Sexo

Meu ex me deletou do Instagram dele porque eu não combinava com sua nova estética

Ainda somos amigos, mas a ascensão da “ex-tética” significa que ex-parceiros estão sendo apagados da rede.
Hannah Smothers
Brooklyn, US
MS
Traduzido por Marina Schnoor
A transmasculine person with a furry blue coat checking his phone on the sidewalk
Foto por Zackary Drucker para The Gender Spectrum Collection.

Fiquei com meu ex-namorado por uns nove meses, então acho que posso dizer que ele gostava, pelo menos um pouco, do meu rosto. Ele postou fotos da minha cara em seu Instagram durante o relacionamento, algo que você não faz se tem vergonha da pessoa com quem está ou não a acha muito interessante. Terminamos no meio de 2017, ele mudou para LA, e alguns meses depois, estávamos fazendo aquela coisa meio impossível de realmente manter contato como amigos. Durante tudo isso, meu rosto continuou um elemento descendente mas ainda presente na página dele. Mas uns três meses atrás, abri o perfil dele e notei que todos os traços do nosso relacionamento tinham desaparecido.

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Apagar todas as memórias agora dolorosas de um relacionamento nas redes sociais é normal. Mas isso é algo que você faz logo depois de terminar, não meses depois. Nosso término foi quase indolor; rapidamente percebemos que nos daríamos melhor como amigos (e sempre fomos basicamente amigos), e passamos facilmente para aquela boa fase das piadas sobre “quando a gente namorava!!!” Então por que me apagar de repente?

A ficha caiu lentamente, porque eu não queria reconhecer. Mas quanto mais eu passava pela página dele e notava que as outras ex ainda estavam lá, ficou difícil negar: meu rosto foi especificamente arrancado da página porque eu não me encaixava mais na estética do Instagram dele. Me tornei o equivalente das garrafas de condimentos que você empurra pra fora do enquadramento antes de tirar uma foto legal da sua comida. Algo no meu rosto (extremamente normal!) não se encaixava na marca que ele queria mostrar para o mundo, então ele me cortou. Como um colega de escola (que, sinceramente, devia ficar com o meu emprego) disse quando tuitei sobre essa conclusão, eu não conseguia deixar de imaginar se eu tinha passado de estética para… ex-tética.

Admito que é um problema muito chato, para os dois lados: isso significa que meu ex é alguém que se importa tanto com sua “Imagem” que meticulosamente poda sua página; e é um golpe por associação pra mim também, alguém que namorou uma pessoa assim e ainda fica entrando na página dele. Mas como logo descobri ao falar sobre essa questão com todo mundo disposto a ouvir, não estou sozinha nesse nicho de vergonha. Enquanto as pessoas investem cada vez mais na curadoria das suas páginas pessoais e outros fazem dinheiro criando e vendendo filtros que tornam o mundo um brinquedo de parque de diversões monocromático, nem todos os rostos e memórias vão sobreviver a cortes cada vez mais rigorosos.

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As razões que consigo pensar para deletar fotos da sua página do Instagram: como já falei, a dor emocional; vergonha extrema sobre o pensamento/ideia; preocupação profissional, e acabou a lista. O conceito de cortar pessoas específicas, especialmente aquelas com quem você namorou/transou, por razões estéticas não tinha me ocorrido antes.

“Estética”, claro, é algo altamente subjetivo. O que guia as postagens artísticas de uma pessoa pode não ser a mesma coisa para outra. O Instagram do Pablo Picasso não seria parecido com o de Edward Hopper, a arte está nos olhos de quem vê, etc. Consigo entender isso se você é alguém que mantém uma imagem profissional online, tipo se é um artista plástico e sua página no Instagram é um meio de publicidade. Nora*, 21 anos, me disse que uma vez apagou um ex e todas as fotos que ela postou que ele tinha tirado, meses depois do fim da relação, por uma certa obrigação criativa.

“Era meio óbvio que aquelas fotos tinham sido tiradas por ele, e senti que meio que estava endossando ou apoiando ele por ter aquelas fotos que ele tirou de mim ainda na minha página”, ela disse.

Mesmo sendo uma desculpa conveniente, esse não é sempre o caso. Colin, 21 anos, me disse por DM no Twitter que foi apagado da página de uma ex-namorada porque não tinha o visual de cara de fraternidade que ela queria (mesmo estando numa fraternidade). “Eu não me encaixava na estética da minha namorada de nenhum jeito ou forma; consequentemente, ela deletou a única foto nossa numa festa de uma fraternidade que nem era a minha”, Colin disse.

