Folia e terror: um fotógrafo entre os bate-bolas do Rio de Janeiro
Foto: Bruno Falcão

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Folia e terror: um fotógrafo entre os bate-bolas do Rio de Janeiro

O fotógrafo Bruno Falcão passou seis anos registrando os bate-bolas, também conhecidos como clóvis.

Uma vez arrancada do animal, a bexiga de boi ou de porco era inflada com ar e colocada ao sol para ganhar resistência. Sua função durante o Carnaval nos subúrbios do Rio de Janeiro na década de 30 era aterrorizar quem estivesse por perto. Presos em varas improvisadas, os órgãos eram batidos no chão, fazendo um barulho forte e provocando cenas nauseantes para os espectadores que, na maioria das vezes, corriam assustados. E assim viviam os bate-bolas – ou clóvis. Homens que, durante um ano inteiro, se dedicam à feitura das fantasias de palhaços aterrorizantes e, ao som de fogos de artifício, saem pelos seus bairros para o festejo. Anteriormente, a VICE já contou essa história de folia e terror.

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Hoje, as bexigas de animais foram trocadas por outros tipos de bola – ainda bem. Mesmo assim, muita gente continua morrendo de medo desses caras fantasiados. Principalmente as crianças.

Foto: Bruno Falcão

Nunca foi o caso do fotógrafo carioca Bruno Falcão, que, quando pequeno, se vestia de clóvis. Já adulto, resolveu explorar novamente o assunto. "Em 2011, eu estava procurando um tema para realizar um grande projeto e não encontrei nada melhor do que os bate-bolas. Não só pela beleza mas também pela importância cultural", explica.

De lá pra cá, foram seis anos convivendo, entrevistando e fotografando os clóvis. O trabalho intenso e de longa duração se consolidou em um e-book, Bate-bolas contemporâneos, lançado em janeiro deste ano. O livro condensa as 273 melhores fotos entre as mais de 15 mil clicadas. Um documentário sobre o tema ainda está em processo de montagem.

Foto: Bruno Falcão

VIOLÊNCIA

Para Falcão, os clóvis entram na mira dos holofotes midiáticos somente quando os festejos terminam em brigas e morte. "A 'grande' mídia só cobre o sambódromo e os blocos da zona sul. [Ela] só aparece no subúrbio em momento ruim", justifica o profissional, que, apesar de defender seu objeto de estudo, já passou perrengues frequentando regiões menos abastadas. "Tive um problema quando fotografava dentro de uma comunidade e um traficante com fuzil me enquadrou", relata. "Por sorte, ele foi muito bem educado, chegou na boa. Só quis ver as fotos."

Foto: Bruno Falcão

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Uma coisa é fato: os bate-bolas levam o Carnaval muito a sério. E a rivalidade entre as diversas turmas muitas vezes aguça ainda mais a violência. Pessoas feridas, brigas e até mesmo homicídios são recorrentes, mas estão longe de ser o cerne dessa cultura. Para Bruno, que conheceu inúmeros pais de famílias empenhados o ano todo em conseguir bancar a própria fantasia e também a dos filhos adolescentes, "a grande maioria é do bem". A competitividade entre as turmas, que levam nomes como Enigma, Havita, Aventura, Pirambola e Magia, é um fato. "Existe mais vaidade [entre os clóvis] do que nas semanas de moda em Paris e Milão juntas", brinca Falcão. "Eles dão o máximo de si o ano inteiro para fazer a fantasia mais linda possível, se apresentar ao público e provocar inveja nos rivais. Procuram problemas nas fantasias das outras turmas, tirando sarro."

Foto: Bruno Falcão

Bruno afirma que a concorrência é tão grande que existem turmas que não se cruzam. "Não pode nem falar o nome delas na frente dos oponentes."

Apesar de todo o esforço e de terem sido considerados Patrimônio Cultural Carioca em 2012, os bate-bolas ainda passam despercebidos e marginalizados perante o Carnaval brasileiro. "Discriminam os bate-bolas, mas acham o Halloween lindo, chique", compara o fotógrafo.

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