Ben Gibbard ranqueia os discos do Death Cab for Cutie do melhor para o pior

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Ben Gibbard ranqueia os discos do Death Cab for Cutie do melhor para o pior

Com o lançamento do novo disco da banda ‘Thank You for Today’, o ícone indie analisa os 20 anos da banda, de ‘The O.C.’ ao Grammy.

Na série Julgando Meus Discos, conversamos com artistas que acumularam discografias consideráveis ao longo dos anos e pedimos a eles que deem notas aos seus lançamentos em ordem de preferência pessoal.

Em um episódio de 2013 de Parks & Recreation, a personagem April, interpretada por Aubrey Plaza, está tentando vender uma cabana no meio do mato para um casal jovem que parece ter saído direto da Urban Outfitters. "Ouvi dizer que Ben Gibbard e Neko Case se pegaram aqui uma vez", conta aos dois, atraindo assim seu interesse. Na vida real, Gibbard considera tudo isso muito engraçado e até elogioso.

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"É lisonjeiro ter um roteirista achando que essa referência cairia bem com as pessoas", afirma o frontman do Death Cab for Cutie. "Que eu ou Neko somos tão parte dessa cultura do indie rock/pop que poderíamos ser usados como fator de convencimento para um casal de hipsters, cara, isso é engraçado de verdade."

A jornada de Gibbard rumo à onipresença indie rock começou em 2005, quando a banda tocou na segunda temporada do drama adolescente The O.C.. Sua franja meio desgrenhada e óculos de armação grossa, acompanhados de uma voz vulnerável emocionalmente, acabaram por trazer um novo tipo de rock ao mainstream e dali por diante a banda estava em toda parte. Indicações ao Grammy, participações no Saturday Night Live, com o hit “I Will Follow You into the Dark” recebendo versões de todo mundo, de Amanda Palmer à Natalie Imbruglia, servindo até de título para um episódio de Grey’s Anatomy.

Ao longo de 20 anos, o Death Cab for Cutie se mostrou uma constante de alta confiabilidade dentro do indie rock, nunca passando mais que dois anos sem lançar algo novo. Eles lançaram recentemente seu nono disco de estúdio, intitulado Thank You for Today, e assim como quase tudo que a banda já lançou, este se baseia nos elementos que fizeram o público cair de amores pelo grupo ao mesmo tempo em que explora novas direções. Gibbard se orgulha do fato de que o disco tem um pouquinho de tudo para agradar a todos, para quem descobriu a banda em The O.C. e para quem só os conheceu recentemente.

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"Pela primeira vez, realmente conseguimos conectar a estética que as pessoas associam a banda em seu início com algumas das coisas que fizemos nos últimos discos que deram certo", afirma.

Para analisar os altos e baixos que trouxeram o Death Cab for Cutie até Thank You for Today, botamos Gibbard pra escolher seus favoritos entre os oito discos lançados da banda.

Ben Gibbard: Este é o que menos gosto por uma série de motivos. O primeiro deles é que eu estava morando em Los Angeles e estava longe de meu lar espiritual e comunidade musical — da galera que não só tocava comigo, mas que também eram amigos que visitava o tempo inteiro e jogávamos conversa fora sobre música, compartilhávamos sons e meio que nos mantínhamos sinceros em meio a tudo, por assim dizer. Outro elemento foi algo que só percebi depois, que ao compôr este disco, comecei a tocar uma guitarra diferente. Nos primeiros discos eu usava uma Fender Bullets, um modelo mais barato da Fender e passei pras Fender G&L, que são maravilhosas, mas muito largas no braço, coisa que só saquei mesmo quando voltei a tocar Fender Mustangs na época do Kintsugi, então a forma como toco meio que reflete como minhas mãos se movem ao longo do braço destes modelos.

