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Sexo

Cinco artistas do pornô compartilham suas histórias de 'sair do armário'

'Contar pra minha mãe que eu trabalhava na indústria do pornô é uma das coisas mais difíceis que já fiz.'
MS
Traduzido por Marina Schnoor
Madalena Maltez
Traduzido por Madalena Maltez
Paulita Porn Stars Coming Out Stories
Foto: Lustery.

Em 2016 a atriz pornô Jiz Lee lançou uma antologia intitulada Coming Out Like A Porn Star, que recebeu boas críticas. O livro contava histórias profundamente pessoais e muitas vezes hilárias; essas pessoas têm que suportar o estigma, mas essas histórias falam de resiliência e do valor do pornô.

Muita coisa mudou desde 2016, mas sites como o Lustery e MakeLoveNotPorn hospedam vídeos amadores progressistas que provam que o pornô pode ser realista e íntimo. Diretoras como Erika Lust estão fazendo filmes incríveis que provam que o sexo pode ter valor artístico. Mas o estigma ainda precisa ser minado, então falamos com cinco artistas do pornô com experiências muito diferentes para discutir o que aconteceu quando eles “se assumiram”.

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Andre: “Minha mãe chorou e insistiu que eu estava me colocando em 'perigo'.”

Andre Porn Stars Chris Jay

Foto: Chris Jay

Quando assumi para minha família que fazia trabalho sexual na faculdade, eles tiveram respostas relativamente previsíveis. Minha irmã mais nova me apoiou, mas o resto da família se recusou a reconhecer o que eu tinha dito ou simplesmente expressaram desgosto. Eu também estava me assumindo como queer e não-monogâmico; e alguns parentes viram essas coisas como uma rebelião insensível ou só uma fase. Minha mãe chorou e insistiu que eu estava me colocando em perigo, mesmo não conseguindo articular qual era esse “perigo”.

Depois de alguns anos, lembro de estar no meu apartamento na Califórnia depois de me mudar para 5 mil quilômetros de distância da minha família – uma benção, com certeza. Eu estava filmando pornô há mais de um ano, então, esperando que minha mãe tivesse aceitado, liguei pra ela. Contei como eu estava feliz e saudável; que eu tinha conhecido um grupo de artistas lindos e poderosos, muitos deles ativistas de direitos humanos como eu; e que estava ganhando bem. Eu disse a ela que tinha orgulho. E que queria que ela também se orgulhasse.

Nada disso importou. Depois de anos esperando ser tratado com o carinho, compaixão e respeito que eu merecia, cortei laços com a minha família em 2017. Foi a melhor decisão que já tomei. Na verdade, queria ter feito isso antes. Agora estou disponível para conversar com colegas da indústria pornô; aqueles que estão sofrendo para se desligarem de famílias que não os apoiam.

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Paulita: “Você nunca sabe como as pessoas vão reagir.”

Paulita Porn Stars Coming Out

Foto: Lustery

“Se assumir” é um processo contínuo. Comecei no pornô quase dez anos atrás, e agora trabalho em tempo integral como produtora – juntei milhares de histórias de “se assumir”. Tem o cenário comum de bar, quando as pessoas perguntam o que você faz. Respondo casualmente: “Pornô!”. Tenho sorte de morar na bolha de Berlim, porque as pessoas tendem a reagir de maneira positiva. Elas ficam curiosas e querem saber mais, o que é ótimo – apesar de nem sempre ter vontade de explicar minha existência.

No geral, as pessoas falam mais abertamente sobre sexo em público. Mas você nunca sabe como uma pessoa vai reagir – você tem sempre que avaliar a situação. Por mais casualmente que você enquadre, uma carreira no pornô não é “normal”, e às vezes até pessoas bem-intencionadas podem reagir de maneira infantil.

Contar pra minha mãe é uma das coisas mais difíceis que já fiz. Nos amamos muitos, talvez por isso ter confrontado as preocupações, julgamento e falta de aceitação dela foi tão doloroso, tanto pra ela quanto pra mim. Nos últimos anos tivemos muitas conversas de “sair do armário”. Ela faz perguntas – às vezes choramos nos braços uma da outra. A última vez que exibiram um filme que eu tinha produzido na Espanha, ela quis assistir. “Mas é pornô”, eu disse. “Você sabe.” “Eu sei”, ela respondeu – “então devo ter idade suficiente para assistir!”.

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NB Jupiter: “Meu irmão mais novo literalmente deu de ombros e disse: 'legal'. Minha mãe tinha muitas perguntas.”