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Ser deletado muito tempo depois do fim de um relacionamento parece mais doloroso (mas de um jeito diferente) do que ser deletado imediatamente depois do rescaldo emocional. Deletar por propósitos estéticos acrescenta outra camada de crueldade; é uma mensagem de que você não se encaixa mais no que essa pessoa está tentando ser. É algo muito deliberado passar por meses do seu feed, clicando num quadrado específico, e deletando. Pelo menos nos momentos depois do término, a negação plausível ainda está na mesa: “É que a foto me deixa triste”. Semanas depois, com seus sentimentos enterrados em 15 centímetros de concreto, essa merda é mais difícil de explicar.

Uma exclusão latente é especialmente perturbadora porque se uma foto não foi removida logo de cara, parece que ela sempre esteve ali. E aí ela some – a menos que você tenha tirado uma screenshot ou tenha uma cópia – você perde o acesso a uma parte legal da sua própria vida. Como a maioria das pessoas provavelmente faz, Lauren, 24 anos, disse que costumava visitar uma foto específica dela na página de um ex da faculdade. Era uma imagem dela sozinha numa rede, com uma figurinha tipo “Amo essa menina!” “Eu voltava para aquela foto e pensava 'Ah, isso foi quando a gente estava realmente apaixonado'. Eu gostava de olhar aquela foto e provar pra mim mesma que não tinha sido tudo uma mentira”, disse Lauren. Aí um dia, ela voltou para aquela foto e notou que a legenda tinha sumido; na verdade, todas as legendas das fotos deles juntos tinham sumido. Ela bloqueou a página dele para cortar aquele hábito ruim.

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Alguns meses depois, uma amiga disse a ela que a página do ex estava muito estranha ultimamente. “Ele estava tentando ser, sei lá, um rapper do Soundcloud, então o desbloqueei e ele tinha apagado não só todas as fotos do nosso relacionamento, mas fotos que ele achou que não eram descoladas”, disse Lauren. “Ficou claro que ele estava deliberadamente mudando sua estética para combinar com algo que ele não é.”

Tem uma cena brutal no final de Me Chame Pelo Seu Nome onde o Oliver liga para o Elio para contar que está noivo. Eles conversam por alguns minutos, e Elio diz seu próprio nome no telefone, do jeito como eles faziam quando estavam juntos naquele verão. É a primeira vez que ele diz isso como uma pergunta, e aí ele repete a questão num sussurro: “Elio? Elio, Elio, Elio”. Há um silêncio na linha, e Oliver diz seu próprio nome de volta, depois diz “Lembro de tudo”. É algo legal de dizer para alguém que está sofrendo por você.

As pessoas nem sempre vão te fazer a cortesia de reconhecer memórias compartilhadas; uma coisa legal no Instagram é que ele vai. Passando por anos mesmo do seu próprio feed pode ser surpreendente, como ler um diário sobre um dia mundano na escola que você tinha esquecido. Assim como ler um antigo diário, pode ser constrangedor ver versões antigas de você e como você pensava sobre o mundo. Postei coisas na época da faculdade, por exemplo, que nunca postaria agora: fotos cheias de filtro de discos; meu namorado tocando violão; hashtags sérias como #adorolivronovo numa foto borrada de… um livro novo. Tento arquivar meu conteúdo mais vergonhoso para escondê-lo do meu feed, mas gosto de deixar a maioria das coisas ali. Gosto de lembrar de tudo, mesmo (especialmente) coisas que não pareciam nada legais.

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Ficou claro que ele estava deliberadamente mudando sua estética para combinar com algo que ele não é.”

Meu ex, que ainda me conhece bem apesar de ter deletado meu rosto do seu Instagram, me disse que estava esperando o dia em que eu ligaria para perguntar por que fui apagada da página dele. Perguntei por que fui cortada quando outras ex ficaram, ele riu e depois se desculpou. “Não é nada muito interessante, só meio que não uso mais redes sociais”, ele explicou. “Tem imagens de relacionamentos anteriores e algumas pessoas pulavam essas – acho que você foi cortada porque foi parte de um período de transição da minha vida, e quando digo de transição, quero dizer esteticamente.” Uma história razoável, mas ainda assim doeu.

Minhas suspeitas foram confirmadas, mas aí ele fez uma coisa por mim. Ele disse que as fotos não tinha sido realmente deletadas, só arquivadas. Ele queria poder ver de novo as memórias não glamourosas dele (como eu, e outras) e lembrar. Acho que ele não quer fazer isso publicamente, e por mim tudo bem. Mas ainda estou ofendida por não ter passado pela edição? Claro que sim, porra!

*Os nomes foram mudados.

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