Noisey: Foi algo que alterou sua forma de tocar fisicamente.
Sim, foi algo me alterou fisicamente mesmo. Eu não compunha quase nada na guitarra porque não estava gostando de tocá-la. Compunha muito no piano, no computador. Além disso, tive duas mudanças bastante dramáticas em minha vida, quando parei de beber e me apaixonei, indo morar em Los Angeles e por fim me casando com uma atriz. Foi um capítulo bastante interessante da minha vida que fico bastante feliz de ter vivido. Mas no final, percebi que por conta das companhias que tive em Los Angeles, estava ficando muito fechado, em termos pessoais; me peguei indisposto a compartilhar o que normalmente compartilhava nos discos, ou que ao menos tinha a impressão de compartilhar ali, por conta da pessoa com quem estava e o medo de alguém ligar os pontos que colocaria a mim e minha esposa num nível de escrutínio com o qual eu não me sentia nada à vontade.

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E também, ao morar em um lugar aberto e ensolarado, senti que era hora de compôr meus hits tipo “Friday, I’m in Love” ou sei lá. Tínhamos acabado de sair de nosso disco mais obscuro até então com Narrow Stairs e acredito que, pra mim, a nível pessoal, mesmo antes de todas essas mudanças em minha vida, acabei percebendo que “Cara, eu não quero nunca mais fazer um disco daqueles na minha vida”. Parei pra ver o que tinha de negativo em Narrow Stairs, com toda aquela autopiedade e ódio de si mesmo. Acabei compensando por aquilo ali, mas perdi a mão. Dito isso, tem algumas faixas aqui que estão entre as minhas favoritas, considerando tudo que já criei.

Certa vez você disse que esse disco meio que broxou as pessoas. A percepção dos fãs afeta a maneira como você encara um disco?
Não muito, mas ao mesmo tempo, como disse a respeito deste ciclo de discos, sou o maior fã da nossa banda. Tocamos um monte de coisas ao vivo, e as canções que nossos fãs amam geralmente são as mesmas que eu adoro e muito disso acaba refletido no novo disco. É meio um lance de querer lembrar as pessoas o porquê dela gostarem da banda, sabe? Ao logo de nossos discos, acabamos nos afastando muito de um modus operandi que tentei manter e por vezes se perdeu: sempre ter noção daquilo em que você é bom e mesmo assim sair um pouco dessa zona de conforto e tentar algo de novo em cada disco.

Esta é uma pergunta meio complicada. Vocês fizeram uma turnê de divulgação deste disco junto ao Frightened Rabbit. Assim como você, Scott parecia o tipo de cara com quem os fãs se ligavam por conta da vulnerabilidade emocional apresentada nas músicas. O falecimento dele te levou a algum tipo de reflexão pessoal?
O que passou pela minha cabeça tinha muito a ver com a presença física de Scott e quanto amava o cara e que pessoa maravilhosa ele era. Sinto que tenho feito um excelente trabalho de manter meus demônios enjaulados, mas nem todos tem essa sorte. Por mais que eu tenha tido problemas com vício, nunca sofri por conta de doença mental, e quando se juntam os dois, acaba por ser uma combinação letal em diversos casos.

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Vocês meio que deram uma estouradinha com esse disco após tocarem algumas de suas canções em The O.C., o que deve ter sido uma experiência e tanto. Você lembra como foi ter essa oportunidade em mãos?
Na época não parecia grande coisa, foi só uma ligação que recebemos numa terça convidando a gente pra tocar nesse programa novo aí da Fox em que queriam usar “Movie Script Ending” e pagar tantos dólares por aquilo. Topamos porque precisávamos de grana, então quando fui lá ver o tal do programa, não tocou só a música de fundo como os personagens estavam falando da banda, coisa que eu nunca tinha visto antes e achei muito doida. Parando pra pensar naquela época, tinha todo esse zeitgeist cultural em torno do rock em geral — com o The Shins e o filme Garden State. O indie rock que eu conhecia e você também, com certeza, era um negócio muito mais underground em que as bandas tinham sorte até demais quando vendiam entre 15 e 20 mil discos, tocando nuns picos intermediários e quem sabe tirando um troquinho nam turnê, mas não era mesmo uma opção de carreira séria. Então é aquilo, se não fosse a gente, seria uma outra galera.

