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Porno

Conversamos com a atriz pornô espanhola mais buscada no PornHub

Apolonia Lapiedra faz mais sucesso nas buscas que a expressão "MILF".
Todas as imagens são cortesia de Apolonia Lapiedra

É estranho entrevistar alguém que você já viu transar. É o que passa pela minha cabeça logo antes de ligar para Apolonia Lapiedra, a atriz pornô cujo nome subiu mais de 900% no ranking do site PornHub em 2017, ultrapassando termos como 'MILF' ou 'sexo em espanhol'.

Mas esqueço tudo isso quando ela atende o telefone e fala comigo com a mesma naturalidade sobre colher cebolas em Albacete, sua cidade natal, ou sobre seu primeiro anal, sobre os prêmios Ninfa que já ganhou — o grande prêmio da pornografia na Espanha — ou sobre a infância difícil que a levou a morar em um orfanato.

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Esta é a história de Samantha, uma garota do povoado de Hellín que trabalhava no campo, e de como ela se transformou em Apolonia, a mulher mais desejada da indústria pornográfica espanhola.

VICE: Oi, Apolonia. Seu nome é muito tradicional e você é de Albacete, até que combina bastante. Mas esse não é o seu verdadeiro nome, é?
Apolonia: Não, meu verdadeiro nome é Samantha. Eu escolhi Apolonia por causa de uma personagem d’O Poderoso Chefão, que é um filme que eu adoro. Eu me identificava muito com ela, com o físico dela. Ela tem peitos assim pequenos e arrebitados, e o rosto redondo. É que antes a minha cara era mais redondinha.

Eu li que você trabalhou no campo desde muito nova. Como foi crescer naquele povoado albacetenho?
A minha infância e a minha adolescência não foram muito fáceis. Eu era uma garota muito tímida e não vivia a minha sexualidade livremente. Eu me reprimia, era assexual, acho que justamente por causa da minha cidade, pela repressão que havia ali, as panelinhas… É um lugar onde tudo se sabe e todo mundo fofoca sobre tudo.

"Eu via como eles falavam das garotas com quem eles transavam e pensava: 'Vocês não vão falar assim de mim'."

Eu tinha um grupo de amigos homens, sempre me dei melhor com homens do que com mulheres. E eu via como eles falavam de certas garotas, diziam que tinham comido essa ou aquela outra, e eu pensava: “Vocês não vão falar assim de mim”. Então eu praticamente não tinha relações sexuais.

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E como você deu esse passo? Você passou de quase não transar a fazer isso profissionalmente em frente às câmeras.
Foi quando eu conheci o Ramiro. Nós nos apaixonamos logo de cara: uma semana depois já estávamos morando juntos. Foi só aí que eu comecei a gostar de sexo, antes eu só tinha prazer com a masturbação, e assim veio a ideia de fazer pornografia.

Minha primeira cena foi com o Pablo Ferrari, pra Mofos, que é uma produtora norte-americana. Vai fez três anos no dia 14 de fevereiro. A experiência foi muito boa, por isso eu decidi continuar. E não acreditei quando vi o quanto eles tinham me pagado. Pensei: "Nossa, isso é mais do que uma caixa de supermercado ganha em um mês".

Como a sua vida mudou desde aquele 14 de fevereiro de 2015?
Mudou muito. Aliás, agora quando as coisas estão indo muito bem, eu fico com a sensação de que algo ruim vai acontecer, de que tem que acontecer, porque não é normal para mim estar tão bem. Eu trabalhei na ilha de Tabarca desde os 14 anos, em lojas de roupa de segunda a domingo, já colhi cebolas — e uma vez um desgraçado não pagou nenhum de nós pelo serviço —, tomates, amêndoas… a minha vida era muito diferente antes de fazer pornografia.

Por motivos que não vêm ao caso, meus pais não foram tão presentes na minha infância quanto deveriam. Quando eu tinha 12 anos, minha avó, que era quem eu mais amava, morreu. Aquilo foi muito difícil para mim e acabei indo parar em um orfanato. Eu tive uma infância e uma adolescência muito difíceis, tentei me matar várias vezes, então o que estou vivendo agora é um sonho.

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Como é voltar à sua cidade, Hellín, agora?
Desde que comecei a trabalhar na indústria só voltei uma vez. Fui para a casa dos meus tios e praticamente não saí de casa. Foi no Natal, fui para ver meus tios e primos.

