Quase trafiquei seres humanos e outras histórias de caronas infernais

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Sociedade

Quase trafiquei seres humanos e outras histórias de caronas infernais

Sua mãe nunca te falou para não entrar em carros de estranhos?

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE Alemanha .

Andar de carro com estranhos é exatamente o que as mães do mundo todo falaram para a gente nunca fazer, e mesmo assim, vivemos fazendo isso — seja pegando um táxi ou aceitando uma carona. Mas com o surgimento de aplicativos de carona nos últimos anos, entrar no carro de um estranho nunca foi tão fácil e aceito. A maioria dos aplicativos têm um sistema de notas, o que facilita saber se você deve ou não passar algumas horas num espaço pequeno com alguém que cheira à sopa, ou é um assassino em série. Ainda assim, coisas estranhas podem acontecer quando estranhos pegam carona.

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Falamos com cinco pessoas que, graças a diferentes aplicativos e sites, desabrocharam sexualmente, ou evitaram a morte e uma acusação criminal.

Paul, 30 anos, quase foi preso por um crime que não cometeu

Todas as fotos cortesia dos entrevistados.

"Quando cheguei ao ponto combinado, um estacionamento de uma loja de móveis, o lugar estava vazio, além do Volkswagen azul estacionado por lá. Vi um homem e uma mulher no carro, e primeiro achei que aquele era o cara que eu devia buscar. Mas quando fizemos contato visual, eles rapidamente desviaram o olhar e foram estacionar em outro lugar. Foi então que vi o cara que eu devia encontrar chegando, e enquanto ele se aproximava, saí para dizer oi. Segundos depois, estávamos cercados por policiais armados, apontando as armas para a minha cabeça.

Fui algemado e jogado contra o meu carro. Eram uns 12 policiais, incluindo as duas pessoas que vi no Volkswagen. Eu disse a eles que não tinha ideia de quem era o outro cara, mas eles não acreditaram. Eles vasculharam meu carro e me interrogaram por 40 minutos antes que eu conseguisse mostrar o pedido de carona que tinha recebido dele, provando que era inocente. Quase uma hora depois, um policial finalmente tirou minhas algemas e explicou que o cara que tinha me contratado era um criminoso perigoso, e que eu me encaixava na descrição do cúmplice dele. Cinco dias antes, os dois tinham assaltado e espancado um casal de idosos — roubando mais de mil dólares. Para encontrar os dois, a polícia estava observando o suspeito e monitorando seu celular.

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Não culpo a polícia pelo que aconteceu, mas nunca vou esquecer o dia em que fui algemado na frente de uma loja de móveis numa manhã de domingo. Quando está olhando para o cano de uma arma, você não consegue deixar de se sentir culpado, mesmo sabendo que não fez nada de errado. Os policiais do Volkswagen se desculparam comigo depois, mas no final acho que tive sorte — eu poderia ter sido a próxima vítima do cara."

Jasmin*, 24 anos, encontrou amantes ao pegar carona com estranhos

"Moro e estudo em Bremen e sempre viajo para Frankfurt para ver minha família. Com a passagem de trem cada vez mais cara, comecei a usar diferentes aplicativos e sites de carona. Primeiro, achei horrível ter que passar uma hora e meia apertada num carro, tendo que conversar qualquer coisa com estranhos. Mas sem dinheiro para o trem, eu não tinha escolha.

Uma vez, quando eu estava voltando para Bremen, peguei carona com esse cara chamado Paule. Gostei dele assim que entrei no seu Ford vermelho velho. Éramos só nós dois, mas logo começamos a conversar. Ele também estudava em Bremen e estava escrevendo sua tese de bacharelado.

No meio da jornada, estava claro que eu ia passar a noite com ele. Passamos alguns dias juntos, e, mesmo sabendo que não ia dar em nada mais sério, foi muito excitante.

E não foi a última vez que isso aconteceu — pegar carona pode ser particularmente divertido na temporada de férias, quando os outros estudantes também estão viajando. Já tive que ligar para minha mãe algumas vezes dizendo que meu carro atrasou, quando na verdade eu tinha acabado de fazer um pit stop para dar uma rapidinha com alguém com quem peguei carona."

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*O nome foi mudado.

Moritz, 30 anos, chegou muito perto de traficar seres humanos sem saber

"Durante o verão de 2014, um amigo e eu decidimos fazer uma viagem pela Europa na minha van. Antes de partirmos, postei na internet meu roteiro de volta de Budapeste a Munique e aceitei o pedido de um cara que queria reservar os cinco assentos vagos da van.