Com certeza, mas vocês foram meio que pioneiros no rolê ou até bois de piranha, dependendo de como você analisa a coisa toda. Que impacto você acredita que isso tenha tido na carreira de vocês? Surgiram fãs que não viriam até vocês caso as coisas fossem diferentes?
Com certeza dá pra dividir as coisas em antes e depois. Lembro que participamos de um evento do New York Times e alguém me perguntou — um adolescente, claro — algo como “Eu frequento os shows de vocês há um tempo e tenho percebido muita gente nova e queria saber o que vocês acham disso aí” e ele provavelmente esperava que eu dissesse que isso era uma bosta e que fãs como ele eram os melhores. Na época, o que me deixava meio bolado era ver uns textos sobre a gente sempre em associação a The O.C. como se a banda não existisse antes daquilo.

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Como se vocês fossem personagens ali.
Isso. Photo Album já tinha vendido umas 50 mil cópias até então, o que era o ápice do indie rock na época. Achávamos que estávamos indo bem. E analisando tudo isso agora, acho que cada vez menos me perguntam menos sobre isso — não que eu esteja querendo diminuir seu trabalho por isso. 15 anos se passaram e ainda estamos aqui. A série deve ter acabado há uns 12 ou sei lá quanto. Com certeza valorizamos o público que a série nos trouxe, porque naquela época a MTV não tocava mais tantos clipes, o YouTube ainda nem existia direito. The O.C. acabou levando muitas bandas às salas de estar das pessoas e eu sou bastante grato por isso.

Muito do seu trabalho, especialmente este disco, lida com sentimentos de isolação. É com isto que as pessoas mais se identificam em relação à música de vocês?
Não sei. The Photo Album foi um disco de transição pra mim. Tem um clichê muito verdadeiro aí que é o de que você tem a vida inteira pra fazer seu primeiro disco, daí vem o segundo que tem músicas que não entraram no primeiro e mais umas coisas novas, aí vem o terceiro disco, o mais complicado. Complicado porque você não tem material e tem menos tempo pra criar. Tinha umas três faixas de We Have the Facts que poderiam estar em Something About Airplanes. Então entre estes dois discos eu só acabei compondo mesmo umas seis faixas. Dito isso, The Photo Album tem algumas das favoritas de nossos fãs e algumas de nossas melhores faixas. “A Movie Script Ending” é e sempre será uma de minhas faixas preferidas de tudo que já fizemos.

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Tem um monte de faixas naquele disco que acabaram saindo meio cruas. Entramos em estúdio lá por maio de 2001, se não me engano, não porque tínhamos canções o suficiente para gravar algo e sim porque vívamos naquela bolha que é fazer música enquanto trabalho. As pessoas tem essa ideia pré-concebida sobre os artistas de que quando estão com grana eles acabam fazendo merda porque simplesmente não ligam mais ou não precisam dar duro em cima daquilo. E não cara, a pior época para um artista é quando eles tomam decisões artísticas com base em necessidades financeiras — este disco foi basicamente isso pra gente considerando que tínhamos que entregá-lo para sair em turnê no outono, e se não fosse por essa turnê no outono, estaríamos quebrados. A banda toda tinha acabado de largar o emprego e mal tinha grana pra pagar o aluguel, então não lançar um disco e não sair em turnê seria declarar nossa morte, teríamos que conseguir empregos temporários ou voltar a estudar.

O clima todo durante a composição daquele disco foi o pior possível simplesmente por conta do contexto em que tudo se desenrolou. Além disso, a nível pessoal, nós da banda não estávamos nos dando tão bem também, o relacionamento com o Chris não estava nada bom, o que levou a toda uma treta gigantesca em Baltimore durante a turnê deste álbum em que a banda quase acabou. Analisando tudo aquilo hoje, bem, o cara estava mesmo esgotado e foi uma época terrível para nós. Ao passo em que fico feliz que tenha gente que realmente gosta deste álbum e que provavelmente vai ler isso aqui e ficar meio pasmo tipo “Como assim? The Photo Album é incrível!” ao que eu responderia “Que bom que você gostou, mas do jeito que eu vejo, tem algumas coisas ali das quais tenho muito orgulho, mas outras estão muitas cruas."