"Eu tive uma infância e uma adolescência muito difíceis, tentei me matar várias vezes, então o que estou vivendo agora é um sonho."

Você assistia à pornografia quando ainda não trabalhava na indústria?
Imagina! Na minha cidade não tinha cobertura, e além disso eu não tinha internet. Eu me masturbava, mas não via pornografia. E também quase não ia ao cinema, porque eu não tinha dinheiro. Agora eu assisto a vídeos pornô, claro, e também vou muito mais ao cinema. Quando eu era pequena não conhecia nada disso, não era normal para mim. Durante a minha infância eu não ia ao teatro, nem ao teatro nem a lugar nenhum, só ia à feira da cidade. Às vezes eu nem tinha o que comer.

Que tipo de pornografia você curte atualmente? A sede da produtora da Erika Lust, por exemplo, fica aí em Barcelona, onde você mora atualmente.
Sim, eu a conheço, mas nunca trabalhei com ela nem vi nenhum de seus vídeos. Na indústria atual, eu gosto muito do trabalho do Greg Lansky, gosto do Dorcel e serei eternamente agradecida ao Cumlouder, que me ofereceu a minha primeira oportunidade. Foi com eles que eu fiz o reality da Apolonia.

Qual é a pior parte das filmagens, aquelas coisas que ninguém sabe que acontecem?
O pior é saber a hora que você vai entrar, mas não a hora que vai sair. Você pode chegar a trabalhar 11, 12 horas direto. E não é só gravar as cenas de sexo, isso é o mais simples, também tem a dramatização, o roteiro que serve de fio condutor, e toda a preparação de atores. Essa é a parte mais difícil para mim. Quando eu comecei a fazer pornografia, eu não conseguia nem dizer "Oi, eu sou a Apolonia". Eu começava a tremer.

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O que você menos gosta no seu trabalho é preparar a parte da dramatização, do roteiro?
É o que dá mais trabalho, mas não é o que eu menos gosto. O que eu menos gosto é o frio (risos). Inclusive, isso está entre as minhas condições. Todo ator e atriz pornô estabelece suas condições para gravar cenas (com quem queremos contracenar, que práticas aceitamos fazer…). Uma das minhas são as condições climáticas.

Quando você vê seus primeiros vídeos, de 2015, percebe alguma mudança, sente que você está diferente?
Sim, claro. Eu sempre fui uma pessoa muito tímida e quando comecei estava muito mais inibida, agora faço tudo com mais naturalidade. Outra coisa que mudou é que agora eu me divirto mais em cena. Antes os anais por exemplo doíam, porque o meu buraco era muito pequeno, agora não doem. E também estou fazendo squirts, antes eu não fazia.

Este ano as buscas pelo seu nome subiram 900% no PornHub, ultrapassando termos como “MILF”. Você é a atriz pornô mais seguida no Twitter espanhol. Você também já foi a vencedora de vários prêmios Ninfa desde que começou. O que você sente ao ver que milhões de pessoas assistem aos seus vídeos e que você recebe prêmios por eles?
Eu fico surpresa e entusiasmada. É incrível saber que eu bati o recorde de reproduções na Espanha, nunca imaginei que isso aconteceria.

apolonia lapiedra

Imagen cortesía de Apolonia Lapiedra

Você também já trabalhou fora da Espanha. A indústria espanhola é diferente do resto da Europa?
Gravar fora daqui é uma experiência muito legal, mas você percebe que as pessoas são mais frias, que te tratam diferente. O lado bom é que tem mais oferta de trabalho. Todos os dias você grava alguma coisa. Na Espanha ainda tem pouco mercado, mesmo com a fama de Barcelona de ser a capital espanhola da pornografia.

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Tanto você como o Jordi, O Garoto Rola, nasceram em Castela-Mancha. Existe algum talento especial para a pornografia naquela região?
Claro que sim, viva a cultura de Castela! E ainda por cima o Jordi é maravilhoso. Nós trabalhamos juntos e ele é muito profissional.

"Eu acho que, assim como ensinam nas escolas sobre higiene e saúde sexual, deveriam também contar que o que acontece na pornografia é pura fantasia."