NB Jupiter Porn Stars Coming Out

Foto cortesia de NB Jupiter

Comecei a fazer trabalho sexual aos 18 anos, quando entrei para a universidade. Como uma pessoa queer, deficiente e vivendo com transtornos mentais, parecia um bom jeito de me sustentar e manter minha independência enquanto investia na minha paixão como artista e criadora. Me apaixonei pela comunidade e o trabalho, e pretendo continuar depois de me formar.

Me assumi primeiro para meu irmão mais novo, que literalmente deu de ombros e disse: “legal”. Foi um selo de aprovação dele! Seis meses depois, contei pra minha mãe. Tenho sorte por sermos muito próximas, mas ela também vive com ansiedade. Ela tinha muitas perguntas, então expliquei o que estava fazendo e ela disse que enquanto eu não estivesse fazendo encontros (tipo trabalhar como escort), ela teria orgulho de mim. Serviço completo é algo que sei que não posso oferecer, então fiz a promessa de manter meu trabalho apenas na internet.

Dois anos depois liguei pro meu pai, que queria assistir minha performance solo “From My Bedroom”, e descrevi ansiosamente meu trabalho. Uma modelo transgênero que vende clipes na internet – usando cosplay? Pra ele, parecia ótimo! Fiquei muito feliz. Sei que tenho sorte; o apoio e amor incondicional dos meus pais me permitem criar performances carregadas de ativismo. Tenho muita esperança para o futuro; de poder usar minha voz para ajudar outros Trabalhadores Sexuais (sim, merecemos as maiúsculas!) e garantir a igualdade que merecemos.

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Mercy: “O conselho da minha mãe foi que se você tem orgulho do que faz, vou te apoiar.”

Mercy Porn Stars Coming Out

Foto cortesia de Mercy

Comecei a fazer trabalho sexual quando tinha 18 anos. Conheci um fotógrafo num bar kink local que queria fazer fotos de bondage com cordas. Acabei gostando muito, mas não sabia como ia me sentir tendo meus peitos na internet pra sempre, então perguntei pra minha mãe. Ela foi stripper nos anos 90; ela sabe que trabalho sexual pode ser uma bosta, mas que também pode ser empoderador e divertido. O conselho dela foi: desde que você se orgulhe do que faz, fico feliz em te apoiar. Foi maravilhoso!

Meus pais são separados, então enquanto o lado da minha mãe estava OK com isso, senti que o lado do meu pai não se sentiria do mesmo jeito. Uma das minhas irmãs descobriu um dois anos atrás; ela viu uma foto na internet por acidente. Nas palavras dela, ela ficou “mortificada”. Ela começou a chorar e nem conseguia falar comigo. Eles ameaçaram me renegar se eu não parasse; eles queriam que eu abandonasse meu trabalho de seis anos sem mostrar nenhuma preocupação ou oferecer qualquer ajuda.

Mais tarde meu pai disse que não aprovava, mas que tinha orgulho de mim. Ainda assim, ele se recusa a me defender; ele me aconselhou a continuar tentando falar com as minhas irmãs. Percebi que ele basicamente estava me dizendo para continuar a aceitar abuso verbal, desrespeito e ser tratada como um ser humano menor. Não posso aceitar isso. A última vez que nos falamos, eu disse que ele podia me defender ou me deixar em paz. Acho que ele escolheu me deixar em paz.

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Siri: “Fui exposta no começo da minha carreira e a reação dos meus pais foi a parte mais difícil.”

Siri Porn Stars Coming Out

Foto via VNA Girls

Menti pra minha família quando me mudei para Los Angeles. Eu planeja contar a eles quando tivesse sucesso na indústria do pornô, mas as coisas não saíram como eu tinha planejado. Fui exposta logo no começo, e a reação dos meus pais foi a parte mais difícil; eles questionaram minha sanidade, e em certo ponto até disseram que sentiam como se eu tivesse morrido.

Tive alguns anos recompensadores e de sucesso como artista, mas contato mínimo com a minha família. Eles são a principal razão para eu ter me aposentado – estar com eles no final das contas era mais importante. Me aposentei quatro anos atrás, mas eles ainda não reconhecem ou entendem minhas experiências. Também encarei estigma em outras partes da minha vida, de trabalho a romance até comentários inapropriados, mesmo de profissionais de saúde.

Precisamos melhorar como sociedade para reconhecer que trabalho sexual é trabalho; que trabalhadores sexuais são dignos de apoio, amor e aceitação. Sou privilegiada de viver uma vida “civil” relativamente normal agora, e a maioria das pessoas só tem muitas perguntas. Então aproveito toda oportunidade para ter um diálogo significativo; acho que cada uma dessas discussões ajuda a construir um entendimento melhor, e trazer mais segurança para trabalhadores sexuais.

@jake2103

Matéria originalmente publicada na VICE UK.

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