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Já neste disco você tinha 21 anos mais ou menos, as expectativas eram as menores possíveis. O que você lembra dessa época?
Eu tocava numa banda chamada Pinwheel em Bellingham que nunca deu em muita coisa, com dois vocalistas e compositores. Parando pra ouvir aquele material ali ele simplesmente não era muito bom. Minhas composições eram bem abaixo da média, ao contrário do outro cara que compunha comigo na época, Justin Kennedy, que era ótimo. Eu só não estava conseguindo fazer a coisa rolar, até que tive esse surto em que compus o Something About Airplanes quase todo em dois ou três meses, como se fosse um projeto paralelo. Eu nunca tinha produzido tanto antes e fazer esse disco foi muito divertido, muito mesmo. Gravamos em nossa casa em Bellingham em um gravador analógico de oito canais. O quarto do Chris era no sótão e então passamos um microfone por um buraco no teto até chegar na sala, gravação caseirona, pra dizer o mínimo. Não tenho nada além de boas lembranças deste disco e o único motivo para ele estar nesta posição é porque acredito que sirva como preâmbulo para o que faríamos depois.

Ele soa bem minimalista. Você ainda era tímido enquanto artista ou estava em meio a um processo de descobrimento de sua sonoridade?
Acho que, primeiro, tínhamos a limitação dos oito canais. E, segundo, quando escuto esse disco, consigo ouvir todas as suas influências. Diziam que éramos um cover do Built to Spill e deixa eu te falar que tem umas coisas bem roubadas deles aqui. Eu era bem influenciado por Rex, Bedhead e mais um monte de bandas mais lentas como essas. Na minha cabeça, se eu fosse criar uma demo do que viria nos próximos 20 anos, seria Something About Airplanes. Sempre que o escuto, escuto um compositor tentando encontrar sua voz, uma sonoridade original, tentando fugir de soar como o Perfect from Now On, que era a única coisa que eu ouvia àquela altura do campeonato. Dito isso, sempre que ouço o disco sou tomado por lembranças de uma época maravilhosa e muito inocente em que não fazíamos a menor ideia de que chegaríamos em algum lugar.

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Muita gente com quem converso nesta coluna muitas vezes afirma que seu primeiro disco é algo complicado de se ouvir já que foi composto quando o artista era mais jovem e muita coisa ali causa uns arrepios. Há algo nesse álbum que faça você se sentir assim?
Tem algumas coisas ali que me incomodam, nada tão grave assim, mas tínhamos só nove músicas e mandamos um cover dos nossos amigos do Revolutionary Hydra chamado “The Face That Launched 1000 Shits” e por mais que eu fique feliz que tenhamos gravado um cover de amigos, não combina com o disco. [Risos] Mas analisando cada faixa, não tem nada ali que seja negativo, mas com certeza tem uns sons muito sadboy ali — “Sleep Spent”, “Line of Best Fit”. As pessoas nos encaravam como uma banda emo e foram essas músicas que nos botaram nessa.

Este foi o primeiro sem Chris Walla?
Não, quer dizer, ele tocou neste disco, mas avisou que sairia da banda bem no meio da gravação; a turnê de divulgação foi sem ele, a primeira sem ele na estrada conosco.

Como isso afetou a dinâmica da banda?
Sinceramente, ficou um ambiente muito mais harmonioso ali em cima do palco e na estrada. Não digo isso como um ataque ao Chris, mas foi uma coisa de renovar energias. Tínhamos uma relação criativa de 17 anos que àquela altura já tinha se esgotado e sair em turnê já ao final daquele tempo era complicado, como se uma nuvem negra pairasse no ar ao ter que lidar com alguém que não está nada feliz e gostaria de estar fazendo outra coisa. Digo tudo isso, mas me considero sortudo por Chris ter ficado com a gente tanto tempo, ficou bem claro que ele estava infeliz há tempos e fazendo tudo meio que por obrigação conosco, eu reconheço e aprecio isso.