Há pouco tempo eu conversei com uma sexóloga que me contou que cada vez ela tem atendido mais adolescentes com problemas sexuais decorrentes da pornografia. Meninos que comparam seu membro com os da pornografia e ficam complexados, meninas que não conseguem transar se não estiverem perfeitamente depiladas… Você acha que a pornografia deveria levar isso em conta e assumir sua responsabilidade social?
Eu acho que quando nós assistimos a pornografia, deveríamos saber que é ficção, que são fantasias. Ninguém acredita nos filmes, ninguém acha que tudo o que acontece ali é cem por cento real. Eu acho que deveriam dar aulas de educação sexual nas escolas, e assim como ensinam sobre higiene deveriam também contar que o que acontece na pornografia é pura fantasia.

Já aconteceu de alguém misturar o seu trabalho com quem você é? Alguém já te tratou de determinada maneira porque viu seus vídeos ou já pressupôs que você gosta muito de sexo só por ter essa profissão?
Uma vez um cara me encheu muito o saco. Eu estava com três amigos e ele começou a falar para eu ir embora com ele, perguntava aonde eu estava indo… Mas normalmente as pessoas são muito simpáticas comigo, simplesmente me param na rua e pedem fotos ou me cumprimentam. Já aconteceu de eu ser parada por famílias inteiras, casais com filhos. Aquele cara foi uma exceção.

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Você já teve alguma experiência ruim durante as filmagens? É comum ouvir que a indústria pornográfica não trata as mulheres como deveria…
Ninguém nunca me tratou mal, pelo contrário. Eu já senti muita vergonha, isso sim, porque sou muito tímida, se bem que agora eu me solto mais. Me lembro de uma das minhas primeiras cenas, em que eu tinha que rebolar. Tinha muita gente olhando e eu estava muito envergonhada, mas acabei indo adiante. Afinal, é preciso ir adiante, esforçar-se, ser corajosa, como em qualquer trabalho.

Eu também lembro de um dia em que estava menstruada — geralmente quando a gente se lembra, coloca lá dentro umas esponjas absorventes — e gravei três sequências. O diretor até disse para esquecermos a última, mas eu quis fazer.

Embora não haja casos registrados na Espanha, nos últimos meses várias atrizes pornô se suicidaram. Essa indústria provoca danos psicológicos? Você acha que a morte dessas mulheres pode estar relacionada à profissão delas?
Acho que o que aconteceu com elas não tem a ver com danos psicológicos, ou pelo menos eu não sinto que este trabalho me afeta psicologicamente. Acho que pode acontecer de alguns produtores darem uma de espertos e tentarem abusar de seu poder. Mas as atrizes podem sempre se defender. Ninguém coloca uma arma na sua cabeça para você fazer nada, você tem sempre a possibilidade de se defender.

"Nós, mulheres que consumimos pornografia, também gostamos de ver cenas em que somos chupadas, e não só por outras mulheres, por homens também."

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Você acha que a indústria pornográfica coisifica a mulher, que foca no prazer masculino e para isso nos relega à categoria de objeto?
Não, de jeito nenhum. Às vezes criticam, por exemplo, o fato de nos baterem ou chicotearem, mas de vez em quando eu também bato no pau dos caras nos vídeos. São fantasias, a pornografia é como o cinema, não é real.

Certo, mas o que eu quero dizer é por que se chupa mais pau do que buceta no pornô mainstream.
Eu me faço a mesma pergunta. Uma vez em uma cena eu parei e perguntei exatamente isso. Nós, mulheres que consumimos pornografia, também gostamos de ver cenas em que somos chupadas, e não só por outras mulheres, por homens também.

E você não tem vontade de dirigir um vídeo para que isso mude?
Eu já faço isso. Às vezes vou para trás das câmeras. É uma coisa que adoro também. Quando faço isso as pessoas me chamam de "chefe" e eu morro de rir, me divirto tanto atuando quanto dirigindo.

Amarna Miller, uma das atrizes pornô espanholas mais conhecidas internacionalmente, ficou famosa por seu ativismo feminista em paralelo ao seu trabalho na indústria pornográfica. Nas suas redes sociais, você não se posiciona muito em relação a isso. Você se considera feminista?
Não. Eu acredito que as mulheres e os homens são iguais, acredito na igualdade entre nós, mas também acho que muitas defensoras do feminismo exageram em relação a algumas coisas, então eu não me identifico com o termo.

O que você diria àquela garota adolescente que ainda não se chamava Apolonia e que dormia em um orfanato ou colhia cebolas e tomates?
Eu diria a ela para não se render, para lutar.

Matéria originalmente publicada na VICE Espanha.
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