O timing foi cirúrgico. As discussões de gênero estão cada vez mais em alta na moda e na publicidade e poucas criações plausíveis existiam concretamente nas terras brasileiras. A cemfreio acabou caindo como uma luva ao oferecer roupas para todos os gêneros sem parecer caricata. Tanto é que assim que o artista divulgou a venda, rapidamente era possível ver pelo menos uma peça da marca em qualquer rolê do circuito noturno paulistano, vestindo do mais fashionista ao mais normcore. Os moletons com inscrições tiradas de logos de bandas de black metal e também mensagens como "passivo agressivo" e "visualizada" estampadas nas peças causam um reconhecimento imediato com a criação do estilista, é quase como achar seu espírito animal da internet.Acredito muito no trabalho do Apolinário. A marca vem revolucionando na estética, na proposta, no em conceito e no e posicionamento que é uma coisa tão fundamental, mas que ao mesmo é tão complicada na nossa sociedade. Estamos em um momento muito interessante onde pessoas de vários ramos têm se posicionado e isso é fundamental para que se leve a uma outra concepção do que tem que ser feito. E de uma maneira que nós todos estamos construindo. Então quando vejo a cemfreio saindo em lugares incríveis e as pessoas usando, me sinto parte disso também. Acho que o Apolinário se sente assim também em relação à minha música, e eu acho que é isso que pode fazer diferença. É a gente querer construir junto. — Tássia Reis, cantora
O desfile promete causar o mesmo impacto do que vimos mês passado com a coleção do Laboratório Fantasma em parceria com o João Pimenta no SPFW. A rapper Lay foi escolhida por Apolinário para se apresentar no evento. "Ela é tipo minha Victoria Secret's", brinca. "A Lay é a amálgama dessa referência do corpo feminino livre de todos os parâmetros atrelados aos nossos históricos culturais de feminilidade e também onde o corpo da mulher negra está inserido. Esse descolamento é que se aproxima tanto de mim e da cemfreio."Pra mim, mano, o que a cemfreio representa é o que o Expensive $hit representa pra mim. É nós denegrindo, chegando com os dois pés na porta. É predominantemente pretos no topo, é protagonizar tudo. — Tasha Okereke
E foi com o pé na porta que a cemfreio foi hackeando a moda. Lançou sua primeira coleção na loja moderninha Cartel 011 em São Paulo e apareceu em quase todas as publicações tradicionais de moda, trazendo discussões (desconfortáveis para muita gente) sempre presentes na vida de Apolinário: a discussão racial, o machismo e a identidade de gênero. "Minha marca aborda muitas dessas frentes porque sou eu. Hoje tenho um produto que diz tudo que sempre dizia quando fazia outros projetos", explica.A cemfreio é liberdade e luta, mas sem esquecer do fervo porque nóis também rebola, né bb? Sempre na vanguarda, a Apolinário traz um jeito novo de ver os pretos e o gênero, questionando tudo e abrindo os horizontes, misturando o mais fuleiro da rua com o mais alto da arte (ou seria o contrário?), anjos e demônios mesmo. A gente veio para causar, e é muito bom poder contar com essa ótima companhia. — Lay, rapper
"Estou aproveitando esse espaço de mídia para hackear e falar mesmo do jeito que quero. E eu quero que minhas manas pretas também tenham esse espaço na discussão", afirma Apolinário. "Eu foco no humano. É pagar bem a costureira, as pessoas que trampam comigo. O produto já está entendido, as pessoas já sacaram. Agora eu quero trazer mais perto é o respeito do trabalho pro próximo, a divisão de inteligência. Não sou a próxima Coco Chanel, só quero reestabelecer novos mecanismos de consumo e dizer que todo mundo pode criar."Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter e Instagram.A cemfreio representa o que toda marca deveria ser: desconstruída e consciente em relação ao gênero e até consciente na questão de passar informação para as pessoas como o Apolinário faz. A cemfreio é o futuro. — Tracie Okereke