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Não é engraçado como você tenta dar o máximo em estúdio para gravar algo excelente, acaba trabalhando em cima de uma canção inacreditavelmente simples como “I Will Follow You into the Dark” e ela acaba sendo uma das suas faixas mais amadas pelo público?
Com certeza. Tínhamos lançado o Transatlanticism há pouco e Chris havia se comprometido com a banda. Quando assinamos com a Atlantic, dizíamos a nós mesmos e qualquer um que estivesse prestando atenção que nada havia mudado — éramos só quatro caras entrando em estúdio, Chris estava no papel de produtor novamente e estávamos fazendo tudo como sempre havíamos feito, sem pressão nenhuma. Mas a verdade era que tinha pressão demais envolvida ali, e não no sentido de que tínhamos que lançar um hit, coisa que nunca foi nessa maior motivação. Dito isso, creio que as boas faixas de Plans estão entre as minhas favoritas de todas que já compus. Creio que “What Sarah Said” e “I Will Follow You into the Dark” por si só levaram este disco a este ponto tão alto; mesmo assim, creio que o álbum sofreu com o mesmo que The Photo Album: foi tudo bem rápido. Transatlanticism saiu no outono de 2003 e estávamos gravando este no começo de 2005, depois de ter feito uma turnê gigantesca de promoção do Transatlanticism. Eu estava nas últimas ao finalizar as canções finais do disco, então tem alguma coisa ali que eu olho e penso “É, dava pra ter saído melhor”.

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Tipo quais?
“Someday You Will Be Loved” é provavelmente uma das canções que menos gosto.

Sério?
É uma canção meio escrota, não gosto de compor qualquer coisa que não seja 100% honesta, onde tento colocar uma emoção que não é a que sinto no momento, é como se eu mentisse um pouco. Só penso que essa faixa, em termos musicais, era algo que tentamos deixar interessante no estúdio mesmo não sendo uma canção interessante. Fora que, em termos líricos, ela é meio fraca.

E olha, respondendo a primeira parte da pergunta, é bem irônico mesmo que tenhamos passado tanto tempo pra tentar deixar “Soul Meets Body” e “Crooked Teeth” no jeito, pra garantir que seria o nosso melhor, daí essa faixa que é toda acústica, violão e vocal gravados ao vivo, ainda é a maior que já fizemos. É a vida, né?

Ela foi gravada num take só? Você lembra quanto tempo levou pra gravá-la?
Não demorou muito não, deve ter rolado lá pelo segundo ou terceiro take. Eu não sou lá um bom guitarrista, não me dou muito bem com dedilhados. Mas acho que a faixa expressou bem um sentimento, soou bem, e assim que toquei a última nota decidi que era aquilo mesmo, não vamos tocar de novo, é o máximo que dá.

Este álbum foi indicado ao Grammy, ganhou disco de ouro e levou vocês a tocarem no Saturday Night Live, fora outra porrada de reconhecimentos. É dureza chegar num pico desses sabendo que não vai ser assim pra sempre?
Acho que todos sacamos que só cresceríamos mais a partir do Plans se inventássemos de ser o Coldplay e digo isso sem querer desrespeitar a banda de forma alguma — acho que é uma banda ok, gosto de muitas coisas deles. Mas tentar virar o Coldplay seria digno de risadas para nossos fãs, e sei lá, eu não quero trabalhar com super-produtores. Eu não quero ter que fazer isso, não quero nada disso! Só não quero.

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Você não quer ter uma participação com o Akon em um som seu?
Isso, não quero mesmo. E beleza pros caras aí, não tô querendo tirar eles nem nada, é só que sacamos que estávamos numa bolha e só restava cair mesmo. [Risos]

Deve ter sido meio assustador.
É, mas também e talvez isso soe como uma analogia meio escrota, mas se você vê uma determinada ação subindo e acredita que ela vai subir pra sempre, bem, você é meio burro. Em algum momento a coisa irá normalizar. E nós normalizamos num ponto que nos deixou bastante felizes. Nunca paramos pra pensar que o que que seria da banda depois do Plans seria como tocar em estádios lotados. Nunca esperamos nada disso, só achávamos que voltaríamos ao estúdio, gravaríamos outro disco e partiríamos disso aí de novo.

