Um pouco de luz em tempos de trevas: o melhor da ciência em 2017
Marcha pela Ciência realizada em Porto Alegre no mês de março. Crédito: Marco Roncattm

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Retrospectiva 2017

Um pouco de luz em tempos de trevas: o melhor da ciência em 2017

Eis uma retrospectiva que fala mais sobre seu futuro do que o que já foi.

O futuro é maravilhoso, o futuro é assustador.

O lema do Motherboard nunca pareceu tão atual a nós, brasileiros, quanto em 2017. Sofremos uma caralhada de revezes na área científica como cortes de orçamento, fim de bolsas e a cristalização de uma horda sem pensamento crítico. Ainda assim, vimos cientistas botarem seus jalecos e irem às ruas para protestar; testemunhamos experimentos inovadores na área de lisérgicos; falamos com caras empenhados em resolver problemas do futuro, como a criptografia quântica, e também imbróglios do presente, a exemplo da dependência química na Cracolândia, em São Paulo.

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Foi um ano difícil, com muitas forças jogando contra, mas também foi um ano bom, cheio de esperança. Isso porque a ciência é e sempre será feita por pessoas que também vão na contramão do pensamento corrente. Um dos nossos orgulhos é divulgar algumas delas e, assim, trazer um pouco de luz ao prato de trevas e intolerância que se tornou o mundo pós-Trump. Com a ajuda de nossos irmãos motherboarders espalhados pelo globo, trouxemos, ao longo de 2017, muitas boas novas sobre o futuro ambíguo que se põe no horizonte.

Poderíamos gastar parágrafos falando de matérias interessantes e que, modéstia à parte, pautamos antes de muitos veículos tradicionais, mas nossa retrospectiva é, além de um serviço, sobre o que tratamos todos os dias: o futuro.

Nessa primeira parte de nossa exposição sobre o que passou – a outra, sobre tecnologias e hacks, sairá na semana que vem –, separamos os assuntos científicos que serão muito falados ao longo de 2018. Pode ser um bom caminho para você se inteirar e se aprofundar sobre os temas dentro e fora de Motherboard. Também pode ser ótimo para você relembrar e, quem sabe, nos sugerir mais explicações e reportagens.

Ainda que algumas dessas áreas pareçam sombrias como um episódio daquela série que você sabe muito bem qual, vale lembrar que elas são feitas e analisadas por humanos. Sempre poderemos reverter a lógica das coisas, por maiores que sejam as forças contrárias. É o que esperamos para o futuro, por sinal.

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Confira, abaixo, alguns temas bem cabeça para abordar com sua família nas festas de fim de ano. Ah, e continue assim, ok? Ok.

Edição genética, o assunto da vez

Lembra daquele papo de que, no futuro, seria possível selecionar características genéticas humanos em um embrião humano? Pois bem, o futuro chegou em 2017. Cientistas estão começando a editar genes humanos em laboratório e, bem, estamos ainda atordoados com tantas possibilidades.

A técnica que tornou isso possível é o CRISPR, que já foi várias vezes comparada à função de copiar e colar dos processadores de texto. Além de ser uma técnica extremamente poderosa, é tida como simples e pode realizar alterações no DNA de plantas e animais.

Em teoria, ela pode ser a chave para a cura de doenças como o HIV e a distrofia muscular. Mas também pode criar uma indústria de seleção de certas características que julgamos desejáveis. O futuro, a partir disso, não seria tão animador. Deste modo, afinal, apenas os ricos teriam seus filhos perfeitos, enquanto as imperfeições e acidentes genéticos seriam destinados apenas aos mais pobres.

Embora adoremos teorizar, não sabemos quais são as consequências reais que o uso desse tipo de técnicas em humanos pode gerar. Uma coisa é certa: esta vai ser uma das grandes discussões de 2018 — nem que seja na mesa do bar.

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O terror e a esperança quântica

Não é de hoje que sabemos que, quando um computador quântico grande o bastante for construído, o terror criptográfico se instaurará. Em resumo, essa maquininha ultra potente seria capaz de burlar TODAS as senhas que usamos hoje. Seria, digamos, a chave-mestra do hacking.

A pesquisa para desenvolver esse tipo de máquina continua a todo vapor, claro, mas também há quem se preocupa com a nossa segurança. É por isso que existe uma corrida para atualizar os padrões e fazer com que a criptografia continue segura. A criptografia pós-quântica será, ao que tudo indica, a bola da vez em 2018. Ela é a nossa boa e velha criptografia só que mais eficiente e pensada para segurar a onda contra esse possível caos futuro.

Paulo Barreto, pesquisador da Universidade de Washington Tacoma, nos EUA, falou com a gente meses atrás e nos explicou a que pé anda essa luta pela nossa segurança. "Existem algumas propostas que se baseiam nos modelos matemáticos antigos, mas estas já foram quebradas logo de cara, então acho que não é bem por aí que a gente precisa procurar novas soluções criptográficas", disse.

Enquanto isso, a internet quântica totalmente segura começa a se desenhar no horizonte. A primeira transmissão feita por meio de um satélite quântico aconteceu no último mês de setembro entre China e Áustria.

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Renascimento psicodélico

Sua mãe, seu pai ou alguém mais velho deve ter falado pra você não usar drogas. Não que esse seja um conselho errado, mas o que está por trás dessas substâncias é um papo que vai um pouco além do Nixon querendo salvar as criancinhas da América.