Antes de começar a viagem de volta, eu não conseguia lembrar o endereço que o cara tinha me dado para buscá-lo, então fui ler de novo o histórico de mensagens, mas ele tinha sido apagado. Mandei mensagem para ele, mas não recebi resposta. Quando anunciei os assentos de novo, instantaneamente duas pessoas entraram em contato. Elas não pareciam legais — o primeiro recusei por princípios porque ele queria pagar o dobro do que eu estava pedindo, enquanto o outro cara não apareceu no encontro que marquei.

Felizmente, duas garotas entraram em contato e nós quatro fomos para Munique. Três dias depois, recebi um e-mail do site de caronas dizendo que o cara que tinha reservado os cinco lugares na minha van na verdade era um traficante de pessoas. Nossas mensagens tinham sumido porque eles o deletaram e bloquearam sua conta. Denunciei os outros dois caras para o site, e descobri que eles também traficavam pessoas.

Tive muita sorte dos caras não terem aparecido — primeiro porque não quero contribuir com a indústria de tráfico humano, claro, mas também porque poderia ter sido preso pelo que eles estavam fazendo."

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Christine, 34 anos, pegou carona com um motorista obscenamente bêbado

"Era um dia quente de verão em Berlim quando entrei no carro com um casal. Nossa jornada para Munique começou muito bem; eles abaixaram a capota e estávamos todos conversando.

Depois de um tempo, paramos para pegar outra passageira. Depois de 20 minutos esperando no lugar combinado, ficou claro que ela não ia aparecer. Por algum motivo, o casal não levou isso numa boa — para dizer o mínimo.

O cara parou num posto de gasolina enquanto a parceira bolava um beck e abria a primeira de muitas garrafas de cerveja. A capota continuou abaixada enquanto chegávamos a 170 km/h na estrada. Logo eu estava coberta de suor frio, vendo meu motorista ficar cada vez mais chapado.

Mesmo sentindo que minha cabeça ia ser arrancada pelo vento e sem saber quanto mais o motorista planejava beber, eu estava com medo de pedir para me deixarem no próximo posto de serviço. Eu queria focar na chegada a Munique — viva de preferência —, mas a raiva do casal não diminuiu. Juntos, eles escreveram uma mensagem de texto para a passageira que não tinha aparecido: "Sua puta, espero que seus ovários congelem e sua bunda queime no inferno".

Felizmente chegamos a Munique inteiros. Às vezes, quando tive um dia difícil e tenho muito que reclamar, lembro que saí daquele carro viva, e preciso ser grata por cada dia que tenho neste mundo."

Demi, 26 anos, ficou sabendo mais do que queria

"Eu tinha planejado uma viagem divertida a Berlim, e o motorista parecia bem normal no começo. Mas depois de alguns minutos de conversa fiada, perguntei se ele fazia a viagem para Berlim com frequência, e foi aí que tudo começou.

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Ele tinha feito muita grana com informática, e tinha acabado de conhecer uma mulher por quem ele tinha ficado louco. 'Ela é uma treinadora de estimulação de orgasmo!', ele disse, orgulhoso. Durante as sessões dela, os homens recebiam instruções para massagear lentamente o clítoris da parceira por 15 minutos. 'Não é sobre o clímax', fui obrigado a aprender, 'mas sobre aproveitar o processo juntos'.

Ele continuou dizendo que estava num relacionamento aberto com a namorada e que eles contavam tudo um para o outro. 'Me incomoda quando ela diz que fez alguma coisa com outra pessoa, mas também me excita muito.'

Depois de várias histórias sobre a vida sexual dele, achei que eu estava salvo quando ele pegou outro passageiro em Augsburgo. Estranhamente, esse cara também trabalhava com TI e parecia muito com o motorista. Depois de uns 10 minutos, ele fez a mesma pergunta que eu sobre Berlim e recebeu a mesma resposta. Diferente de mim, o cara novo ficou fascinado. 'Estive procurando alguém como você há anos', ele disse. Ele continuou contando que estava tentando redescobrir sua sexualidade e ser mais aberto com novas pessoas. Não demorou muito para o cara novo começar a contar que tinha feito troca-troca com a namorada, um amigo e a namorada do amigo. A namorada do amigo tinha achado a coisa perturbadora demais e terminou com ele. Desde então, ele estava 'emprestando' sua namorada para o amigo.

Quando chegamos, o motorista nos convidou para sair com ele e a namorada no dia seguinte. Me senti honrado, mas percebi que, sexualmente, eu não estava na mesma onda que eles. Então recusei educadamente."

Tradução do inglês por Marina Schnoor.

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