Pegando o gancho do que falávamos há pouco, este disco veio na esteira do sucesso de Plans. Vocês achavam que teriam que superar este disco de alguma forma?
Nós só queríamos fazer algo diferente. Chris chegou com a ideia, “Vamos fazer um disco analógico, fazer soar como fazíamos antes”, e aí que geral topou mesmo. Sinto orgulho de muitas coisas neste álbum, mas ainda mais do fato de que nenhuma das decisões tomadas — escolha de faixas, mixagem, clipes — foram feitas levando em consideração alguma competição com o Plans. Parando pra pensar nele hoje, talvez de maneira subconsciente a gente tenha desejado deixar as coisas mais sossegadas e fazer um disco mais obscuro, em termos sonoros e líricos, que viesse a normalizar nosso público. Porque quando você deixa de ser uma banda independente e suas músicas tocam no rádio em tudo que lugar, você acaba ganhando um monte de fãs que conhecem o disco novo. Essa galera não conhece o material antigo, e tudo bem. Mas sempre que tocávamos nesses locais enormes que envolveram o lançamento desse disco, nunca pensamos “Ah, esses são nossos fãs agora. Sempre que formos pra Bay Area vamos vender 20 mil ingressos porque temos todos estes fãs”. Muito pelo contrário, sacamos que as pessoas haviam ouvido “Soul Meets Body” no rádio ou assistiram The O.C. e assim que aquilo passasse, muita gente ali era um fã ocasional de música que não se interessaria pelo resto do nosso material; eles já tinham ouvido o suficiente. Já tinham aquele disco lá. Então Narrow Stairs saiu numa posição tão alta porque considero um álbum verdadeiramente destemido, em que só fomos lá e tocamos. É um período meio ruim da minha vida e creio que isso se reflete no disco, em que fiz boa parte das composições. Os três discos em que mais compus coisas de qualidade foram Narrow Stairs, Transatlanticism e Thank You for Today.

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Uma coisa pela qual me sinto muito afortunado com esta banda é que temos diversos pontos de acesso. Transatlanticism, claro, é um deles. Photo Album também. Mas We Have the Facts é de longe o maior ponto de acesso para nossos fãs antigos, Airplanes ainda não existia. Se você não morasse numa cidade com uma loja de discos com ele no estoque, não existia mesmo. Já com Facts parecia que havíamos nos tornado uma banda de verdade pro mundo. “Company Calls Epilogue” é ainda uma das minhas três faixas favoritas entre tudo que já compus. Chris e eu fizemos muitas coisas legais na guitarra, toquei bateria no disco todo e acho que ele representa o melhor daquela época, sem sombra de dúvida.

Hoje, o disco é considerado um clássico emo, um rótulo do qual muitas bandas nunca conseguiram escapar. Já o Death Cab parece ter conseguido se livrar disso aí, foi algo proposital?
Falo por mim, mas desde o início não quis ser associado a esse tipo de música porque tinha muita coisa ruim, uma galera do pop punk que ouviu o Pinkerton e resolveu falar de sentimentos. Sério mesmo, escuta as coisas daquela época ali, é como se os caras curtissem NOFX aí ouviram o Pinkerton e pensaram “Cara, eu tenho sentimentos! Sou um moleque branco suburbano que não tem a capacidade intelectual de expressar estes sentimentos de forma interessante então vou falar de tudo do jeito mais direto possível”. E um monte disso aí me dá arrepios. Aí que um monte de gravadora emo ou banda emo queria que a gente tocasse com eles e nós não queríamos isso. Ao menos eu não queria, não queria ser associado àquelas bandas. O interessante é que hoje tocaremos com o Pedro the Lion em Utah, que são nossos amigos há anos, e sinto que eles estavam no mesmo barco que nós. Nos beneficiamos com a galera indo aos nossos shows, mas sempre conseguimos nos desviar dessa parada, uma parada meio Matrix, assim, em que impedimos do rótulo emo nos levar abaixo. Tivemos muita sorte em não sermos tão associados a essa parada, mas sei que muita gente nos vê assim e tudo bem.

