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Erika Lust Está Ocupando o Pornô Feminista

A Lust usa sua bagagem para impulsionar sua companhia cinematográfica, a Lust Films, para a linha de frente do pornô escrito, produzido e dirigido por mulheres.

A Erika Lust é uma cineasta nascida em Estocolmo que tem um currículo impressionante em ciências políticas e estudos feministas na Universidade de Lund na Suécia. A Erika mora atualmente em Barcelona e usa sua bagagem para impulsionar sua produtora de filmes, a Lust Films, para a linha de frente do pornô escrito, produzido e dirigido por mulheres.

Nos encontramos com a Erika no lobby de seu hotel na Times Square, em Nova York. Ela estava na cidade para receber seu terceiro prêmio de Filme do Ano no Feminist Porn Awards 2012 pela sua obra mais recente, Cabaret Desire. Passamos os primeiros cinco minutos do nosso encontro tirando sarro da Times Square e o resto trocando figurinhas sobre os filmes pornôs nojentos que já vimos, e como ela pretende acabar com eles, ou pelo menos oferecer alternativas mais atraentes.

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VICE: Como você começou a fazer filmes pornô?
Erika Lust: Eu tinha que arrumar um jeito de ganhar a vida e tinha muitos amigos envolvidos com filmes e televisão, então comecei fazendo o básico, sendo mensageira, pegando as pessoas no aeroporto e coisas assim. Fiz isso durante alguns anos e aí comecei a trabalhar como assistente de produção. Nunca decidi que ia trabalhar com filmes, foi uma coisa que simplesmente aconteceu. Sempre fui apaixonada por cinema e teatro. Minha irmã era bailarina quando criança, então eu era louca por essas coisas, mas nunca pensei que seria capaz de fazer esse tipo de trabalho. Eu era uma boa aluna. Por volta de 2004 comecei a querer aprender mais sobre o lado técnico e artístico dos filmes, então fiz alguns cursos noturnos. Eventualmente surgiu a oportunidade de fazer um curta, mas me senti meio perdida e não sabia o que fazer. O feminismo sempre foi uma grande paixão minha, outra era sexualidade, então combinei essas duas coisas e decidi fazer um filme explícito. Um filme pornográfico. Mas do meu ponto de vista, o ponto de vista de uma mulher.

A maioria dos pornôs é bem nojenta.
Sim! Quando tive minha primeira "educação pornográfica", porque foi exatamente isso, uma educação, um namorado me mostrou uns DVDs e ficava dizendo: "Vamos fazer isso!". E eu sentia que meu corpo reagia às imagens, mas que eu não curtia verdade. Há uma grande discrepância entre o que senti fisicamente e o que senti emocional e intelectualmente.

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Por que você acha que a maioria dos filmes pornográficos é tão nojenta e repugnante?
Acho que é porque a indústria pornô é completamente dominada por homens. E não é qualquer tipo de homem. O pornô começou nos anos 60 e 70 como algo bem "pra frente". O pornô era uma reação a uma sociedade conservadora em que a sexualidade era vista como algo que devia ser escondido. Os primeiros filmes eram visionários. Aí a tecnologia dos anos 80 chegou e meio que destruiu tudo. De repente todo mundo tinha uma câmera em casa, não era uma coisa assim tão cara, qualquer um podia comprar, então os caras que gerenciavam os clubes de striptease e boates compraram câmeras e decidiram "filmar as garotas". Eles começaram a ganhar dinheiro com isso, e queriam fazer ainda MAIS dinheiro, aí foram ficando mais e mais nojentos. Nunca foi uma questão de sexualidade, e com certeza nunca foi algo a respeito da sexualidade feminina, as mulheres eram apenas objetos.

Você acha que algum dia apreciar pornografia não vai ser mais considerado tabu?
Não dá pra saber por que a sociedade tende a se abrir e depois se fechar novamente. Mas agora tenho a sensação de que vamos dar uns três passos para frente e talvez só um para trás. Há um grupo de intelectuais que estão começando a aceitar pornografia como algo bom, e algo que pode fazer parte da nossa sexualidade de uma maneira mais natural, mas não é uma coisa que está aí disponível para as massas.

