nos enfumaçados anos 60, apenas para retornar nos já cheirados e alertas anos 90 — o sonho molhado de qualquer editor de revistas. Mas pare pra pensar nos tais símbolos cool britânicos: Tony Blair, Damon Albarn e a porra do Damien Hirst.Sade é um diamante brilhando em meio a um oceano de mediocridade. A Grã-Bretanha é triste, enfadonha, funesta — resumindo-se a purê de batata empelotado, John Stapleton e caça a fósseis em Lyme Regis. Sade está além disso. Em pleno 2017, ela pode muito bem ser nosso melhor produto de exportação. E nem mesmo Drake — decididamente longe de ser o cara mais foda de todos — pode arruinar isso.Leia mais no THUMP, o canal de música eletrônica da VICE.
Siga o THUMP no Facebook e Twitter.
Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.
Publicidade
Publicidade
Publicidade
Siga o THUMP no Facebook e Twitter.
Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.