Ao compor este disco tivemos um puta estresse com o Chris em outubro de 2001, voltamos pra casa da turnê e sacamos que precisávamos de uma pausa. Era preciso um tempo para fazer outras coisas e foi isso que fizemos. Tive muito tempo pra compôr. Sei que nunca mais terei um ano como 2003. O disco do The Postal Service saiu, Transatlanticism saiu também, dois discos que estarão na minha lápide e tudo bem por mim. Nunca vivi um ano tão inspirado em termos criativos e a prova está aí.

O que estava acontecendo na sua vida que te deu a capacidade de lançar dois dos mais amados discos de indie rock de todos os tempos? Dois em um só ano, é loucura.
Eu tinha uns 25, 26 anos naquela época. Eu finalmente podia só fazer música. Jimmy [Tamborello] me mandava uma música do Postal Service na segunda, eu mexia nela e devolvia já na terça e aí parava pra compor “We Looked Like Giants” na quarta. Tudo rolava muito rápido. Parando pra observar aquela época, eu mataria pra ter um ano como aquele, em que tudo fluía numa boa, considerando que hoje tudo dá mais trabalho. A diferença é que eu estou disposto a dar duro e acredito que nosso disco novo é um de nossos cinco melhores. São faixas excelentes, e acho que finalmente consegui voltar para onde queria estar, em termos de letras.

Como era a dinâmica da banda naquela época?
Transatlanticism teve, dos oito discos que lançamos, o melhor ambiente para se trabalhar. Eu nunca fui desses de acreditar que a melhor arte nasce do sofrimento, do conflito. Não é assim que a banda toca, de forma alguma. Pode até render uma história melhor, mas quando todo mundo está se dando bem e se comunicando, se respeitando quanto ao seus limites e vontades musicais, é aí que as melhores obra surgem. Não quando você está quebrando o pau com todo mundo.

No mesmo ano rolou um boom absurdo do indie rock com discos de bandas como The Shins, Cursive, White Stripes, Strokes. Onde vocês se encaixariam em meio a esse cenário?
Não sei como os caras da banda se sentiam quanto a isso, mas sempre senti como se estivéssemos do lado de fora só observando. Nunca fomos uma banda descolada, raramente alguém pensa em nós quando pensa numa banda descolada. Ainda não o li, mas tem muita gente falando daquele livro Meet Me in the Bathroom. É engraçado estar nessa há tanto tempo que as pessoas já gastam suas palavras sobre uma época da música que nem parece tão distante assim. Foram 15 anos, mas nem parece tudo isso. Rolou White Stripes, Strokes e Yeah Yeah Yeahs, todas bandas muito descoladonas, que se vestiam bem, que andavam com um pessoal bacana. A gente nunca foi assim, pode ser coisa de quem veio do noroeste sei lá, rola todo um complexo de inferioridade aí, éramos uns vagabundos de Bellingham/Seattle só.

A impressão do público te afetou de alguma forma?
Naquele ponto da vida muito provavelmente estava prestando mais atenção em quem não gostava de mim do que quem gostava, o que faz parte desse negócio todo de ter 20 e poucos anos, né? Tem aquele ditado que diz que você passa seus 20 e poucos anos pensando que todos falam de você, os 30 e poucos pensando porque não estão falando de você e nos 40 você percebe que ninguém falava de você. Hoje eu percebo o quão sensível eu era com esse negócio de não gostarem de mim. “Ah, a Pitchfork não me curte, uma revista falou coisas ruins de mim”. E hoje eu digo: quem liga pra essa porra? Não dá pra ficar ligando pra “haters”, que inclusive é uma merda de palavra burra também. Não preste atenção nas pessoas negativas e sim em quem te joga pra cima. Acredito mesmo que criar grandes obras tem a ver com isso.

Esta matéria foi originalmente publicada no NOISEY US.

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