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Quando você faz um filme, no que você se envolve diretamente? No design do cenário, casting ou tudo isso?
Tudo. Eu sou a chefe (RISOS). Meus filmes têm um passado e um futuro. Realmente conto quem são essas pessoas e porque elas se sentem assim umas pelas outras. A maioria dos outros filmes pornô é tipo, "um sofá", e começa daí. Não sinto que isso seja para mulheres em geral, acho que somos todos indivíduos quando se trata de sexualidade, mas pra mim, é difícil ficar excitada quando você não sabe o que está acontecendo. Mas estou envolvida em absolutamente tudo. Penso na história, escrevo o roteiro, escolho o elenco, tudo. Pra mim, fazer um filme é como uma gravidez. Um período de nove meses para fazer o tipo de filme que quero fazer.

Fale mais sobre a escolha do elenco.
Sempre tento tirar o pornô dos atores que escalo, porque isso é uma coisa completamente diferente. Se eles já trabalharam em filmes pornôs antes logo começam a fazer poses. Preciso dizer para eles transarem como fazem na vida real, porque nem os atores pornôs fazem sexo como nos filmes pornôs na vida real. Pornô é uma coisa entranha onde precisam separar as pessoas para mostrar alguma coisa. E na vida real isso não ia te satisfazer, porque a satisfação vem da intimidade, de poder sentir a pele da outra pessoa. Então, nos meus filmes tento fazer eles transarem como gente comum, aí é o meu trabalho achar os ângulos certos.

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O que mais gostei no Cabaret Desire é que o filme tem diálogos de verdade, e todo mundo é atraente.
Sim! A questão é que nos meus filmes escolho pessoas que são atraentes para mim, porque preciso querer ver essas pessoas nessas histórias, mas elas não são atraentes de um jeito falso. Adoro estética, adoro coisas bonitas e é isso que quero mostrar.

A maioria das pessoas só veem cerca de cinco minutos de um filme pornô. É por isso que você fez a história do Cabaret Desire em partes que podem ser assistidas separadamente?
Sim, exatamente. Quando você procura esse tipo de sensação que a pornografia fornece, geralmente é um impulso que dura 20 minutos. Sinto que é complicado fazer um filme de uma hora e meia. Assisti muito cinema mainstream e independente e às vezes acho que os filmes são muito longos. Não sei se é porque a sociedade está indo mais e mais depressa, e a gente simplesmente não tem mais tempo, mas sinto que um filme tipo Missão Impossível é longo demais. Então acho que temos que repensar os formatos, em todos os tipos de filmes.

Fale um pouco sobre o prêmio que você está recebendo.
Filme do ano! E na verdade já é a terceira vez pra mim. Eles começaram o Feminist Porn Awards para mostrar que existem outros tipos de pornografia, porque temos pouca visibilidade. É por isso que ganhar esses prêmios é uma coisa tão importante, é uma chance de mostrar para as pessoas que não conhecem esse gênero que esse tipo de filme existe.

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Por que o pornô é importante?
É importante porque faz parte da nossa sociedade. Mesmo que as pessoas não queiram pensar que a pornografia faz parte da nossa sociedade, ela faz! Da mesma maneira que a publicidade faz, porque está aí, e nos afeta. É especialmente importante para os jovens porque eles não têm uma educação sexual de fato. Nos ensinam coisas básicas como se você fizer sexo pode ficar grávida, ou pegar um DST, mas não ensinam COMO fazer sexo. Então quando você é garota ou garoto e pensa "UOU, estou sentindo alguma coisa. Quero fazer alguma coisa. Não sei como", o que você faz? Procura na internet, ou descobre um DVD. Você começa a ver pornografia. Aí esses garotos e garotas acabam aprendendo sobre pornografia, mas não sobre sexualidade. Eles ficam com essa concepção errada e nojenta sobre como o sexo funciona. Em vez de aprender sobre eles mesmos, só reproduzem o que veem na pornografia.

Você está trabalhando em algum projeto novo?
O Cabaret Desire saiu em novembro, então ainda estou promovendo o filme. Acho que é meu melhor filme e agora sinto que estou realmente começando a ter controle sobre as coisas e conseguindo mostrar minha visão. Meu objetivo agora é promovê-lo. Para que mais pessoas possam assisti-lo.

Como você edita aqueles barulhos de peido e coisas assim que acontecem durante as filmagens?
[Risos] Tento não editar e sim manter. Tudo. Tento manter tudo o mais natural possível.

Saiba mais sobre a Erika e a Lust Films AQUI.

Fotos: Maxwell Lander