Este 2017 marcou um resgate da pesquisa científica sobre substâncias psicoativas, que há bastante tempo são usadas em terapias alternativas, como ayahuasca e ibogaína. Depois de anos trancados nas gavetas dos laboratórios, os estudos sobre drogas recreativas enfim voltaram à tona para nos esclarecer as muitas dúvidas que temos sobre elas.

Começamos a entender melhor como elas afetam nosso cérebro, como podem ser utilizadas para tratamento de transtornos alimentares. Também pudemos sacar um pouco melhor porque a famosa bad trip acontece — coisa bastante importante importante se vamos usá-las como medicamento algum dia.

Apesar do destaque dos alucinógenos, a maconha não ficou esquecida e caminhamos para entender porque ela pode não bater legal. E, sim, tivemos mais confirmação de que cocaína te fode mais dos que você gostaria de admitir.

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Vibrações do espaço

Se 2016 foi o ano em que descobrimos o brinquedo novo das ondas gravitacionais, em 2017 vimos seus primeiros estudos de larga escala. A escala dos eventos que geram esse tipo de onda é tão surreal que é difícil de imaginar.

No início do ano, foi a observação da colisão de dois buracos negros com massas 19 e 31 vezes maiores do que o nosso sol. Apesar da magnitude do evento, não é algo simples de captar a ondulação do tecido do espaço-tempo, uma vez que essas ondulações são extremamente sutis e geram vibrações aproximadamente 400 vezes menores do que o raio de um próton. Até Einstein — que previu o evento em 1916 — duvidava que elas pudessem ser detectadas por meios tecnológicos.

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Quando estávamos felizes com a detecção das ondas geradas pelas fusões de buracos negros, eis que a colisão duas estrelas de nêutrons há 130 milhões de anos-luz da Terra, produziram ondas detectáveis aqui no nosso planeta. Diferente dos buracos negros, que não emitem nenhuma forma radiação visível, as estrelas de nêutrons emitem tanta luminosidade quanto a explosão de uma supernova. Com isso foi possível visualizar pela primeira vez a relação entre luz e ondas gravitacionais de um fenômeno desse porte. O mais animador: ainda estamos começando a explorar as possibilidades da pesquisa com este tipo de onda.

A expectativa é que 2018 deve reservar boas novidades para quem curte olhar para as estrelas. Enquanto o ano novo não chega, você pode curtir a jam do sistema Trappist-1, com 7 exo-planetas com tamanho aproximado ao da terra.

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Robôs para o bem, robôs para o mal

Enquanto esperamos a singularidade acontecer e nos preparamos para o possível apocalipse robótico, vamos curtindo as promessas de que robôs vão melhorar a nossa vida — até em coisas que realmente não estamos precisando de ajuda —, em especial em relação aos algoritmos que estão sendo desenvolvidos.

Infelizmente ainda não chegou o momento em que carros e o petróleo serão aposentados, mas começaram a surgir os algoritmos que prometem colocar um pouco de ordem na bagunça do nosso sistema viário. Até coisas mais mundanas como reconhecimento facial de atores e atrizes porno também estão na lista de coisas que começamos a ver este ano e logo menos vão estar disponíveis. (Isso sem contar no cara que usou aprendizado de máquina para colar a cara de famosas em filmes adultos numa mistura de surpreendente e assustador. Alguns debates sobre isso rolarão ano que vem, e sim, isso vai ser bom para botarmos ordem nas coisas.)

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Também vimos em 2017 que têm um monte de gente usando robôs para o pior lado. E não estamos falando dos deprimentes robôs sexuais. Citamos aqueles algoritmos que fazem você pagar mais caro pelas coisas e que manipulam a opinião política por meio das redes sociais. Esses aproveitadores, infelizmente, não vão desaparecer. Nossa missão, claro, é ficar em cima deles para mostrar o quão perversa algumas tecnologias podem ser.

Este também foi o ano de sacar que as máquinas estão ficando bem mais inteligentes. Algumas até aprenderam física quântica e, segundo muitos levantamentos, estão prestes a roubar muitos empregos, incluindo o de hackers. Mas talvez isso seja algo bem menos terrível do que você imagina.

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A luta para entender a relação entre tecnologia e ansiedade

Por mais forte que você julgue ser sua mente, este ano não foi fácil pra ninguém. Especialmente se você mora aqui no Brasil, onde as taxas de transtorno de ansiedade são as mais altas do mundo. Por mais que a não gostemos de admitir, o fato das coisas não estarem realmente legais mexem com a nossa cabeça.

A ciência tem dado uma força para entender melhor o que acontece com a nossa mente quando não estamos na nossa melhor forma. E uma coisa que ficou clara é que nessas horas a internet pode não ser a sua melhor amiga, tampouco as redes sociais. Na verdade, vimos que as empresas de redes sociais estão se aproveitando de nossas vulnerabilidades emocionais para nos vender coisas. A bolha é mais cruel do que imaginamos.

Também tivemos a confirmação de que parte da explicação para forma como lidamos com alguns dos nossos problemas ter raíz nos nossos genes ou mesmo na forma como nossos pais lidaram com a nossa criação.

Se entender o problema é uma parte importante para a sua resolução, 2018 têm tudo pra ser um ano melhor do que este.

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